Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:012/21
Data do Acordão:09/29/2021
Tribunal:CONFLITOS
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO
PEDIDO DE PROTECÇÃO JUDICIÁRIA
Sumário:Incumbe aos Tribunais Judiciais a competência para julgar o indeferimento de um pedido de protecção jurídica se a autora alegou no referido pedido de protecção jurídica pretender propor acção cível contra um Sindicato.
Nº Convencional:JSTA000P28203
Nº do Documento:SAC20210929012
Data de Entrada:03/18/2021
Recorrente:CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE O TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DO PORTO - JUÍZO LOCAL CÍVEL DO PORTO - JUIZ 2, E O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO
AUTOR: A..........
RÉU: INSTITUTO DE SOLIDARIEDADE E SEGURANÇA SOCIAL - APOIO JUDICIÁRIO
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral: Conflito n.º 12/21


Acordam no Tribunal dos Conflitos


1.Relatório
A…………, com os sinais dos autos, deduziu impugnação judicial contra a decisão do Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, IP, de 13 de Agosto de 2020 que indeferiu o seu pedido de protecção jurídica.
Recebida a impugnação judicial, o Centro Distrital do Porto do Instituto da Segurança Social, IP emitiu pronúncia, em 17.09.2020, nos termos dos artigos 27º e 28º da Lei 34/2004, de 29/7, no sentido da manutenção do acto impugnado e procedeu à sua remessa para a Secção Local Cível do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.
Por despacho de 29.09.2020, o Juízo Local Cível do Porto julgou-se materialmente incompetente para apreciar a referida impugnação judicial por entender que «a acção que justificará a existência da impugnação sub judice é da competência dos Tribunais Administrativos, pois que o requerimento de protecção jurídica apresentado em 13-7-2020 foi-o a fim de propor Acção Administrativa (contra o sindicato no P. 1234/18 … no TAF Porto – cfr. requerimento de protecção jurídica apresentado pela impugnante)» e ordenou a remessa ao Tribunal Administrativo do Porto.
No TAF do Porto e na sequência de notificação a impugnante esclareceu que «o pedido de apoio judiciário se destina à propositura de uma acção cível contra o Sindicato (STFPSN) por ter proposto a acção-processo 1234/18.BEPRT (…), à margem do seu conhecimento e sem a menção de todos os danos sofridos e indicados (…) pelo que pretende ser ressarcida».
No seguimento, aquele Tribunal considerou «Ora, como é bom de ver, no pedido de protecção que a Autora formulou perante o Centro Distrital do Porto do ISS, I.P. com a referência APJ/74142/2020, esta indicou no seu formulário que a finalidade do pedido era “propor acção judicial – cível contra o sindicato” pela alegada actuação ilícita deste na representação que daquela fez na acção administrativa que corre termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal sob o n.º 1234/18BEPRT, pretendendo, por isso, “obter uma indemnização do STFPSN”. Assim sendo, grassa, pois, à evidência que, não sendo o Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Norte [“STFPSN”] uma entidade pública e inexistindo qualquer sinal de administratividade do litígio a intentar, este Tribunal não pode deixar de se “guiar” pelas indicações apostas em tal pedido de protecção jurídica – que se mostram em consonância com o esclarecimento da Autora a fls. 35-36 do SITAF – no sentido de que, com tal pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono oficioso, esta pretende, na realidade, intentar uma acção de natureza cível (e não administrativa) eventualmente de efectivação de responsabilidade civil extracontratual de tal sindicato».
O Sr. Juiz do TAF do Porto suscitou oficiosamente a resolução do presente conflito de jurisdição.
Remetidos os autos a este Tribunal dos Conflitos, as partes notificadas para efeitos do disposto no nº 3 do art. 11º da Lei nº 91/2019, de 4 de Setembro.
A Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da atribuição da competência aos tribunais da jurisdição comum para o conhecimento do litígio.

2. Os Factos
Os factos relevantes para a decisão são os constantes do relatório.

3. O Direito
Nos termos do art. 28º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, a competência para julgamento da impugnação da decisão relativa à protecção jurídica é atribuída ao tribunal da comarca em que está sedeado o serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica ou, caso o pedido tenha sido formulado na pendência da acção, o tribunal em que esta se encontra pendente.
Este Tribunal dos Conflitos já apreciou várias vezes a competência para conhecer de pedidos de impugnação do indeferimento da concessão de apoio judiciário, como no acórdão proferido em 14.06.2018, no Conflito nº 069/17, no qual se pode ler:
«Assim, ambas as decisões são concordantes quando consideram que o tribunal competente para conhecer da impugnação do despacho que cancelou a protecção jurídica que havia sido concedida à requerente é o que o for para o julgamento da acção em função da qual o apoio judiciário fora requerido, ainda que esta não esteja pendente em juízo.
E esta posição está, efectivamente, em consonância com a orientação adoptada por este Tribunal de Conflitos, como resulta do Ac. de 17/5/2007 – Conf. n.º 07/07 (cf. no mesmo sentido, entre outros, os Acs. de 20/6/2006 – Conf. n.º 013/06 e de 3/4/2008 – Conf. n.º 024/07), onde se pode ler:
“(…).
O artigo 28.º, n.º 1 da Lei n.º 34/2004, de 29/7/2004 refere que é competente para conhecer da impugnação o tribunal de comarca em que está sedeado o serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica ou, caso o pedido tenha sido formulado na pendência da acção, o tribunal em que a acção se encontra pendente.
Este preceito deve, no entanto, ser interpretado tendo em conta, logo à partida, uma regra básica da realidade processual de que o acessório segue o principal.
Depois, há que ter em consideração que o incidente do apoio judiciário sempre foi um incidente do processo a que dizia respeito e que o legislador, quando determinou a competência das autoridades administrativas para a sua decisão numa primeira fase, agiu apenas com intuitos de aliviar os tribunais, nunca tendo pretensão de autonomização relativamente à causa principal. Mesmo, quando, no art.º 24.º, n.º 1 da mencionada lei, refere que o procedimento de protecção jurídica na modalidade de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite, quis apenas afastar uma realidade que vinha sendo comum de o pedido de apoio judiciário bloquear o andamento daquela causa principal. Basta lerem-se os demais números daquele artigo para assim se concluir.
Ademais, a vantagem em o incidente de recurso de denegação do apoio judiciário correr no tribunal onde se pretende intentar a acção é manifesta. Muitas vezes, elementos da própria acção são indiciadores de que os dados fornecidos relativamente a tal incidente não são verdadeiros. Sendo também na acção principal que surgem a maior parte dos dados que conduzem ou podem conduzir ao cancelamento ou caducidade do benefício (art.º 10.º e 11.º da citada lei).
Então, se em casos como o nosso, se atribuísse a jurisdição aos tribunais judiciais, ou o juiz do processo principal tinha que fornecer os dados ao juiz dos tribunais judiciais para ele decidir da extinção do benefício (ou do recurso dessa extinção) ou o juiz da causa principal passava a ter jurisdição para se intrometer na decisão que o colega da outra jurisdição tomara.
Qualquer das hipóteses é de repudiar.
(…)”.
Nestes termos, competente para conhecer da aludida impugnação, será o tribunal judicial se o pedido de protecção jurídica se destinar à propositura de uma acção cível ou, pelo contrário, o tribunal administrativo se tiver sido feito com o fim de intentar uma acção administrativa.
Ora, desconhecendo-se, no caso em apreço, os contornos da acção que a requerente irá propor, apenas se pode atender ao que alegou no requerimento onde formulou o pedido de protecção jurídica, onde referiu que esta se destinava à propositura de uma acção cível.
Portanto, não pode deixar de se entender que são os tribunais judiciais os competentes para julgarem a mencionada impugnação.»
Ora, também no presente caso, atendendo ao que a requerente alegou no pedido de protecção jurídica - pretender propor acção “cível contra o Sindicato” para “obter uma indemnização do STFSN” [por alegada actuação ilícita daquele na representação da requerente no processo nº 1234/18BEPRT] - não pode deixar de se considerar que são os tribunais judiciais os competentes para julgarem a impugnação.

4. Decisão
Pelo exposto acordam em atribuir a competência para julgar a impugnação da decisão que indeferiu o pedido de protecção jurídica aos Tribunais Judiciais (Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Cível do Porto).
Sem custas.

Nos termos e para os efeitos do art. 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13/3, a relatora atesta que a adjunta, Senhora Vice-Presidente do STJ, Conselheira Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza tem voto de conformidade.

Lisboa, 29 de Setembro de 2021
Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa