Acórdão do Tribunal dos Conflitos | |
Processo: | 013/18 |
Data do Acordão: | 12/13/2018 |
Tribunal: | CONFLITOS |
Relator: | MADEIRA DOS SANTOS |
Descritores: | APREENSÃO DE CARTA DE CONDUÇÃO.RESPONSABILIDADE CONTRA-ORDENACIONAL |
Sumário: | Compete à jurisdição comum, «ratione materiae», o conhecimento da acção em que a autora impugna actos relativos à apreensão policial da sua carta de condução, porquanto tal pleito se inscreve e permanece na linha de uma responsabilidade contra-ordenacional dela pela prática de infracções rodoviárias (DL n.º 433/82, de 27/10). |
Nº Convencional: | JSTA000P23954 |
Nº do Documento: | SAC20181213013/18 |
Data de Entrada: | 02/23/2018 |
Recorrente: | CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, ENTRE O TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE MIRANDELA, UNIDADE ORGÂNICA 1 E O TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE BRAGANÇA, JUÍZO LOCAL. |
Recorrido 1: | * |
Votação: | UNANIMIDADE |
Área Temática 1: | * |
Aditamento: | |
Texto Integral: | CONFLITO N.º 13/18 Acordam no Tribunal dos Conflitos: O Mm.º Juiz do Tribunal Judicial da comarca de Bragança (Juízo Local Criminal) solicitou «ex officio» a este tribunal que resolva o conflito negativo de jurisdição aberto entre esse Juízo Local e o TAF de Mirandela visto que ambos, por decisões transitadas, declinaram a competência própria para conhecer do processo dos autos – inicialmente instaurado naquele TAF como «acção administrativa» movida por A…… à Polícia de Segurança Pública e onde a autora questiona actos relacionados com a apreensão policial da sua carta de condução – atribuindo-a à jurisdição do outro. A Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal dos Conflitos emitiu douto parecer no sentido de que se atribua à jurisdição comum a competência material para o conhecimento da causa em virtude da dita apreensão ser «um acto de natureza contra-ordenacional». Cumpre decidir. Mediante uma «acção administrativa», a autora impugnou no TAF de Mirandela o acto – praticado por agentes da PSP na sequência de contra-ordenações rodoviárias pretéritas – que apreendeu a sua carta de condução; bem como os actos que indeferiram uma reclamação e um recurso hierárquico relativos àquela apreensão. Considerando que a acção questionava o modo como se executara o sancionamento de infracções contra-ordenacionais, o TAF declarou-se incompetente, «ratione materiae», para o conhecimento da causa. E, transitada essa pronúncia, foi o processo, por solicitação da autora, remetido ao Tribunal Judicial da comarca de Bragança. Aí, o Mm.º Juiz disse que a pretensão da autora não correspondia à impugnação de um qualquer acto punitivo, segundo o modo previsto no DL n.º 433/82, de 27/10; razão por que o «petitum» tinha cariz administrativo, carecendo os tribunais judiciais de competência material para julgar o pleito. E esta decisão também transitou – seguindo-se a suscitação oficiosa do presente conflito. A circunstância dos dois referidos tribunais, por decisões transitadas, terem recusado a competência própria e reciprocamente se atribuírem a competência material para conhecer do pleito dos autos evidencia a presença de um conflito negativo de jurisdição (arts. 109º, n.º 1, do CPC, e 85º e ss. do Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 19.243, de 16/1/1931). Nos termos do art.64º do CPC, a competência dos tribunais judiciais é residual; pelo que a jurisdição comum só não será competente para conhecer da acção «sub specie» se a apreciação da causa estiver deferida, «ex vi legis», aos tribunais da jurisdição administrativa. A competência «ratione materiae» para conhecer de uma qualquer causa determina-se pelo pedido que nela se formule, esclarecido ou iluminado pela «causa petendi». «In casu», o pedido fundamental da autora consiste na declaração de nulidade ou na anulação dos actos relativos à apreensão da sua licença para conduzir. Mas tal apreensão não surgiu «ex nihilo», visto que se deveu a contra-ordenações praticadas pela autora. Assim, e enquanto mero efeito – aliás, já executivo – dessas infracções, a dita apreensão inscreve-se no mesmo plano delas, ou seja, permanece na linha da responsabilidade contra-ordenacional da autora pela prática de contravenções rodoviárias. Ora, o DL 433/82, de 27/10, é claríssimo no sentido de que as decisões administrativas em matéria contra-ordenacional são recorríveis para os tribunais comuns («vide» os arts. 59º e ss. do diploma). É certo que aí se alude à aplicação de coimas – e não à apreensão de cartas de condução. Todavia, este último assunto integra a mesma matéria – que podemos, «in genere», definir como a responsabilidade contra-ordenacional fixada pelas autoridades administrativas – não havendo razão para a recortarmos e extrairmos do âmbito regido pelo DL n.º 433/82. Até porque nenhuma norma do ETAF – designadamente, o seu decisivo art. 4º – permite que um assunto deste género seja decidido na jurisdição administrativa. Pode realmente suceder que a acção proposta careça de viabilidade à luz do regime por que se regulam os recursos previstos nos arts. 59º e ss. do DL n.º 433/82 – e o Mm.º Juiz do Tribunal Judicial, em claro «obiter dictum», já afirmou algo sobre o assunto. Mas os lapsos, porventura fatais, que afectem o presente meio impugnatório são alheios à competência em razão da matéria; pois esta questão – a primeira «in cognoscendo» – há-de estabelecer qual a jurisdição competente para, eventualmente, reconhecer tais lapsos e deles extrair as devidas consequências. Conclui-se, deste modo, pela atribuição aos tribunais comuns da competência material para conhecer a impugnação dos autos. Nestes termos, acordam em invalidar o despacho do Mm.º Juiz do Tribunal Judicial da comarca de Bragança, que declarou a incompetência desse tribunal, em razão da matéria, para julgar o processo dos autos, e em resolver o presente conflito declarando a jurisdição comum competente para conhecer da referida causa. Sem custas. Lisboa, 13 de Dezembro de 2018. – Jorge Artur Madeira dos Santos (relator) – Júlio Manuel Vieira Gomes – António Bento São Pedro – Isabel Francisca Repsina Aleluia São Marcos – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Francisco Manuel Caetano. |