Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:05/16
Data do Acordão:05/11/2016
Tribunal:CONFLITOS
Relator:ARMINDO MONTEIRO
Descritores:RESPONSABILIDADE POR ACTO JUDICIAL.
CONFLITO DE JURISDIÇÃO.
Sumário:Compete aos tribunais judiciais conhecer da acção em que se pretende efectivar a responsabilidade do Estado por erro judiciário eventualmente praticado na jurisdição comum, ainda que o erro incida sobre actos de distribuição do processo.(*)
Nº Convencional:JSTA00069704
Nº do Documento:SAC2016051105
Data de Entrada:01/18/2016
Recorrente:A............, NO CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE O TRIBUNAL JUDICIAL DE MATOSINHOS, 1º JUÍZO CÍVEL E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:CONFLITO.
Objecto:NEGATIVO JURISDIÇÃO TJ MATOSINHOS - TAF PORTO.
Decisão:DECL COMPETENTE JURISDIÇÃO COMUM.
Área Temática 1:DIR ADM CONT - CONFLITO JURISDIÇÃO.
Área Temática 2:DIR JUDIC - ORG COMP TRIB.
Legislação Nacional:CONST05 ART22 ART212 N3 ART218.
ETAF02 ART1 ART4 N3 A ART5.
CPC13 ART109 N1 ART110 N1 ART100 N2 ART203 ART206 ART213 ART217.
CCIV66 ART486.
CPP ART225 ART461 ART462.
L 67/07 DE 2007/12/31.
DL 48051 DE 1967/11/21.
Jurisprudência Nacional:AC TCF PROC03/05 DE 2006/11/29.; AC TCF PROC021/06 DE 2008/06/05.; AC TCF PROC021/07 DE 2008/11/04.; AC TCF PROC08/09 DE 2009/07/07.; AC TCF PROC06/09 DE 2009/11/04.; AC TCF PROC015/10 DE 2010/10/28.; AC TCF PROC023/10 DE 2012/01/12.; AC TCF PROC05/11 DE 2012/09/28.; AC STA PROC041403 DE 1996/10/03.; AC STA PROC041487 DE 1997/02/26.; AC STJ PROC05B2490 DE 2005/10/20.; AC STJ DE 2002/02/12.; AC STJ DE 2004/01/15.; AC STJ DE 2004/01/27.; AC STJ DE 2004/03/18.; AC STJ DE 2004/05/13.; AC STJ DE 2008/03/13.; AC STJ DE 2008/04/10.; AC TCAN PROC01324/10.4BEPRT DE 2012/09/26.
Referência a Doutrina:JOÃO CAUPERS E JOÃO RAPOSO - A NOVA JUSTIÇA ADMINISTRATIVA PAG11.
VIEIRA DE ANDRADE - JUSTIÇA ADMINISTRATIVA LIÇÕES PAG56.
MARCELO REBELO DE SOUSA - LIÇÕES DE DIREITO ADMINISTRATIVO VOLI PAG57.
FREITAS DO AMARAL - DIREITO ADMINISTRATIVO VOLIII PAG439-440.
REDENTI - PROCESSO CIVIL VOLI PAG265.
MANUEL DE ANDRADE - NOÇÕES ELEMENTARES DE PROCESSO CIVIL PAG86.
PINTO DE ALBUQUERQUE - COMENTÁRIO AO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL PAG54.
FILIPE RENTE RAMALHO - ACTO ADMINISTRATIVO FDUP 2007.
RODRIGUES ARANA E MIGUEL ÂNGELO SENDIN - DERECHO ADMINISTRATIVO ESPAÑOL PAG5.
GOMES CANOTILHO - IN RLJ ANO123 N3799 PAG307.
VIEIRA DE ANDRADE E CARLOS CADILHA CIT POR NÉLIA DIAS - IN RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO E DEMAIS ENTIDADES PÚBLICAS.
FÁTIMA GALANTE - TESE DE DOUTORAMENTO UAL 2013 PAG12.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência no Tribunal de Conflitos:

Conflito n° 5 /16

A…………, intentou acção declarativa, de condenação, com processo comum, na forma ordinária, no Tribunal Judicial de Matosinhos – Procº 1196/12.4TBMTS, contra o Estado Português, em 23/2/2012, alegando, e no que interessa, que:

Desempenhou funções profissionais de bancário, desde 1967, ao longo de 28 anos, sendo admitido no então B…………, e promovido, precedendo prestação de provas, em 1987, à categoria profissional de Sub-gerente e colocado na agência de Vila Nova de Gaia, da então C………….

Em Janeiro de 1989, foi o Autor exonerado das suas funções e alvo de dois processos disciplinares com vista o seu despedimento.

A partir daí, o Autor foi compelido a exercer funções inferiores à sua categoria profissional, tais como transporte de valores, motorista e/ou ajudante de motorista, bem como executou trabalhos de dactilografia, como foi dado como provado pelo Tribunal de Trabalho do Porto, em acção oportunamente intentada pelo Autor (1992) contra a sua entidade patronal.

Desde Janeiro de 1989 até 1995, portanto, cerca de 6 (seis) anos, o Autor esteve completamente desligado das funções de gerência, conforme supra referido.

Em Janeiro de 1995, o Autor foi transferido para a Agência de Matosinhos do então D…………, onde foi colocado, numa cave, sem luz natural, isolado, sem nada para fazer, sem qualquer função definida.

Ao longo daquele período de tempo, a entidade patronal agrediu psicologicamente o Autor (processo de Mobbing), retendo-o na “prateleira”.

Com esse assédio moral reiterado e continuado no tempo – durou anos –, foi ferida a dignidade moral do Autor,

Actuação essa da entidade patronal, que culmina com terceiro processo disciplinar (já em 1995), pretendia cortar, como cortou, uma relação laboral que se tinha iniciado em 1967.

O Autor veio a ser despedido pela sua entidade patronal por deliberação de Setembro de 1995., falsamente, por desobediência a ordem de superior hierárquico para que em 8 dias elaborasse “... plano de acção comercial para desenvolvimento das potencialidades identificadas”, e todo o concelho de Matosinhos, ter dado uma entrevista ao programa Praça Pública, da SIC e ter-se envolvido em cena de pancadaria no passeio junto à supra referida agência da C………… em Matosinhos (Av. da ………).

O Autor intentou em 1992 contra a sua entidade patronal e em 1996 acção no Tribunal de Trabalho do Porto para ver declarado ilícito o despedimento de que foi alvo pela sua entidade patronal.

A acção foi julgada procedente, por provada e, em consequência, condenado o Banco Réu a pagar ao Autor a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, bem como a REINTEGRAR O AUTOR NO SEU POSTO E TRABALHO, SEM PREJUÍZO DA SUA CATEGORIA E ANTIGUIDADE

O Banco Réu interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto e o A. Recurso subordinado, pelo facto de julgar a sentença nula por omissão de pronúncia quanto à caracterização do despedimento de abusivo (além de ilícito).

O autor já oportunamente interpusera recurso, interlocutório, de agravo pelo facto de considerar de que já caducara a possibilidade de procedimento disciplinar quanto a alguns factos – aqueles ocorridos antes de 26 de Março de 1995, ou seja, com mais de 60 dias da nota de culpa (26 de Maio de 1995).

O Tribunal da Relação do Porto, decidiu dar provimento parcial ao recurso de agravo, na questão da caducidade do exercício da acção disciplinar.

Quanto ao carácter abusivo de despedimento o mesmo Acórdão nada disse, arguindo-o de nulidade, desatendida, com o que ficou claramente definida a matéria de facto dada como provada e a não provada no âmbito do processo judicial em questão.

O Acórdão da Relação do Porto foi objecto de recurso de revista interposto pelo Banco Réu para o STJ.

A lei processual é bem clara ao prescrever que está vedado no recurso de revista ao STJ alterar a matéria de facto provada nas Instâncias.

O Acórdão proferido pelo STJ, alterou a matéria de facto fixada pelas Instâncias, sendo que a referida alteração da matéria de facto conduziu a uma solução diversa da que se obteria caso a alteração da matéria de facto não se tivesse verificado.

O STJ arredou o conceito de justa causa de despedimento, subsistindo a alegada recusa a ordem de superior hierárquico e a entrevista à Sic.

Quanto à caducidade do procedimento disciplinar relativa à alegada recusa de cumprimento de ordem da superiora hierárquica, que o Tribunal da Relação do Porto havia considerado, o STJ “descaducou” o que havia caducado.

E dessa forma conduziu o Acórdão do STJ a uma decisão diferente da que teria sido proferida não fosse essa conduta.

Com esse “equívoco” do STJ, o mesmo analisou uma alegada infracção disciplinar que o Tribunal da Relação do Porto tinha arredado, e levou a uma decisão oposta das Instâncias.

Sem prejuízo dessa questão da caducidade, em que o STJ alega que o Autor não provou (quando o ónus não lhe competia) o que tinha nos autos sido confessado pela entidade patronal, não sendo, portanto, matéria controvertida que carecesse de ser provada, muitíssimo mais grave do que isso, foi a alteração da matéria de facto operada pelo STJ quanto a essa alegada infracção disciplinar.

A fls. 27 do mesmo pode ler-se “Na verdade, foi dado como provado (cfr. alínea U) da matéria de facto) que, contrariamente ao sustentado pelo autor, “não existia qualquer impeditivo para que desenvolvesse o trabalho que lhe foi pedido, uma vez que as tarefas que lhe foram solicitadas se enquadravam no âmbito das funções de subgerente e não implicavam qualquer prévia formação específica, pois só exigiam um «conhecimento genérico dos produtos referenciados, designadamente as suas características e tipo de cliente a que se destinavam», informações que constavam do Manual de Produtos e Serviços existente no Balcão e acessível ao autor» – sic.

O que de facto se provou nas Instâncias é que aquilo que o Acórdão do STJ transcreve e se lê na sua página 27, é o que consta na carta a que se faz alusão,

Coisa muito diferente de dizer-se que o que aí se mostra afirmado, se tenha realmente provado.

O que vale por dizer que o STJ alterou, também neste aspecto, a matéria de facto que as Instâncias tinham estabelecido, aspecto que se mostra fortemente influente para se poder concluir, ou não, pela injustificação da recusa com que se houve o autor: afirma ter-se provado matéria que não é coincidente com aquela que as Instâncias tinham dito que se provara.

Com essa alteração da factualidade provada, o STJ conclui pela injustificação e, portanto, dá como verificada a prática de uma infracção disciplinar que as Instâncias tinham arredado, prejudicando gravemente o Autor.

No que se refere à entrevista à SIC também o STJ alterou a matéria de facto fixada nas Instâncias, a saber:

No Acórdão proferido pela STJ vem referido que “num meio de comunicação social com a repercussão pública de uma televisão, cuja potencialidade danosa da imagem do Banco réu é incomparavelmente superior à de um jornal diário”, mais vindo referido que “à aludida entrevista televisiva e às consequências danosas que desta última não podiam deixar de resultar para a imagem e prestígio do Banco réu” (o que é bem diferente de estar provado em Juízo terem efectivamente resultado consequências para o prestígio do banco – o que não ficou provado nas Instâncias).

O que significa que o STJ em 2001 considerou as consequências danosas que “não podiam deixar de resultar”, mas por suposição do STJ, ficcionando danos para a imagem e prestígio do Banco., mas não consta da matéria de facto dada como provada (que é aquela que o STJ se devia ter cingido), que tenha havido danos para o prestígio do Banco.

Uma coisa é ter havido a intenção por parte do Recorrente de denegrir a imagem do Banco (tratou-se sim do direito à indignação do Recorrente), outra coisa bem diferente é ter sido provado em Juízo que a entrevista comprovadamente tenha tido consequências para o prestígio do Banco (o que não se provou).

Mais alterou o STJ a matéria de facto quando no Acórdão que proferiu refere “não consta da matéria de facto apurada que o autor tenha sido «emprateleirado», numa cave, com uma secretária sem gavetas e uma cadeira, junto aos quartos de banho da Agência (de Perafita), a partir de 23 de Janeiro de 1995, como se refere no acórdão recorrido, para acentuar a situação de vexame que justificaria o desabafo do autor na aludida entrevista.”

Isto é, o STJ insurgindo-se quanto ao que a Relação do Porto considerou provado, considera que isso não ficou provado, ou seja, dá como falso o conteúdo da entrevista que se refere nomeadamente a esse aspecto, pelo que neste ponto o STJ também alterou matéria de facto fixada nas Instâncias.

Um outro aspecto em que o STJ alterou a matéria de facto foi quando considerou o Autor ter efectuado “a revelação pública da identidade de um cliente do Banco”, quando o que ficou provado nas Instâncias é que a identidade do cliente foi revelada pela Jornalista – alínea BB) da especificação.

Também neste ponto o STJ em alterou, como a simples leitura o evidencia, matéria de facto com a consequência de ter imputado ao Autor a violação do sigilo profissional e consequente agravamento do seu comportamento.

A propósito da entrevista, o único quesito que foi considerado provado pelas Instâncias foi o quesito 19° (provado) “o Autor mais não fez do que prestar esclarecimentos que pelo jornalista lhe foram solicitados”, facto que foi absolutamente desvalorizado pelo STJ.

Os factos relatados na entrevista, foram factos que já tinham sido dados como provados em Tribunal, ou seja na primeira acção judicial que o Autor intentara em Tribunal (1992).

Ficou provado – alínea N) da Especificação – que “Naquelas secções o Autor executou transporte de valores, agindo como motorista e/ou ajudante de motorista, bem como também executou trabalhos de dactilografia”.

Na aludida entrevista, e considerado provado na alínea N) da Especificação — cfr. alínea Z) da Especificação quanto ao conteúdo da entrevista, no aspecto em que se considerou provado que foi colocado-o numa situação de contínuo, motorista, ajudante de motorista, ...».

Donde resulta claro que o conteúdo da entrevista é verdadeiro nomeadamente nesse aspecto.

O STJ devia ter apreciado a alegada justa causa obedecendo à Lei vigente na data, e de acordo com a verdadeira matéria de facto provada nos autos e as circunstâncias concretas, o que não fez, e não com base em critério ilegal e subjectivo.

Na matéria de facto apurada e dada como provada nos autos relativamente a cada uma das pretensas infracções disciplinares resulta que, não foi apurada nem provada em concreto qualquer lesão para a entidade patronal.

Está provado que é o pior caso de perseguição laboral que o Tribunal do Trabalho do Porto teve conhecimento em muitos e muitos anos no exercício de funções. Assim “Não podemos deixar agora e aqui de nos referir à forma “pouco humana” e à “manifesta indiferença” pelos mais elementares princípios de justiça que devem reger as relações laborais, com que o Banco-réu sempre tratou (e continua a tratar) este caso relativo ao autor, caso que é por nós demasiado bem conhecido face ao exercício das nossas funções profissionais, felizmente sem paralelo em qualquer outra empresa, de que tenhamos conhecimento, ao longo de muitos e muitos anos nesta jurisdição.” - cfr. sentença proferida no primeiro processo que o Autor interpôs contra a entidade patronal.

O STJ não apreciou nem valorou a ausência de passado disciplinar do Recorrente (não lhe foi aplicada sequer a suspensão por um único dia, isto em 28 anos ao serviço).

As pretensas infracções disciplinares não podem ser analisadas independentemente e isoladamente do relacionamento entre a entidade patronal e o trabalhador e as circunstâncias em concreto, e não podem ser analisadas em desrespeito pela Lei nomeadamente fazendo tábua rasa da lei.

Tendo o STJ ignorado completamente a regra da distribuição do ónus da prova, ignorado a matéria de facto apurada nas Instâncias que confere veracidade às afirmações do autor, e ignorado o facto de a matéria que a entidade patronal teria de provar e não provou, levou também a uma decisão oposta à das Instâncias.

Neste cenário, o recurso subordinado de agravo interposto pelo autor (referente à omissão de pronúncia das instâncias quanto à questão da natureza abusiva do despedimento) ficou prejudicado devido àquela decisão do STJ depois de ter alterado a matéria de facto, o que agravou ainda mais os prejuízos do autor.

Caso não tivesse sido alterada a matéria de facto, o Acórdão do STJ teria uma decisão igual à das Instâncias, e teria sido apreciado o recurso referido no número anterior.

Assim, o acórdão do STJ, encontrou-se ferido de nulidade uma vez que não observou os comandos legais e, através de violação da Lei adoptou matéria de facto nova, não fixada nas Instâncias, da qual não lhe era, por isso, consentido conhecer.

O Autor oportunamente arguiu a nulidade do Acórdão do STJ, a qual foi apreciada pelo mesmo Colectivo que alterou a matéria de facto, sendo que o mesmo STJ, entenda-se mesmo Colectivo indeferiu a arguição de nulidade.
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Tendo em conta a actuação violadora da Lei, de forma grosseiríssima por parte do STJ, justificada está a acção entretanto proposta contra o Estado, peticionando, aí, o Autor a condenação do Estado Português no pagamento de todos os prejuízos já causados e que continua a causar ao mesmo, por erro judiciário no exercício da função jurisdicional, no sobredito Acórdão proferido pelo STJ.

Esta acção contra o Estado, foi, contudo, julgada improcedente, sendo que o Autor inconformado com a mesma, recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que confirmou a sentença recorrida.

Inconformado com o mesmo Acórdão, o Autor recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, que anulou a decisão da Relação e ordenou que o processo baixasse novamente à Relação do Porto.

Vem a ser proferido novo Acórdão pela Relação do Porto, que apesar de o Autor não ter concordado com o mesmo e dele recorrendo para o STJ, aquela decisão da Relação veio a reconhecer expressamente que o STJ havia alterado a matéria de facto, quanto à alegada recusa em executar tarefas, podendo ler-se na página 60 do mesmo Acórdão:

“Ora não tendo as instâncias considerado provado que o autor para executar as ditas tarefas dispunha das condições alegadas pela ré, não podia o Supremo Tribunal de Justiça considerar que essas condições existiam por tal ser uma alteração da matéria de facto fixada pelas instâncias, o que retira qualquer suporte fáctico à avaliação do Supremo Tribunal de Justiça de que tal recusa era injustificada, e, nessa medida integrar o conceito de justa causa de despedimento.”

O Tribunal da Relação julgou improcedente a acção, pois julgou que mesmo o STJ tendo alterado matéria de facto (que se reporta a um dos três alegados factos integradores de justa causa), ainda subsistia a questão da entrevista à SIC, onde não foi entendido o STJ ter alterado e ficcionado matéria de facto.

O recurso interposto pelo Autor para o STJ, confirmou o Acórdão da Relação, sem, no entanto, ter alterado a matéria de facto fixada.

Todos os factos alegados nessa acção contra o Estado Português estavam todos provados documentalmente, era apenas uma questão de confirmar os factos, por exemplo comparar a verdadeira matéria de facto provada nas Instâncias e a considerada como provada no Acórdão do STJ, isto por uma leitura séria e atenta de um e de outro.

Sendo que tal comparação não se compadecia com interpretações subjectivas, uma vez que a matéria de facto verdadeira estava bem delimitada e definida pelas Instâncias, o que objectivamente era fácil de verificar se foi alterada.

Assim, temos que dos três factos alegadamente integradores de justa causa, um já tinha caído por decisão do próprio STJ – a questão da cena do confronto físico com o marido de uma colega, que note-se tinha ficado provado que foi o outro contendor quem veio a ser criminalmente punido por crime de injúrias, dano e ofensas corporais na pessoa da Autor – cfr. alínea NN) da matéria de facto.

E o segundo – alegada desobediência a ordem de superior hierárquico, veio a ser reconhecido pelo Tribunal da Relação do Porto que o STJ nesta parte alterou a matéria de facto fixada pelas instâncias, o que retira qualquer suporte fáctico à avaliação do Supremo Tribunal de Justiça de que tal recusa era injustificada, e, nessa medida integrar o conceito de justa causa de despedimento.

Subsistiu a questão da entrevista à Sic, toda ela de conteúdo verdadeiro, sendo que o Autor mais não fez do que prestar os esclarecimentos que lhe foram solicitados pela jornalista,

Num cenário de perseguição laboral comprovada, num caso claro de mobbing, que durava na época há seis anos, enfiado o Autor numa cave, isolado, e sem luz natural, sendo que o autor em 28 anos de serviço num tinha tido um único dia de suspensão, salvo o devido respeito, é grave ser-se despedido alegadamente com justa causa.

E mais grave ainda é a atitude do STJ que alterando, como a simples leitura o evidencia, a matéria de facto fixada pelas Instâncias faz proceder o recurso de revista do Banco Réu.

E não menos grave, o Autor lançar mão de mais um meio legal ao seu dispor na acção que intentou contra o Estado Português, devido à tal actuação ilícita e violadora da Lei por parte do STJ, não tendo sido reposta a verdade dos factos, e acima de tudo não foi reposta a JUSTIÇA que sempre se espera dos Tribunais.
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De sublinhar que, entretanto, por ocasião de intentar acção contra o Estado Português no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em 03.03.2009, o mandatário do Autor solicitou a confiança daquele processo intentado contra o Estado Português.,

Sendo que nessa sequência foi compulsado o mesmo processo, verificando-se um conjunto de ilegalidades ocorridas nas Instâncias Superiores nos recursos que interpôs na mesma acção, já aludidos supra.

De considerar que, em 07.03.2006, é aberta conclusão no processo julgando improcedente a pretensão indemnizatória contra o Estado e que baixou à Relação para supressão de nulidade, segundo o ordenado pelo STJ, o Exmo Sr. Juiz Desembargador, relator da 2ª Secção que, por despacho de 14.03.2006, considera o recurso o próprio e ordena a remessa do mesmo aos vistos dos Exmos Juízes Adjuntos – fls. 364.

Em 16.03.2006 vai à vista do Exm.º 1º Adjunto e em 04.04.2006 vai à vista do Exm.º Desembargador 2.° Adjunto, com o n° 2328, datado e assinado pelo Sr. Juiz Desembargador em 20.04.06 – fls. 365.

Inexplicavelmente e sem qualquer informação de qualquer espécie, a fls. 366, e com data anterior aos segundos vistos – 29.03.2006 –, os autos são remetidos à central para redistribuição – fls. 366., sem motivo se apresentando para os autos serem redistribuídos, depois de terem sido recebidos pelo Relator e irem aos vistos, pelo menos do 1° Adjunto pois a alegada redistribuição terá sido anterior aos vistos do 2° Adjunto.

Violando princípios fundamentais num Estado de Direito os autos foram redistribuídos, num acto sem qualquer sustentação legal.

Não há qualquer motivo atendível e legal para a redistribuição dos autos a outra Exmª Desembargadora

O legal e habitual nos Tribunais é o processo ser distribuído uma única vez, seja a que Senhor Magistrado for, aleatoriamente, sendo o processo julgado pelo Juiz natural, resultante dessa distribuição, o que não aconteceu.

Depois do processo baixar à Relação do Porto, a fls. 665, não se sabe porque motivo é aberta conclusão ao Exmo Sr. Desembargador 1° Adjunto em que ordena a remessa do processo à distribuição.

Por despacho de fls. 368 foi ordenado fossem colhidos os vistos (em segunda versão) e a outros Adjuntos.

Em escassos meses deu-se uma nova redistribuição, com a consequente mudança de Relator e de Adjuntos, e que põe desde logo em causa a credibilidade do Estado de Direito e em grosseira violação dos mais elementares princípios num Estado dito de Direito.

Em 05.02.2007 é proferido novo Acórdão a fls. 373 a 402 que julga improcedente a apelação e manteve a decisão recorrida, sendo que o Autor não se conformando com esta Decisão, dela recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça.
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Após a anulação da decisão decidida pelo Supremo Tribunal de Justiça, normalmente o processo foi redistribuído, supostamente para outro Colectivo com Relator e Adjuntos diferentes dos que proferiram a primeira Decisão, pois se assim não fosse seriam Juízes em causa própria.

Eis que o processo é redistribuído, passa a ter outra Relatora mas os Adjuntos são exactamente os mesmos da anterior decisão. Salvo o devido respeito, isto é completamente inaceitável num Estado dito de Direito.

Da primeira vez que o processo esteve no Tribunal da Relação, o processo foi naturalmente distribuído a um Colectivo, sendo que ilegalmente foi redistribuído a outro Colectivo.

Da segunda vez que o processo esteve na mesma Instância, é redistribuído, mas no Colectivo mantêm-se os Adjuntos da primeira Decisão, e que inclusivamente fazem parte de secção diferente da Exmª Srª Relatora.

Temos um Colectivo afastado devido à redistribuição, e numa segunda fase, temos a maioria de um Colectivo a repetir funções após uma redistribuição do processo, o que supunha a alteração total do Colectivo, o que não aconteceu.
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Apesar de o Tribunal da Relação ter reconhecido que o STJ havia alterado matéria de facto na pag. 60 do mesmo Acórdão, o recurso foi julgado improcedente, sendo que o Autor dele recorreu para o STJ – fls. 703, o qual é admitido por Despacho proferido em 28.04.2008 – fls. 707.

O processo é apresentado na Secção Central do Supremo Tribunal de Justiça para ser distribuído – fls. 765, sendo-o à 7ª Secção e foi registado sob o n° 2726/08-7.

É aberta conclusão ao Sr. Juiz Conselheiro Relator que por Despacho de fls. 765 refere não ter de haver nova distribuição, e ordena a remessa dos autos à 1ª Secção a quem tinha sido anteriormente distribuído – fls. 765, sendo registado sob o n° 2146/07 e a um seu Exm.º Cons.º que, por despacho de fls. 654., ordena a remessa dos processo aos vistos e em 18.09.2007 vai à vista do 1º Adjunto e, depois, ao Exmo Conselheiro, 2.° Adjunto

Sem qualquer sustentação ou suporte legal há um Despacho que viola as mais elementares regras num Estado de Direito, que viola as regras da distribuição natural, e o direito a ser julgado por pessoas diferentes das anteriores.

A fls. 766 estamos perante outro Despacho, proferido pelo Juiz Conselheiro Relator da 1ª Secção, violador da Lei, quando, por alegada ausência (sem se saber de que espécie, por quanto tempo), do Exmo Juíz Conselheiro Adjunto, os autos prosseguiram com outro Sr. Juiz Conselheiro Adjunto.

O processo é entregue a determinado Relator sem qualquer suporte legal, que por sua vez ordena que esse Colectivo de Juízes seja composto por outro Adjunto que não tinha composto o primeiro Colectivo que julgara o processo no STJ.

Além de ter sido violada a distribuição natural, sendo o processo remetido para um Relator que já julgara o processo, o que é intolerável, sendo alterada também inexplicavelmente e sem qualquer sustentação legal a composição desse Colectivo.

Em 2008.10.10 o processo vai aos vistos a um Exm.º Cons.º fls. 766 verso, e em 2008.10.13 o processo vai aos vistos a outro – fls. 766 verso.

O processo que foi distribuído naturalmente à 7ª Secção e registado sob o n° 2726/08-7, converte-se em 2146/07-1 na maior das normalidades e sem qualquer suporte legal.

É proferido Acórdão em 28.10.2008 no Supremo Tribunal de Justiça – fls. 768 a 797, que julga improcedente o recurso e mantém a decisão recorrida da Relação (que absolvera o Estado Português).

Sendo que a única matéria que consta dos autos, portanto, verdadeira, que foi considerada como provada, foi de que o Autor mais não fez do que prestar à jornalista os esclarecimentos que esta lhe solicitou, e desvalorizou completamente a veracidade do conteúdo da reportagem televisiva e as circunstâncias concretas em que o Requerente – Quadro Superior do Banco – estava enfiado numa cave sem luz natural (caso de mobbing na época com 6 anos de duração e pior caso de perseguição laboral considerado já pelo Tribunal do Trabalho do Porto), como que imputa responsabilidades ao Autor afirmando que se tratou de uma entrevista em que “participou activamente” e que “não há sinal de o Recorrente se ter demarcado da indicação do nome em causa”, nem o Autor o podia fazer pois a indicação do nome em causa por parte da jornalista foi da sua inteira responsabilidade.

Acresce que, foram gravadas imagens que foram tratadas e montadas pela jornalista e por inteira responsabilidade desta. Não se tratou de uma entrevista em directo, e o conteúdo da reportagem foi da exclusiva responsabilidade da jornalista, aliás, como é normal nestas situações.

É inaceitável o STJ, tecer considerações não exactas, perfeitamente subjectivas, e sem interesse para a questão em apreço, que era a verificação da alteração da matéria de facto operada pelo STJ em 2001 com a consequente procedência da revista.

Mais inaceitável é a insistência, contida no Acórdão do STJ, na alegada “ofensa à imagem e prestígio do banco, havida como suficiente para concluir pela “imediata e prática impossibilidade de manutenção da relação laboral”, com verificação da justa causa de despedimento.”,

Quando está amplamente demonstrado que nem o próprio Banco alegou qualquer ofensa à sua imagem e prestígio, nem da matéria fixada nas Instâncias isso consta, é, portanto, salvo o devido respeito, uma ficção que o STJ efectuou em 2001 que o STJ não verificou em 2008.

Depois da triste situação laboral do autor e depois da alteração da matéria de facto operada pelo STJ em 2001, era escusado o STJ em 2008 imputar responsabilidades ao Autor (que nunca as teve realmente), nada disse sobre a omissão do Acórdão do STJ de 2001 sobre as circunstâncias em concreto da relação laboral, e não cuidou de visionar a cassete para com todo o rigor se poder pronunciar e avaliar a mesma reportagem televisiva.

Por Requerimento apresentado em 17 de Novembro de 2008, o Requerente vem requerer a reforma do Acórdão e arguir a nulidade desse último acórdão.

É proferido Acórdão pelo STJ que não atende o Requerimento do Autor.

Nos presentes autos, coloca-se em crise, e em síntese, a redistribuição do processo no Tribunal da Relação do Porto, sem qualquer sustentação legal, em violação do princípio do Juiz natural,

Não se sabe porque o processo não foi redistribuído mais vezes.

Depois de redistribuído o processo na Relação, depois de ter baixado do STJ, foi constituído um Colectivo, em que os Adjuntos foram precisamente os mesmos que constituíram o primeiro Colectivo, tendo sido formado um Colectivo misto com Desembargadores de duas secções cíveis diferentes, isto também sem qualquer sustentação legal.

No STJ, o processo foi à distribuição, como teria de ir, e por despacho sem qualquer sustentação legal, foi remetido objectivamente para um Relator (que já havia julgado o processo),

Sendo que acresce que nessa nova passagem no STJ, um Adjunto é substituído por outro, isto sem qualquer suporte legal.

O autor tinha de ser julgado por um Juiz natural, e por duas vezes no Tribunal da Relação do Porto, e uma vez (a que acresce a substituição do Adjunto) no Supremo Tribunal de Justiça, não o foi, em clara violação da Lei, isto tudo num único processo judicial, a acção intentada contra o Estado Português referida no número 108, supra.

O Juiz natural, de que o autor foi privado, na Relação e no Supremo trata-se de um Juiz com largos anos de experiência na Judicatura, perante o quadro laboral do autor,

O autor, sem qualquer suporte legal, perdeu a oportunidade de pelo menos três vezes ser julgado por um Juiz natural, com os consequentes danos daí resultantes, pois um juiz natural, conforme já supra referido, julgaria em sentido oposto aos Juízes que efectivamente julgaram os processos do autor.

Na verdade, se um Juiz natural respeitasse a Lei, teria de julgar em sentido favorável ao Autor.
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Um Juiz natural, perante os factos concretos e o direito aplicável, teria de decidir em sentido favorável ao Autor.

Um juiz natural não sancionaria a alteração ilegal da matéria de facto, valorando-a devidamente.

O facto de o Autor não ter sido julgado no âmbito do mesmo processo, por várias vezes, por Juiz natural, que decidiria em sentido inverso ao decidido, causou-lhe danos, e continua a causar, nomeadamente patrimoniais, a saber:

Conforme supra referido, o autor foi despedido pela sua entidade patronal em Setembro de 1995, peticionando na acção que lhe moveu a sua reintegração, com o pagamento de todos os vencimentos, além de ter peticionado o despedimento ser considerado abusivo, acção que tendo em conta a actuação ilegal do STJ em Fevereiro de 2001 (alteração da matéria de facto) foi julgada improcedente, e que na acção intentada anteriormente contra o Estado, um Juiz natural consideraria ilegal.

Os danos patrimoniais reportados a esse período são todas as retribuições que o Autor deixou então de auferir com as diuturnidades respectivas, em dobro, atento o carácter abusivo do despedimento de que foi alvo (pedido que foi prejudicado de ser conhecido em função do Acórdão do STJ de 2001).

Conforme supra, referido, além da retribuição base do nível 10 que o Autor detinha na época, acresciam diuturnidades por cada 5 anos completos de trabalho efectivo, num máximo de 7 (sete) diuturnidades.

Em 1995 o autor tinha 28 anos de serviço efectivo, pelo que tinha já 5 (cinco) diuturnidades, sendo que o valor na época por que cada diuturnidade era paga era de 25,49€. Em 1997 completava 30 anos de serviço e em 2002 atingiria 35 anos de serviço, pelo que a partir dessas datas serão consideradas 6 e 7 diuturnidades, respectivamente.

Entre Setembro de 1995 e Junho de 2000, altura em que o D………… foi incorporado no E………… o autor receberia a retribuição segundo a tabela do Acordo Colectivo de Trabalho geral para o sector bancário, sendo que a partir daquela data – Junho 2000 – o autor receberia segundo a tabela do Acordo Colectivo de Trabalho do grupo E…………, o que foi considerado na contabilização das retribuições do autor.

Assim, de Setembro de 1995 a Fevereiro de 2001, a retribuição do nível 10 que o Autor deixou de auferir e em que ficou objectivamente lesado foi:

Em 1995 para uma remuneração de 906,82€ x 4 + diuturnidades 529,80€ = 4157,08€.

Em 1996 para uma remuneração de 906,82€ x 14 + diuturnidades 1854,30€ = 14549,78€.

Em 1997 para uma remuneração de 936,24€ x 14 + diuturnidades 1854,30€ = 14961,66€.

Em 1998 para uma remuneração de 964,42€ x 14 + diuturnidades (6x26,49€) 2225,16€ = 15727,04€.

Em 1999 para uma remuneração de 995,85€ x 14 + diuturnidades 2225,16€ = 16167,06€.

Em 2000 para uma remuneração de 1028,27€ x 14 + diuturnidades 2225,16€ = 16620,94€.

Em 2001 para uma remuneração de 1088,00€ x 2 + diuturnidades 316,28€ = 2492,28€.

O total de remunerações reportadas a esse período (Set/95 a Fev/2001) totalizam 84675,84€, e os juros das mesmas, à taxa legal, calculados até à presente data, ascendem a 57779,34€, num total de 142455,18€ (cento e quarenta e dois mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e dezoito cêntimos).

Tendo sido considerado abusivo o despedimento de que foi alvo o autor, a sanção legal era o pagamento das retribuições em dobro, pelo que o autor em Fevereiro de 2001 ficou objectivamente lesado em 284910,36€ (duzentos e oitenta e quatro mil novecentos e dez euros e trinta e seis cêntimos), da qual deve ser ressarcido.

A tudo isto acresce que o Autor seria reintegrado no seu posto de trabalho e continuaria a trabalhar até atingir a idade de reforma, aos 65 anos, que o autor completou em Fevereiro de 2011, pelo que o autor foi objectivamente lesado das quantias que deixou de auferir nesse período (Mar/2001-Fev/2011), que pela presente também peticiona, a saber:

Em Março de 2001 para uma remuneração de 1088,00€ x 12 + diuturnidades 1907,28€ = 14963,28€.

Em 2002 para uma remuneração de 1123,00€ x 14 + diuturnidades 2225,16€ = 17947,16€.

Em 2003 para uma remuneração de 1153,00€ x 14 + diuturnidades (7x26,49€) 2596,02€ = 18738,02€.

Em 2004 para uma remuneração de 1185,00€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 191 86,02€.

Em 2005 para uma remuneração de 1215,00€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 19606,02€.

Em 2006 para uma remuneração de 1245,40€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 20031,62€.

Em 2007 para uma remuneração de 1279,90€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 20514,62€.

Em 2008 para uma remuneração de 1313,18€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 20980,54€.

Em 2009 para uma remuneração de 1332,88€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 21256,64€.

Em 2010 para uma remuneração de 1346,21€ x 14 + diuturnidades 2596,02€ = 21443,26€.

Em 2011 para uma remuneração de 1346,21€ x 2 + diuturnidades 370,86€ = 3063,28€.

O total de remunerações reportadas a esse período (Mar/2001 a Fev/2011) totalizam 197730,46€, e os juros das mesmas, à taxa legal, calculados até à presente data, ascendem a 42904,88€, num total de 240635,34€ (duzentos e quarenta mil seiscentos e trinta e cinco euros e trinta e quatro cêntimos), de que o autor também deve ser ressarcido.

Nesta conformidade, o total de danos patrimoniais em que o autor está lesado, é de 525545,70€ (quinhentos e vinte e cinco mil quinhentos e quarenta e cinco euros e setenta cêntimos), que o Estado deve ser condenado a pagar ao autor a título de danos patrimoniais, o que muito respeitosamente requer a Vossa Excelência.

Sem prescindir,

O autor teve danos não patrimoniais, e continua a ter, resultantes de toda esta situação, nomeadamente:

Pelo facto de ter sido vítima de “bulling” durante seis anos, e pela forma desumana com que foi sempre tratado nesse período. Pela perda do seu posto de trabalho, e pela perda de oportunidades de progressão na carreira, sendo que o autor era muito brioso na sua actividade profissional.

Por ter sido o autor privado do seu ordenado, único rendimento que possuía, sendo que como chefe de família, viu-se privado de contribuir para o sustento do lar, o que sempre atormentou o autor.

O autor passou a viver da ajuda da mulher, e pontualmente da ajuda de um amigo de longa data.

Com a decisão do STJ em 2001 (que alterou a matéria de facto com a consequente procedência do recurso de revista) o estado de saúde do autor piorou e veio sempre a piorar até hoje.

O que era e é bem visível pela simples observação do semblante do autor, que a partir daí mostra bem a angústia e revolta em que vive.

O autor passou a ser uma pessoa que vive o seu quotidiano angustiado e revoltado,

Revolta do autor que se passou a reflectir sobretudo nas relações familiares,

E nas relações com pessoas amigas, de que o autor se afastou na quase totalidade devido a esta situação.

O autor viu-se privado de gozar férias uma vez por ano, como sempre fazia até 1995, e nunca mais se ausentou do domicílio, nem sequer num fim de semana, como fazia antes daquela data.

Com a decisão do STJ de 2008, na acção contra o Estado Português, mais o autor piorou no seu estado de saúde, sendo que quando o autor tomou conhecimento das irregularidades cometidas que o privaram de ser julgado por Juiz natural, mais ficou afectado psicologicamente.

Sendo que o autor tem consciência de que não cometeu nenhum crime, nem qualquer infracção disciplinar enquanto trabalhador, nem cometeu qualquer irregularidade, e mesmo lançando mão dos meios legais ao seu dispor, até ao momento não lhe foi reconhecida a razão que efectivamente tem,

Também por isso que a revolta e angústia fazem parte do dia a dia do autor.

O autor deixou de saber relativizar o que quer que seja, sendo que uma pequena contrariedade do dia a dia, por exemplo a televisão deixar de funcionar, deixam o autor em estado anormal de irritação,

Tendo o autor perdido a faculdade de escutar os outros, nomeadamente dos familiares mais próximos.

Qualquer comunicação ao autor que altere o seu quotidiano, deixa-o perturbado e ansioso.

Os graves danos não patrimoniais que para o Autor resultaram, nomeadamente das irregularidades cometidas na acção que intentou contra o Estado Português, que estão interligados e não se podem dissociar de toda a situação vivida pelo autor desde Janeiro de 1989,

Em que o autor por todos os motivos já expostos, supra, portanto, há mais de 20 anos não vê esta situação resolver-se, sendo que os danos não patrimoniais irão agravar-se até ser-lhe reconhecida a razão que inegavelmente tem (e nunca o autor há-de ser ressarcido de tudo o que sofreu, acima descrito).

Os danos não patrimoniais sofridos pelo autor até à presente data quantificam-se em 180000,00€ (cento e oitenta mil euros).

Acrescem danos não patrimoniais que vão continuar a resultar no futuro para o autor devido a esta situação, que no momento não se podem quantificar, por isso que a fixação destes deve ser relegada para execução de sentença.
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O autor, funda “de iure” a presente no artigo 22°, da Constituição da República Portuguesa.

Assim peticiona que o Estado Português seja condenado a pagar ao Autor:

a) — Danos patrimoniais sofridos pelo autor, supra discriminados, sendo o capital no valor de 367082,14€, e os juros vencidos até à presente data, no montante de 158463,56€ (calculados à taxa legal), num total de 525545,70€ (quinhentos e vinte e cinco mil quinhentos e quarenta e cinco euros e setenta cêntimos), acrescido dos juros vincendos até integral e efectivo pagamento;

b) — Danos não patrimoniais que até ao momento se quantificam em 180000,00€ (cento e oitenta mil euros);

c) — Danos não patrimoniais que o autor vai continuar a sofrer, que no momento não se podem quantificar, a liquidar em execução de sentença.

- tudo com as legais consequências.

O Tribunal Judicial de Matosinhos por seu despacho de 6.3.2012 declarou-se materialmente incompetente em razão da matéria para apreciar o pleito, indeferiu liminarmente a p.i., atribuindo a competência à jurisdição administrativa, alegando, no essencial que, no processo importa distinguir entre actos jurisdicionais “stricto sensu” em que a função de julgar surge em todo o esplendor e outros, não jurisdicionais, em que é preponderante a função de administração do processo, a regulação da sua ritologia, substancialmente não jurisdicionais, entre as quais se engloba a distribuição.

O erro judiciário fundante da responsabilidade civil extracontratual – não contratual. – pressupõe a prática de acto englobado na específica e restrita missão de julgador, assim devendo ser interpretado o art.º 13.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12 e o seu art.º 13.º n.º 1, sendo alusivo a actos decorrentes de decisões jurisdicionais, nessa medida se posicionando o AC. deste TC de 29.11.2006, e por força, ainda, do art.º 4.º n.º 1 als. g) e h), do ETAF, declinou incompetente a jurisdição comum, procedendo a excepção dilatória em causa – art.°s 101.º e 105.º, do CPC e 494.º aI. a), do CPC.
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Em sequência, o A., em 30.5.2012, veio então a intentar, na jurisdição administrativa, TAFP, a presente acção administrativa em forma ordinária contra o Estado Português, mantendo exactamente o quadro factual que à acção intentada na jurisdição comum, serviu de fundamento, sua causa de pedir, apenas actualizando os danos patrimoniais sofridos para o capital no valor de 382.163,96 € e os juros vencidos até à presente data, no montante de 178.082,63€ (calculados à taxa legal), num total de 560.246,59€ (acrescido dos juros vincendos até integral e efectivo pagamento);

Colhidos os legais vistos, cumpre decidir:

Está delineado em função do precedentemente exposto um conflito negativo de jurisdição, na medida em que duas entidades judiciais pertencentes a diferentes jurisdições – comum, Tribunal de Matosinhos e administrativa – TAF Porto – se atribuem recíproca competência, rejeitando a própria – art.ºs 109.º n.º 1, 110.º n.º 1 e 111.º n.º 2, do CPC.

A nossa organização judiciária consagra uma ordem jurisdicional administrativa e fiscal que a Constituição faz assentar num critério substantivo, centrado no conceito de “relações jurídicas e fiscais”, mas “sem erigir esse critério num dogma, uma vez que a Constituição, como o Tribunal Constitucional tem entendido, não estabelece uma reserva material absoluta, impeditiva aos tribunais comuns de competência em matéria administrativa ou fiscal ou da atribuição à jurisdição administrativa de competência em matérias de direito comum”, escrevem João Caupers e João Raposo, in A Nova Justiça Administrativa, pág. 11. Sirva de exemplo desta dessincronia a competência atribuída aos tribunais comuns para arbitramento da indemnização por via de prisão de grosseiro erro judiciário - art.º 4.º n.º 3 a), do ETAF.

E a CRP no seu art.º 212.º, n.º 3, atribui aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.

Aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, enquanto órgãos de soberania, cabe a administração da justiça em nome do povo nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais – art.º 1.º, do ETAF, na redacção dada pela lei n.º 107/2003, de 31/12, a tutela dos direitos e interesses legalmente protegidos fundados em normas de direito fiscal e administrativo e fiscal, decorrentes de actos jurídicos praticados ao abrigo do direito administrativo e fiscal.

E a sua competência fixa-se no momento da propositura da acção (em 2011) - art.º 5º do ETAF.

O âmbito do domínio da justiça administrativa e da distinção entre direito privado e público passa, pois, pela definição do que devam ser relações públicas, que, para Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa, Lições, Almedina, pág. 56, são aquelas em que um dos sujeitos, pelo menos, actua na veste de autoridade pública, munido de um poder de “imperium” com vista à realização de um interesse público legal.

E assim a jurisprudência o tem entendido, de que são exemplos os ACS. deste Tribunal de 5.6.2008, P.º 21/06, de 4/11/2008, P.º 21/07, de 4.11.09, P.º 6/09, de 28/10 e de 12.1.12 ; P.º 0/11

São relações jurídicas administrativas externas ou interpessoais as que se estabelecem entre a Administração e os particulares, em que ocorre uma prevalência do interesse público sobre o particular traduzido na atribuição de poderes de autoridade à Administração, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, I; 57.

Fernandes Cadilha sustenta que, por relação administrativa, se deve entender a estabelecida entre dois ou mais sujeitos (um dos quais a Administração Pública), regulada por normas de direito administrativo e das quais resultam posições subjectivas.

A relação jurídico-administrativa estabelece-se, por regra, pois, entre pessoas colectivas públicas, aquelas que actuam um poder público, em vista da realização de um interesse público legalmente definido, no cumprimento de deveres inerentes à autoridade pública.

Para o Prof. Freitas do Amaral, in Direito Administrativo, III, 439-440, a relação jurídico-administrativa confere poderes de autoridade pública ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares ou correspondentes deveres.
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A questão da competência do tribunal afere-se, como é jurisprudência sem divergência (Cfr. Acs. do STJ de 12.2.2002, 15.1.2004, 27.1.2004, 18.3.2004, 13.5.2004, 13.3.2008 e 10.4.2008) pelo pedido, pela pretensão do autor e seus fundamentos, ou seja pela causa de pedir, enquanto facto jurídico concreto devidamente explicitado, segundo a teoria da substanciação, que rejeita afirmações vagas, não factualmente concretizadas, ou seja pelo que é “disputatum”, em antítese com o que, mais tarde, será decidido, segundo Redenti, Processo Civil, I, 265, e Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 86, sem descer à apreciação da bondade, ao mérito do “quod disputatum” e mesmo à legitimidade processual.

A competência do tribunal é a medida da sua jurisdição e é no art.º 4.º do ETAF, que, de uma forma não taxativa, mas meramente exemplificativa, se enumeram os litígios que lhe incumbe decidir, eliminando-se o critério delimitador da natureza pública ou privada do acto de gestão que gera o pedido - AC. do TC, p.º 8/09, de 7/7/2009 – ou seja a sua pertinência à gestão pública ou privada.

O seu n.º 1 segue a técnica do enunciado genérico dos actos sobre que incide a sua competência material; os seus n.ºs 2 e 3 materializam algumas excepções àquela competência.

Os tribunais administrativos e fiscais apresentam-se hoje como uma área própria, uma reserva de jurisdição que espelha o seu núcleo essencial, ainda que algumas matérias possam ser pontualmente atribuídas a outra jurisdição – Ac. do STA, de 3.10.96, Rec.º 41403, 26.2.97, Rec.º n.° 41487 e do TC, P.º n.º 372/94, DR 25.07.97.

E nos termos do artigo 13° do CPTA “o âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria.”.
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De relevar que os actos processuais, das partes, do juiz e auxiliares de justiça, são, por definição, os que provocam consequências jurídicas no processo; actos processuais são os actos das pessoas envolvidas no processo e com relevância nele.

E a distribuição é um acto processual, cuja finalidade é repartir por via igualitária e aleatória o serviço judicial, e a ela todos os actos que impliquem início de causa estão sujeitos, nos termos dos artigos 203.°, 206.° n.º 1 e 213.º n.º 1, do CPC.

A distribuição designa a secção, a instância e o tribunal em que o processo há-de correr, bem assim, no tribunal superior, o juiz a servir de relator.

E se o juiz relator estiver impedido, efectuar-se-á nova distribuição na mesma escala, o mesmo sucedendo se, mais tarde, o relator estiver impedido ou deixar de fazer parte do quadro desse tribunal. – art.º 217.º n.º 1, do CPC.

Para ela é designado um juiz a presidir e resolver as dúvidas que se suscitarem – art.° 213.° n.º 3, do CPC.

Do exposto se vê que a distribuição não é um acto anódino, de segunda valia, quase neutro de um ponto de vista normativo, pois que visa assegurar importantes princípios fundamentais da função de julgar, como sejam os da imparcialidade, independência e objectvidade, pela forma cega e aleatória como se processa e numericamente equitativa entre os juízes.

As precauções de que o legislador se serve, designadamente a forma aleatória, por sorteio entre os Magistrados do tribunal, tem em vista evitar a escolha adrede, interessada, no julgamento por certo Magistrado, atribuindo-lhe o processo, realizando, no plano dos princípios legais, o princípio do juiz natural, impeditivo de que o dissídio seja afecto a um tribunal a criar, em detrimento da afectação da competência a um tribunal précriado e enraizado na orgânica funcional do sistema judiciário.

A competência defere-se a um Tribunal existente ao “tempus acti”, segundo Paolo Tonnini; outros Autores sustentam que o princípio não choca com a atribuição a outro tribunal desde que não seja arbitrária, discricionária; o TC disse que o princípio não veda a alteração das regras da organização judiciária nem a possibilidade de imediata aplicação dessas regras de alteração, embora o tribunal competente possa ser distinto do que resultaria da aplicação das regras vigentes à data da prática do facto. Cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código de Processo Penal, 54.

Trata-se um acto processual, com toda a relevância e subsistência no processo, não algo que se dilui, apagando-se na marcha do processual, como se faz crer na decisão de indeferimento liminar do Tribunal de Matosinhos, reconduzindo-o, redutoramente, à figura de acto de pura administração endoprocessual.

Que seja acto administrativo no sentido próprio ninguém duvida que o não é, qualquer que seja a concepção adoptada, que, para o Prof. Freitas do Amaral vai no sentido de acto unilateral praticado no exercício do poder administrativo por um órgão da administração ou por uma entidade privada habilitada por lei e que se traduz numa decisão tendente a produzir efeitos jurídicos – Curso de Direito Administrativo, III, 2001.

Trata-se acto subordinado aos princípios da legalidade, presunção de equidade, imperatividade, revogabilidade, sanabilidade, autoridade, condição necessária do uso da força e impugnabilidade contenciosa, cfr. Filipa Rente Ramalho, Acto Administrativo, FDUP, 2007.

Segundo uma definição com inspiração germânica é toda a manifestação de autoridade pública, endereçada à criação, modificação ou extinção de uma relação jurídica administrativa determinada, normativamente regulada pelo direito administrativo e com efectividade imediata no âmbito externo; para um entendimento de inspiração italiana assume a natureza de declaração de vontade, que vai desde o juízo realizado pela administração pública, submetida ao direito administrativo – cfr. Derecho Administrativo Español, Rodrigues Arana e Miguel Angelo Sendin, pág. 5.
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Divergindo, agora, de campo de análise, de reter que até à entrada em vigor da Lei n.º 67/2007, de 31/12, a responsabilidade civil extracontratual do Estado por facto ilícito dos juízes ou da actividade judiciária estava já prevista, mas restritamente, com relação apenas aos casos de privação ilegal da liberdade e aos casos de revisão em que a injustiça da decisão, necessariamente grave, fosse reconhecida, como resulta dos art.ºs 225º e 461.º 462.º, do CPP.

A efectivação da responsabilidade dos juízes, não estava directa e expressamente ali prevista, ou seja no Dec.º-Lei n.º 48.051, de 21/11/67, sendo tratada por apelo às regras da culpa funcional, ao funcionamento deficiente da justiça, sem abdicar da verificação dos pressupostos de responsabilidade civil por facto ilícito, segundo art.º 486.º, do CC.

Por seu turno o art.º 22.º da CRP, alude à responsabilidade solidária das entidades públicas e dos titulares dos órgãos administrativos, funcionários e seus agentes, no exercício das suas funções, pelos actos e omissões de que derivem danos para aos direitos, liberdades e garantias ou causem prejuízos a terceiros.

Neste domínio, o Prof. Gomes Canotilho defendia, a propósito de tal responsabilidade, que só poderia, sob pena de paralisação da actividade judiciária e ofensa dos princípios da autonomia e independência no “jus dicere”, ancorar-se nos casos de dolo ou culpa grave ou com compromisso para o funcionamento da função judiciária – Rev. Leg. Jur. Ano 123, n.º 3799, 307.

A CRP estipula no seu art.º 218.º a irresponsabilidade dos juízes nas suas decisões, salvo os casos declarados por lei, vindo aquela Lei n.º 67/2007, de 31/12, ao regular sobre a matéria, e a compatibilizar-se com o diploma fundamental, e com o EMJ (Estatuto dos Magistrados Judiciais), ao estabelecer que aos danos ilicitamente causados na administração da justiça designadamente por violação do direito a uma decisão em prazo razoável, é aplicável o regime da responsabilidade civil por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa – art.° 12.°.

Sem prejuízo do disposto na lei processual penal por caso de sentença condenatória penal injusta ou privação injustificada da liberdade, o Estado é civilmente responsável por danos derivados das decisões judiciais manifestamente inconstitucionais ou ilegais ou injustificadas por erro grosseiro na apreciação dos respectivos pressupostos de facto – art° 13.° n° 1.

Os Magistrados Judiciais e do M.º P.º, além da responsabilidade criminal só podem ser responsabilizados por danos resultantes do exercício das funções quando tenham agido com dolo ou culpa grave – art.° 14.° n.º 1 - e em via de regresso, comprovada a responsabilidade na jurisdição própria.

O pedido de indemnização deve, pois, ser fundado na revogação da decisão danosa, declarada na jurisdição competente – n.º 2.

É, reconhecidamente, um regime apertado em termos de efectivação o que bem se compreende por o direito não ser uma ciência exacta, o direito é passível de várias interpretações, presta-se à argumentação e nutre-se da convicção, por vezes intimista e subjectiva do julgador e seus destinatários, isto sem falar, como é reconhecido por doutrinadores consagrados, que nem sempre as leis se conseguem adaptar à realidade – cfr. Vieira de Andrade e Carlos Cadilha, citados por Nélia Dias, in Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas e, ainda Fátima Galante, Tese de Doutoramento, UAL, pág. 12, 2013.

Isto sem falar, ainda, na avalanche legislativa a que se assiste, desacompanhada de textos legislativos cristalinos, coerentes, aplicáveis sem esforço, inconciliáveis, por vezes, com a filosofia do sistema jurídico.

A responsabilidade assenta, pois, em erro ou em culpa grave, um erro com especial cariz, por dever ser grosseiro, conceito também usado com idêntico sentido, no direito processual penal, onde é concebido no sentido de intolerável, manifesto, patente, em que um juiz razoável e exigivelmente preparado não incorre quanto à aplicabilidade de normas da CRP ou da legislação ordinária, próprio de uma análise desatenta, desleixada e desinteressada – cfr., ainda, Fátima Galante, op. e loc. cit. e, ainda, Prof. Manuel de Andrade, como o alcance de “aberratio legis”, Teoria, II, 239.

Não basta a divergência com a solução adoptada ou a consideração de que, em outros processos, seria divergente, antes se impondo aquela interpretação reforçada de que um juiz normal, minimamente cuidadoso, não incorreria em tal erro, revestindo-se, por isso, da maior censurabilidade, não bastando uma interpretação peregrina da lei - cfr. Ac. do STJ, de 20.10.2005, Rec.º n.º 05B2490, ITIJ.

A responsabilidade in casu do Magistrado é normalmente a procedente de dolo, intenção de favor, indiferença ou pura insensibilidade na função de julgar, na qual se engloba a condução do processo.
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Já o referimos, o A. recorreu à jurisdição administrativa face ao indeferimento “in limine” que lhe sobreveio na jurisdição comum no Tribunal de Matosinhos, mas, ainda aqui, não mereceu aquiescência a sua pretensão de firmar a competência material em tal Tribunal, onde o Exm.º Magistrado do M.º P.º, representando o R. Estado, pugnou, além do mais, pela incompetência do Tribunal, invocando que:

-dos termos da petição inicial decorre que a causa de pedir se funda, em tal acção, num presuntivo erro judiciário, baseado na incorrecção, por irregularidades havidas na distribuição processual no STJ e na Relação, em preterição de regras do “juiz natural”, além de que “contra legem” o STJ alterou a matéria de facto antes provada, do que resultaram danos, pois a conformar-se as decisões ao formato legal, às regras processuais especificamente previstas na lei, de não violação de tais regras, outra teria sido a solução, à margem da alteração da matéria de facto, que de favorável se tornou ostensivamente desfavorável.

Argumenta, ainda, que nos termos legais, a competência para apreciar as questões por responsabilidade extracontratual de pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional, cabe à jurisdição fiscal e administrativa, ut art.°s 212.° n.º 3, da CRP e 4.° n.º 1 g) do ETAF, excluindo-se dessa competência os litígios cujo objectivo seja a impugnação de decisões judiciais proferidas por tribunais não integrados na jurisdição administrativa e fiscal - n.º 2, al) b.

Expressamente excluídas de tal jurisdição especial ainda a apreciação de responsabilidade por erro judiciário cometido por tribunais pertencentes a outra ordem de jurisdição, bem como das competentes acções de regresso - art.º 4 n.º 3 a), do ETAF.

Atendendo ao pedido do A. e a causa de pedir que o sustenta, que suportam e definem os contornos de uma acção indemnizatória por danos emergentes de erro da acção judiciária, exercida em moldes grosseiros pelos seus magistrados, impõe-se a declaração de incompetência material da jurisdição administrativa.

O TAFP, na sequência da pronúncia do A., decidiu, outorgando razão ao Exm.º Magistrado excipiente, aduzindo que aquela norma do art.º 4.º n.º 3, a) do ETAF, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19/2, tem como fim firmar a ideia de que cada jurisdição deve julgar as acções de indemnização fundadas nos erros judiciais por si cometidos, como se decidiu no Ac. deste TC de 28.10., p.º 015/1 e depois, seguindo-o, o TCA Norte, de 29.6.2012, P.° n.º 1334 /10.4 BEPRT e, nessa medida, competente à a jurisdição comum, absolvendo da instância o R. Estado.

De novo o A. interpõs recurso, desta feita para o TCA Norte, finalizando a articulado conclusivo no sentido de que o acto de distribuição se limita a ordenar a ritologia processual, não estando em causa a função jurisdicional, enquanto manifestação do poder de julgar.

As excepções previstas no art.° 4.º n.ºs 2 b) e 3 a), do ETAF não se aplicam, uma vez que não está em causa, apenas, uma decisão jurisdicional nem somente um erro judiciário, que pressupõe que se expresse numa decisão substancialmente jurisdicional, o que não sucede.

O TCA Norte veio, entretanto, no recurso interposto pelo A. a decidir no sentido de a competência ser atribuída à jurisdição comum, por ser “juridicamente insustentável” que a “existência de erro judiciário pressupõe que o facto gerador da responsabilidade se expresse numa decisão substancialmente jurisdicional”, e mais que se a interpretação do 4.° n.º 3 a), do ETAF englobasse apenas as decisões substancialmente jurisdicionais”, posto que então tratar-se-ia de uma disposição legal inútil, porque tais decisões proferidas por jurisdição exterior à administrativa já resultava “expressis et appertis verbis” do art.° 4.° n.º 2 b ), do ETAF.

O A suscitou, de seguida, o conflito entre tribunais pertencentes a distintas ordens jurisdicionais, fazendo menção de que nos tribunais e seus processos os actos processuais se agrupam entre actos jurisdicionais, em que a soberania do Estado e da função de julgar surge em toda a sua pujança e actos não jurisdicionais, cumprindo ritos processuais, actos parajudiciais, os de secretaria, sendo que os actos de distribuição integram os últimos.

As excepções derivadas daqueles preceitos do art.° 4.º n.º 2 b) e 3 a), do ETAF não colhem aplicação no caso vertente uma vez que não está em causa somente uma decisão jurisdicional nem somente erro judiciário que se prende com a determinação, interpretação da norma e sua aplicação aos factos ou do direito mas já não com a infracção de regras de procedimento judiciário, cabendo à jurisdição administrativa a tramitação do dissídio que o opõe ao Estado, por comportamento censurável processualmente dos seus Magistrados nos Tribunais superiores.

A Exm.ª Procuradora Geral-Adjunta junto do Tribunal Central Administrativo do Norte, vincando o propósito do A. de sindicância de decisões proferidas por Juízes dos Tribunais da Relação e do STJ, que o lesaram, causando-lhe prejuízos de índole vária de que se propõe ver ressarcido pelo Estado, fundada em erro judiciário, atenta a residualidade atribuída à jurisdição comum, aos preceitos do ETAF em alusão e à jurisprudência do TC, em particular a afirmada no AC. do TC, Proc.° n.º 5/11 e também no Ac. do TC n.º 15/10, e à doutrina em termos de delimitação da competência material e a forma como deve ser aferido esse pressuposto processual, emite parecer no preciso sentido de ser resolvido o conflito negativo suscitado devolvendo-se a competência à jurisdição comum.

Chegados a este ponto é aprazado o momento de, sem controvérsia, cremos, decidir o conflito negativo gerado.

Temos como preciso que o acto de distribuição, como processual que é, é integrado no âmbito da actividade judiciária, não fazendo distinção a lei, a menos que à revelia da lógica, entre tipos, natureza ou categoria de actos para o efeito de a uns caber a apreciação da sua bondade na jurisdição administrativa, os de menor importância, na tese do A. e do Tribunal de Matosinhos, para outros, aqueles onde se afirma em todo o “esplendor” a actividade judiciária, de que é protótipo a sentença, caindo-se numa dicotomia funcional e de competência sem sentido, até porque, já o dissemos, a distribuição pode ser viciada e radicar em erro grosseiro, dolo, culpa grave, causar danos, de resto se mostrando a coberto de despachos judiciários, ao fim e ao cabo, expressão da missão de o juiz dizer o direito aplicável em pertinência com tal acto.

Não colhe, pois, razão a afirmação, pelo A., de que a existência de erro judiciário pressupõe que o facto dele gerador “expresse uma decisão substancialmente jurisdicional”, o que não sucede por também estar em jogo, também, a apreciação da legalidade e conformidade à lei de um acto não decisório, de secretaria, parajudicial, de natureza ordinatória do andamento processual e, deste modo as excepções previstas no art.º 4.º n.º 2 b) e 3 a), do ETAF não se aplicam ao vertente caso.

O art.º 4.º n.º 3 a) do ETAF exclui da competência da jurisdição administrativa, a apreciação das acções por erro judiciário cometido por tribunais de outras jurisdições, como das competentes acções de regresso.

A norma em causa assenta na ideia de que, como regra, cada Tribunal conhece, em caso de apreciação da responsabilidade civil, dos erros judiciários por si cometidos, como se decidiu no Ac. deste TC de 28.10.2010, P.° 015/10 e, depois, o de 26.9.2012, P.° 01324/10.4BEPRT, do TCAN, com apoio na doutrina do Prof. Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida que, in Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, 3.ª ed., esclarecem ser excluídas da apreciação pela justiça administrativa das questões por responsabilidade emergente por erro judiciário cometido por tribunais integrados noutras ordens de jurisdição (naturalmente que não as proferidas na administrativa), bem como as competentes acções de regresso contra os Magistrados.

Este entendimento opõe-se ao sufragado no AC. do TC de 29. 11.2006, perfilhada pelo Ac. da Rel. Lisboa, de 6.10.2011, que serviu de linha orientadora à decisão do Tribunal de Matosinhos, “segundo o qual a decisão a seguir passa pela distinção entre a responsabilidade emergente da função de julgar e os restantes actos e omissões de juízes (e outros agentes), estranhos a essa específica atribuição”, nos quais se integram “os factos constitutivos do direito a que o Autor se arroga”, que “não se encontram ligados à soberana função de julgar”.

Por todo o exposto, estando como está, em apreço um caso de apreciação de responsabilidade civil por erro judiciário eventualmente praticado no âmbito da jurisdição comum, deve a competência atribuir-se a esta mesma jurisdição, onde deve ser dirimido o presente litígio, como acertadamente o A. começou, de resto, inicialmente, por observar, assim se solucionando o conflito.

Sem custas.

Notifique.

Lisboa, 11 de Maio de 2016. - Armindo dos Santos Monteiro (relator) - Alberto Augusto Andrade de Oliveira - João Moreira Camilo - Vítor Manuel Gonçalves Gomes - Raul Eduardo do Vale Raposo Borges - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa.