Sentença de Julgado de Paz
Processo: 188/2014-JP
Relator: JOÃO CHUMBINHO
Descritores: INCUMPRIMENTO CONTRATUAL E A RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
Data da sentença: 06/20/2014
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
Proc. n.º x
I - IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A
Demandados: 1-B, 2-C e 3-D
II - OBJECTO DO LITÍGIO
A Demandante intentou contra os Demandados uma acção declarativa de condenação, enquadrada na alínea i) e h), do n.º 1, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, respeitante a incumprimento contratual e a responsabilidade civil contratual e extracontratual, pedindo que este Tribunal condene os Demandados no pagamento da quantia de €: 6806,02, relativamente a trabalhos de remodelação da canalização, electricidade e ligação de gás natural, bem como referente a despesas de alojamento e a danos não patrimoniais.
Alegou em síntese que, em finais de Fevereiro de 2013, a Demandante adquiriu ao Demandado a fracção autónoma designada pela letra “C” correspondente ao 2.º andar no n.º 8, em Lisboa pelo preço de € 57.500,00. Alegou ainda que a Demandante tomou conhecimento do imóvel através do site E e do anúncio da F, colocados pela primeira Demandada, na qualidade de mediadora imobiliária. Alegou ainda que a terceira Demandada celebrou com a G um contrato de seguro titulado pela apólice n.º x, ao qual a primeira Demandada aderiu com efeitos a partir de 01/04/2012. Alegou ainda que, apesar do segundo Demandado ter informado a Demandante que as canalizações de água tinham sido objecto de remodelação, a Demandante constatou que as remodelações das referidas instalações não ocorreram, e por isso, pede que os Demandados sejam condenados a suportar o custo de instalações novas, bem como os custos com alojamento pelo facto de não ter podido habitar a fracção e ainda nos danos morais.
A primeira Demandada, regularmente citada, não contestou, mas compareceu na data agendada para a a realização do julgamento.
O segundo Demandado, regularmente citado, contestou, alegando em síntese que nunca informou ou afirmou, o que quer que fosse em relação a remodelações de canalização, electricidade e gás natural, apenas informou o segundo Demandado que os anteriores proprietários tinham efectuado pequenas remodelações a nível estético.
A terceira Demandada, regularmente citada, contestou, alegando em síntese que celebrou com a G um contrato de seguro titulado pela apólice n.º x, ao qual a primeira Demandada aderiu com efeitos a partir de 01/04/2012, que em tal contrato vigora uma franquia de 10% dos prejuízos indemnizáveis, no mínimo de €: 500,00, além de que, não pode a Demandante pretender que os Demandados paguem uma quantia em obras correspondentes a mais de 10 % do preço de aquisição.
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância do legal formalismo, como da acta se alcança.
Cumpre apreciar e decidir.
Verificam-se os pressupostos processuais de regularidade e validade da instância, não existindo questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
III - FUNDAMENTAÇÃO
Os factos provados decorrem da documentação junto aos autos de fls. 6 a 25, 40, 41, 51 a 60, da testemunha ouvida em Julgamento e pela inspecção efectuada ao local.
O n.º 1, do artigo 60.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho refere que da sentença deve constar uma sucinta fundamentação.
Da prova produzida, constatou-se que, em finais de Fevereiro de 2013, a Demandante adquiriu ao Demandado a fracção autónoma designada pela letra “C” correspondente ao 2.º andar no n.º 8, em Lisboa, pelo preço de € 57.500,00. Alegou ainda que a primeira Demandada tomou conhecimento do imóvel através do site E e do anúncio da F, colocados pela primera Demandada, na qualidade de mediadora imobiliária. Alegou ainda que a terceira Demandada celebrou com a G um contrato de seguro titulado pela apólice n.º x, ao qual a primeira Demandada aderiu com efeitos a partir de 01/04/2012. Alegou ainda que, apesar da primeira Demandada ter informado a Demandante que as canalizações de água tinham sido objecto de remodelação, a Demandante constatou que as remodelações das referidas instalações não ocorreram.
Resulta igualmente provado que o Demandado nunca informou ou afirmou o que quer que fosse em relação a remodelações de canalização, electricidade e gás natural, apenas informou a segunda Demandada que os anteriores proprietários tinham efectuados pequenas remodelações a nível estético, não se referiu a quaisquer instalações de água, luz ou gás (provado por doc. a fls. 41)
Resulta ainda da prova produzida que a G celebrou um contrato de seguro com a terceira Demandada, titulado pela apólice n.º x, ao qual a primeira Demandada aderiu com efeitos a partir de 01/04/2012, ao qual é aplicável uma franquia de 10% dos prejuízos indemnizáveis, no mínimo de €: 500,00
A Demandante e o Demandado celebraram um contrato de compra e venda, o qual vem previsto no artigo 874.º do Código Civil., onde se refere que “Compra e Venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço.”
A primeira Demandada no âmbito da sua actividade de mediação imobiliária procedeu à promoção do imóvel com vista à sua comercialização na sequência de celebração de contrato de prestação de serviços de mediação imobiliária com o segundo Demandado, o qual estava definido no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei 211/2004, de 20 de Agosto (diploma em vigor na data da ocorrência dos factos) onde se referia que “… uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessados na realização do negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou na cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel” .
A Demandante fundamenta a sua pretensão na informação prestada pela primeira Demandada no facto de ter sido informada que o imóvel se encontrava remodelado no que diz respeito à canalização, electricidade e Gás natural tendo resultado provado que o vendedor não prestou essa informação e tais instalações não foram, de facto, remodeladas, como resultou da inspecção efectuada ao local.
Nos termos do artigo 483.º do Código Civil “aquele que com dolo ou mera culpa violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” A responsabilidade civil pressupõe a verificação de pressupostos, a saber: ilicitude; culpa; dano e nexo de causalidade.
A primeira Demandada, ao prestar as informações sobre as instalações de água, electricidade e gás do bem objecto da compra e venda à Demandante que não lhe tinham sido transmitidas pelo proprietário do imóvel e que não correspondiam ao estado em que a fracção se encontrava, praticou um facto ilícito, pois violou os deveres constantes das alíneas b), c) e d) do n.º 1.º, do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, pois prestou informações aos interessados sem que a informação lhe tivesse sido transmitida pelo vendedor, e não propôs com exactidão e com clareza os negócios de que foi encarregada, procedendo de modo a não induzir em erro os interessados, o que se verificou no presente processo. No contexto do artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, qualquer declaratário não podia deixar de entender que a expressão um “...imóvel com algumas remodelações (canalização, electricidade e gás natural).”, se refere a um imóvel com instalações remodeladas. Além de não ter sido alegado que o Demandado tenha informado a primeira Demandada de que foram efectuadas remodelações nas instalações de água, gás e electricidade (a primeira Demandada não contestou), não resultou provado que tal tenha sido transmitido ao angariador, H, pela convicção que se retirou do depoimento prestado por esta testemunha aquando da inspecção.
A conduta é culposa nos termos do artigo 487.º, n.º 2, do Código Civil, pois qualquer mediador médio nas circunstâncias em que se encontrava a Demandada, pela simples leitura do documento a fls. 7, constatava que esses dizeres podiam suscitar dúvidas aos potenciais interessados, tendo em conta os deveres legais de clareza e de transparência exigidos ao exercício da actividade, o que é censurável.
Quanto aos danos, resulta das declarações do próprio vendedor que as instalações não foram remodeladas (provado por docs. 1 e 2 juntos na contestação do Demandado) e resulta do depoimento da testemunha, I, que se o imóvel tivesse sido vendido com as canalizações conforme o constante no anúncio o imóvel valeria mais 20%, ou seja, €: 11.500,00 (€: 57,500 x 20%), no entanto, referiu que essa percentagem deveria ser apurada tendo em conta as remodelações que foram efectuadas antes da venda.
Resultou da inspecção efectuada ao local que, quanto à instalação eléctrica, foi parcialmente remodelada, com um quadro recente e novos disjuntores, no entanto, dada a parte da instalação não remodelada, não permite suportar os electrodomésticos existentes. Quanto à instalação do gás o técnico presente no local, J, referiu que a instalação ali existente não foi remodelada, além de apresentar uma fuga e de estar em desconformidade com os regulamentos em vigor. Além de que, resulta do material existente na instalação de gás não ser o adequado para o gás natural (provado por doc. 3, 4 e 5 junto com o Requerimento Inicial). Quanto à instalação de água, resulta dos documentos juntos na contestação do segundo Demandado que a mesma não foi remodelada, o que não foi possível de confirmar em sede de inspecção.
Importa referir que o que se discute neste processo não é se as instalações de água, luz, e água estão a funcionar, ou a questão de saber se foram efectuadas reduções ao preço inicialmente proposto, mas sim a questão de saber se as instalações foram objecto de uma recente remodelação, tendo sido considerado provado que as informações prestadas pela primeira Demandada quanto á remodelação daquelas instalações não foram claras nem precisas, pelo contrário, induziram a Demandante em erro.
Assim, quanto aos danos patrimoniais, resulta provado que a remodelação das instalações de água, luz e gás implicam o custo total de €: 6171,02, como decorre dos documentos 4 e 6 junto com o Requerimento Inicial, no entanto, foi possível constatar que foram efectuadas pequenas remodelações na instalação eléctrica cujo valor de fixa equitativamente nos termos do 566.º, n.º 3, do Código Civil e tendo em conta as regras da experiência em €: 300,00, fixando-se o pedido de indemnização em € 5871,02.
Quanto ao pedido de danos não patrimoniais a Demandante não provou qualquer facto susceptível de ser indemnizado, ónus que lhe caberia nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
A Demandante apesar de ter provado que suportou a quantia de €: 135,00 em despesas de alojamento, não provou que tal dano ocorreu em consequência do facto ilícito e culposo praticado pela primeira Demandada, ónus que lhe cabia, nos termos do n.º 1, do artigo 342.º do Código Civil e, por isso, este pedido não pode proceder.
A conduta ilícita e culposa da primeira Demandada foi a causa adequada à luz do artigo 563.º do Código Civil, para os danos provados na quantia de €: 5871,02.
A responsabilidade civil da primeira Demandada por danos causados a terceiros no exercício da sua actividade, foi transferida para a terceira Demandada, através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º x, nos termos do qual é aplicável uma franquia de 10% dos prejuízos indemnizáveis, (cf. condições da apólice juntas como doc. 1 da contestação da segunda Demandada, a fls. 52/verso), ou seja, €: 587,10.
Assim, a Demandante é credora da primeira Demandada na quantia de €: 587,10 e da terceira Demandada na quantia de €: 5.283,92.
IV- DECISÃO
A Demandada, B, é condenada na quantia de €: 587,10 (quinhentos e oitenta e sete euros e dez cêntimos) e absolvida dos restantes pedidos.
A Demandada, D, é condenada na quantia de €: 5283,92 (cinco mil duzentos e oitenta e três euros e noventa e dois cêntimos) e absolvida dos restantes pedidos.
O Demandado, C, é absolvido de todos os pedidos.
Custas de €: 19,00 a pagar pela terceira Demandada, D e de €: 6,00 apagar pela primeira Demandada, B com a restituição de € 25,00 à Demandante e de €: 35,00 ao segundo Demandado, nos termos dos artigos 8.º e 9.º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro.
As Demandadas deverão efectuar o pagamento das custas em dívida num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, incorrendo numa sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no efectivo cumprimento dessa obrigação, conforme disposto nos números 8.º e 10.º, da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro.
Decorridos dez dias sobre o termo do prazo supra referido sem que se mostre efectuado o pagamento, será enviada certidão para execução por custas aos Serviços do Ministério Público junto dos Juízos Cíveis de Lisboa, pelo valor então em dívida, que será de € 119,00 e de 106,00, respectivamente.
A leitura da sentença foi previamente agendada.
Registe e notifique
Lisboa, 20 de Junho de 2014
Processado por meios informáticos
Revisto pelo signatário. Verso em branco
O Juiz de Paz
(João Chumbinho)