Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:011/20
Data do Acordão:11/08/2022
Tribunal:CONFLITOS
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P30165
Nº do Documento:SAC20221108011
Data de Entrada:05/20/2020
Recorrente:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE O TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA VISEU – INSTÂNCIA CENTRAL – SECÇÃO CÍVEL – J1 E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE VISEU
AUTOR: A............ E OUTROS
RÉU: B............ – COMPANHIA DA SEGUROS, S.A. E OUTROS
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral: Conflito Nº 11/20

Acordam no Tribunal dos Conflitos

1. Relatório

A……………….. e C………………., por si e em representação legal do seu filho menor D………………, intentaram no Tribunal Judicial de Resende acção declarativa comum contra B……………. - Companhia de Seguros, SA, E……………., SA (a quem entretanto sucedeu F………………. Douro, SA), G………………, Companhia de Seguros H………………, SA e Município de Resende pedindo a sua condenação solidária na quantia de €130.589,65 acrescida dos juros moratórios contados desde a citação e, bem assim, quanto se venha a liquidar em execução de sentença e/ou em oportuna ampliação do pedido a título de: “a) danos patrimoniais futuros decorrentes da afectação da capacidade de ganho do A. D……………… em função da incapacidade de que venha a ficar em permanência afectado, do salário que venha a auferir uma vez integrado na vida activa e do tempo esperado de vida activa futura não inferior a 50 anos; b) Despesas com tratamentos médicos e medicamentosos que o menor D……………. venha a realizar no futuro; e c) Despesas com deslocações futuras para esses tratamentos”.

Alegam em síntese que o Réu Município de Resende celebrou um contrato de transporte escolar com a segunda Ré e que, no ano lectivo de 2010/2011, o Autor menor deslocava-se diariamente de casa para a escola e vice-versa como passageiro do autocarro da Ré E……………. afecto a tal transporte. No dia em que o Autor menor foi vítima do acidente de viação seguiam no autocarro da referida Ré alguns menores, em pé, junto à porta traseira sem que o motorista lhes tenha feito qualquer advertência e não estando no autocarro qualquer vigilante. Um dos menores terá puxado o dispositivo de emergência de abertura da porta traseira do autocarro a qual abriu, tendo o menor D……………. caído para fora do mesmo e, em consequência disso, sofrido ferimentos.

Mais alegam que o transporte dos alunos era custeado pelo Réu Município de Resende, que para isso recebia e recebe do Orçamento do Estado dotações financeiras destinadas a garantir tal transporte escolar. Acrescentam que ao transporte colectivo de crianças e jovens até aos 16 anos de e para estabelecimentos escolares, é aplicável o regime da Lei n.º 13/2006, de 17 de Abril, nos termos do qual estava a transportadora sujeita a um conjunto de obrigações, que se não se observavam no caso, e que o Réu Município tinha conhecimento das condições em que o transporte era efectuado e não cuidou de garantir que o mesmo fosse efectuado em conformidade as disposições legais, pelo que violação dessas disposições legais foi causal do acidente, sendo solidária a responsabilidade dos Réus pelos danos sofridos pelo Autor.

Em sede de contestação o Réu Município suscitou, além do mais, a excepção da incompetência em razão da matéria.

Ouvidos os Autores quanto à excepção, responderam que o fundamento do pedido é a “responsabilidade civil extracontratual emergente da omissão dos deveres de vigiar/zelar e garantir a manutenção e conservação das condições adequadas ao transporte de alunos (…) no autocarro afecto a tal serviço, deveres esses que os RR incumpriram", pelo que "o litígio não emerge do contrato celebrado entre a Ré E……………, SA e o Réu Município de Resende, nem de qualquer relação jurídica administrativa”.

Em 09.04.2015, na Secção Cível da Instância Central de Viseu foi proferida decisão a julgar o Tribunal incompetente em razão da matéria para apreciação e julgamento da acção intentada, absolvendo os Réus da instância.

Remetidos os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAF de Viseu) foi o Município de Resende notificado para juntar aos autos fotocópia certificada do contrato de transporte escolar celebrado com a empresa E………., Lda, tendo vindo informar que “tal como já havia alegado nos artigos 18.º a 22.º da sua contestação, não celebrou qualquer contrato com a ré E………… Lda. Não pode, por isso, juntar um contrato que não existe”. (fls. 383)

Ainda no TAF de Viseu foram notificadas as partes para se pronunciarem quanto à incompetência material do Tribunal e o Município de Resende para “esclarecer ao abrigo de que contrato e/ou deliberação do executivo camarário (...) e/ou ainda também de que norma ou normas legais efectuou ou efectuava o pagamento de determinados transportes aos alunos da sua área territorial (...)”. (fls. 689)

Os Autores responderam defendendo a competência do Tribunal (fls. 694).

Por sua vez, o Município de Resende esclareceu que “não foi celebrado qualquer contrato, nem tomada qualquer deliberação, nem despacho, a adjudicar o transporte à ré E…………. SA, quando esta transportava os alunos sinistrados. Foram (...) praticados atos materiais (requisição de passes sociais junto da referida ré, para os alunos que o solicitavam junto dos serviços administrativos do município, e o pagamento do valor destes àquela mesma ré) no cumprimento da obrigação legal do município garantir o transporte dos alunos, nos termos do artigo 6.º, n.º 1 do D.L. 299/84, de 05 de Setembro". (fls.698)

Na audiência prévia (fls. 705) os Autores mantiveram que o Tribunal é materialmente competente e os Réus defenderam ser o Tribunal materialmente incompetente.

Por sentença de 13.02.2019, o TAF de Viseu declarou o Tribunal materialmente incompetente para conhecer do pedido formulado na acção e absolveu os Réus da instância.

Ambas as decisões supra indicadas transitaram em julgado.

Suscitada a resolução do conflito negativo de jurisdição, o processo foi remetido ao Tribunal dos Conflitos.

Neste Tribunal dos Conflitos as partes foram notificadas para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 11.º da Lei n.º 91/2019.

A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de dever ser atribuída a competência material para apreciar a presente acção aos tribunais judiciais.

2. Os Factos

Os factos relevantes para a decisão são os constantes do relatório.

3. O Direito

O presente Conflito Negativo de Jurisdição vem suscitado entre o Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, Instância Central Cível de Viseu, e o TAF de Viseu.

Entendeu a Instância Central Cível de Viseu ser a jurisdição comum incompetente, em razão da matéria para conhecer do litígio por considerar que “os autores peticionam a condenação solidária dos réus; ou seja, a fonte de responsabilização de todos os réus é a mesma, que já se referiu: a inobservância de determinadas obrigações legais para efetivação do transporte escolar” (...) “Daí que pretendendo a autora ser indemnizada dos danos advindos de determinada conduta/omissão de uma entidade pública, por invocada responsabilidade extracontratual dos réus (demandados em regime de solidariedade), em consequência da omissão de um dever a que estava(m) obrigado (s), a sua eventual responsabilização insere-se no âmbito de aplicação do citado artigo 1º, nºs 2 e 5, da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro”. (fls. 311/317)

Por sua vez o TAF de Viseu também se considerou incompetente em razão da matéria. Entendeu que “(,..) nenhuma relação administrativa emerge ou está subjacente ao acidente em discussão nos autos, na medida em que o Réu, Município de Rezende, é totalmente alheia ao referido serviço público de transporte de passageiros que o menor e sinistrado, D…………….. utilizava nas circunstâncias de tempo, modo e lugar em que o acidente ocorreu.

Ou seja, os Autores configuram a acção como sendo, como efectivamente é, de responsabilidade civil extracontratual. Todavia, não demonstram minimamente que a mesma quer pelo pedido quer pela causa de pedir, que a mesma se possa fundar na responsabilidade extracontratual do Réu, Município de Rezende, já que, como demonstrado, sendo que estão impossibilitados os Autores de o demonstrarem, já que essa prova necessariamente tem ou teria que ser documental, qual seja o alegado contrato de transportes escolares e/ou de circuitos especiais escolares regulado pela Lei n.º 13/2006, de 7 de Abril, pois o mesmo não existe. E assim, substancialmente o Réu Município de Rezende, necessariamente que seria ou é parte ilegítima nesta acção e, consequentemente, inexistindo a necessária relação jurídica administrativa, só possível apenas se demonstrada relativamente ao réu Município, por ser a única entidade pública interveniente, jamais se pode responsabilizar o mesmo Réu nos termos da Lei n.º 67/2007, de 31/12.

Com efeito, a responsabilidade emergente nesta acção ou que subjaz à mesma é regulada exclusivamente por normas do direito civil, no caso a responsabilidade civil ou aquiliana regulada nos artigos 483.º e seguintes do Código Civil, porque em causa estão apenas normas de direito civil e não de direito público ou jurídico-administrativas e, também, se nos afigurando que o litígio terá necessariamente que ser dirimido entre sujeitos privados (as partes em confronto, autores e réus de que necessariamente terá de ser excluído o réu Município)”.

Vejamos.

Cabe aos tribunais judiciais a competência para julgar as causas “que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional” [artigos 211º, nº 1, da CRP, 64º do CPC e 40°, nº 1, da Lei nº 62/2013, de 26/8 (LOSJ)], e aos tribunais administrativos e fiscais a competência para julgar as causas “emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais” [artigos 212°, nº 3, da CRP, 1º, nº 1, do ETAF].

Na redacção anterior à que lhe foi conferida pelo DL nº 214-G/2015, de 2 de Outubro, que atendendo à data de propositura da acção é a que aqui releva, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF, aprovado pela Lei nº 13/2002, de 19 de Fevereiro) replicava no art. 1°, nº 1, essa genérica previsão que era concretizada no artigo 4°, com delimitação do “âmbito da jurisdição” mediante uma enunciação positiva (nº 1) e negativa (nºs 2 e 3).

Tem sido reafirmado por este Tribunal, e constitui entendimento jurisprudencial e doutrinário consensual, que a competência material do tribunal se afere em função do modo como o autor configura a acção e que a mesma se fixa no momento em que a acção é proposta.

Como se afirmou no Acórdão deste Tribunal de 01.10.2015, Proc. 08/14 “A competência é questão que se resolve de acordo com os termos da pretensão do Autor, aí compreendidos os respectivos fundamentos e a identidade das partes, não importando averiguar quais deviam ser os termos dessa pretensão, considerando a realidade fáctica efectivamente existente ou o correcto entendimento do regime jurídico aplicável. O Tribunal dos Conflitos tem reafirmado constantemente que o que releva, para o efeito do estabelecimento da competência, é o modo como o Autor estrutura a causa e exprime a sua pretensão em juízo. (...) É certo que o tribunal é livre na indagação do direito e na qualificação jurídica dos factos. Mas não pode antecipar esse juízo para o momento de apreciação do pressuposto da competência”.

O mesmo entendimento foi seguido no Acórdão do Tribunal dos Conflitos de 24.02.2021, Proc. 03143/19.3T8GMR.S1: “Com efeito, saber como se qualifica a relação (...) invocada pela autora, e se os efeitos que a autora pretende são ou não fundamentados, são questões que respeitam ao mérito da causa e à procedência ou improcedência da acção; interpretar o contrato invocado e retirar dessa interpretação consequências quanto à identificação do tribunal competente significa inverter a relação pressupostos/questão de fundo”.

Os Autores alegam que, no ano lectivo em que sofreu o acidente, o menor D…………… deslocava-se diariamente de casa para a escola e vice-versa como passageiro do autocarro que a empresa E……………, SA afectou a tal transporte, ao abrigo do contrato celebrado com o Município de Resende para transporte escolar dos alunos do 1° ao 12° anos de escolaridade. Referem que juntamente com os alunos aquela empresa também procedia ao transporte oneroso de outras pessoas que para o efeito adquirissem o respectivo título de transporte/bilhete.

Afirmam que o transporte dos alunos era custeado pelo Réu Município de Resende, que para isso recebia e recebe do Orçamento do Estado dotações financeiras destinadas a garantir tal transporte escolar. Que o Réu Município tinha conhecimento das condições em que o transporte era efectuado e que não observava as regras estabelecidas pela Lei nº 13/2006, de 17 de Abril (regime jurídico do transporte colectivo de crianças e jovens até aos 16 anos de e para os estabelecimentos de educação e ensino) e não cuidou de garantir que o mesmo fosse efectuado em conformidade com as disposições legais, pelo que a violação dessas disposições legais foi causal do acidente, sendo solidária a responsabilidade dos Réus pelos danos sofridos pelo Autor.

Pelo DL nº 299/84, de 05 de Setembro, diploma ao tempo em vigor, foi regulada a transferência para os municípios do Continente das novas competências relativas à organização, financiamento e controle de funcionamento dos transportes escolares.

Nos termos daquele diploma, “na efectivação do transporte da população escolar serão utilizados, em princípio, os meios de transporte colectivo (rodoviário, ferroviário ou fluvial) que sirvam os locais dos estabelecimentos de ensino e de residência dos alunos”, só se realizando circuitos especiais quando os transportes colectivos não satisfaçam aquelas condições (cfr. art. 6°) e cabendo às Câmaras Municipais requisitar e suportar os custos dos bilhetes de assinatura (passe escolar) (cfr. art. 13°).

Ora, não estando em causa a apreciação do mérito, como se disse, será na forma como os Autores configuraram a acção e na versão fáctica por si alegada que terá de assentar a decisão acerca da competência do tribunal recorrido em razão da matéria.

Os Autores configuram a acção como sendo de responsabilidade civil extracontratual emergente de negligência e violação das disposições legais relativas ao transporte colectivo de crianças e jovens por parte do Município e demais Réus.

O nº 1 do art. 4° do ETAF na versão em vigor à data de propositura da acção estipulava na alínea g) que “Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto: g) Questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa.

No ETAF 2002, como se observou no Acórdão deste Tribunal de 20.09.2011, Proc. 03/11: “Adoptou-se, assim, em matéria de responsabilidade civil extracontratual, um critério de atribuição de competência aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal que atende apenas à natureza pública da entidade demandada, independentemente da natureza da relação jurídica de que emerge o litígio”.

De facto, na Exposição de motivos da PROPOSTA DE LEI N.º 93/VIII-APROVA O ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS (REVOGA O DECRETO-LEI N.º 129/84, DE 27 DE ABRIL) que deu origem à Lei nº 13/2002 de 19 de Fevereiro podemos ler:

“Ao mesmo tempo, e dando resposta a reivindicações antigas, optou-se por ampliar o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos em domínios em que, tradicionalmente, se colocavam maiores dificuldades no traçar da fronteira com o âmbito da jurisdição dos tribunais comuns.

A jurisdição administrativa passa, assim, a ser competente para a apreciação de todas as questões de responsabilidade civil que envolvam pessoas colectivas de direito público, independentemente da questão de saber se tais questões se regem por um regime de direito público ou por um regime de direito privado”.
(https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=18674)
O que foi reiterado na Exposição de motivos da PROPOSTA DE LEI N.º 102/IX (ALTERA O ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS, APROVADO PELA LEI N.º 13/2002, DE 19 DE FEVEREIRO) e que deu origem à Lei n.º 107-D/2003, de 31 de Dezembro:

“Afigura-se, por último, aconselhável aproveitar o ensejo para rever em três aspectos muito pontuais o regime do artigo 4.º do ETAF, no que respeita à delimitação do âmbito da jurisdição.

Não se pretende reabrir a controvérsia em torno de uma matéria tão complexa e sensível, o que se afigura mesmo indesejável sem dar ao novo Estatuto o tempo de aplicação necessário para que possam ser testadas as soluções nele consagradas. Apenas se pretende esclarecer três dúvidas que têm sido suscitadas a propósito de três aspectos pontuais e facilmente resolúveis. (…) o segundo tem o propósito de esclarecer que o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos se estende à apreciação de todos os litígios respeitantes à questão da responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público”.
(https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=19924)

Deste modo, a competência assim atribuída aos tribunais administrativos não depende do regime público ou privado da responsabilidade.

No caso em apreço, estamos perante uma acção para efectivação de responsabilidade civil em que é pedida a condenação solidária de uma pessoa colectiva de direito público - o Município - e de privados. Saber se existia o contrato de adjudicação de transportes escolares, se houve negligência ou se se verificou a violação dos dispositivos legais invocados são questões que respeitam ao mérito da acção.

Assim, a natureza pública do Réu Município impõe que sejam os tribunais administrativos os competentes para a acção nos termos da alínea g) do n° 1 do art. 4°, na versão vigente à data da propositura da acção.

Acresce que, como se disse no Acórdão deste Tribunal de 07.10.2009, Proc. 01/09, “O facto de ser demandada uma empresa privada em conjunto com entidades públicas não é obstáculo à atribuição do conhecimento do litígio aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, pois os particulares podem ser demandados nos processos do contencioso administrativo «no âmbito de relações jurídico-administrativas que os envolvam com entidades públicas ou com outros particulares» (art. 10.º, nº 7, do CPTA).

Esta norma permite que, quando a relação jurídica controvertida respeitar a várias pessoas e tiver natureza administrativa, a acção possa ser proposta contra todos os interessados, mesmo que tenham natureza privada, desde que estejam envolvidos nessa relação jurídica administrativa, que determina a competência contenciosa dos tribunais administrativos.

«É irrelevante, neste contexto, que a alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF circunscreva o âmbito de jurisdição administrativa aos litígios que tenham por objecto a “responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público”. O que delimita o âmbito de jurisdição administrativa é a natureza da relação jurídica em causa: desde que a acção tenha por objecto um facto imputável a uma pessoa colectiva pública e na mesma relação jurídica se encontre envolvido um particular, a acção pode ser dirigida também contra este particular, ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 10.º do CPTA». (Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 1ª, edição, página 80) (cfr. no mesmo sentido o Acórdão do Tribunal dos Conflitos de 29.09.2011, Proc. 03/11 e o Acórdão do STA de 03.03.2010, Proc. 0278/09).

Deste modo, tem de concluir-se que nas circunstâncias do caso, é a jurisdição administrativa e fiscal a competente para conhecer da acção.

Pelo exposto, acordam em julgar competente para apreciar a acção o TAF de Viseu.

Sem custas.

Lisboa, 8 de Novembro de 2022. - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza.