Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:019/22
Data do Acordão:07/05/2023
Tribunal:CONFLITOS
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO
TRIBUNAIS JUDICIAIS
CONTRATO DE DIREITO PRIVADO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
Sumário:Compete aos Tribunais Judiciais dirimir o litígio sobre contrato, cujo alegado incumprimento está em causa, que foi celebrado entre duas pessoas colectivas de direito privado e não foi sujeito à disciplina aplicável à contratação pública.
Nº Convencional:JSTA000P31174
Nº do Documento:SAC20230705019
Data de Entrada:05/31/2022
Recorrente:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LISBOA OESTE, JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE CASCAIS - JUIZ 4 E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA UO2
AUTOR: A..., S.A.
RÉU: B... S.A.
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral:
Conflito nº 19/22

Acordam no Tribunal dos Conflitos

1. Relatório
A..., SA (doravante A...), identificada nos autos, intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Oeste, Juízo Central Cível de Penafiel, acção declarativa de simples apreciação negativa, com processo comum, contra B..., SA (doravante B...), pedindo que o Tribunal:
a) Declare inexistente o direito de crédito de que a Ré se arroga perante a Autora, por o mesmo não corresponder a qualquer trabalho, custo ou sobrecusto suportado pela Ré;
Ou caso assim não se venha a entender:
b) Declare inexigível o direito de crédito de que a Ré se arroga, concretizado no pagamento da factura nº ...07, emitida em 2018.04.29, enquanto se encontrar pendente de verificação a condição suspensiva correspondente à prévia aceitação e pagamento à Autora pela Câmara Municipal de Cascais de um valor de, pelo menos, €498.136,00 (quatrocentos e noventa e oito mil cento e trinta e seis euros) pela aceleração da execução da empreitada de construção do “...”, em Cascais.
Alega, em síntese, que, em 24 de Novembro 2006, na sequência de um procedimento de ajuste directo concorrencial, as partes celebraram um contrato de empreitada para a construção do “...” em regime de preço fixo ou global, cujo valor ascendia a €9.489.020,84 (nove milhões, quatrocentos e oitenta e nove mil e vinte euros, e oitenta e quatro cêntimos). E que, no contexto da execução desse contrato, pagou à B... todas as facturas que lhe foram apresentadas, relativas aos trabalhos contratados, trabalhos a mais e demais custos de execução da empreitada. Mas que em meados de 2017, foi confrontada com uma factura, emitida pela Ré em 28 de Abril de 2008 que, alegadamente, não teria sido paga.
Alega que o valor nela facturado não é devido à B..., por não respeitar a qualquer serviço, trabalho os sobrecustos por esta prestado no âmbito da referida empreitada. E que esse valor corresponde, na prática, a um “prémio de produtividade” que, no contexto de um “acordo de cavalheiros” celebrado entre as partes, a Autora aceitou atribuir à Ré se e quando a Câmara Municipal de Cascais e a Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto lhe viessem a pagar uma compensação pelos sobrecustos decorrentes da necessidade de aceleração da obra de construção do referido parque de estacionamento. Porém, até à data, aquelas Entidades nunca chegaram efectivamente a reconhecer-lhe aquele direito a receber qualquer valor adicional a título sobrecustos adicionais decorrentes da necessidade de acelerar a obra, nem tão pouco a acordar os termos do pagamento de uma tal quantia e a proceder a esse efectivo pagamento.
Conclui, por isso, pela inexistência do direito de crédito titulado pela referida factura, por não corresponder a qualquer trabalho, custo ou sobrecusto suportado pela B...
O Juízo Central Cível de Penafiel, Juiz 4, por despacho de 11.09.2018, julgou-se incompetente, em razão do território, para decidir o litígio, tendo determinado a remessa dos autos para o Tribunal Judicial de Lisboa Oeste, Juízo Central Cível de Cascais, que entendeu ser o competente (cfr. fls. 332 a 333 verso).
O Juízo Central Cível de Cascais, Juiz 4 veio a proferir decisão, em 03.07.2019 [complementada quanto a custas em 28.10.2019] referente à presente acção [acção de processo comum, Proc. nº 670/16.6T8PNF] e à acção de condenação intentada no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Central Cível de Cascais, no mesmo dia, pela aqui Ré contra a aqui Autora, processo nº 967/18.2T8CSC, pedindo-se a condenação da aqui Autora a pagar àquela a quantia de €676.332,21, apensada à primeira, declarando a incompetência absoluta, em razão da matéria daquele Tribunal, sendo competente o TAF de Sintra, atento o disposto no art. 4º, nº 1, al. e) do ETAF, absolvendo a ré da instância (cfr. fls. 340 e 342).
O TAF de Sintra por despacho de 17.02.2021, julgou-se incompetente em razão da matéria para conhecer do(s) litígio(s), referentes aos presentes autos, processo nº 45/20.4BESNT e ao apenso nº 45/20.4BESNT-A [em que a B... pede a condenação da A... a quantia de €676.332,21, acrescida de juros de mora, pelos sobrecustos que suportou no decorrer da empreitada] determinando a remessa dos autos ao Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, Juízo dos Contratos Públicos [JCP] – cfr. fls. 353 a 357.
Remetidos os autos ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC) - JCP, foi aí proferida sentença em 24.02.2022 a declarar a incompetência em razão da matéria para conhecer do objecto dos autos.
Suscitada oficiosamente a resolução do conflito negativo de jurisdição, por despacho de 28.04.2022, foram os autos remetidos a este Tribunal dos Conflitos.
Neste Tribunal dos Conflitos as partes foram notificadas para efeitos do disposto no nº 3 do artigo 11º da Lei nº 91/2019 e nada disseram.
O EMMP emitiu parecer no sentido de que a competência material para julgar a acção deverá ser atribuída aos tribunais comuns.

2. Os Factos
Os factos relevantes para a decisão são os enunciados no Relatório.

3. O Direito
O presente Conflito Negativo de Jurisdição vem suscitado entre o Tribunal Judicial de Lisboa Oeste, Juízo Central Cível de Cascais e o Tribunal Administrativo de Lisboa - JCP.
Entendeu o Juízo Central Cível de Cascais que “Compulsados os autos, afigura-se que subsiste a incompetência material deste Tribunal face, quer à natureza do contrato celebrado entre as partes quer, ao que expressamente vem referido na cláusula 1ª, nº 4 do contrato de empreitada, cuja cópia se encontra a folhas 18 e seguintes do processo original 967/18.2T8CSC.
Efectivamente, o contrato em causa visou a construção de um parque de estacionamento que serve o público do concelho. Por esse motivo deve ser sujeito às regras da contração pública, como de resto foi expressamente convencionado pelas partes, na referida cláusula 1ª, nº 4 do contrato em questão.”. Tendo feito apelo ao disposto no art. 4º, nº 1, al. e) do ETAF, entendeu que a competência para dirimir o litígio cabe aos Tribunais Administrativos.
Por sua vez o TAC de Lisboa - JCP considerou, nomeadamente, que “E nada evidencia nos autos que este tal “ajuste direto” efetuado à Ré (empresa cuja proposta foi selecionada para a execução da empreitada), tenha, de facto, obedecido às regras da contração pública, regendo-se por normas de direito público, nomeadamente as atinentes à contratação pública, i.e. que tal “ajuste direto” se trate (ou possa ser tratado como) um procedimento pré-contratual de direito público e que os atos praticados no seu âmbito possam ser qualificados como atos administrativos, designadamente o ato de adjudicação da empreitada.
Sendo certo que na cláusula 1.ª, nº 1 do contrato de empreitada sob análise também não se faz qualquer referência às peças (procedimentais) incluídas no procedimento pré-contratual adotado. A própria cláusula 1.ª, n.º 4 do contrato milita a favor deste entendimento quando, perante um ato de conflito de interpretação por divergência entre as peças, remete não para o concreto caderno de encargos do procedimento pré-contratual (e para as suas cláusulas gerais e especificações técnicas) com um cariz jurídico-público, mas para o “caderno de encargos tipo para as empreitadas de obras públicas”.
É que se é verdade que se verifica esta remissão [que, em si mesma, não permite a qualificação do procedimento pré-contratual como jurídico-público], não é menos verdade que é o próprio clausulado do contrato [que prevalece sobre todos os documentos (cláusula 1.ª, n.º 3, al. a) do contrato] que expressamente estipula, na cláusula 22.ª, que “Para a resolução de eventuais litígios emergentes do presente contrato e sem prejuízo de quaisquer disposições imperativas resultantes de lei do processo, será competente o foro da Comarca de Cascais, com renúncia expressa a qualquer outro”, estando aqui estipulada à jurisdição comum, para onde, aliás, foram dirigidas as duas ações aqui em causa. (…)
Ademais, importa notar que embora se verifique a pontual remissão ao longo do clausulado do contrato de empreitada sob análise para determinadas regras constantes do Decreto-Lei n.º 59/99, da sua leitura constata-se que o contrato não se limita a pormenorizar as regras constantes deste diploma, não havendo, pois, uma receção geral deste regime em termos idênticos ao que sucede em qualquer “contrato administrativo”.
Tal sucede, designadamente, na cláusula 4.ª, n.º 4, cláusula 5.ª, n.º 3, parte final; cláusula 8.ª, n.º 1, ii) e n.º 2; cláusula 9.ª, n.º 2 e cláusula 23.ª.
Em suma, face ao acima exposto, resta-nos concluir que o Juízo Administrativo de Contratos Públicos do TAC de Lisboa não é competente em razão da matéria, para conhecer das presentes ações, por esta pertencer ao Juízo Central Cível de Cascais, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste.

Vejamos.
Cabe aos tribunais judiciais a competência para julgar as causas «que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional» [artigos 211º, nº 1, da CRP; 64º do CPC e 40º, nº1, da Lei nº 62/2013, de 26/08 (LOSJ)], e aos tribunais administrativos e fiscais a competência para julgar as causas «emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais» (artigos 212º, nº 3, da CRP e 1º, nº 1, do ETAF).
A competência dos tribunais administrativos e fiscais é concretizada no art. 4º do ETAF (Lei nº 13/2002, de 19 de Fevereiro), com delimitação do «âmbito da jurisdição» mediante uma enunciação positiva (nºs 1 e 2) e negativa (nºs 3 e 4).
Tem sido reafirmado por este Tribunal, e constitui entendimento jurisprudencial e doutrinário consensual, que a competência material do tribunal se afere em função do modo como o A. configura a acção e que a mesma se fixa no momento em que a acção é proposta.
Como se afirmou no Acórdão deste Tribunal de 01.10.2015, Proc. 08/14 «A competência é questão que se resolve de acordo com os termos da pretensão do Autor, aí compreendidos os respectivos fundamentos e a identidade das partes, não importando averiguar quais deviam ser os termos dessa pretensão, considerando a realidade fáctica efectivamente existente ou o correcto entendimento do regime jurídico aplicável. O Tribunal dos Conflitos tem reafirmado constantemente que o que releva, para o efeito do estabelecimento da competência, é o modo como o Autor estrutura a causa e exprime a sua pretensão em juízo».

No caso concreto verifica-se que a sociedade “A...” (primeira contratante) e a sociedade “B...” (segunda contratante) celebraram entre ambas, em 24.11.2006, um “Contrato de Empreitada”, com o teor constante do documento de fls. 21 verso a 32 verso (e anexos), junto com a petição inicial.
Do considerando B) desse contrato resulta que o processo referente à empreitada objecto daquele contrato esteve impossibilitado do seu desenvolvimento atempado, devido à tardia disponibilização dos terrenos de implantação do futuro ..., pelo que “foi efectuado convite para apresentação de propostas para a execução dos trabalhos em causa a uma selecção de empresas. Com a empresa cuja proposta foi selecionada foi efectuado o ajuste directo tendente à adjudicação da empreitada.”. Segundo o considerando C) a primeira contratante realizou o estudo do financiamento do presente investimento, assegurando o financiamento da empreitada na banca; tendo a segunda contratante, de acordo com os considerandos A) a E) do contrato, efectuado o seu próprio estudo e apresentado a sua proposta e o seu programa de trabalhos (considerando F) do contrato).
Dispersamente em algumas cláusulas do contrato previram-se critérios supletivos de aplicação do “caderno de Encargos tipo para as empreitadas de obras públicas” (cfr. cláusula 1ª, nº 4), ou a aplicação de preceitos do então em vigor DL nº 59/99, de 2/3 (cfr. a cláusula 4º, nº 3), estabelecendo a cláusula 21ª, nº 1, sobre o “Regime Jurídico”, que: “Em tudo o que estiver omisso neste contrato será observado o previsto no Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, e na demais legislação referente ao regime de empreitadas de obras públicas”, e, o nº 2: “As relações entre a PRIMEIRA CONTRATANTE e a SEGUNDA CONTRATANTE regem-se pelo disposto no Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, salvo nos casos em que os Documentos Contratuais disponham em contrário ou alterem expressamente o que ali estiver disposto”. No entanto, a cláusula 1ª, nº 3 estabelece que: “As divergências que porventura existam entre os vários documentos que se consideram integrados no presente contrato resolver-se-ão de acordo com as seguintes regras:
a) O estabelecido neste contrato prevalece sobre o que constar de todos os demais documentos;
b) O estabelecido na proposta da SEGUNDA CONTRATANTE prevalece sobre todos os restantes documentos, salvo naquilo que tiver sido alterado pelo contrato”.
Por sua vez a cláusula 23ª, sob a epígrafe (ACORDO TOTAL – ALTERAÇÕES AO TÍTULO CONTRATUAL), estabelece que: “O presente Contrato e os seus anexos constituem a totalidade do estabelecido entre as Partes sobre esta matéria prevalecendo sobre todos os outros documentos que disponham diversamente sobre tal matéria, apenas podendo o seu conteúdo ser alterado, modificado ou aditado por escrito e assinado pelos legais representantes das partes”. E a cláusula 22º prevê que para a resolução de eventuais litígios emergentes do contrato (sem prejuízo de quaisquer disposições imperativas resultantes da lei do processo), será competente o foro da Comarca de Cascais, com renúncia expressa a qualquer outro, ou seja, é sugerida a competência da jurisdição comum.
Significa isto que do “Contrato de Empreitada” celebrado não resulta que as partes o tenham querido submeter ao regime das empreitadas de obras públicas (o qual apenas pontualmente admitem ser aplicável), ou que ele tivesse que estar submetido a esse regime.
O art. 4º, nº 1, alínea e) do ETAF, na versão aplicável ao tempo, estabelecia que: “1 – Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto: (…) e) Questões relativas à validade de actos pré-contratuais e à interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento pré-contratual regulado por norma de direito público.”
Ora, as pretensões que se querem fazer valer emergem do próprio contrato de empreitada celebrado, nada nos autos indicando que haja lei específica que submeta a interpretação, validade e execução deste contrato, ou admita que estivesse submetido a um procedimento pré-contratual (de ajuste directo) regulados por normas de direito público.
Desde logo, não colhe a tese de que as partes concordaram em aplicar ao contrato o regime do DL nº 59/99, porque, como já se referiu, o contrato apenas pontualmente admite a aplicação daquele diploma, tendo expressamente estipulado na indicada cláusula 22ª que o foro competente para a resolução de eventuais litígios resultantes do contrato de empreitada seria a Comarca de Cascais. Depois, porque nada impede dois sujeitos de direito privado de, como expressão da sua autonomia contratual, adoptarem o regime jurídico das empreitadas públicas, para efeitos de regulamentação de um contrato. Além de que, a remissão para o regime jurídico das empreitadas de obras públicas não configura automaticamente uma relação jurídica-administrativa (cfr. o acórdão deste Tribunal dos Conflitos de 30.01.2010, Proc. nº 017/19)
Com efeito, não vemos motivo para não seguir a jurisprudência firmada por este Tribunal dos Conflitos no acórdão deste Tribunal de 04.02.2016, Proc. nº 035/15, «(…), não é o facto da empreitada em causa ser um contrato de direito civil celebrado por sujeitos privados que determina a competência dos Tribunais comuns para julgar a acção mas a circunstância da celebração daquele contrato não ter de ser, por força de lei específica, precedida de um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público (art.º 4.º/1/e) do CPTA). Com efeito, como vem sendo decidido por este Tribunal dos Conflitos, o que resulta daquela norma é que compete “à jurisdição administrativa dirimir todos os litígios relativos a todos os contratos que, independentemente da sua natureza e da qualidade dos contraentes, foram, por imposição legal (Sublinhado nosso.) precedidos de um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público. Na verdade: (i) a letra não distingue entre contratos públicos e contratos privados, nem entre contraentes públicos e contraentes privados; (ii) inclui na previsão da norma não só as questões relativas á formação do contrato, mas também as da interpretação, validade e execução dos contratos; (iii) e quanto a estas, não as restringe às que estejam associadas à adjudicação ou, em geral, ao procedimento pré-contratual. (…). Em suma; o que a citada norma do ETAF determina é que a competência da jurisdição administrativa para o julgamento das acções como aquela que está em causa não é a da natureza do contrato nem a qualidade dos seus sujeitos mas o facto do mesmo ter precedido de um procedimento regido por normas de direito público por imposição legal.»
No caso tratado naquele Conflito nº 035/15, o procedimento pré-contratual que precedera a celebração do contrato ali em causa não era exigido por qualquer norma ou diploma legais, pelo que se concluiu que a competência para julgar a acção cabia aos Tribunais comuns.
Ora, nos presentes autos nem sequer se evidencia que o “ajuste directo” efectuado à Ré (cuja proposta foi selecionada para a execução da empreitada), tenha, efectivamente, obedecido às regras de contratação pública, nomeadamente a um procedimento pré-contratual de direito público. E, mesmo que o tenha sido, não o foi por imposição legal (cfr. ainda os acórdãos deste Tribunal dos Conflitos de 23.03.2022, Proc. nº 041/21, e de 23.05.2012, Proc. nº 021/12).
Deste modo, não se inscrevendo a acção em nenhuma das alíneas do nº 1 do art. 4º, do ETAF, na versão então em vigor, que permitam submeter o litígio ao âmbito da jurisdição administrativa, e sendo da competência dos tribunais judiciais conhecer e decidir as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional, conclui-se que a competência material para conhecer da presente acção executiva cabe à jurisdição comum.
Pelo exposto, acordam em julgar competente para apreciar a acção o Tribunal Judicial da Comarca de Cascais, Juízo Central Cível de Cascais, Juiz 4.

Sem custas.

Lisboa, 5 de Julho de 2023. - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) - Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza.