Sentença de Julgado de Paz
Processo: 146/2017-JPSXL
Relator: FERNANDA CARRETAS
Descritores: ÁREA URBANA DE GÉNESE ILEGAL (I) - DEVOLUÇÃO DAS DESPESAS DE RECONVERSÃO PAGAS - EXPROPRIAÇÃO
Data da sentença: 04/16/2018
Julgado de Paz de : SEIXAL
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA
**
RELATÓRIO:
A; HERANÇA POR ÓBITO DE B, REPRESENTADA PELA CABEÇA DE CASAL, A; C; D; E e F, identificados a fls. 1 a 4 e 6, intentaram, em 2 de junho de 2017, contra G, melhor identificada a fls. 5 e 6, a presente ação declarativa de condenação, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 7.204,24 € (Sete mil, duzentos e quatro euros e vinte e quatro cêntimos) correspondente aos valores liquidados por estes a título de despesas com a reconversão da H.
Para tanto, alegaram os factos constantes do Requerimento Inicial de fls. 1 a 11, que se dá por reproduzido, dizendo que: a primeira Demandada e seu marido – B -, já falecido, adquiriram, por compra, duas parcelas de terreno, sitas nas ruas que identificaram, em Fernão Ferro; o B faleceu, sem deixar testamento, sendo seus herdeiros a mulher e os filhos, ora Demandados; as referidas parcelas integravam o prédio rústico que identifica, e integravam a Área de Génese Ilegal (doravante designada por H) constituída por várias parcelas; para tratar da reconversão da H em área urbana, foi criada a G; para custear as despesas de reconversão os titulares das várias parcelas de terreno inscreveram-se na referida Associação, tendo a primeira Demandante e seu marido pago a jóia no valor de 5.000$00 €, hoje correspondente a 2.500,00 € (Dois mil e quinhentos euros); posteriormente pagaram por conta dos “lotes” 937 e 990, o montante de 471.600$00, hoje correspondente a 2.352,12 € (Dois mil, trezentos e cinquenta e dois euros e doze cêntimos) para cada “lote” ou seja, pagaram o montante total de 7.204,24 € (Sete mil, duzentos e quatro euros e vinte e quatro cêntimos); as quantias pagas à Associação destinavam-se a pagar as despesas com as diversas infraestruturas necessárias, bem como para pagamento de taxas e licenças camarárias, projetos de arquitetura e de especialidade, despesas administrativas, honorários de advogado, entre outras; sucede que os ora Demandantes foram expropriados de ambas as parcelas de terreno, Expropriação por Utilidade Pública para construção do lanço IC32 – Palhais/Coina – sublanço Laranjeiras/Coina – Trecho 4; tal expropriação foi realizada pela I.; a carta de resolução de expropriação, datada de 18 de outubro de 2010, foi remetida aos ora demandantes naquela data; em consequência daquela expropriação, os ora Demandantes ficaram sem qualquer parcela ou parte, sendo que a entidade expropriante tomou posse dos terrenos no dia 31 de outubro de 2011;jamais, desde a inscrição como sócios naquela associação, até à data indicada em 16.º, decorridos 18 anos, os terrenos foram convertidos em prédios urbanos, o que a ter acontecido teria valorizado significativamente os mesmos e, consequentemente, permitido aos Demandantes receber indemnização justa pela expropriação e assim sendo, porque desde 2011 já não existem aquelas parcelas, porque não foram realizadas as infraestruturas necessárias à conversão daqueles prédios rústicos em urbanos, nem tão pouco faz qualquer sentido o pagamento de despesas relativas àquela H, entendem os ora Demandantes que sofreram um empobrecimento correspondente aos valores que liquidaram à Associação de Moradores tendo esta obtido um enriquecimento do mesmo valor, pelo que pretendem ser ressarcidos das quantias que despenderam, no valor indicado. Terminam pedindo a condenação da Demandada a pagar-lhe a referida quantia.
Juntaram 9 documentos (fls. 12 a 41 e 271 a 273) que, igualmente, se dão por reproduzidos.
A Demandada foi, pessoal e regularmente, citada para contestar, no prazo, querendo, tendo apresentado a douta contestação de fls. 94 a 108, que se dá por reproduzida, qual se defende por exceção, invocando a ilegitimidade passiva da Demandada, uma vez que a Demandada não pode ser parte na ação porque nada deve aos Demandantes, não tendo a obrigação de os ressarcir do valor que peticionam; a Associação foi constituída em 17 de abril de 1980, com várias finalidades, constantes dos Estatutos; um dos objetivos da Associação, entre outros, era, e ainda é, o de promover a reconversão urbanística da área da Quinta das Laranjeiras; A referida Quinta, nos anos 80, estava definida com solo rústico, destinado essencialmente a pinhal e foi “retalhado”, nesses anos, pelos seus titulares e vendida em avos indivisos; os adquirentes dos avos indivisos, ao realizarem a escritura, ficavam com a expetativa de poderem erigir aí a sua habitação e muitos avançaram para a construção clandestina; perante esta realidade, os primeiros moradores (clandestinos), depararam-se com grandes dificuldades pois estavam numa zona sem nenhuma infraestrutura; sem rede de água, esgotos, eletricidade, ruas, nem qualquer prestação de serviços públicos; foi, então, constituída a Associação para, dentro das suas várias funções, procurar soluções para estes problemas; Foi necessário iniciar um processo de reconversão urbanística da área e a Associação foi mandatada pelos seus sócios para promover a urbanização desta área; como todo este processo implicava custos, os sócios aprovaram o pagamento de comparticipações para este fim, que identificaram com a rubrica de infraestruturas, o que está refletido no Regulamento de Gestão; o processo iniciou-se com a execução de um Plano de Pormenor e dos projetos de infraestruturas; o Plano de Pormenor da Quinta das Laranjeiras foi aprovado em 1 de abril de 1997 e só nessa data é que ficaram definidos todos os parâmetros urbanísticos, ou seja, zonas para a constituição de lotes para moradias ou prédios; zonas destinadas a equipamentos; zonas industriais; zonas de reserva paisagística; arruamentos, etc.; para a execução do Plano de Pormenor, projeto de infraestruturas e início da obra havia necessidade de gastar dinheiro e foram as comparticipações dos sócios na rúbrica infraestruturas que permitiram que se avançasse com todo este processo; a Quinta das laranjeiras tem hoje a sua área infraestruturada, ou seja, tem em funcionamento a rede de eletricidade, água, esgotos e telefones; as ruas estão executadas com lancil e asfalto; foi necessário construir emissários que também estão em funcionamento, pelo que, todos quantos passam hoje por esta área, verificam que o que de início era uma área de pinhal, tem hoje vias que permitem o livre acesso de todos os moradores e veículos públicos (autocarros, polícia, ambulâncias, recolha de lixo) e a prestação de todos os serviços públicos, com loteamentos aprovados, construções licenciadas e muitos moradores; todas estas obras foram executadas com o dinheiro que todos os sócios pagaram na sua rúbrica infraestruturas; a constituição da H FF 80, que delimita este prédio, deu-se em 9 de maio de 2002, pela aplicação da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, alterada; a Administração Conjunta está instituída e a Comissão de Administração está em funções; todas as obras realizadas foram consideradas na avaliação que foi feita pelos peritos na altura da expropriação; no Acórdão arbitral, junto ao processo n.º 4962/13.0-TBSXL, que corre termos no Tribunal da Comarca de Lisboa, Seixal – Instância Local, Secção Cível – J1, são vários os parâmetros considerados para a avaliação da área expropriada, o primeiro dos quais é o solo ter sido considerado “solo apto para construção”, à luz da Lei das Expropriações; esta classificação só foi possível porque os sócios da Associação efetuaram pagamentos que permitiram que a mesma avançasse para a aprovação de um Plano de Pormenor que, depois de aprovado e publicado, transformou a área de rústica para área urbanizável; tal como decorre da Lei n.º 56/2008, o solo só é considerado apto para construção se tiver acessos rodoviários, rede de abastecimento de água, energia elétrica, saneamento ou que disponha de parte dessas infraestruturas mas esteja integrado em núcleo urbano ou ainda o que tem instrumento de gestão territorial para o efeito; decorre do Acórdão arbitral de Expropriação que o prédio objeto de expropriação estava infraestruturado, que se encontra em aglomerado urbano; que na sua envolvente existem alguns equipamentos; que está integrado no Plano de Pormenor da Quinta das Laranjeira; na metodologia de avaliação é considerada a aprovação e publicação do Plano de Pormenor da Quinta das Laranjeiras e o facto de estar delimitado como I; na avaliação é também atendido ao valor unitário de terreno e ao custo de construção; com a aprovação deste Plano de Pormenor e dos projetos de infraestruturas, seno que o referido Acórdão Arbitral considerou as infraestruturas executadas para efeitos de cálculo da indemnização, onde na Base de incidência Fundiária se consideram as infraestruturas existentes junto à parcela que ali são descriminadas; inclusive na resposta aos quesitos da entidade expropriante, em resposta à pergunta “12-No valor do solo a expropriar, está incorporado o custo das infraestruturas coletivas existentes? R: Sim.”; nos quesitos formulados pelo comproprietário J às perguntas acerca da existência de vias de acesso rodoviário confinante com as parcelas; se estas estão em bom estado de circulação; se dispunham de rede de abastecimento de água, eletricidade e saneamento adequadas, bem como a respetiva rede executada; se existe um sistema de transportes públicos; se existem nos arredores habitação, comércio e industria, clinicas, centros de saúde, farmácia, escolas, estabelecimentos de restauração, para todos s resposta foi sim; e todas as páginas do Acórdão Arbitral, identificam, no cimo das páginas, as parcelas 24/12 e 24/17, a que os Demandantes se referem, não restado dúvidas acerca da sua inclusão na avaliação; os Demandantes pagaram as quantias cobradas a título de infraestruturas e nada mais. Esta rúbrica cobre as despesas mencionadas: execução do Plano de Pormenor, projetos e obras de infraestruturas, despesas administrativas, estando a obra executada, referindo-se que quanto às infraestruturas os Demandantes não pagaram a sua totalidade, já que não pagaram o reforço de 1.000 euros, que foi aprovado em 2009, nem o ramal de esgoto no montante de 500 euros por parcela; a Associação da Quinta das Laranjeiras cumpriu as funções para que foi mandatada pelos seus sócios, ou seja aplicar a verba que lhe foi entregue a título de infraestruturas na execução das mesmas, nos termos dos Estatutos aprovados; a parcela a expropriar foi avaliada; os Demandantes foram notificados da decisão, tendo-a aceite, não tendo interposto recurso; estão os Demandantes, ao receberem a quantia aprovada para a expropriação, a ser ressarcidos do que pagaram a título de infraestruturas à Demandada, tendo já feito o pedido para essa quantia lhes fosse paga; já receberam a quantia de 343,35 €; sendo a entidade expropriante parte legítima para efetuar esse pagamento, o que está a fazer em processo próprio, não pode a Demandada ser condenada na devolução do dinheiro pago pelos Demandantes que, de outra forma, estariam a receber duas vezes; não é verdade que a Demandante tenha adquirido “duas parcelas de terreno”, porque, conforme o registo predial de 26 de abril de 1989, a Demandante adquiriu o direito a 700/100.000 avos indivisos do prédio descrito sob o n.º 6552; quando a Demandante adquiriu aqueles avos indivisos do referido, este ainda não estava integrado em nenhuma I, uma vez que a Lei que permitiu a constituição nasceu em 1995, pela Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, tendo a I sido delimitada em 9 de março de 2002; quem se associou na Demandada foi o Sr. B, o qual pagou a joia de 5.000$00 (Cinco mil escudos), a que corresponde hoje a quantia de 25,00 € (Vinte e cinco euros) e não, como alega a Demandante de 2.500 € (dois mil e quinhentos euros); ainda hoje, quem se queira associar, paga a quantia de 25,00 € (Vinte e cinco euros) e a Demandante irá receber, a título de expropriação, o valor justo em função da valorização conseguida com a intervenção da Demandada e seus associados, já que o valor a pagar seria muito inferior se hoje essa área estivesse classificada como solo rústico (não urbanizável), integrado numa área de pinhal, sem estar dotada das infraestruturas, ou de outra forma, se o solo não estivesse classificado como apto para construção, no âmbito do processo de expropriação. Termina pedindo que a ação seja julgada improcedente e a Demandada ser totalmente absolvida do pedido.
Os autos foram conclusos à, então, Sra. Juíza de Paz titular, em 23 de junho de 2017, mas só após a redistribuição de processos, levada a efeito em 26 de janeiro de 2018, foi possível à signatária dar-lhes o necessário impulso processual, o que ocorreu em 21 de fevereiro de 2018, com decisão sobre a douta contestação e sobre os vários requerimentos, entretanto juntos aos autos, nomeadamente, designando data para a realização da audiência de julgamento (fls. 239). Pelo facto, o tribunal apresentou já o seu pedido de desculpas a todos os intervenientes processuais.
**
Cabe a este tribunal decidir se a Demandada deve ser condenada a reembolsar os Demandantes das quantias pagas a título de jóia, pela inscrição na Associação, e de infraestruturas para legalização da área urbana de génese ilegal (H), atento o facto de os avos indivisos de que eram proprietários terem sido expropriados. Na afirmativa, cabe determinar, qual a quantia a devolver.
**
Tendo os Demandantes optado pelo recurso à Mediação para resolução do litígio, foi agendado o dia 2 de junho de 2017 para a realização da sessão de Pré-Mediação, a qual foi desmarcada, por recusa da Demandada em aceder a este meio alternativo de resolução de litígios (fls. 83). Efetivada a redistribuição, conforme supra se referiu, foi designado o dia 6 de março de 2018 para a realização da Audiência de Julgamento e não antes, devido à acumulação excecional de serviço e à absoluta indisponibilidade de agenda (Fls. 239).
**
Aberta a Audiência e estando presentes os demandantes – A, por si e em representação da herança Jacente, por óbito de B; C; D; E e F –, acompanhados da sua Ilustre mandatária – Sra. Dra. K - e o representante legal da Demandada – L – acompanhado da sua Ilustre mandatária – Sra. Dra. M – foram todos ouvidos, nos termos do disposto no art.º 57.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho (LJP), tendo-se explorado todas as possibilidades de acordo, que não se revelou possível, pelo que se procedeu à realização da audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, conforme da respetiva ata melhor se alcança (fls. 266 a 268).
A audiência foi suspensa para a junção de documentos, imprescindíveis à decisão e respetivo exercício do direito ao contraditório sobre os mesmos, tendo-se designado, desde logo, o dia 29 de março de 2018, para a sua continuação, com prolação de sentença e não antes, por absoluta indisponibilidade de agenda.
A referida data viria a ser dada sem efeito, devido ao facto de o tribunal não dispor de recursos humanos para o efeito, em consequência da concessão de tolerância de ponto pela Câmara Municipal do Seixal, tendo-se designado, em sua substituição, a presente data (fls. 304).
**
Cumpre, antes de mais, resolver a questão do valor da ação, atento o lapso de cálculo na conversão de escudos para euros da joia paga pela primeira Demandante e seu marido à Demandada, pela inscrição e bem assim a questão da exceção da ilegitimidade, invocada pela Demandada.
Quanto à questão do valor da ação, verifica-se que a jóia paga pela primeira Demandante e seu marido à Demandada, tendo em consideração que 1 € corresponde a 200,482 escudos, a quantia paga cifrou-se em 24,94 € (Vinte e quatro euros e noventa e quatro cêntimos) e não em 2.500,00 € (Dois mil e quinhentos euros) conforme alegado pelos Demandantes.
E que a quantia paga a título de infraestruturas correspondia a 4.704,66 € (Quatro mil, setecentos e quatro euros e vinte e quatro cêntimos), apura-se o montante total de 4.729,60 € (Quatro mil, setecentos e vinte e nove euros e sessenta cêntimos) e não 7.204,24 € (Sete mil, duzentos e quatro euros e vinte e quatro cêntimos), conforme indicado e peticionado pelos Demandante.
Decisão:
Nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 306.º, do Código de Processo Civil (CPC), fixo o valor da ação na quantia de 4.729,60 € (Quatro mil, setecentos e vinte e nove euros e sessenta cêntimos).
**
No que à ilegitimidade passiva concerne, não são necessárias grandes indagações para se chegar à conclusão de que a Demandada elabora em erro quando invoca a sua ilegitimidade por entender que, se houver lugar a algum ressarcimento das quantias pagas pela primeira Demandante e seu marido, esse ressarcimento é da responsabilidade da entidade expropriante e não sua.
De facto, em termos gerais, a legitimidade não constitui uma qualidade pessoal das partes, referente aos processos, mas uma posição delas em face do processo concreto – o interesse de cada uma delas em determinado processo (cfr. Antunes Varela, RLJ, ano 114.º, p.139).
Significa isto queÉ uma posição de autor e réu, em relação ao objecto do processo, qualidade que justifica que possa aquele autor, ou aquele réu, ocupar-se em juízo desse objecto do processo– Castro Mendes, Direito Processual Civil, 1980, 2.º, p.153.
Assim, a legitimidade do Demandada afere-se pelo seu interesse direto em contradizer, pelo prejuízo que dessa procedência advenha [art.º 30.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil CPC)].
A ilegitimidade constitui uma exceção dilatória de conhecimento oficioso, nos termos dos Art.ºs 577.º, al. e) e 578.º do Código de Processo Civil (CPC).
As exceções dilatórias obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar - no caso do reconhecimento da ilegitimidade - à absolvição da instância (Art.º 576.º, n.º 2, do CPC).
Ora, a causa de pedir consiste no facto de a Demandada ter recebido verbas para reconverter a área rústica em área urbana, criando as necessárias infraestruturas, alegando os Demandantes que a Demandada não cumpriu este desiderato, ou seja, transcrevendo que “jamais, desde a inscrição como sócios naquela Associação até à data indicada em 16.º (data da expropriação), decorridos 18 anos, os terrenos foram convertidos em prédios urbanos, o que a ter acontecido teria valorizado significativamente os mesmos e, consequentemente, permitido aos Demandantes receber uma indemnização justa pela expropriação.” (sic).
Portanto, é medianamente claro que os Demandantes imputam à Demandada a responsabilidade pela não valorização dos prédios, o que os teria prejudicado na arbitragem da indemnização a receber pela expropriação dos mesmos.
Se tal corresponde à verdade, sendo certo que se estranha esta alegação dos Demandantes, face aos elementos que têm em seu poder, é questão de mérito e não de pressuposto da estabilidade da instância.
Tanto assim é que, procedendo a exceção da ilegitimidade passiva, a consequência seria a da absolvição da instância, como se viu, e, no caso de não resultarem provados os factos alegados pelos Demandantes, a consequência será a da absolvição do pedido.
Ou seja, a Demandada é parte legitima porque o seu interesse em contradizer é direto, pelo prejuízo que a procedência da ação lhe pode causar.
Decisão:
Atenta a causa de pedir e o pedido, declaro a Demandada parte legítima na presente ação, improcedendo a invocada exceção da ilegitimidade.
**
Estando reunidos os pressupostos da estabilidade da instância, cumpre apreciar e decidir:
**
FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE FACTO
A convicção probatória do tribunal, ficou a dever-se ao conjunto de prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomadas em consideração as declarações das partes na audiência de julgamento e bem assim os documentos juntos por ambas as partes, com especial para o Laudo Arbitral que deu origem ao respetivo Acórdão Arbitral de expropriação.
Ponderaram-se também os depoimentos das testemunhas, apresentadas pela Demandada, as quais prestaram depoimento credível e revelaram conhecimento direto dos factos sobre os quais testemunharam. Assim:
1.ª N, que, aos costumes, declarou ser funcionária da Demandada, há 26 anos, conhecendo os Demandantes por terem pedido alguns esclarecimentos nas instalações da Associação. A sua especial qualidade não retirou credibilidade ao seu depoimento.
2.ª O que, aos costumes declarou ser proprietário de um “lote” de terreno na H, na década de 80, conhecendo bastante bem aquela realidade, até porque exerce as funções de tesoureiro da Associação. A sua especial qualidade não retirou credibilidade ao seu depoimento.
**
Com interesse para a decisão da causa, ficaram provados os seguintes factos:
1. A primeira Demandante é viúva de B, falecido em 15 de junho de 2002 e cabeça de casal da herança aberta por óbito deste (Doc. n.º 1);
2. O primeiro, terceiro, quarto, quinto e sexto Demandantes, são herdeiros legitimários do de cujus (idem);
3. A primeira Demandante e seu marido, adquiriram, por compra, em 26 de abril de 1989, o direito a 700/100.000 avos indivisos (Parcelas 24/12 e 24/17), do prédio rústico, sito em Pinhal dos Frades ou da Palmeira, descrito a Conservatória do Registo Predial do Seixal, sob o número 000 (Doc. fls.270 a 272);
4. Os comproprietários organizaram-se em Associação de Moradores da Quinta das Laranjeiras, em 17 de abril de 1980, com vista a melhor poderem defender os interesses comuns (Doc. n.º 1, junto com a contestação);
5. O B tornou-se membro da Associação, tendo pago a jóia de 5.000$00, a que corresponde a quantia de 24,94 € (Vinte e quatro euros e noventa e quatro cêntimos) – Doc. n.º 4;
6. Posteriormente, por cada um dos “lotes” pagaram a primeira Demandante e seu marido a quantia unitária de 471.600$00, a que corresponde hoje o montante de 2.352,33 €, no total de 4.704,66 € (Quatro mil, setecentos e quatro euros e sessenta e seis cêntimos) por ambos os “lotes” (Dos. N.ºs 5 e 6);
7. Tais quantias haviam sido aprovadas para criação das infraestruturas necessárias à urbanização da área que, à data era rústica, um dos objetivos da criação da Associação;
8. E, foram pagas em 72 (setenta e duas) prestações, conforme o acordado com a Demandada (idem);
9. Os Demandantes, e bem assim outros comproprietários, de uma parte da área onde se inseriam, foram expropriados de ambos os “lotes”, por utilidade pública para construção do lanço IC32- Palhais/Coina – Sublanço Laranjeiras/Coina – Trecho 4 (Doc. n.º 7);
10. A carta de resolução da expropriação, datada de 18 de outubro de 2010, foi remetida aos ora Demandantes naquela data (Doc. n.º 8);
11. A G, constituída em 17 de abril de 1980, foi constituída com o objetivo, entre outros, de continuar com a urbanização da XXXXX, que, nos anos 80, estava definida como prédio rústico, destinado essencialmente a pinhal e que foi “retalhado” pelos anteriores proprietários e vendida por “lotes” em avos indivisos;
12. Os adquirentes de tais avos tinham a expetativa de aí erigir a sua habitação própria e muitos avançaram com construções clandestinas;
13. Perante esta realidade, os primeiros moradores “clandestinos” depararam-se com grandes dificuldades, uma vez que haviam construído numa zona que não possuía qualquer infraestrutura;
14. Nessa altura, não havia rede de água pública; esgotos, eletricidade, ruas, nem qualquer prestação de serviços públicos;
15. Foi necessário iniciar um processo de reconversão urbanística da área e a Demandada foi mandatada pelos seus Associados para promover a urbanização da área (Doc. n.º 2, junto à contestação);
16. O processo de reconversão implicava custos, pelo que os Associados aprovaram o pagamento de comparticipações pelos comproprietários, que identificaram como rubrica de infraestruturas, conforme o Regulamento de Gestão (Doc. n.º 2);
17. O processo iniciou-se com a execução de um Plano de Pormenor e dos projetos de infraestruturas;
18. O Plano de Pormenor da XXXXXXX, foi aprovado em 1 de abril de 1997, sendo que só nessa data ficaram definidos todos os parâmetros urbanísticos, ou seja, zonas para a constituição de lotes para moradias; zonas destinadas a equipamentos; zonas industriais; zonas verdes; zonas de reserva paisagística; arruamentos, etc.;
19. Todas as infraestruturas foram executadas com as quantias pagas pelos associados à Demandada;
20. Posteriormente, com a publicação da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, constituiu-se a H FF 80, em 9 de maio de 2002, que delimita o prédio (Docs. n.º 5 e 6);
21. Todas as obras realizadas, foram consideradas pelos peritos na altura da expropriação;
22. No Acórdão Arbitral, são enunciados os vários parâmetros considerados na avaliação da área a expropriar, sendo o primeiro o de o solo ter sido considerado “solo apto para construção” (Doc. n.º 7);
23. Tal classificação só foi possível porque os associados da Demandada efetuaram pagamentos que permitiram que esta avançasse para a aprovação de um Plano de Pormenor que, depois de aprovado e publicado transformou esta área que, no ordenamento do território, estava classificada como rústica, em área urbanizável;
24. Decorre do Acórdão Arbitral da expropriação que o prédio estava infraestruturado; que se encontrava em aglomerado urbano (página 18); que na sua envolvente existem alguns equipamentos (página 14) e que está integrado no Plano de Pormenor da XXXXXXXX (página 17);
25. Na metodologia de avaliação é considerada a aprovação e publicação do Plano de Pormenor e o facto de estar delimitado como I, sendo também atendido o valor unitário do terreno e o custo de construção (Doc. n.º 7); ---
26. Igualmente, no Acórdão Arbitral da expropriação, na parte das respostas aos quesitos da entidade expropriante, em resposta à pergunta 12 “No valor do solo a expropriar, está incorporado o custo das infraestruturas coletivas existentes?” é dito que sim:
27. Em todas as páginas do Acórdão Arbitral estão identificadas as parcelas, propriedade dos Demandantes, as quais foram englobadas na avaliação;
28. A Demandante e o seu marido, apenas pagaram parte dos custos com as infraestruturas necessárias, não tendo pago o reforço de 1.000,00 € (Mil euros), que foi aprovado no ano de 2009; nem o ramal de esgoto, no montante de 500,00 € (Quinhentos euros), por parcela, no total de 1.845,00 € (Mil, oitocentos e quarenta e cinco euros) - (Doc. de fls. 35);
29. Pagamento que foi suspenso e declarado não exigível pela Demandada, atenta a perspetiva de expropriação;
30. Todas as verbas pagas pelos associados a título de infraestruturas estão aplicadas na obra em geral executada de acordo com o Plano de Pormenor, aprovado e publicado, execução dos respetivos projetos e despesas administrativas inerentes;
31. A Demandada sempre cumpriu as funções para que foi mandatada pelos associados, ou seja, aplicou a verba que lhe foi entregue, a título de infraestruturas, na execução das mesmas, nos termos dos Estatutos aprovados;
32. Os Demandados foram notificados do valor e dos parâmetros utilizados no apuramento da indemnização a pagar pela expropriação, tendo-os aceite; --
33. No valor atribuído foi considerado que as parcelas eram aptas à construção, pelo que a indemnização a receber engloba os valores pagos pelos comproprietários para a criação das infraestruturas que, já em 2011, permitiram considerar a área urbana, logo, apta à construção;
34. O que, sem os referidos pagamentos e diligências levadas a cabo pela Demandada, nunca ocorreria, por se tratar de prédio rústico, sem qualquer infraestrutura, à data da aquisição e ainda por largos anos até à aprovação do Plano de Pormenor;
35. A rua onde se situavam os “lotes” expropriados, não se encontrava asfaltada, por imposição da entidade expropriante.
Não resultaram provados quaisquer outros factos, alegados pelas partes ou instrumentais, com interesse para a decisão da causa.
**
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
A relação material controvertida prende-se com uma realidade que assolou a área metropolitana de Lisboa, na década de 60/70, em que, com “êxodo” de habitantes das províncias, nomeadamente do Alentejo, os especuladores imobiliários viram um filão na venda de “lotes” de terrenos rústicos, sem que tais terrenos pudessem ser objeto de loteamento por não reunirem os requisitos legais, mormente por não serem áreas urbanizáveis e não preencherem os requisitos para loteamento. ---
Alguns dos adquirentes de tais “lotes” sabiam que qualquer construção levada a efeito naquela área seria considerada clandestina e/ou ilegal, mas, outros, foram ao engano, nomeadamente nos últimos anos.
Tanto assim é que, os “proprietários” dos “lotes”, bem sabendo que não iriam ter arruamentos, esgotos, água canalizada, eletricidade, equipamentos públicos, etc. sujeitavam-se a viver em situação inumana, construindo quatro paredes, uma porta e um telhado, instalando na construção a sua família, para evitar a demolição da mesma.
Assim se foram construindo aglomerados habitacionais, sem quaisquer condições ou ordenamento; os chamados “Bairros Clandestinos”.
Nestas condições, repete-se inumanas e de muito sacrifício, os comproprietários - porque proprietários não eram, por terem adquirido determinados avos da área – foram-se organizando, criando Comissões e Associações, que, de forma organizada e centralizada, resolvessem os inúmeros problemas de que estes aglomerados habitacionais padeciam.
Para o efeito, os comproprietários tinham de participar com pagamento das verbas necessárias ao desenvolvimento dos projetos e à legalização de tais bairros. ---
A sua dimensão e número eram de tal forma evidentes que motivaram a publicação da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, com a qual se pretendeu ordenar o território e legalizar uma situação que durava havia demasiados anos, tendo, então sido denominadas de Áreas Urbanas de Génese Ilegal, as H’s, que proliferaram na área metropolitana de Lisboa, como se disse.
Ainda assim, o processo não era fácil, implicando o Plano de Pormenor que alguns dos comproprietários não pudessem manter os “lotes” que originariamente haviam adquirido, os quais seriam destinados a espaços verdes, vias rodoviárias, equipamentos sociais, serviços públicos, etc., porque a exigência era grande, tendo, contudo, contado com o apoio inexcedível dos municípios envolvidos. ---
Tratava-se de contrariar o velho ditado de “Quem torto nasce, tarde ou nunca se endireita”, o que não era (e ainda não é!) fácil.
É que, por um lado, tratava-se de pessoas humildes, normalmente operários fabris de fracos recursos, que tinham aplicado o mais que podiam na compra do terreno e na construção – por toda a família, pelas próprias mãos – da habitação que queriam fazer sua, pelo que atentas as quantias elevadíssimas para a sua precária situação, mas necessárias para a melhoria da sua qualidade de vida e, depois, para a legalização dos bairros, não raro, endividavam-se para fazer o pagamento das quantias aprovadas.
Tudo isso trazia grandes dificuldades ao avanço do processo, sendo certo que a Caixa Geral de Depósitos, numa exceção até a algumas normas legais e com diminuição das suas garantias de pagamento, era a única entidade bancária que concedia empréstimos para esse efeito.
Por outro lado, não obstante a vontade demonstrada pelo legislador em legalizar aquilo que tinha começado e que se tinha desenvolvido sem a observância de qualquer regra, o processo era exigente e implicava não só grandes despesas como de atos administrativos que careciam de apoio especializado em várias áreas (v.g. jurídica, arquitetura, etc.).
Para se perceber as dificuldades de legalização desta situação, basta atentar no facto de o Plano de Pormenor, neste caso, só ter sido aprovado mais de dois anos depois da publicação da referida Lei, em 1997, e de, só em 2002, ter sido possível delimitar a área da H FF 80 que lhe corresponde.
E de, ainda hoje estar em curso o processo de reconversão de avos para metros quadrados, em várias das H’s existentes no concelho do Seixal e noutros da área metropolitana de Lisboa.
É nesse contexto que, entre o ano de 1993 e o ano de 1999, a primeira Demandante e o seu marido, entretanto falecido, procedem ao pagamento das quantias aprovadas para as infraestruturas que permitissem criar o Plano de Pormenor da área e a sua reconversão de área rústica para área urbana, apta à construção.
Tendo pago apenas parte das quantias aprovadas, pelo menos até ao ano de 2009, para o efeito, uma vez que, havendo notícia de que a área onde estavam inseridos os seus “lotes”, iriam ser expropriados, a própria Demandada renunciou ao seu direito de receber as restantes quantias aprovadas e, para todos os legais efeitos, ainda em dívida, o que tem de se realçar positivamente.
O certo é que, ao contrário do que alegam os Demandantes, à data da avaliação para cálculo da indemnização a pagar aos Demandantes, foram consideradas as infraestruturas existentes na área envolvente; foi considerada a aptidão dos “lotes” para construção e, até, o valor do metro quadrado de construção na área.
Aliás, dispõe o art.º 1.º da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, alterada pela Lei n.º 165/99, de 14 de setembro; pela Lei n.º 64/2003, de 23 de agosto e pela Lei n.º 19/2008, de 20 de fevereiro, que Área Urbana de Génese Ilegal como “Os prédios ou conjuntos de prédios contíguos que, sem a competente licença de loteamento, quando legalmente exigida, tenham sido objeto de operações físicas de parcelamento destinadas à construção até à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 400/84, de 31 de dezembro, e que, nos respetivos planos municipais de ordenamento do território (PMOT) estejam classificadas como espaço urbano ou urbanizável, sem prejuízo do disposto no artigo 5.º.”.
Por seu turno, dispõe o n.º 1, do art.º 3.º, do referido diploma legal que “A reconversão urbanística do solo e a legalização das construções integradas em H constituem dever dos respetivos proprietários ou comproprietários.”, sendo certo que “O dever de reconversão inclui o dever de conformar os prédios que integram a H com o alvará de loteamento ou com o plano de pormenor de reconversão, nos termos e prazos a estabelecer pela câmara municipal.”.
Ainda nos termos do n.º 3, que o dever de reconversão inclui ainda o dever de comparticipar nas despesas de reconversão, nos termos fixados na presente lei. –
E, nos termos do n.º 4, “Os encargos com a operação de reconversão impendem sobre os titulares dos prédios abrangidos pela H, sem prejuízo do direito de regresso sobre aqueles de quem hajam adquirido quanto às importâncias em dívida no momento da sua aquisição, salvo no caso de renúncia expressa.”.
Finalmente, o n.º 5, do referido diploma legal, dispõe que “A câmara municipal tem a faculdade de suspender a ligação às redes de infra-estruturas já em funcionamento que sirvam as construções dos proprietários e comproprietários que violem o seu dever de reconversão.”.
Daqui decorre que, para que uma área seja designada por H, ela tem de possuir já o Plano de Pormenor, aprovado pela Câmara Municipal respetiva e que esteja classificada como urbana ou urbanizável, o que no caso, ocorreu no ano de 2002. –
Decorre, ainda, que as despesas necessárias à reconversão são da responsabilidade dos titulares inscritos à data da deliberação que as aprova, sem prejuízo do eventual direito de regresso a exercer contra o anterior titular, salvo no caso de renúncia expressa.
Inclusive a Câmara Municipal pode suspender a ligação às infraestruturas já em funcionamento no caso de o proprietário ou comproprietário violar os seus deveres de reconversão.
Diz-nos a experiência que há dois momentos em que as despesas são mais significativas. O primeiro, é o inicial, em que têm de ser criadas todas as infraestruturas e elaborado o Plano de Pormenor; o segundo, quando depois de criadas as condições de loteamento; da conversão de avos para metros quadrados e da divisão da coisa comum.
Naturalmente, nos termos das disposições legais aplicáveis (n.º 1, do art.º 16.º-C, da referida Lei) as comparticipações nos encargos de reconversão são consideradas provisões ou adiantamentos até à aprovação das contas finais da administração conjunta, o que só ocorrerá em qualquer H quando todo o processo de reconversão estiver terminado e não houver mais diligências a levar a efeito e, por consequência, mais despesas ou cobranças a efetuar.
Nos presentes autos, os Demandantes fazendo uma alegação temerária e a roçar a litigância de má-fé, como ela é configurada na legislação processual civil, ancoraram a sua pretensão à devolução das quantias pagas e que eram da responsabilidade dos titulares do direito de propriedade (compropriedade, à data, neste caso), nos termos legais, no facto de “jamais, desde a inscrição como sócios naquela associação, até à data indicada em 16.º, decorridos 18 anos, os terrenos foram convertidos em prédios urbanos, o que a ter acontecido teria valorizado significativamente os mesmos e, consequentemente, permitido aos Demandantes receber indemnização justa pela expropriação.”.
Ora, face a tudo o que se disse, não se compreende como podem os Demandantes produzir a alegação que produzem, quando os próprios juntam documentos que a contrariam e quando bem sabem que, desde 2002 a área foi delimitada e classificada como tal, o que implicaria, nos termos legais, que fosse considerada área urbana ou urbanizável e que as infraestruturas estavam criadas antes mesmo daquela data, por ser condição indispensável, à sua qualificação.
Aliás, se os Demandantes ali não construíram foi porque não puderam ou não quiseram, mas que essa decisão apenas dependia de si, é a realidade.
Não se analisa aqui a litigância de má-fé por se entender que, embora estejam acompanhados de Ilustre mandatária, os Demandantes estavam convictos da sua razão ao propor a presente ação, o que, não se compreendendo, se aceita.
Quanto à jóia paga pela inscrição na Associação, também não podemos aceitar a posição processual dos Demandantes, uma vez que a Demandada, ao ser criada, tinha muitos outros objetivos que, ainda hoje, assegura e persegue, nomeadamente no que se refere a equipamentos sociais, promovendo e fomentando o convívio entre todos os associados; promover atividades de índole cultural, recreativa e desportiva e incentivar o acesso a cuidados de saúde, assistência infantil e resolução de outros problemas dos seus associados, conforme consta dos seus Estatutos.
Nada alegam os Demandantes quanto ao incumprimento de tais objetivos, sendo certo que é Associado quem quer e o anterior titular do direito de propriedade dos “lotes” de que nos ocupamos, tornou-se associado da Demandada, pagando a respetiva jóia e até as quotas devidas, porque, estamos em crer, nisso viu interesse.
Pelo que, não podem os seus herdeiros vir, agora, passados que são 24 anos, pedir o reembolso da jóia paga. Vá lá que não se lembraram de pedir também a devolução das quotas pagas, na qualidade de associado do anterior titular…
No exercício dos nossos direitos, temos sempre de considerar ambos os núcleos: o moral e o legal. Neste caso, não estão preenchidas as condições que permitam dizer que um e/ou o outro foram violados.
Na verdade, atenta a legislação aplicável e tudo o que foi feito pela Demandada na prossecução dos seus múltiplos objetivos; a causa de pedir e o pedido, a presente ação estava condenada ao insucesso.
Dir-se-á finalmente que os direitos que os Demandantes exerceram contra a Demandada, deveriam ter sido exercidos no processo de expropriação, se entendessem que a indemnização arbitrada não contemplava o valor atual (em 2011) dos terrenos que herdaram e de que a primeira Demandante é também proprietária.
Não o fizeram tendo, ao que tudo indica, aceite a indemnização arbitrada – que não discutimos – pelo que lhes estava vedada a possibilidade de exercer os direitos que lhes eram conferidos no âmbito da expropriação contra a Demandada.
Assim, sem maiores indagações porque, a nosso ver, desnecessárias, não pode deixar de improceder o pedido formulado pelos Demandantes.
**
DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos invocados, decido declarar a presente ação totalmente improcedente, porque não provada, e, em consequência, absolver a Demandada do pedido contra si formulado pelos Demandantes.
**
Custas a suportar pelos Demandantes (art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro).
**
Registe.
**
Seixal, 16 de abril de 2018
(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – Art.º 131.º/5 do C.P.C.)

__________________________________
(Fernanda Carretas)