Sentença de Julgado de Paz
Processo: 564/2013-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
Data da sentença: 08/30/2013
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença
(n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)

Processo n.º x
Matéria: Responsabilidade Civil.
(alínea h) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)
Objecto: Acidente de Viação e danos decorrentes.
Valor da acção: € 4.989,86 (quatro mil novecentos e oitenta e nove euros e oitenta e seis cêntimos).
Demandante:A
Mandatário: B
Demandados: 1 - C
Mandatário: D
Demandados: 2 - E
Mandatário: F
Do requerimento inicial: fls. 1 a 14.
Pedido:fls. 13
Junta: 13 documentos .
Contestação:
1.ª Demandado: de fls. 51 a fls. 64.
2.º Demandado: de fls. 47 a fls. 49.
Tramitação:
As partes recusaram a mediação, pelo que se procedeu ao agendamento de data para realização de audiência de julgamento o dia 01 de Agosto de 2013, pelas 16h00, tendo as partes sido devidamente notificadas.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 80 a 83 e 111.
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – No dia 01 de Março de 2013, pelas 18h e 10m, ocorreu um acidente de viação na 2.ª Circular, no sentido Lisboa/Sintra, no qual foram intervenientes os seguintes veículos: ligeiro de passageiros de matrícula LE – 00, propriedade do demandante e por este conduzido; o ligeiro de passageiros de matrícula LE – 80, propriedade da empresa G, conduzido por H e ligeiro de passageiros de matrícula LO;
2 – O local do acidente configura uma reta;
3 – No dia e hora do acidente o estado do tempo era bom;
4 – À data do acidente o piso encontrava-se em bom estado de conservação;
5 – No dia e hora do acidente o tráfego naquela artéria era intenso;
6 – Na zona do acidente a artéria possuiu seis hemi – faixas de rodagem sendo três para cada um dos dois sentidos de trânsito;
7 – Os veículos identificados supra ponto 1, circulavam no mesmo sentido, todos na faixa de rodagem mais à esquerda;
8 – O veículo de matrícula LE – 00, seguia na frente do veículo de matrícula LE – 80, seguindo atrás deste o veículo de matrícula LO;
9 – Em dado momento a intensidade do tráfego obrigou o veículo de matrícula LE – 00 a parar, sendo de imediato embatido na sua traseira pelo LE – 80, que por seu turno foi embatido na sua traseira pelo LO;
10 – No momento do acidente o veículo de matrícula LO estava registado a favor de I e não tinha seguro válido e eficaz;
11 - No momento do acidente o veículo de matrícula LE – 80, havia transferido para a C a responsabilidade através do seguro de responsabilidade civil obrigatório com a apólice n.º x;
12 – A demandada C rejeitou a responsabilidade na ocorrência do sinistro e imputou a responsabilidade ao condutor do 58 – LO em 23 de Abril de 2013 (crf. Doc 5, fls. 21 dos autos);
13 – O veículo de matrícula LE – 00 foi peritado em 16 de Março de 2013 (crf. Doc 6, fls. 22 a 24);
14 - Do embate do veículo de matrícula LE – 80, no veículo de matrícula LE – 00, resultaram danos neste, cujo montante foi estimado pelo perito da demandada C em €734,11 (crf. Doc 7, fls. 25);
15 – Desde a data do acidente que o demandante está impedido de circular com a sua viatura;
16 – A impossibilidade de usar o veículo de matrícula LE – 00 obrigou o demandante a recorrer ao transporte de táxi em algumas deslocações tendo despendido a quantia de €130,75 (crf. 8 a 13, a fls. 31 a 36);
17 – O demandante reside na zona do Alto dos Moinhos, trabalha na zona do Parque das Nações, e frequenta um curso de topografia em horário pós laboral (depoimento das testemunhas J e K);
18 – A impossibilidade de usar a sua viatura nas deslocações para cumprir as rotinas diárias tem obrigado o demandante a um acréscimo de desgaste físico e psicológico;
19 – O sinistro foi participado à demandada C em 05 de março de 2013 (admitido a fls. 114 dos autos);
20 – A demandada C comunicou ao demandante a sua decisão de não assunção de responsabilidade em 23 de abril de 2013 (crf. Doc de fls. 90); 21 – O demandante e o condutor veículo de matrícula LE – 80, bem como o condutor do LO, assinaram a declaração amigável (doc 1, junto com o RI., fls. 15 e doc de fls. 92 a 94 dos autos) ;
22 – À data da propositura da presente ação o veículo de matrícula LE – 00, encontrava-se por reparar, estando imobilizado há 110 dias, estimando o demandante em €2.200,00 a indemnização por não uso.
Factos não provados.
Não se consideram provados:
1 – Que tenha sido o condutor do veículo de matrícula LO, que projetou o veículo de matrícula LE – 80 contra a traseira do veículo de matrícula LE – 00;
2 – Que por força do embate do LO na traseira do LE este foi projetado para frente embatendo única e exclusivamente por causa disso na traseira do veículo do autor;
Motivação da matéria de facto provada e não provada:
O Tribunal formou a sua convicção com base nos depoimentos produzidos em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões, parcialidade, coincidências e mais inverosimilhanças que, porventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos. Relevou o depoimento da testemunha L, que estava com o demandante dentro da viatura e que prestou depoimento claro e isento. Relevou o depoimento das testemunhas M e N, o primeiro colega de trabalho e o segundo compartilha habitação, tendo ambos assistido à alteração do quotidiano do demandante pela falta de viatura. Acresce ainda a prova documental referenciada nos respetivos factos.
Do Direito.
Questão prévia.
Da legitimidade do demandado E.
Pretende-se nos presentes autos apurar a responsabilidade dos condutores dos veículos envolvidos no acidente de viação, ocorrido no dia 01 de Março de 2013, pelas 18h e 10m, na 2.ª Circular, no sentido Lisboa/Sintra, no qual foram intervenientes os seguintes veículos: ligeiro de passageiros de matrícula LE – 00, propriedade do demandante e por este conduzido; o ligeiro de passageiros de matrícula LE – 80, propriedade da empresa G, conduzido por F e ligeiro de passageiros de matrícula LO.
Considerando que, em sede de contestação, foi arguida a ilegitimidade do demandado E, impõe-se analisar se este é, ou não, parte ilegítima, face ao disposto no DL. N.º 291/2007 de 21 de Agosto.
A legitimidade processual, pressuposto de cuja verificação depende o conhecimento do mérito da causa (artigo 288º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 63º, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho,) afere-se pelo interesse directo do autor em demandar e pelo interesse directo do réu em contradizer (artigo 26º, nº 1, do mesmo diploma) e, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (nº 3 do citado artigo 26º): há que atender à substância do pedido formulado e à concretização da causa de pedir, de tal maneira que partes legítimas na acção são os sujeitos da relação material definida através destes dois elementos.
Face aos factos dados por provados, constata-se que o veículo de matrícula LO, no momento do acidente, estava registado a favor de I e não tinha seguro obrigatório válido e eficaz (sopra ponto 10).
Relativamente à responsabilidade do E, estabelece o n.º 1, artigo 47.º do supra, referido DL. :1 — A reparação dos danos causados por responsável, desconhecido ou isento da obrigação de seguro em razão do veículo em si mesmo, ou por responsável incumpridor da obrigação de seguro de responsabilidade civil automóvel, é garantida pelo E nos termos da secção seguinte. Por seu turno, relativamente à legitimidade, estabelecem os n.ºs 1 e 2, do artigo 62.º, do mesmo diploma:
1 — As acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, quando o responsável seja conhecido e não beneficie de seguro válido e eficaz, são propostas contra o E e o responsável civil, sob pena de ilegitimidade.
2 — Quando o responsável civil por acidentes de viação for desconhecido, o lesado demanda directamente o E.
Assim, constata-se que, no caso vertente, ficou provado que o veículo de matrícula LO, não dispunha de seguro válido à data do acidente. Contudo, ficou igualmente provado que a propriedade deste estava registada em nome de I e era por este conduzido. Assim, há que concluir que, nos termos da disciplina jurídica referida há que concluir que, nesta ação, o E é parte ilegítima, procedendo a alegada exceção, ilegitimidade que desde já se declara.
Do alegado litisconsórcio necessário.
A fls. 112 e segs. dos autos, veio a demandada C, a pretexto de pronuncia sobre os documentos juntos pelo demandante a fls. 89 e 90, alegar a ilegitimidade do demandante, desacompanhado do O na presente ação, face ao pedido de indemnização que faz nos termos previstos no n.º 2 do art. 40.º do DL n.º 291/2007.
Cumpre apreciar e decidir.
Atento o disposto nos artigos 27.º e 28.º, do CPC e n.º 2 do artigo 40.º do DL n.º 291/2007, entende-se não estarem preenchidos os pressupostos do litisconsórcio obrigatório, na medida em que o n.º 2 do art. 40.º, não contem tal previsão. Acresce que, entendemos, tal disposição visa proteger os interesses do lesado, este requer apenas a parte da indemnização que lhe compete, e seu efeito útil normal, de acordo com os interesses em causa, é plenamente alcançado sem a intervenção de outros sujeitos. Assim, indefere-se a alegada exceção.
Do mérito da causa.
Pretende-se nos presentes autos apurar a responsabilidade pelos danos sofridos pelo demandante, decorrentes do acidente de viação, ocorrido no dia 01 de Março de 2013, pelas 18h e 10m, ocorreu um acidente de viação na 2.ª Circular, no sentido Lisboa/Sintra, no qual foram intervenientes os seguintes veículos: ligeiro de passageiros de matrícula LE – 00, propriedade do demandante e por este conduzido; o ligeiro de passageiros de matrícula LE – 80, propriedade da empresa G, conduzido por H e ligeiro de passageiros de matrícula LO.
Dos factos supra dados por provados resulta que o condutor do veículo ligeiro de passageiros de matrícula LE – 80, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula LE – 00, conduzido pelo seu proprietário, aqui demandante, circulavam no mesmo sentido, na mesma faixa de rodagem, numa artéria com tráfego muito intenso e que, tendo o demandante, em dado momento, devido a essa intensidade de tráfego, parado a sua viatura, o condutor do LE - 80, não conseguiu fazer o mesmo em condições de segurança. Isto é, não conseguiu imobilizar o LE - 80 sem evitar a colisão com o LE – 00 que seguia à sua frente.
Estabelece o Artigo 24.º do CE: “1 - O condutor deve regular a velocidade de modo que, atendendo às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”; por seu turno, estabelece o Artigo 18.º, também do CE: 1 - O condutor de um veículo em marcha deve manter entre o seu veículo e o que o precede a distância suficiente para evitar acidentes em caso de súbita paragem ou diminuição de velocidade deste”. Assim, violou o condutor do LE- 80, estas fundamentais regras estradais, sendo responsável pelos danos daí decorrentes, uma vez que, dos factos supra dados por provados resultam preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil, estabelecidos no art. 483.º do CC.
Ao caso dos autos aplica-se também a disciplina jurídica contida no DL. N.º 291/2007, de 21 de Agosto, já citado a propósito da questão prévia, ao qual nos referimos se outra menção não for feita.
Dos factos provados resulta que a demandada C, demandada enquanto responsável do acidente em causa nos presentes autos, não realizou a peritagem ao LE – 00 no prazo estabelecido no n.º 7, do artigo 36.º, nem comunicou a sua decisão de não assunção de responsabilidade, no prazo estabelecido, prazo que deve ser fixado conjugando o disposto na alínea e), do n.º 1, do artigo 36.º, com a alínea a), do n.º 6 do mesmo artigo, na medida em que estamos perante uma situação em que os intervenientes no acidente assinaram a declaração amigável, incorrendo, por isso, na obrigação de indemnizar o lesado.
Quanto à indemnização pedida, invoca o demandante o disposto no n.º 2, do art. 40.º . Assim, tendo ocorrido o acidente no dia 01 de Março de 2013, tendo a comunicação à demandada sido feita em 05 de Março, constata-se que fê-lo com dezasseis dias de atraso, o que atribui ao demandante o direito de reclamar da demandada a parte da indemnização que lhe compete nos termos previstos no n.º 2, do artigo 40.º, e que perfaz a quantia de €1600,00.
Quanto à reclamada indemnização por privação de uso, é hoje pacífico que o dano sofrido pelo dono de um veículo automóvel é constituído pela simples privação da possibilidade de uso do mesmo, não sendo necessário demonstrar a concreta utilização que daria ao veículo durante o período em que o não pode utilizar, a não ser que alegue outros prejuízos para além dessa privação.
Tal decorre do disposto no artigo 562.º do CC, que consagra o princípio da reconstituição natural, nos termos do qual “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”. Esta reconstituição, no caso da privação de uso de veículo pode (e deve) ser assegurada pela disponibilidade de um veículo com as características do veículo paralisado. Se tal não ocorrer, então, o dano constituído pela privação de uso deverá ser reparado através da fixação de indemnização em dinheiro, nos termos previstos no art. 566.º do CC. E, quanto a esta, não podendo ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados, conforme determina o n,º 3, do citado art. 566.º. Ora, está provado, além do mais, que o demandante se tivesse a livre disponibilidade do veículo, tê-lo-ia utilizado nas suas deslocações para o trabalho, para as aulas noturnas, ou quaisquer necessidades da sua vida pessoal ou profissional. Alega o demandante que se tivesse alugado uma viatura, o custo não seria inferior a €20,00 diários, computando o montante indemnizatório em €2.200,00, montante que entendemos razoável, justo e equitativo.
Quanto ao pedido de condenação em procuradoria, nos julgados de paz não há lugar a esta, na medida em que as custas são reguladas especificamente pela Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, pelo não é o mesmo considerado.
O mesmo sucede com o pedido de indemnização por danos morais, no montante de €125,00, por não se encontrarem provados factos susceptíveis de integrar este conceito.
Decisão.
Em face do exposto, atento eventual erro na contagem do prazo por parte do demandante, que se retifica de acordo com o supra dado por provado, considero a presente ação procedente por provada e em consequência condeno a demandada C, a pagar ao demandante a quantia de €4664,86 (quatro mil seiscentos e sessenta e quatro euros e oitenta e seis cêntimos).
Custas.
Para efeitos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero a demandada C parte vencida, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso. Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação ao demandante.
Julgado de Paz de Lisboa, em 30 de Agosto de 2013
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias