Sentença de Julgado de Paz
Processo: 947 /2014-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL - CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DECORRENTE DE CONTRATO DE SEGURO
Data da sentença: 12/22/2014
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença

Processo n.º 947 /2014-JP
Matéria. Responsabilidade Civil.
(alínea h) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de Julho).
Objeto: Cumprimento de obrigação decorrente de contrato de seguro.
Valor da ação: €13.680 (treze mil seiscentos e oitenta euros)

Demandante: A, com domicílio na Rua ---------------------------- Lisboa.
Mandatário:.

Demandada: B S. A com sede na Av. ----------------------------Lisboa.
Mandatário: Dr. C , advogado, com domicílio profissional na ------------------------ Lisboa.

Do requerimento inicial: de fls. 1 a 5.
Pedido: a fls. 5.
Junta:10 documentos.
Contestação: a fls. 54 a 68.
A demandada recusou a mediação pelo que foi marcada audiência de julgamento para o dia 25 de novembro de 2014, pelas 14h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito.
O Julgado de Paz é competente, não foram suscitadas quaisquer excepções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Relatório.
Nos presentes autos, pretende a demandante que a demandada lhe pague a quantia de €13.680,00, correspondentes à reparação, privação de uso, despesas com transportes e danos morais, conforme descrimina no pedido a fls. 5 dos autos, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido. Para tanto alegou que no dia 24 de dezembro de 2013, o seu veículo D de matrícula JX, ficou imobilizado quando circulava na Estrada de Benfica, tendo parado e não mais funcionou, pelo que foi o mesmo rebocado para a oficina, sendo que, após peritagem, foi constatado que a avaria se deveu a aspiração de água para o motor. A demandante exige indemnização com base na cobertura de danos próprios de acordo com a apólice n.º --------------------- que abrange “fenómenos da Natureza”, alegando que foi o caso, dado que a chuva que caiu alagou a estrada; por seu turno, alega a demandada que a chuva, mesmo que considerada “Fenómeno da Natureza”, não foi a causa direta da avaria. Ou seja, sustenta que a admissão de água ocorreu em virtude da caixa de ar estar danificada, concluindo pela improcedência da acção.

Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 132 a 135.
***
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – A demandante é proprietária do veículo automóvel ligeiro de marca D, com matrícula JX, doravante JX (cfr. doc 1, fls. 1 e 2);
2 – A viatura encontra-se segura na demandada B, com a apólice n.º ---------------------, que inclui condições gerais e especiais (cfr. doc. 2, fls. 8, e fls. 85 a 127, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido);
3 – A referida apólice contempla danos próprios e cobre o risco fenómenos da natureza, até ao montante de €17.538,21 (cfr. doc 2);
4 – No final da tarde de 24 de dezembro de 2013, a demandante circulava na Estrada de Benfica, numa zona em que, sempre que cai fortes chuvadas a água forma poças, sendo esta a situação no dia e hora em que a demandante ali circulava (afirmado pela testemunha E, dono da banca de jornais existente naquele local e que ajudou a colocar e veículo da demandada em cima do passeio);
5- Outros carros passaram a poça e prosseguiram a sua marcha (constatado pela testemunha F);
6 – A água da poça atingiu a zona do sistema de escape (ponto 7 do requerimento inicial);
7 – A demandante, ao fazer inversão de marcha na praceta próxima do Restaurante Califa, após ter feito uma desaceleração muito rápida em virtude da interposição de outra também em circulação, o motor do JX parou deixando de funcionar a partir daí (ponto 6 do RI, confirmado pela testemunha G);
8 – O JX foi rebocado em 26 de dezembro de 2013 para a oficina da H, em Alfragide (confirmado pela testemunha I);
9 – O perito da demandada deslocou-se à oficina onde estava o JX e constatou que a caixa de filtro, situada a 23cm do chão, estava partida e a frente do pára-choques danificada com mossas típicas de subidas e descidas de passeios (doc de fls. 128 a 131, confirmados pela testemunha J);
10 - O perito averiguador constatou que naquela zona a água não subiu mais que 35/40cm dado que as lojas contíguas ao local do sinistro não sofreram inundações naquela ocasião (afirmado pela testemunha K);
11 - A admissão de ar no JX dá-se a cerca de 80cm do chão (afirmado pelas testemunhas K, J e não contraditado pela testemunha I, apresentada pela demandante);
12 – A alínea g), do artigo 40, exclui a garantia de danos provenientes de má conservação do veículo (cfr. fls. 98 dos autos).
Motivação.
A convicção do tribunal fundou-se nos autos, nos documentos apresentados e referidos nos respectivos factos, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual e nos depoimentos das testemunhas apresentadas.
A testemunha I, mecânico da oficina disse que a água entrou para o motor através do tubo de aspiração situado a meio da grelha, a cerca de 60cm do chão; por seu turno, a testemunha J, que fez a peritagem em 10 de janeiro de 2014, afirmou que a sucção da água foi feita através da caixa do filtro, situada a 23cm do solo, devido a mesma estar partida; esta testemunha interpretou e explicou as fotos juntas aos autos a fls. 128 a 131, afirmou que se a caixa não estivesse partida, não havia sucção, na medida em que esta é feita, normalmente a cerca de 80cm, a sucção não é feita pelo tubo de escape, que fica bem mais abaixo; esta testemunha foi acareada com a testemunha da demandante, I, não tendo este conseguido contradizer as explicações dadas pela testemunha da demandada que, perante as fotos, reafirmou que, para que a inundação fosse a causa da avaria era necessário que a água tivesse subido a 80cm; explicação semelhante deu a testemunha K, perito averiguador, que, igualmente confrontado com as fotos de fls. 128 e 131, afirmou que a aspiração normal se dá a 80cm do chão, e que era necessário que a água tivesse subido àquela altura para ser causa da avaria. Ora, o facto da caixa do filtro se situar a 23cm do chão, é mais conforme a situação descrita pela demandante no ponto 7 do RI, quando diz que água “cobriu o sistema de escape”, que fica sensivelmente a cerca de 20/30cm do chão, avaliar pelas fotos observadas.
Do Direito.
Resulta dos factos supra dados por provados que a Demandante e a Demandada celebraram entre si o contrato de seguro titulado pela apólice n.º -------------------, por força do qual a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo comercial ligeiro de matrícula JX. No referido contrato foi Incluído o seguro facultativo referente a danos sofridos pelo próprio veículo em consequência de Fenómenos da Natureza cuja cópia a demandante juntou como doc 2, a fls.8, e a demandada juntou, a fls. 85 a 127, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. É pacífico que estamos perante um contrato de seguro, validamente celebrado entre as partes, vigente no momento do sinistro, e foi com base nele que a demandante intentou a presente ação contra a demandada. É consabido que a apólice, como documento que titula o contrato celebrado entre o tomador do seguro e a seguradora, é integrada pelas condições gerais, especiais, se as houver, e particulares acordadas.
Resulta dos factos supra dados por provados que o veículo seguro na demandada avariou em virtude da aspiração de água, e que essa aspiração não podia ser feita pela zona onde ela é feita normalmente, zona situada a 80cm do chão; logrou a demandada provar que a aspiração da água ocorreu pela caixa de filtro do ar, colocada a cerca de 23cm do chão (supra ponto 9 dos factos provados). Em consequência da factualidade supra dada por provada, a demandada declinou qualquer responsabilidade, com fundamento no facto da causa direta do sinistro não ser quaisquer fenómenos da natureza mas sim os danos existentes na caixa do filtro do ar. Assim, face à causa de exclusão prevista na alínea g), do artigo 40, exclui a garantia de danos provenientes de má conservação do veículo, e à factualidade supra dada por provada, resulta que a demandante não logrou provar que, ainda que a caixa do filtro do ar não estivesse danificada, sempre teria havido a aspiração da água para o interior do motor, sendo que também não logrou provar que a água subiu a oitenta centímetros. É que, o efeito de onda a que se aludiu, mesmo que tivesse ocorrido, o que não se provou, ainda assim não seria suficiente para produzir o efeito que a demandante lhe pretendeu atribuir.
Decisão.
Em face do exposto, considero a presente ação improcedente por não provada e em consequência fica a demandada absolvida do pedido.
Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, custas pela demandante, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação à demandada.
Julgado de Paz de Lisboa, em 22 de dezembro de 2014
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias