Sentença de Julgado de Paz
Processo: 1123/2016-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS RESULTANTES DE INFILTRAÇÃO
Data da sentença: 06/30/2017
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença

Processo n.º 1123/2016 - JP
Matéria: Responsabilidade civil.
Objeto: Danos resultantes de infiltração
Valor da ação: €3.035,00 (três mil e trinta e cinco euros)

Demandante: A, residente na Rua x n.º x, x, xxxx-xxx Lisboa.
Demandado: B, por si e na qualidade de cabeça de casal da herança por óbito de C, residente em x – x – Strasse x x – xxxxx, Deutschland.
Mandatária: Dra. D, advogada, com domicílio profissional na Rua x, n.º x, x, xxxx – xxx Lisboa.

Do requerimento inicial: de fls. 1 a fls.5.
Pedido: fls.5.
Junta: 24 documentos.
Contestação: A fls. 65 a 71.
Tramitação:
Foi designado o dia 23 de janeiro de 2017, pelas 11h e 30m, para a audiência de julgamento, que continuou em 26 de maio de 2017, pelas 10h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme ata de fls. 167 e 168; e fls. 184 a 187.
***
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – O demandante é proprietário da fração autónoma designada pela letra “S”, correspondente ao x andar x do prédio sito na Rua x, n.º x, em Lisboa (não impugnado);
2 – A demandada é cabeça de casal da herança indivisa aberta por óbito de C, do qual é única herdeira, de cujo acervo faz parte a fração designada pela letra “X”, correspondente ao x andar xo, do prédio sito na Rua x, n.º x, em Lisboa (cfr. doc.1, fls. 6 e 7 e doc. 3, fls. 75 a 78 dos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3 – O demandante sofre infiltrações cuja origem não está fixada em rigor dado haver relatórios contraditórios, concretamente o relatório do perito da companhia seguradora da fração da demandada e o relatório da empresa E, contratada pelo condomínio;
4 - As infiltrações atingem os 6.º e 7.º andares (Doc. 2, fls. 8 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
5 - Em 20 de outubro de 2015 a companhia de seguros da fração da demandada declinou a responsabilidade, doc. 17, fls. 95;
6 - A acta técnica elaborada pelo perito da seguradora da fração da demandada diz que “As infiltrações estarão a acontecer ao nível de uma prumada de esgoto das casas de banho do edifício e não na fração segura” cfr. doc. 18, fls. 96;
7 - Em 07 de dezembro de 2015 a representante da demandada informa o condomínio da posição da sua seguradora acompanhando a mesma (cfr. email de 07 de dezembro de 2015, a fls. 100 dos autos, doc. 22);
8 - A Administração do Condomínio providenciou uma peritagem feita pela empresa E, concluída em 06 de janeiro de 2016, que concluiu que a origem da infiltração estava nos tubos que fazem a ligação do esgoto da fração da demandada ao tubo de queda de águas residuais (cfr. doc. 24, fls. 102 a 105);
9 - Em 08 de janeiro de 2016, face à não assunção de responsabilidade por nenhuma das quatro companhias envolvidas, o condomínio decidiu, na Assembleia de Condóminos de 07 de janeiro de 2016, assumir os custos das reparações, incluindo a canalização da fração do x, visada no relatório da empresa E, o que comunicou aos condóminos envolvidos (cfr. doc. 23, fls101, e-mail de janeiro de 2016, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
10 - A administração do Condomínio informou a representante da demandada, do supra referido relatório dando lugar a troca de e-mailes juntos como docs. 26 a 28, a fls. 107 a 110, cujo teor se dá por reproduzido);
11- Em 24 de fevereiro de 2016 a representante da demandada enviou à administração do condomínio o relatório da sua companhia de seguros datado de 15 de outubro de 2015 (cfr. doc. 29 e doc. 30, fls. 112 a 124);
12 - A administração comunica que vai agir conforme o deliberado em 07 de janeiro de 2016 (cfr. doc. 31, e.mailes trocados em 11 de março de 2016);
13 - A administração do condomínio desenvolveu diligências, entre 11 de março e 9 de junho de 2016, no sentido de articular disponibilidades do empreiteiro, peritos e dos responsáveis das frações envolvidas para a realização da obra (cfr. docs. 31 a 67, contendo cerca de 41 emailes, cujo teor se dá por integralmente reproduzidos);
14 – A realização da obra afigura-se mais eficaz se for realizada através da fração da demandada.
Factos não provados.
Com relevância para a decisão da causa não se consideram não provados quaisquer factos.
Motivação.
A convicção do tribunal fundou-se nos autos, nos documentos apresentados e referidos nos respetivos factos, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual e nos depoimentos das testemunhas apresentadas.
As partes não se mostraram em oposição relativamente aos danos que se verificam na casa do demandante, nem mesmo em considerar que a fração do demandante se encontra perto da inabitabilidade. Tanto assim que, o condomínio tomou uma posição que é de louvar, assumindo a reparação mesmo convencido de que a responsabilidade não lhe pertence.

Do direito.
Nos presentes autos estamos perante um conflito entre proprietários de frações autónomas e o respetivo condomínio. É um facto inquestionável que a fração do demandante está afetada por infiltrações que a tornam inabitável e se agravam por falta de reparação, sendo que as seguradoras rejeitam a responsabilidade, do mesmo modo que o perito contratado pelo condomínio rejeita que a rotura seja nas partes comuns. E é aqui que o conflito surge e se agudiza. É que o condomínio (e também o demandante), insiste que a causa da infiltração reside em tubos da fração da demandada, e esta louva-se no relatório da companhia de seguros, o qual aponta para a eventualidade de haver rotura em tubo ou cano da parte comum. O processo de resolução já desgastou todos os intervenientes, incluindo peritos e engenheiros, gerando-se um clima nada propício para consensos, mau grado os esforços desenvolvidos no decurso das diligências levadas a efeito nos presentes autos, que se revelaram infrutíferos o que muito se lamenta. Uma vez aqui aportados, vamos ao que interessa, que é a realização da obra que estanque o vazamento e coloque a fração do demandante habitável.
Nos presentes autos não está em causa saber a quem cabe a responsabilidade na rotura e danos daí decorrentes. O pedido formulado circunscreve-se tão só a que a demandada franqueie o acesso à sua fração para através dela se fazer a pesquisa e proceder à reparação. Face ao facto da fração da demandada se encontrar acima das frações que estão afetadas, manda o bom senso que se pesquise no plano mais elevado. É um facto que esta intervenção coloca em colisão o direito de propriedade da demandada (face à invasão) e o direito de propriedade do demandante, face aos danos que sofre tornando a fração inabitável e sem solução à vista e cada vez se degrada mais. Assim, face ao disposto no artigo 335.º do Código Civil, dúvidas não temos de que a demandada tem de franquear o acesso à sua fração conforme reclamado pelo demandante. É certo que não se pode afirmar que a parte demandada tenha negado o acesso à fração para pesquisa e realização da obra. Por outro lado a tarefa do condomínio está dificultada pela necessidade de articular disponibilidades de várias pessoas, o que levou à frustração das diligências que desenvolveu durante meses.

Decisão.
Em face do exposto:
1.º Condeno a demandada a dar acesso à sua fração para início e conclusão da obra em causa nos presentes autos;
2.º Concede-se às partes trinta dias para acordarem na data de início da obra e duração prevista para a mesma;
3.º Caso as partes não logrem estabelecer datas por acordo, o condomínio fixa as mesmas e informa a demandada e a sua representante, com oito dias, seguidos, de antecedência da data de início da obra e duração prevista da mesma;
3.º Se a indisponibilidade da parte demandada se prolongar por mais de quinze dias seguidos, haverá lugar ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de €10,00 por cada dia de atraso.

Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, determino custas em partes iguais já satisfeitas pelas partes.

Julgado de Paz de Lisboa, em 30 de junho de 2017
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias