Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:049/13
Data do Acordão:12/11/2013
Tribunal:CONFLITOS
Relator:ANTÓNIO LEONES DANTAS
Descritores:HABITAÇÃO SOCIAL
DESPEJO
JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA
Sumário:Cabe à jurisdição administrativa, nos termos do artigo 4°, n.° 1, al. f) do ETAF, a competência para conhecer de uma acção em que uma empresa pública municipal, actuando por delegação do Município, peça, para além do mais, a desocupação de parte de uma casa de habitação social adjudicada no âmbito do Plano Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, PER, por incumprimento das obrigações do adjucatário, nomeadamente, a não residência no imóvel adjudicado e a falta de pagamento de rendas.
Nº Convencional:JSTA000P16737
Nº do Documento:SAC20131211049
Data de Entrada:09/05/2013
Recorrente:EMGHA - EMPRESA DE GESTÃO DO PARQUE HABITACIONAL DO MUNICÍPIO DE CASCAIS, EM, NO CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO ENTRE O TRIBUNAL DE FAMÍLIA E MENORES E DE COMARCA DE CASCAIS - 2.º JUÍZO CÍVEL E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE SINTRA
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral: Conflito n.°: 49/13.

Acordam no Tribunal dos Conflitos:
I

A EMGHA - EMPRESA de GESTÃO do PARQUE HABITACIONAL do MUNICÍPIO de CASCAIS intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Cascais uma «acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário», contra A…………, solteiro, com última residência conhecida no Bairro de …………, Rua …………, ex lote ………, n.° …………, Quarto …………, 2785-………… — …………, comarca de Cascais, formulando os seguintes pedidos: «Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e, consequentemente: a) ser declarado resolvido o “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho” celebrado entre a a. e o r. em 24.03.2004; b) ser o r. condenado a entregar à a. a parte do fogo cedida, totalmente livre e devoluta de pessoas e bens e em bom estado de conservação, tal como a encontrou; c) ser o r. condenado a pagar à a. a quantia de € 981,96 (novecentos e oitenta e um euros e noventa e seis cêntimos), correspondente a 06 (seis) prestações em atraso, bem como todas as prestações mensais que se vencerem até à data em que se considerar resolvido o “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho”, acrescida dos juros de mora calculados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento; d) ser o r. condenado a pagar à a. a indemnização devida pela ocupação da parte do fogo cedida desde a data da resolução do “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho” até à data da restituição efectiva da mesma.

Para o caso de se entender que o doc. n.° 2 constitui um contrato de arrendamento urbano, deverá subsidiariamente: a) ser declarado resolvido o “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho” celebrado entre a a. e o r. em 24.03.2004; b) ser o r. condenado a entregar à a. a parte do locado, totalmente livre e devoluta de pessoas e bens e em bom estado de conservação, tal como a encontrou: c) ser o r. condenado a pagar à a. a quantia de € 981,96 (novecentos e oitenta e um euros e noventa e seis cêntimos), correspondente a 06 (seis) rendas vencidas e não pagas, bem como as rendas vincendas até ser declarado resolvido o referido acordo de cedência, acrescida dos juros de mora calculados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento: d) ser o r. condenado a pagar à a. a indemnização devida pela ocupação da parte do locado desde a data da resolução do “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho” até à data da restituição efectiva da mesma.»

Frustradas as diligências tendentes à citação do Réu, foi proferido despacho pelo M.m° Juiz de Direito do 2.° Juízo Cível do «Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais» em que declarou a incompetência em razão da matéria do Tribunal da Comarca de Cascais para conhecer do pedido formulado pela Autora.

Aquela decisão é fundamentada, para além do mais, no seguinte:

«No caso em apreciação a relação material controvertida queda-se já pelo próprio incumprimento do contrato, enquanto complexo de obrigações e deveres, que teve subjacente o acto de atribuição de um fogo, pelo que nos encontramos no âmbito de aplicação da alínea f) do citado artigo 4° do ETAF.

Na verdade, nos termos do artigo 4°, alínea f) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais:

“1 - Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto: (...)

f) Questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto passível de acto administrativo, de contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos específicas do respectivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública ou um concessionário que actue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público: (...)”.

Em suma, perante o facto de a atribuição de fogo ser decidida por despacho, por decisão da autarquia, perante a análise dos rendimentos do agregado e na prossecução do interesse público, afigura-se-me inquestionável que o que legitima a ocupação do locado e que, por outro lado, estriba a obrigação de pagamento de renda não poderá deixar de ser qualificado como administrativo, face ao regime legal a que se submete. - neste sentido, com muito interesse: douto acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18.05.2006. disponível in www.dgsi.pt.

Assim, também já foi decidido pela 6.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa, no agravo n.° 959106, relatado por Gilberto Martinho dos Santos Jorge.

Assim, impõe-se concluir, sem necessidade de mais delongas, que o presente tribunal é absolutamente incompetente em razão da matéria para a instrução dos autos e subsequente apreciação do pedido, por se verificar a situação prevista no artigo 4º, alínea f) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais».

Notificada deste despacho veio a Autora, embora manifestando discordância com o mesmo, requerer a remessa dos autos ao tribunal administrativo considerado competente, nos termos do artigo 14.° n.° 1, do CPTA.

Já no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foram desencadeadas novas diligências tendentes à citação do Réu, que veio a ser citado editalmente.

Citado o Ministério Público, veio este a deduzir contestação em representação do Réu ausente, contestação que motivou resposta da Autora.

Foi então lavrado despacho pelo M.° Juiz titular que declarou a incompetência material do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra para conhecer do litígio.

Este despacho integra o seguinte dispositivo:

«Por tudo o exposto, julgo incompetente este tribunal administrativo de círculo de Sintra, em razão da matéria e da jurisdição, para conhecer da presente acção e dos respectivos pedidos condenatórios, por ser competente o tribunal comum, em face da natureza privada da relação jurídica contratual concreta e das consequentes normas; sendo que, para casos de contratos administrativos de arrendamento para habitação, respectivo despejo e execução das dívidas, sempre seria competente a própria proprietária do imóvel CMC/Autora, em face das normas especiais que lhe atribuem tal poder de autoridade, e do processo de execução respectivo, e não este tribunal.

Sem custas do incidente por entender que a Autora não deu causa.

Notifique e dê baixa, em face do critério do SITAF, sem prejuízo da decisão superior.

Após, se nada houver, subam os autos ao venerando STA - Tribunal de Conflitos.»

Ambas as decisões transitaram em julgado, pelo que estamos perante um conflito negativo de jurisdição que urge resolver.

O Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal dos Conflitos proferiu parecer, pronunciando-se pela atribuição da competência ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra. Invoca como fundamento desta posição e, em síntese conclusiva, que «no caso, por detrás de tudo está a deliberação da Câmara Municipal de Cascais de 2 de Fevereiro de 2004 que concedeu ao R. licença para habitar a casa que é o motivo da acção no âmbito da habitação social e de rendas condicionadas» pelo que refere ainda «acompanhamos a fundamentação da decisão do Tribunal Judicial de Cascais (2.° Juízo Cível) constante de fls. 60/67 destes autos que no fundo segue a jurisprudência constante» de vários acórdãos deste Tribunal dos Conflitos que indica.

Sem vistos, mas com distribuição prévia do projecto de acórdão, cumpre decidir.
II

1 - A causa de pedir da acção instaurada é a seguinte:

«1 - A a. é gestora do parque habitacional do Município de Cascais, legítimo proprietário do fogo habitacional sito no Bairro de …………, Rua …………, ex Lote …………, n.° …………, Quarto …………, em …………, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………… sob o art. 17938, isento de licença de utilização nos termos da lei, conforme Protocolo cuja cópia se junta como doc. n.° 1 e aqui se dá por integralmente reproduzido.

2 - Em virtude do “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho” celebrado em 24 de Março de 2004, a a. cedeu ao r., para habitação deste, a parte do fogo identificada no art. 1.º antecedente, nos termos estabelecidos no referido acordo, cuja cópia se junta como doc. n.° 2 e aqui se dá por integralmente reproduzido.

3 - Tal parte do fogo foi cedida para habitação do r. pelo prazo de 1 (um) ano, com início em 01.06.2004, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos, conforme estabelecido na cláusula 1.ª do citado doc. n.° 2.

4 - A prestação mensal convencionada inicialmente foi de € 47,65 (quarenta e sete euros e sessenta e cinco cêntimos), conforme estabelecido na cláusula 3. do citado doc. n.° 2

5 - Estabelecendo a respectiva cláusula n.° 5 que a prestação seria paga adiantadamente na tesouraria da a, até ao dia oito do mês a que respeitasse.

6 - Em virtude das actualizações operadas e de acordo com o rendimento do r., a prestação mensal sofreu alterações e foi ajustada gradualmente (cfr. cláusula n.° 4), sendo que na presente data o respectivo valor ascende a € 165,00 (cento e sessenta e cinco euros).

7 - Sucede, porém, que o r. deixou efectivamente de residir na parte do fogo cedida pela a..

8 - Com efeito, a a. efectua regularmente visitas aos fogos atribuídos aos cessionários com vista, por um lado, a avaliar a respectiva situação social e, por outro lado, a verificar as condições em que os fogos e respectivas partes cedidas se encontram

9 - Vários técnicos da a. comprovaram pessoalmente e em diversas tentativas de visitas ao fogo em apreço que o r. não usa efectivamente a parte do fogo cedida pela a. desde, pelo menos, meados de 2007, conforme adiante melhor se descreverá.

10 - Sucede que, em 24 de Agosto de 2007 o r. informou a a. que se iria ausentar para o Luxemburgo alegando que iria exercer naquele país a sua actividade profissional, conforme cópia da declaração que se junta como doc. 3 e cópia do recibo de vencimento que se junta como doc. n.° 4 (e cuja tradução se protesta juntar) e aqui se dão integralmente por reproduzidas.

11 - Com efeito, o r. até à presente data, nunca mais voltou a residir no locado em apreço.

12 - Quer os moradores dos fogos vizinhos, quer os próprios funcionários da a. que se deslocam regularmente aos fogos municipais destinados a habitação social confirmaram que o r. deixou de residir na parte do fogo cedida pela a, conforme atestam os relatórios de visita domiciliária elaborados pelos técnicos da a. e que se juntam como docs. n.° 5 a 10 e aqui se dão por integralmente reproduzidos.

13 - Se a parte do fogo cedida constituísse o centro da vida familiar e social do r. e aí este residisse, certamente os colaboradores da a. conseguiriam contactá-lo e visitá-lo, o que não sucede.

14- Deste modo desde, pelo menos, meados de 2007, que o r. não pernoita na parte do fogo cedida.

15 - Assim como desde essa data que o r. não recebe na parte do fogo cedida os seus amigos e/ou familiares.

16 - Da mesma forma que, desde então, o r. não confecciona nem toma na parte do fogo cedida as suas refeições.

17 - Circunstância que se mantém desde, pelo menos, meados de 2007 até à presente data, conforme foi atestado pelos vizinhos do r. e colaboradores da a.

18 - Acresce que até à presente data o r. não pagou as prestações mensais correspondentes aos meses de Dezembro de 2007, Fevereiro, Novembro e Dezembro de 2008, Janeiro e Fevereiro de 2009, estando em dívida actualmente a quantia total de € 981,96 (novecentos e oitenta e um euros e noventa e seis cêntimos), assim discriminada: a) Dezembro de 2007, no valor total de € 160,98; b) Fevereiro, Novembro e Dezembro de 2008, no valor total de € 490,98; c) Janeiro e Fevereiro de 2009, no valor total de € 330,00.

19 - Na presente data encontra-se em dívida a quantia total de € 981,96 (novecentos e oitenta e um euros e noventa e seis cêntimos), correspondente a 06 (seis) rendas em atraso,

20 - Acresce que a parte do fogo cedida pela a. ao r. tem vindo a ser ocupada por pessoas que, além de não integrarem o agregado familiar do r. jamais a sua permanência foi autorizada pela a (conforme citados docs. n.° 5 e 6).

21 - Por conseguinte, não resta alternativa à a. senão o recurso à presente acção para exercício dos seus legítimos direitos, designadamente para efeitos de resolução do “Acordo de Cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e casa de banho”, restituição da parte do fogo cedida ao r. e cobrança de todas as quantias devidas por este.»

2 - Por sua vez, o “acordo de cedência” referido pela Autora na petição integra, com relevo para a decisão do presente conflito, o seguinte:

«Entre EMGHA - Empresa de Gestão do Parque Habitacional do Município de Cascais, E.M., com sede na Av. Eng.° Adelino Amaro da Costa, n.° 89, Freguesia e Concelho de Cascais, número de contribuinte ............, representada pelo Presidente do Conselho de Administração, Dr. …………, casado, residente na Travessa do …………, n° ………… - ……….., Alcabideche, por delegação da Câmara Municipal de Cascais, nos termos da cláusula segunda do Protocolo assinado em 23 de Novembro de 1998, adiante designado como cedente; e A…………, Solteiro, contribuinte n.° …………, residente em Bairro das …………, Freguesia do Carcavelos e Concelho de Cascais, adiante designado como cessionário:

É cedido, nos termos da deliberação da Câmara Municipal de Cascais, na sua reunião de 02 de Fevereiro de 2004, a utilização de parte de casa, designado por quarto n.° ………… com direito de serventia de cozinha e casa de banho, relativo ao fogo correspondente a fracção ………… ., do prédio sito no B.° de ………… Lote ………… Quarto …………, Bairro de ………… Freguesia de …………, Concelho de Cascais, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………… sob o art. (...) e isento de licença de utilização nos termos da lei, e do qual a representada da cedente é proprietária, nos termos e condições seguintes:

1.ª A licença é concedida pelo prazo de um ano, com início em 1 de Junho de 2004, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos, se a cedente não comunicar o contrário, por escrito, com a antecedência de 90 dias;

2.ª O cessionário, caso seja sua pretensão renunciar à licença concedida, pode fazê-lo, mediante pré-aviso escrito de 30 dia;

3.ª O cessionário pagará a prestação mensal de 47,65 euros (Quarenta e sete euros e sessenta e cinco cêntimos), calculada nos termos do Decreto-Lei n.° 166/93, 07 de Maio;

4.ª O cessionário é obrigado a declarar bienalmente os seus rendimentos, a fim da actualização da renda ser efectuada com base na variação percentual para esse ano do Salário Mínimo Nacional, conforme o estabelecido no n.° 4 do art. 8.° do Decreto-Lei n.° 166/93, de 7 de Maio;

5.ª O pagamento da renda será efectuado nos Serviços de Tesouraria da EMGHA-EM, até ao dia 08 do mês a que respeitar;

6.ª Ao cessionário é expressamente proibido proceder a quaisquer obras ou instalações que modifiquem as condições de utilização da parte de casa que vai ocupar, sem autorização por escrito da EMGHA-E.M., assim como consentir na sua ocupação, no todo ou em parte, por pessoas estranhas;

7.ª O cessionário obriga-se a conservar em bom estado, como actualmente se encontram, as instalações e canalizações de água, luz, aquecimento, esgotos e demais equipamentos da área cedida, pagando à sua custa todas as reparações, bem como a manter ainda em bom estado os respectivos soalhos, pinturas, vidros, portas, janelas e estores;

8.ª O cessionário obriga-se, de igual modo, a cumprir integralmente as disposições da Postura de Habitação Municipal, aprovada pelas deliberações respectivamente da Câmara Municipal de Cascais em 09 de Abril de 1992 e da Assembleia Municipal em 11 de Junho de 1992, cujo teor consta de fotocópia anexa ao presente Acordo, e que se considera para todos os devidos efeitos legais como fazendo parte integrante deste;

9.ª Fica autorizado a habitar a parte de casa cedida pelo presente Acordo, a seguinte pessoa: A…………;

10.ª O cessionário pode ser desalojado quando se verifique que não tem necessidade de ocupar a parte de casa cedida ou se torne indigno do direito de ocupação que lhe é concedido, em especial:
a. quando deixar de efectuar o pagamento da renda dentro dos trinta dias posteriores à data do respectivo vencimento;

b. se vier a possuir casa própria e tenha a possibilidade legal de a ocupar;

c. quando pelo seu comportamento provoque distúrbios ou prejudique os outros cessionários residentes no mesmo fogo;

d. quando se recuse a mostrar a parte de casa cedida ao representante da EMGHA-E.M;

e. quando não mantiver em bom estado a parte de casa cedida;

f. quando proceda de forma a criar risco para a segurança ou salubridade do prédio;

g. quando habitem na parte de casa cedida, pessoas não autorizadas pelo presente Acordo de Cedência».

3 - De acordo com a documentação junta aos autos, a Autora é uma Empresa Pública Municipal e tem como objecto social principal «a gestão social, patrimonial e financeira dos imóveis pertencentes ao Município de Cascais», podendo, de acordo com os respectivos estatutos, aquele Município delegar-lhe os poderes necessários para a concretização do seu objecto.

Nos termos da cláusula do Protocolo assinado entre o Município de Cascais e a Autora em 1 de Junho de 2004, junto com petição inicial como documento n.° 1, a atribuição dos fogos é da exclusiva competência da Câmara Municipal, cabendo à Autora «a instrução dos respectivos processos, nomeadamente a elaboração de contratos de arrendamento, a atribuição do valor correspondente à renda mensal, de acordo com a legislação em vigor e a promoção de acções de despejo».

4 - A proposta de deliberação da Câmara Municipal de Cascais de 2 de Fevereiro de 2004, de que resultou a atribuição ao Réu da parte do imóvel a que se referem os autos tem a seguinte fundamentação:

«Considerando:

- Acordo Geral de Adesão assinado pelo INH, IGAPHE e CMC;

- O Decreto-Lei n° 163/93 de 7 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 271/2003 de 28 de Outubro e o Decreto-Lei n.° 159/03 de Julho, que regulamenta este Programa PER;

- O objectivo global do PER/Cascais de promoção e desenvolvimento sócio-urbanístico do concelho, sustentando em princípios e estratégias de intervenção nas comunidades locais;

- O objectivo específico deste realojamento no Empreendimento de ………… é de conjugar a melhoria da qualidade de vida destas pessoas e do tecido urbano e ambiente residencial da zona;

- Que este empreendimento totaliza 204 fogos dos quais 124 a atribuir em regime de arrendamento no âmbito do PER, 29 fogos de venda no âmbito do PER Famílias e 51 fogos de Habitação a Custos Controlados (HCC)

- Que o Empreendimento de ………… permitirá o realojamento de 11 famílias provenientes do núcleo ………… (…………), bem como a demolição das respectivas barracas (planta de localização do núcleo com famílias a realojar em anexo);

- Que em caso de recusa de assinatura do Contrato de Arrendamento:

a) a família perca o direito ao realojamento por parte da C.M.C.

b) a família seja notificada para abandono do local e consequente demolição da construção.»
III

1 - Resulta do artigo 211.°, n.° 1, da Constituição da República (CRP), que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais e decorre do artigo 212.°, n.° 3, daquele diploma que compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os «litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais».

Na determinação do conteúdo do conceito de relação jurídico administrativa ou fiscal, tal como referem J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, deve ter-se presente que «esta qualificação transporta duas dimensões caracterizadoras: (1) as acções e recursos incidem sobre relações jurídicas em que, pelo menos um dos sujeitos é titular, funcionário ou agente de um órgão de poder público (especialmente da administração); (2) as relações jurídicas controvertidas são reguladas, sob o ponto de vista material, pelo direito administrativo ou fiscal. Em termos negativos, isto significa que não estão aqui em causa litígios de natureza «privada» ou «jurídico civil». Em termos positivos, um litígio emergente de relações jurídico administrativas e fiscais será uma controvérsia sobre relações jurídicas disciplinadas por normas de direito administrativo e/ou fiscal» (Constituição da República Portuguesa, Volume II, Coimbra Editora, 2010, p. p. 566 e 567.).

A competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais veio a ser concretizada nos artigos 1.°, n.° 1 e 4.° do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.° 13/2002 de 17 de Fevereiro (Lei n.° 13 2002, de 19 de Fevereiro, com as alterações decorrentes da Lei n.° 20/2012, de 14/05; da Lei n.° 55-A/2010, de 31/12; do DL n.° 166/2009, de 31/07; da Lei n.° 59/2008, de 11/09; da Lei n.° 52/2008, de 28/08; da Lei n.° 26/2008, de 27/06; da Lei n.° 2/2008, de 14/01; da Lei n.° 1/2008, de 14/01; da Lei n.° 107-D/2003, de 31/12; da Lei n.° 4-A/2003, de 19/02 e objecto da Rectificação n.° 18/2002, de 12/04 e da Rectificação n.° 14/2002, de 20/03.) .

A aparente diversidade de critérios relativos à atribuição da competência da jurisdição administrativa que emerge destas duas normas deve resolver-se na base do princípio de que «pertence ao âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de todos os litígios que versem sobre matéria jurídica administrativa e fiscal e cuja apreciação não seja expressamente atribuída, por norma especial, à competência dos tribunais judiciais, assim como aqueles que, embora não versem sobre matéria jurídica administrativa e fiscal, são expressamente atribuídos, por norma especial, à competência desta jurisdição - sendo que encontramos no artigo 4.° do ETAF algumas disposições especiais com este alcance». (MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 2013, Almedina, p. 157.)

Resulta da alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF que «compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação dos litígios que tenham por objecto: e) questões relativas à validade de actos pré-contratuais e à interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei especial que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público».

No teor literal desta norma, para além do mais, serão da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios relativos à «execução de contratos» relativamente aos quais exista «lei especial» que os submeta ou admita que sejam submetidos» a um «procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público».

A sujeição, ou possibilidade de sujeição destes contratos a um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público, determinada por «lei específica» é o critério de administratividade relevante para atribuir à jurisdição administrativa a competência para conhecer dos litígios derivados destes contratos, nomeadamente os relacionados com a respectiva execução.

Na opinião de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, «a alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF atribui à jurisdição administrativa a competência para dirimir os litígios emergentes de todos os contratos que a lei submeta, ou admita que possam ser submetidos, a um procedimento de formação regulado por normas de direito público. A previsão do preceito compreende claramente litígios respeitantes a quaisquer contratos, que não apenas os contratos administrativos, e tanto contratos celebrados por pessoas colectivas de direito público, como contratos celebrados por entidades privadas, quando sujeitas a regras de direito público em matéria de procedimentos pré-contratuais» (Obra citada, p. 165.) , pelo que «desde que a formação de um contrato esteja submetido a regras procedimentais de formação de Direito Administrativo, todas as acções que dele possam vir a emergir devem ser objecto de uma acção a propor perante os tribunais administrativos, e não perante os tribunais judiciais - e isto porque se trata de um contrato público, independentemente da sua qualificação ou não como contrato administrativo nos termos do CCP.» (Obra citada, p. 166.)


Por seu turno, resulta da alínea f) resulta do n.° 1 daquele artigo 4.° do ETAF que «compete aos tribunais de jurisdição administrativa e fiscal a apreciação dos litígios que tenham nomeadamente por objecto questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto passível de acto administrativo, de contratos especificadamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos de respectivo regime substantivo, ou de contratos que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público».

De acordo com o autor acima referido, estão abrangidos pela jurisdição administrativa «os contratos que apresentem alguma das três notas de administratividade a que se reporta o artigo 4.°, n.° 1, alínea f) do ETAF: a) Os “contratos com objecto possível de acto administrativo” ou relativos ao “exercício de poderes públicos”, que determinam a (ou se comprometem à futura) produção de efeitos correspondentes à prática, pelo contraente público, de um acto administrativo unilateral (cfr. artigo 1.°, n.° 6, alínea b) do CCP); b) Os contratos cujo regime substantivo das relações entre as partes é total ou parcialmente regulado por normas de direito administrativo: b’ Em primeiro lugar os contratos administrativos típicos, como tal previstos e regulados por normas específicas do Direito Administrativo (artigo 1.°, n.° 6, alínea a), do CCP), o que compreende (...) b” Em segundo lugar os contratos que “confiram ao contraente privado direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público” (...); c) Os contratos que, sendo uma das partes contraente público (nos termos dos artigos 3.° e 8.° do CCP) ou um concessionário actuando no âmbito da concessão, as partes tenham optado, de modo expresso e inequívoco, por qualificar como administrativos ou por submeter a um regime de Direito Administrativo (...)» (Manual de Processo Administrativo, 2013, Almedina, p.p. 162 e 163.).

Especifica, deste modo, esta alínea f) do n.° 1 do artigo 4.° que, entre outros, cabem no âmbito da jurisdição administrativa os litígios relacionados com contratos públicos que tenham um «objecto passível de acto administrativo», os contratos administrativos típicos, os contratos que confiram ao contraente privado «direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público» e os contratos em que, sendo uma das partes contraente público, «as partes tenham optado, de modo expresso e inequívoco por os qualificar como administrativos ou por os submeter a um regime de Direito Administrativo».

A atribuição à jurisdição administrativa dos conflitos relacionados com estes contratos pressupõe que se individualize a categoria de contrato público que serve de fundamento àquela atribuição, não bastando uma referenciação genérica a contratos por maior ou menor que seja a dimensão administrativa do regime que os enquadre.

2 - O “acordo de cedência de parte de casa com direito de serventia de cozinha e de casa de banho”, dada a natureza bilateral que o caracteriza e a afirmação de direitos e obrigações para as partes, pode ser considerado um contrato, e, atentos os objectivos de natureza pública que visa realizar, a natureza de disciplina jurídica que o enquadra e natureza de uma das partes, não pode deixar de ser considerado um contrato administrativo atípico.

Este acordo titula as condições em que se efectiva o direito à ocupação da casa por parte pelo Réu, discriminado o complexo de obrigações que o onera derivadas desta ocupação e os inerentes direitos da Autora.

Importa, contudo, que se tenha presente que o direito do Réu a ocupar essa parte da casa não nasce do contrato, mas sim da deliberação da Câmara Municipal que lhe atribuiu esse direito, deliberação essa que é o fundamento do mencionado acordo.

Por outro lado, no contexto das obrigações que oneram o cessionário da parte da casa, aqui Réu, destaca-se o dever de pagamento das rendas, em conformidade com o regime decorrente do Decreto-Lei n.° 166/93, de 7 de Maio, e a obrigação de facultar os elementos que permitam a actualização das mesmas de acordo com aquele diploma.

Para além disso, a ocupação da parte da casa em causa ocorre nos quadros da Postura de Habitação Municipal, que é assumida como anexo ao mencionado acordo, tendo tal ocupação uma natureza claramente precária, expressa, entre outros, no direito da cedente a não renovar o contrato, nomeadamente, quando ocorram situações que justifiquem o “desalojamento” do cessionário previstas na cláusula 10.ª, que consagra e adapta soluções previstas no Decreto n.° 35 106, de 6 de Novembro de 1945, em cuja vigência o contrato foi celebrado.

O contrato em causa mostra-se, assim, enquadrado nos seus elementos essenciais por disciplina de natureza pública, quer no que se refere ao regime de desocupação do imóvel, quer no regime da fixação e actualização das rendas, quer na sujeição aos parâmetros decorrentes da Postura de Habitação Municipal, daí emergindo o complexo de obrigações que caracterizam a situação do Réu.

3 - Numa primeira abordagem, a sujeição do contrato a segmentos de direito público poderia apontar para a sua integração na alínea f) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF e consequente atribuição aos Tribunais Administrativos da competência para conhecer dos litígios derivados do mesmo. Foi, de alguma forma, essa a solução que foi encontrada pelo Tribunal Judicial da Comarca de Cascais.

A verdade é que o despacho proferido naquele Tribunal não concretiza o tipo de contrato que motivaria a subsunção àquela alínea do referido artigo 4.º do ETAF, nomeadamente, em que categoria dos contratos ali previstos se subsumiria o «acordo de cedência» dos autos.

Como se referiu, o direito à ocupação da parte da casa a que se refere o presente processo tem origem na deliberação da Câmara Municipal de 2 de Fevereiro de 2004, que atribuiu ao Réu uma licença relativa àquela ocupação.

Esta deliberação culminou um procedimento de natureza administrativa no contexto do qual o Município averiguou do preenchimento por parte do aqui Réu dos requisitos que fundamentaram a atribuição do direito à ocupação daquela parte do imóvel, na realização dos objectivos de natureza pública inerentes ao realojamento dos moradores de barracas, nos quadros da disciplina emergente do Decreto-Lei n.° 163/93, de 7 de Maio, relativo à execução do Programa PER (Programa Especial de Realojamento).

No fundo, através desse procedimento o Município escolheu a parte com quem veio a ser celebrado pela Autora, por delegação do Município, o acordo de cedência em causa.

Ora, a existência deste procedimento administrativo poderia permitir que se equacionasse a atribuição da competência para conhecer dos litígios que emergem da respectiva execução, no caso a desocupação da parte do imóvel por incumprimento por parte do Réu das condições que rodearam a adjudicação da mesma, à jurisdição administrativa, em conformidade com o disposto na alínea e) do artigo 4.° do ETAF.

Na verdade, a escolha do cessionário da parte da casa a adjudicar, no fundo o co-contraente privado, derivou de um procedimento que culminou com a deliberação da Câmara relativa à atribuição do direito à ocupação da casa que veio a ser enquadrado pelo referido acordo. Trata-se de um procedimento administrativo que culmina na prática de um acto administrativo - a deliberação da Câmara - que materializa por sua vez o concreto direito do Réu à ocupação da parte da casa e que tem natureza pré- contratual relativamente à celebração do acordo de cedência que vai formalizar as condições em que a ocupação do imóvel e a respectiva cessação podem ocorrer.

Importa, contudo, ponderar se este procedimento pode ser considerado um procedimento pré-contratual relevante para os efeitos do disposto na alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF, o que depende de se considerar que a sujeição a esse procedimento decorre de «lei específica» que sujeite a celebração do contrato a este tipo de procedimento.

À adjudicação da parte da casa a que se referem os autos está subjacente o alojamento de cidadãos que se encontravam instalados precariamente em “barracas”, não havendo elementos que permitam afirmar ter-lhes sido aplicado o procedimento concursal previsto no artigo 8.° do Decreto-Lei 797/76, de 6 de Novembro, que esteve subjacente à decisão proferida no Conflito 025/12, decorrente do acórdão deste Tribunal de 14 de Março de 2013, ou qualquer outro de natureza análoga, não podendo encontrar-se naquele diploma a «lei específica» a que se refere a citada alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF.

Apesar de ter sido determinada a notificação da Autora para fazer juntar aos autos o procedimento que fundamentou a adjudicação da casa pelo Município, veio a ser junto apenas a proposta de deliberação do Município de que derivou aquela adjudicação.

Pode, assim, concluir-se no sentido de que não decorrem dos autos elementos seguros que permitam fundamentar na referida alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do ETAF a atribuição à jurisdição administrativa da competência para conhecer do litígio que é objecto do presente processo.

Daí não decorre que a competência para conhecer do presente litígio não deva ser atribuída à jurisdição administrativa.

4 - Na verdade, tal como acima se referiu, o «acordo de cedência» que está em causa formalizou a adjudicação da parte do imóvel ao Réu, concretizando as obrigações decorrentes daquela cedência, nomeadamente, o pagamento de um quantitativo mensal à Autora, como contraprestação dessa cedência.

Analisado esse acordo não se constata no mesmo algo que não seja a concretização de dispositivos de natureza administrativa relacionados com as condições em que a ocupação do imóvel ocorreria.

Por outro lado, ao tempo em que referido acordo de cedência foi outorgado ainda estava em vigor o Decreto n.° 35 106, de 6 de Novembro de 1945, que previa no seu artigo 1.º que a ocupação das habitações em causa seria concedida «a título precário, mediante licença da entidade proprietária, sob a forma de alvará».

A atribuição das casas era deste modo feita por acto administrativo - a licença - sujeito a uma forma especial - o alvará -, não tendo uma qualquer dimensão contratual.
Acresce que as condições que enquadravam a cedência eram as definidas por via legal ou regulamentar, limitando-se a licença a concretizar essas condições, assumindo claramente a natureza de um acto administrativo.

No caso dos autos, apesar do recurso a uma forma de titulação que se aproxima do arrendamento de direito privado, materializada na assinatura de um documento — o acordo de cedência —, com natureza contratual e que acaba por substituir o alvará, nada impedia que essas condições fossem desde logo definidas, unilateralmente, pelo Município através de acto administrativo, no uso dos poderes que lhe assistem relativamente à gestão do património municipal.

Ou seja, o complexo de obrigações que decorrem do referido acordo para o cessionário poderia integrar um acto administrativo que as concretizasse, identificando igualmente os inerentes direitos e obrigações que assistem ao Município, ou à aqui Autora.

Deste modo, estamos perante um contrato cujo objecto «é passível de acto administrativo», o que legitima a atribuição à jurisdição administrativa da competência para conhecer os litígios que do mesmo derivem, nos termos da alínea f) do artigo 4.° do ETAF.
IV

Nestes termos, acordam em resolver o presente conflito de jurisdição no sentido de que pertence aos Tribunais Administrativos e Fiscais a competência para conhecer da acção em causa.

Sem custas.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2013. - António Leones Dantas (relator) - Maria Fernanda dos Santos Maçãs - Maria Clara Pereira de Sousa de Santiago Sottomayor - Ana Paula Lopes Martins Boularot (voto a decisão) - António Políbio Ferreira Henriques - Vítor Manuel Gonçalves Gomes.