Sentença de Julgado de Paz
Processo: 430/2016-JPPRT
Relator: LUÍS FILIPE GUERRA
Descritores: ARRENDAMENTO - OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO
Data da sentença: 05/29/2018
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

Proc. nº 430/2016

I. RELATÓRIO:
A e B, com os demais sinais identificativos nos autos, intentaram a presente ação declarativa respeitante ao arrendamento urbano contra C, melhor identificado a fls. 2, pedindo a condenação do mesmo a pagar-lhes a quantia de 550,00 €, referente à diferença de Março de 2015 a Janeiro de 2016, a quantia de 2.250,00 € por incumprimento do pagamento de rendas, no período de Fevereiro a Junho de 2016, acrescida da indemnização de 50% prevista no artigo 1041º do Código Civil, no valor de 1.125,00 € e dos juros legais relativos às rendas em atraso contabilizados desde Fevereiro a Junho de 2016, abdicando dos valores relativos às rendas até à data do fim do contrato, 31/10/2016, caso o demandado liquide os valores em falta e entregue o imóvel nas devidas condições.
Para tanto, os demandantes alegaram os factos constantes do requerimento inicial de fls. 2 e 3, que aqui se dá por reproduzido, tendo juntado ao mesmo três documentos.
Atendendo à ausência em parte incerta do demandado, foi-lhe nomeado defensor oficioso, o qual, uma vez citado, não apresentou contestação.
Não se realizou a sessão de pré-mediação, dado o paradeiro desconhecido do demandado.
Foi, por isso, marcada e realizada a audiência de julgamento, segundo as regras legais.

II. SANEAMENTO DO PROCESSO:
Verificam-se os pressupostos de regularidade da instância, nomeadamente:
Este julgado de paz é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território (cfr. artigos 6º nº 1, 8º, 9º nº 1 g) e 11º, nº 1 da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho).
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há nulidades, exceções ou outras questões prévias de que cumpra conhecer.
Isto posto, fixa-se o valor da ação em 5.275,00 € (cfr. artigo 297º, n.ºs 1 e 2 e 300º, nº 1 do CPC).
Assim, cabe apreciar e decidir:

III. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA:
Discutida a causa, ficaram provados os seguintes factos:
1.Em 20/10/2014, os demandantes, na qualidade de proprietários, deram de arrendamento ao demandado a fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente a uma habitação tipo T3 situada no 1º andar, e a fração autónoma designada pela letra A, correspondente a um lugar de garagem no rés-do-chão, do prédio urbano com entrada pelos nº 1680 e 1686 da Rua ---------------------------, na cidade do Porto.
2.O arrendamento foi feito pelo prazo de dois anos, com início em 01/11/2014, mediante o pagamento da renda mensal de 450,00 €.
3.Por carta simples, datada de 04/03/2015, o demandado comunicou aos demandantes que decidira unilateralmente passar a pagar somente 400,00 € de renda a partir dessa data, o que fez até Janeiro de 2016, a partir do qual deixou de pagar qualquer valor até à data da propositura da ação.
4.Os demandantes responderam à carta do demandado por meio de carta datada de 26/05/2015.
5.O demandado entregou voluntariamente o locado em Setembro de 2016, após ter sido resolvido o contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas.

Os factos provados assentam, por um lado, nos documentos constantes dos autos, nomeadamente contrato de arrendamento e correspondência trocada pelas partes (n.ºs 1 a 4) e, por outro, nas declarações prestadas pelos demandantes durante a audição das partes, na medida em que implicam confissão de facto desfavorável (nº 5). Por sua vez, o facto nº 3, parte final, resulta sem mais da repartição do ónus da prova, competindo ao demandado provar o pagamento pontual da renda, em face da alegação contrária dos demandantes (cfr. artigo 342º, nº 2 do Código Civil).
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa, nomeadamente que os demandantes tenham efetuado várias tentativas de contacto telefónico e de visita ao imóvel, mas sem sucesso, nem que o imóvel se encontrasse para venda, nem que o demandado tivesse deteriorado o locado e violado as regras da boa vizinhança e as normas do condomínio, dada a absoluta falta de prova a esse respeito e a dispensa do ónus de impugnação de que beneficia o defensor oficioso do demandado (cfr. artigo 574º, nº 4 do CPC). Além disso, também não se provou que os arrumos estivessem compreendidos no objeto do arrendamento nem que o demandado não tivesse podido beneficiar do seu gozo por facto imputável aos demandantes, sendo certo que esta factualidade reveste caráter de exceção, pelo que carecia de ter sido alegada na contestação (cfr. artigo 573º do CPC).

IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA:
O contrato estabelecido entre as partes enquadra-se no regime jurídico da locação de imóveis, regulado pelo disposto no artigo 1022º e segs. do Código Civil.
Ora, de entre as obrigações do locatário avulta a de pagar a renda (cfr. artigo 1038º do Código Civil).
Neste caso, porém, o demandado não procedeu a esse pagamento nos meses de Fevereiro a Junho de 2016 nem posteriormente. Note-se que se pode depreender do pedido formulado pelos demandantes, por aplicação do princípio do máximo aproveitamento dos atos processuais, que estes pretenderam incluir no mesmo as rendas vincendas na pendência da ação, enquanto subsistisse a obrigação (cfr. artigo 557º do Código de Processo Civil), salvo se tivesse havido pagamento dos valores vencidos e a entrega do local em boas condições. Ora, o demandado entregou o locado no mês de Setembro de 2016, na sequência de resolução do contrato de arrendamento por parte dos demandantes com fundamento na falta de pagamento das rendas, mas não pagou as rendas vencidas.
Assim sendo, o demandado ficou em dívida em relação aos demandantes pelo montante de 3.600,00 €, correspondente a oito meses de renda, tendo três delas vencido na pendência da ação.
No entanto, tendo o contrato sido resolvido com base na falta de pagamento de tais rendas, não têm os demandantes direito à indemnização moratória prevista no artigo 1041º, nº 1 do Código Civil, como resulta claramente da parte final do mesmo preceito legal.
Por outro lado, durante os meses de Março de 2015 a Janeiro de 2016, o demandante pagou apenas 400,00 € de renda mensal, invocando para o efeito a limitação parcial do gozo do locado. De facto, o artigo 1040º, nº 1 do Código Civil prevê que a renda possa ser reduzida proporcionalmente na hipótese de diminuição do gozo da coisa locada por facto não imputável ao arrendatário ou aos seus familiares, enquanto esta durar. Todavia, no caso em apreço, não resulta do contrato de arrendamento que o mesmo compreendesse quaisquer arrumos e não se provou que o demandado tivesse estado impedido do seu gozo ou da respetiva garagem, desde logo porque essa factualidade não foi alegada na contestação e porque os demandantes não a reconheceram expressamente, nomeadamente na resposta dada ao demandado, tendo mesmo invocado a mora de este.
Deste modo, o demandado terá que pagar aos demandantes a diferença entre a renda devida e a renda efetivamente paga, ao longo de onze meses, no total de 550,00 €, tal como peticionado.

V. DECISÃO:
Nestes termos, julgo a presente ação parcialmente procedente e provada e, consequentemente, condeno o demandado a pagar aos demandantes a quantia de 4.150,00 € (quatro mil cento e cinquenta euros), correspondente às rendas dos meses de Fevereiro a Setembro de 2016, por um lado, e à diferença entre as rendas devidas e as efetivamente pagas entre Março de 2015 e Janeiro de 2016, absolvendo-o do demais peticionado.
Custas por demandantes e demandado na proporção de 20% para os primeiros e 80% para o segundo, sem prejuízo da isenção de que este beneficia por se encontrar ausente em parte incerta, por aplicação analógica do artigo 4º, nº 1 l) do Regulamento das Custas Processuais.
Registe e notifique.
Porto, 29 de maio de 2018

O Juiz de Paz,

(Luís Filipe Guerra)