Sentença de Julgado de Paz
Processo: 7/2018-JPSRT
Relator: MARTA NOGUEIRA
Descritores: AÇÃO DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO
NOS TERMOS DO ART. 9º N.º 1 AL. G) DA LEI N.º 78/2001
DE 13 DE JULHO
ALTERADA E REPUBLICADA PELA LEI N.º 54/2013
DE 31 DE JULHO.
Data da sentença: 07/09/2018
Julgado de Paz de : SERTÃ
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
(art. 57º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho – LJP)

Objeto da ação: Ação Declarativa de Condenação, nos termos do art. 9º n.º 1 al. g) da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho. –--
Valor: € 8.123,07 (oito mil cento e vinte e três euros e sete cêntimos). ---
Demandante: J. ---
Demandados: C Unipessoal, Lda. e P. --

OBJETO DO LITÍGIO
O Demandante, J, veio intentar, em 18-01-2018, a presente ação, com fundamento na alínea g) do n.º 1 do art. 9º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho (LJP), pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros) a título de rendas vencidas e não pagas, consubstanciada também numa declaração de dívida subscrita pelos Demandados em 04-12-2013.
Para tanto o Demandante alegou os factos constantes do seu requerimento inicial de fls. 1 a 3, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
Juntou: 4 (quatro) documentos, que se dão por integralmente reproduzidos.

TRAMITAÇÃO
Os Demandados foram regularmente citados, cfr. fls. 55 e 74 dos autos.
Foi designado o dia 29-05-2018, pelas 14h30m, para realização da audiência de julgamento, à qual os Demandados faltaram, não tendo justificado a sua falta no prazo legal, apesar de notificados para o efeito.

FUNDAMENTAÇÃO
Dispõe o art. 58.º, n.º 2 da LJP que, se o demandado, tendo sido regularmente citado, não comparecer, não apresentar contestação escrita nem justificar a falta no prazo de três dias, opera a cominação prevista no supramencionado normativo, pelo que se consideram confessados os factos articulados pelo demandante. Ora, foi o que sucedeu nos presentes autos.

Assim, consideram-se provados (por confissão) e relevantes para o exame e decisão da causa os seguintes os factos:
1 – O Demandante é dono e legítimo proprietário da fração autónoma designada pela letra «G», correspondente ao imóvel rés-do-chão direito para comércio do prédio urbano sito na Rua …, freguesia de L, concelho de T, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 0000-G, e descrito na Conservatória do Registo Predial de T sob o n.º 000, e com a Licença de Utilização n.º 00/98, emitida em 21-04-1998 pela Câmara Municipal de T;
2 – A 1ª Demandada é uma sociedade por quotas unipessoal, com capital social de € 5.000,00 (cinco mil euros), e cujo objeto da atividade comercial é «a importação e exportação de café e produtos alimentares»;
3 – O 2º Demandado é sócio e gerente da 1ª Demandada;
4 – No dia 01 de setembro de 2009 o Demandante, como senhorio, celebrou com a Demandada enquanto inquilina, C Unipessoal, Lda., representada pelo seu sócio-gerente, P, um contrato de arrendamento urbano para o exercício da atividade comercial;
5 – O Demandado P constituiu-se fiador da C, Lda., assumindo pessoal e solidariamente o fiel cumprimento de todas as cláusulas do contrato de arrendamento;
6 – O prazo de duração do contrato de arrendamento foi fixado em 5 anos, com termo a 31 de agosto de 2014, renovando-se automaticamente no fim do prazo, por iguais períodos de 3 anos, quando não seja denunciado por qualquer das partes;
7 – A renda do primeiro ano foi fixada em € 4.000,00 (quatro mil euros), a pagar mensalmente em duodécimos de € 370,00 (trezentos e setenta euros), na conta bancária do Demandante;
8 – Foi acordado que, em caso de mora no pagamento, o senhorio tem direito a exigir a indemnização igual a 50% do que for devido, além da quantia em atraso;
9 – A Demandada C Unipessoal, Lda. não cumpriu pontualmente as obrigações de pagamento de renda, decorrentes da lei e do contrato;
10 – Obrigações que não foram cumpridas pessoal e solidariamente pelo Demandado fiador;
11 – No dia 04 de dezembro de 2013, o montante devido ao Demandante, a título de rendas vencidas e não pagas, incluindo os encargos de mora do imóvel arrendado, era de € 7.000,00 (sete mil euros);
12 – Nessa mesma data os Demandados, de forma unilateral, nessa mesma data, subscreveram uma declaração de dívida respeitante ao montante de € 7.000,00 (sete mil euros), na qual declararam e reconheceram-se devedores do Demandante;
13 – O qual foi devidamente assinado pela Demandada C Unipessoal, Lda., enquanto devedora das rendas, e pelo Demandado P na qualidade de representante da Demandada e na qualidade de fiador;
14 – Os Demandado comprometeram-se a pagar o montante em dívida em prestações mensais de € 200,00 (duzentos euros) cada uma, com início em janeiro de 2014;
15 – Até à presente data nenhuma quantia foi paga ao Demandante;
16 – Os Demandados devem ao Demandante a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros).

Motivação dos factos provados:
A convicção probatória do tribunal ficou a dever-se à confissão por parte dos Demandados, operada pela ausência de contestação escrita e falta, injustificada, à Audiência de Julgamento, tendo sido tomados em consideração os documentos juntos aos autos, considerando-se provados todos os factos alegados pelo Demandante.

DIREITO
A questão a decidir por este Tribunal circunscreve-se a saber se tem o Demandante legitimidade para cobrar dos Demandados a quantia peticionada a título de rendas vencidas e não pagas, no montante de € 7.000,00 (sete mil euros), em virtude do alegado incumprimento da Demandada.
No caso vertente deu este tribunal como provado que o Demandante é dono e legítimo proprietário da fração autónoma designada pela letra «G», correspondente ao imóvel rés-do-chão direito para comércio do prédio urbano sito na Rua…, freguesia de L, concelho de T, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 0000-G, e descrito na Conservatória do Registo Predial de T sob o n.º 000, e com a Licença de Utilização n.º 00/98, emitida em 21-04-1998 pela Câmara Municipal de T, bem como a dívida dos Demandados para com o Demandante no montante global de € 7.000.00 (sete mil euros), de rendas vencidas e não pagas até à presente data, bem como a indemnização de 50% pela mora no cumprimento prevista no art. 1041º do CC.

Com efeito, entre o Demandante e os Demandados foi celebrado um contrato de locação, o qual contém regras próprias, convencionadas pelas partes, no âmbito da liberdade contratual estabelecida no art. 405º CC. Mas além das cláusulas e do conteúdo que as partes entendem fixar nos contratos que celebram, a lei estabelece limites, regulando total ou parcialmente determinados contratos.

No caso em apreço Demandante e Demandados celebraram um contrato de locação regulado pelos arts. 1022º a 1091º CC, os quais definem as disposições gerais aplicáveis à locação. Ora, diz o art. 1022º CC que «Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa mediante retribuição». Por sua vez, o art. 1023º CC faz a distinção entre arrendamento e aluguer, consoante verse sobre coisa imóvel ou móvel. Assim, em resumo, é obrigação do locador (Demandante) entregar ao locatário (Demandados) a coisa locada e assegurar o gozo desta para os fins a que a mesma se destina, cfr. art. 1031º CC, als. a) e b). Por contraposição, é obrigação do locatário (Demandados), pagar a renda ou aluguer, cfr. art. 1038º a) CC, entre outras.

Ora resulta provado, porque não impugnado, que Demandante e Demandados celebraram um contrato de locação, tendo o primeiro entregue a coisa locada e assegurando o seu gozo aos Demandados, os quais não lograram provar, como lhes competia, o pagamento das rendas em dívida, ou que as mesmas não eram devidas. Foram ainda dados como provados os factos alegados pelo Demandante, tendo em consideração o art. 342º CC. Diz este art. que «1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.» No caso em apreço resultou provada a celebração de um contrato de arrendamento para fins comerciais, com prazo certo de 5 anos, com início em 01-09-2009 e termo em 31-08-2014, da fração autónoma designada pela letra «G», correspondente ao imóvel rés-do-chão direito para comércio do prédio urbano sito na Rua…, freguesia de L, concelho de T, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 0000-G, e descrito na Conservatória do Registo Predial de T sob o n.º 000, e com a Licença de Utilização n.º 00/98, emitida em 21-04-1998 pela Câmara Municipal de T, propriedade do Demandante. Igualmente resultou provada que a renda mensal era, à data da propositura da presente ação, no montante de € 370,00 (trezentos e setenta euros) e que esta deveria ser paga, por depósito ou transferência bancária para a conta bancária do Demandante, o que também foi considerado provado pelo Tribunal. Mais resultou provado que os Demandados devem ao Demandante as rendas vencidas e não pagas, no montante global de € 7.000,00 (sete mil euros), por absoluta falta de prova dos Demandados, que não lograram fazer essa prova, sendo certo que, nos termos do n.º 2 do art. 342º CC, «2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita». Ou seja, competia aos Demandados alegar e, acima de tudo provar, quaisquer factos que contrariassem o direito invocado pelo Demandante, o que não fizeram.
Face ao que antecede não restam dúvidas a este Tribunal que os Demandados devem ao Demandante a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros), correspondente ao não pagamento de rendas vencidas e não pagas, e peticionadas pelo Demandante. Assiste, assim, ao Demandante o direito de pedir o pagamento das rendas vencidas e não pagas, no valor total de 7.000,00 (sete mil euros), a qual já inclui a indemnização no valor de 50% das rendas em atraso, prevista no art. 1041º n.º 1 do CC, o qual estipula que, em caso de mora do locatário/inquilino, tem o locador/senhorio, o direito a exigir, para além das rendas em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido.

O 2º Demandado, enquanto fiador do contrato sobre o qual nos pronunciamos, assume nos termos e para os efeitos no disposto do art. 627º n.º 1 do CC que aí refere «o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor». Acrescentando o n.º 2 «a obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor». Ora, nos termos do art. 634º do CC «a fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor», pelo que «o credor, ainda que o fiador goze do benefício da excussão, pode demandá-lo só ou juntamente com o devedor (…)».
O 2º Demandado subscreveu o contrato de arrendamento em causa na qualidade de fiador do arrendatário, como aliás se constata do mesmo.

A fiança deste 2º Demandado foi prestada por escrito no contrato de arrendamento, obedecendo ao requisito formal exigido (art. 628º n.º 1 do CC).

Face ao que fica dito, conclui-se que, válida a obrigação principal, válida é igualmente a fiança prestada (art. 632º n.º 1 do CC). Uma das características normais da obrigação assumida pelo fiador é a sua subsidiariedade em relação à obrigação do devedor principal, que se traduz no benefício da excussão prévia, de acordo com o qual ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver ‘esgotado’ todos os bens do devedor sem obter satisfação do seu crédito (art. 638º n.º 1 do CC). No caso dos autos não benefício da excussão prévia. Consequentemente, arrendatários e fiadores respondem solidariamente perante o credor pela dívida principal (rendas), bem como pelas consequências legais e contratuais do seu não cumprimento - art. 634º do CC.

Acresce que, os Demandados assinaram uma confissão de dívida para com o Demandante, junta aos autos sob o doc. n.º 3, de fls. 11, na qual declaram dever ao Demandante a quantia de «… € 7.000,00 (sete mil euros) a título de rendas vencidas e não pagas incluindo os encargos de mora do imóvel a este (Demandante) pertencente… da qual a primeira foi arrendatária o segundo fiador». Acrescentando ainda que «O pagamento desta importância será feito em prestações mensais de 200€ cada uma, com início em janeiro de 2014, sendo que o atraso de qualquer prestação implica o vencimento de todas as outras.».

Ora, diz-nos o art. 458º do CC, «1. Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou reconhecer uma dívida, sem indicação da respectiva causa, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário. 2. A promessa ou reconhecimento deve, porém, constar de documento escrito, se outras formalidades não forem exigidas para a prova da relação fundamental.»

Dos juros de mora
Adicionalmente, pede o Demandante que os Demandados sejam condenados no pagamento de juros legais de mora vencidos desde a data o dia 01-01-2014 (vencimento da primeira prestação consignada na declaração de dívida, bem como nos vincendos até efetivo e integral pagamento.
Vejamos então quanto ao pagamento de juros legais de mora vencidos e vincendos.
Nos termos do art. 559º do CC, os juros legais são fixados em Portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do Plano, sendo atualmente de 4,00% a taxa supletiva de juros de mora civis. Por outro lado, o art. 804º CC preceitua que, ao não cumprir pontualmente a sua obrigação – ainda possível – o devedor incorre em mora, sendo que a simples mora o constitui na obrigação de reparar os danos causados ao credor. Os nºs 1 e 2 do art. 806º CC dispõem, por sua vez, que na obrigação pecuniária – caso ora em apreço – a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora sendo, em princípio, devidos os juros legais.

Acrescenta ainda o n.º 1 do art. 805º CC que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. No entanto, a alínea a) do n.º 2 dispõe que, independentemente de interpelação, há mora do devedor se a obrigação tiver prazo certo.

Resultou provado nos presentes autos que a primeira prestação de € 200,00, consubstanciada na declaração de dívida deveria ter ocorrido em janeiro de 2014. Mais resultou provado que os Demandados nada pagaram ao Demandante, pelo que concluiremos que os Demandados se constituíram em mora nessa data.

Assim, verificado o não cumprimento pelos Demandados também este pedido tem de proceder, pois tem fundamento legal, nos termos do art. 805º n.º 2 alínea a) CC, pois, como sucede no caso em apreço, a obrigação a que estavam adstritos tem prazo certo, ou seja, aqui o mês de janeiro de 2014.

DECISÃO
Face ao que antecede e às disposições legais aplicáveis, julgo a presente ação totalmente procedente por provada e, em consequência, condeno os Demandados a pagar ao Demandante a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros), relativa a rendas vencidas e não pagas, bem como a indemnização de 50% pela mora do locatário. Mais condeno os Demandados a pagar ao Demandante a quantia de € 1.123,07 (mil cento e vinte e três euros e sete cêntimos) correspondente aos juros de mora vencidos desde a data do vencimento e calculados pela Demandante. Condeno ainda os Demandados a pagar ao Demandante os juros legais de mora vincendos até efetivo e integral pagamento, calculados sobre o capital em dívida (€ 7.000,00), à taxa de juro definida por Aviso da Direção Geral do Tesouro para as transações civis.
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Custas:
São responsáveis pelas custas, no valor de € 70,00 (setenta euros), os Demandados.
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Os Demandados deverão proceder ao pagamento do valor em dívida – € 70,00 (setenta euros) – num dos três dias úteis seguintes à presente notificação sob pena de se constituírem devedores de uma sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso (art. 8º e 10º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro). Decorridos catorze dias sobre o termo do prazo suprarreferido sem que se mostre efetuado o pagamento, será entregue certidão da não liquidação da conta de custas ao Ministério Público, para efeitos executivos, no valor então em dívida, que será de € 210,00 (duzentos e dez euros).

Cumpra-se o disposto no art. 9º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro em relação ao Demandante, e devolva-se a quantia de € 35,00 (trinta e cinco euros).
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Notifique-se, sendo que os Demandados também para o pagamento das custas da sua responsabilidade, por via postal registada simples.

Após o trânsito, arquivem-se os autos.


Sertã, Julgado de Paz, 09 de julho de 2018

A Juíza de Paz,


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(Marta Nogueira)