Sentença de Julgado de Paz
Processo: 9/2017-JPPRS
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: CONDOMÍNIO/PAGAMENTO DE QUOTAS ORDINÁRIAS
SEGURO E DESPESAS JUDICIAIS/EXCEÇÃO DE CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO POR PAGAMENTO OU NÃO PAGAMENTO.
Data da sentença: 05/11/2018
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
O demandante, Condomínio do edifício, sito na rua …, n.º…, NIPC. …, no concelho de Coimbra, representado pela administradora e mandatária constituída.

Requerimento Inicial: O demandante é administrado por C., a qual exerce esta função desde 6/03/2014. Na sequência constatou que os demandados são os proprietários da fração J, a qual corresponde ao 1º andar esq., destinada a habitação, garagem e arrumos, sita no r/c daquele edifício, descrita na 1ª Conservatória do registo Predial de Coimbra sob n.º …. da freguesia de …. Nos anos de 2012 e 2013 os demandados não pagaram quotas ao condomínio, assim como o seguro referente aos períodos de 2011/2012 e 2012/2013, encontrando-se em divida a quantia de 963,86€. Foi efetuado levantamento das quantias em dívida dos condóminos neste edifício, pois não existia registo de pagamentos efetuados durante o ano de 2013, do qual resultou o documento anexo á ata n.º 20. Quanto ao ano de 2012 já constava, também, do relatório de contas apresentado pela anterior administração, algumas das frações que tinham dividas. Entretanto, apresentaram comprovativos de pagamento, sendo confirmados com o registo de entradas na conta bancária do edifício, mas tal não sucedeu com os demandados, embora o seu representante legal alegue ter efetuado o pagamento integral dos valores peticionados. Para o efeito enviaram documentos e cópia de um cheque, bem como dois emails, no qual referiram um valor de 481,93€. Após análise detalhada á conta bancária do condomínio, a administradora não verifica qualquer registo de entrada dos valores mencionados, pelo que na assembleia de 14/05/204 foi deliberado que tais documentos não constituem prova de pagamento das dívidas, sendo deliberado que no ano de 2012 e ano de 2013 dos demandados têm em divida a quantia de 765,60€, deliberaram também que está em divida o valor do seguro desses anos na quantia de 198,26€, pelo que os demandados deveriam ter pago a quantia de 963,86€. O demandante tem efetuado diversas interpelações para pagarem aquela quantia, mas nada pagaram, até ao momento. Assim, a assembleia realizada a 29/04/2016, na qual estiveram representados por procurador, deliberaram que se realizasse a cobrança judicial da divida á fração J, ao qual acresce os juros de mora vencidos e vincendos, á taxa legal fixada a 4%, até efetivo e integral pagamento, além disso, deliberaram que ainda as despesas judiciais e extrajudiciais, nas quais se incluem os honorários de advogado que se fixam em 185€.

Conclui pedindo que: A) sejam condenados no pagamento das quotas ordinárias na quantia de 765,60€; B) nos seguros dos anos 201/2012 e 2012/2013 na quantia de 198,426€; C) nas despesas judiciais e extrajudiciais no que se inclui os honorários de advogado na quantia de 185€; D) tudo acrescido dos juros á taxa legal, até efetivo e integral pagamento. Junta 23 documentos.

MATÉRIA: Ação referente aos direitos e deveres dos condóminos, enquadrada no art.º 9, n.º1, alínea C) da L.J.P.

OBJETO: Pagamento de quotas ordinárias e seguro, e despesas judiciais.

VALOR DA AÇÃO:1.146,86€ (mil cento e quarenta e seis euros e oitenta e seis cêntimos)

Os demandados, A. e M., com residência conhecida na rua …, no concelho de Coimbra, representados por mandatário constituído.

Contestação: Por exceção- Efetivamente os demandados são os legítimos proprietários da fração J. Esta fração é dada de arrendamento para habitação há mais de 25 anos, desde aí as questões relacionadas com a referida fração são confiadas ao escritório de advocacia dos procuradores dos demandados, com escritório na rua …., em Coimbra. São os ditos procuradores que diligenciam pela celebração dos contratos de arrendamento, que recebem os pagamentos das rendas e emitem os recibos, e procedem aos pagamentos das despesas de condomínio. As rendas são pagas no referido escritório e recebidas pelas 2 funcionárias que ai trabalham há mais de 20 anos, sendo estas que diligenciam pelo pagamento das despesas de condomínio. Relativamente a estas, até ao ano de 2014, o pagamento foi efetuado maioritariamente em numerário, e ocasionalmente por cheque, diretamente á sócia gerente da antiga administração de condomínio, ou a pessoa da sua confiança, que rubricavam um documento no qual declaravam ter recebido tal quantia. A referida senhora, telefonava antecipadamente para o escritório, informando que iria passar ou enviar certa pessoa para receber as quantias do condomínio, sendo este o procedimento realizado durante 25 anos consecutivos, até ao ano de 2014, devido á relação de confiança com a antiga administração do condomínio e os procuradores dos demandados, uma vez que aquela era também cliente do escritório, não só a título profissional, como em questões pessoais. A 7/02/2013 um colaborador da antiga administração recebeu no escritório a quantia global de 481,93€ referente às quotas do ano de 2012 e seguro do período de 2011/2012, a qual foi paga por meio de cheque n.º …., que foi depositado na conta do demandante, a 8/02/2013 pela gerente da antiga administração. Posteriormente, a 5/09/2013 um colaborador enviado por aquela, recebeu no escritório, em numerário a quantia de 481,93€, referente às quotas do ano de 2013 e seguro de 2012/2013. A quantia foi entregue á pessoa que rubricou uma folha elaborada pelo escritório, para prova da quantia entregue e recebida. Pelo que, a antiga administração recebeu a quantia referente às quotas dos anos de 2012 e 2013, bem como os seguros, não se encontrando em divida qualquer quantia por parte dos demandados. Na referida assembleia foi, ainda, referido que a antiga administradora não procedeu ao pagamento do seguro desde 2010, nem a manutenção dos elevadores desde 2012, e que sobre a mesma havia uma suspeita de fraude, sendo proposto a eleição de nova administração, devido a atos daquela que lesaram o condomínio, proposta que foi aprovada por unanimidade dos presentes, sendo apresentado queixa-crime contra aquela administradora. Esta foi incorporada no processo de inquérito n.º …. PCBR, que corre termos no departamento de investigação e ação penal de Coimbra, no qual investigam factos que integram abuso de confiança. Neste foram incorporadas dezenas de queixas efetuadas por outros condomínios, que se consideraram lesados por ela. Por os demandados terem feito os pagamentos pelo modo referido, deve considerar-se pagas as mesmas, pelo cumprimento da obrigação, o qual constitui um facto extintivo da obrigação dos condóminos. Por impugnação, aceitam os factos com os n.º 1 a 3, 14,15, 17 e 24. Os demandados dão de arrendamento a fração J, e encarregaram os procuradores de procederem ao pagamento das despesas de condomínio, o que tem sido feito por estes e suas funcionárias há mais de 20 anos. As despesas de condomínio foram pagas á antiga administração, diretamente ou por pessoa da confiança daquela administradora, que declaravam ter recebido as quantias em documento, mas previamente aquela telefonava a dizer que iria passar ou enviar pessoa para o fazer. Este foi o procedimento adotado durante mais de 25 anos consecutivos, até 2014, o que sucedeu por aquela ser pessoa de confiança dos procuradores dos demandados, por razões de índole profissional e, também, pessoal. A 7/02/2013 um colaborador da antiga administração foi ao escritório e recebeu a quantia de 481,93€ em cheque, o qual era referente ao condomínio de 2012 e seguro de 2011/2012. Este foi depositado na conta do condomínio pela dita senhora. Posteriormente, a 5/09/2013 um colaborador enviado pela dita senhora, foi receber a quantia de 481,93€, referente ao ano de 2013 e seguro de 2012/2013, a qual foi paga em numerário, tendo aquele rubricado a folha elaborada pelo escritório. Estes documentos foram entregues á atual administração para prova dos pagamentos realizados. Assim sendo nada está em divida. A partir de 2014 os pagamentos passaram a ser realizados por cheque ou transferência bancária, uma vez que nessa altura tomou-se o conhecimento que existia uma suspeita de fraude sobre a antiga administradora, o que foi conhecido pelo envio da ata da assembleia realizada a 6/03/2014, na qual foi comunicado que a antiga administradora não tinha realizado os pagamentos do seguro do edifício desde 2010, nem a manutenção dos elevadores desde 2012, recaindo sobre ela suspeita de fraude. Nessa assembleia exoneraram a referida senhora, o que foi aprovado por unanimidade dos presentes e apresentaram queixa-crime contra ela, que foi incorporada no inquérito n.º …. PCBR, que se encontra a correr no DIAP de Coimbra, juntamente com outras dezenas de queixas de outros condomínios, que também alegam ter sido lesados por ela. Concluindo pedem: A) deve proceder a exceção de cumprimento da obrigação, com a devida absolvição; ou caso assim não se entenda, B) deve a ação ser julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se os demandados dos pedidos. Juntam 4 documentos. Requerem que o demandante junte o extrato bancário referente á conta n.º …., sediada na CGD, que reflita os movimentos do ano de 2013 e 2014.

Em resposta: No que respeita ao pagamento não se aceita a exceção de cumprimento da obrigação, nem tão pouco fizeram prova cabal do mesmo. O referido cheque não foi depositado na conta do demandante. Por outro lado, quanto ao alegado pagamento do ano de 2013, não se tratava de uma folha elaborada pelo escritório, mas sim de um email rubricado sem referência á forma de pagamento ou ao seu interveniente, os quais jamais entraram na conta do demandante, por isso não se aceita aquele documento. Assim, considera-se estar em divida as quantias referidas no r.i., cujo teor se reproduz na íntegra, impugnando-se a posição assumida pelos demandados, que esteja em contradição com o teor do r.i. Conclui pela procedência da ação, com a devida improcedência da exceção alegada. Junta 23 documentos.

TRAMITAÇÃO:

Realizou sessão de mediação sem haver acordo das partes.

As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.

O processo está isento de nulidades que o invalidem na totalidade.

O Tribunal é competente em razão do valor e da matéria.

AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO:

Foi iniciado dando cumprimento ao disposto no art.º 57,n.º1 da L.J.P., sem obter o consenso das partes, seguindo-se para produção de prova com declarações de parte da demandante, audição das testemunhas e terminando com um requerimento dos demandados, conforme ata de fls. 152 a 155.

FUNDAMENTAÇÃO

I- DOS FACTOS ASSENTES (Por Acordo):

A) O demandante é administrado por C, a qual exerce esta função desde 6/03/2014.

B) Desde então, até há atualidade, a dita senhora tem desempenhado o cargo de administradora, cumprindo todas as funções da sua competência.

C) Os demandados são os proprietários da fração J, a qual corresponde ao 1º andar esq., destinada a habitação, garagem e arrumos, sita no r/c daquele edifício, descrita na 1ª Conservatória do registo Predial de Coimbra sob n.º …. da freguesia de Stº António dos Olivais.

D) Os demandados, através do seu representante, alegam ter feito o pagamento integral das dívidas anteriores ao ano de 2014.

E)Para o efeito, enviaram á administradora uma cópia de documentos, nomeadamente um cheque ao portador datado de 7/02/2013 no valor de 481,93€, dois emails datados de 16/08/2013 que referem o valor de 481,93€.

F) Na assembleia realizada a 14/05/2014 foi deliberado que tais documentos não constituem prova de pagamento das quantias em divida.

G) Na assembleia realizada a 29/04/2016, na qual os demandados estiveram representados por procurador, foi deliberado a cobrança judicial da divida referente á fração J.

II- DOS FACTOS PROVADOS:

1)Após a exoneração da anterior administração do demandante, na assembleia realizada a 6/03/2014, a atual administração efetuou o levantamento de todas as quantias dos condóminos em divida até ao final de 2013, documento 1, junto de fls. 8 a 11, cujo conteúdo se dá reproduzido.

2)Pois não existia registos de pagamento efetuados naquele ano.

3)A maioria dos condóminos registavam divida até ao final daquele ano, documento 1, a fls. 11.

4) As frações I, K, L, N, O e P apresentaram os respetivos comprovativos de pagamento das quantias em divida, confirmados com os registos de entrada na conta bancária do demandante.

5)Os demandados, através do seu representante legal, alegam ter feito o pagamento integral das dívidas anteriores ao ano de 2014.

6)A administradora não verificou qualquer registo de entrada dos valores mencionados naqueles documentos.

7)Na assembleia realizada a 14/05/2014 foi deliberado que tais documentos não constituem prova de pagamento das quantias em divida, documento 2, junto de fls. 12 a 14.

8)Foi apurado o total em divida da fração J, no valor total de 963,86€, conforme documento 2.

9)Referente às quotas de 2012 e 2013, no valor de 765,60€.

10)E, referente ao seguro do condomínio do período entre 2011/2012 e 2012/2013 no montante global de 198,26€, conforme documento 2.

11)A administradora efetuou diversas interpelações e diligências, para os demandados, conforme documentos juntos de fls. 33 a 39.

12)Na assembleia realizada a 29/04/2016, na qual os demandados estiveram representados por procurador, foi deliberado a cobrança judicial da divida respeitante á fração J, documento 23, junto de fls. 41 a 42, cujo conteúdo se dá reproduzido.

13)A referida fração J é dada de arrendamento para habitação há mais de 25 anos.

14)As questões relacionadas com o arrendamento desta fração são confiadas ao escritório de advocacia dos procuradores dos demandantes, sito na rua …., em Coimbra.

15)São os procuradores que diligenciam pela celebração dos contratos de arrendamento que recebem os pagamentos das rendas e emitem os respetivos recibos, e procedem ao pagamento das despesas do condomínio.

16)As rendas são pagas no referido escritório e recebidas pelas funcionárias deste, as quais aí trabalham há mais de 20 anos.

17)São as funcionárias que diligenciam pelo pagamento das despesas do condomínio, da responsabilidade dos demandados.

18)Até ao ano de 2014 a maioria dos pagamentos eram feitos em numerário e ocasionalmente em cheque, diretamente á sócia gerente da antiga administração do condomínio, …., Lda., ou a pessoa da sua confiança e por si indigitava.

19)A socia gerente da antiga administração, Dra. C., telefonava antecipadamente para o escritório dos procuradores a informar que iria passar ou enviar pessoa da sua confiança, que identificava, para receber as quantias devidas ao condomínio.

20)Este foi o procedimento adotado para efetuar os pagamentos das despesas do condomínio da responsabilidade dos demandados, durante 25 anos consecutivos, até ao ano de 2014.

21)O que sucedeu devido á relação de confiança que existia entre a antiga sócia gerente da administração do condomínio e os procuradores dos demandados.

22)Com efeito aquela era também cliente do escritório dos procuradores, em questões de índole profissional, e também de índole pessoal.

23)A 7/02/2013 um colaborador da antiga administração foi ao escritório e recebeu a quantia global de 481,93€, referentes ás quotas do ano de 2012 e 99,13€ do seguro do edifício do período entre 2011/2012.

24)A referida quantia foi entregue por meio de cheque n.º …., a qual foi levantada pela sócia gerente do condomínio, C., documento 1 da contestação, junto a fls. 103 a 104.

25)E, destinava a ser depositada na conta bancária do demandante n.º …., documento 1 e 3 da contestação, junto a fls. 103 a 105.

26)A 5/09/2013 um colaborador, enviado pela antiga administradora, recebeu no escritório dos procuradores a quantia global de 481,93€, referente ás quotas do ano de 2013 e ao seguro do edifício no período entre 20112/2013, documento 4 da contestação, junto a fls. 106.

27)A quando da entrega da referida quantia, em numerário, a pessoa em causa rubricou a folha, apresentada pelo escritório dos procuradores, para prova do recebimento da quantia, documento 4 da contestação, junto a fls. 106.

28)A antiga administração recebeu as quantias referentes ás quotas dos anos de 2012 e 2013, bem como os seguros dos períodos de 2011/2012 e 2012/2013.

29)Pelo que não se encontra qualquer quantia em divida.

30)A partir do ano de 2014, todos os pagamentos foram realizados por cheque ou transferência bancária.

31)Pois tomaram conhecimento que existia suspeita de fraude sobre a antiga administradora da anterior administração.

32)O que souberam através da ata de condomínio realizada na 6/03/2014, documento 1 do r.i, junto de fls. 8 a 11.

33)Nessa assembleia foi comunicado aos condóminos que a anterior administração não havia procedido aos pagamentos do seguro desde setembro/2010 e ao pagamento da manutenção dos elevadores desde 2012, documento 1 do r.i, junto de fls. 8 a 11.

34)Nessa assembleia, foi proposto a exoneração da antiga administração pela prática de actos que lesaram o condomínio e suspeita de fraude, documento 1 do r.i, junto de fls. 8 a 11.

35)A proposta foi colocada a votação e aprovada por unanimidade dos presentes, documento 1 do r.i, junto de fls. 8 a 11.

36)Em consequência foi apresentada queixa-crime contra a anterior administração.

37)A qual foi incorporada nos autos de inquérito n.º ….PCBR, que corre termos no DIAP de Coimbra.

38)No qual, foram incorporadas outras queixas por várias administrações de condomínio que, alegam ter sido lesadas pela sócia gerente daquela administração.

MOTIVAÇÃO:

O Tribunal sustenta a decisão com base na análise crítica dos documentos juntos pelas partes, os quais foram conjugados com a prova testemunhal, considerada em regra como credível, as regras da experiência comum e regras de repartição do ónus da prova.

A administradora do condomínio prestou declarações nos termos do art.º 57, n.º1 da L.J.P., tendo conhecimento dos factos que sucederam desde que passou a ser a responsável pela administração. Esclareceu que também apresentaram queixa-crime, na qual já depôs, no que referiu esta situação, assim como tudo o que verificavam estar em falta. Quanto ao extrato da conta do condomínio verificou existir movimentos estranhos desta conta para outros condomínios, assim como de outros para este condomínio. Explicou, ainda, que neste condomínio era só a antiga administradora que geria as contas, e que a mesma esteve envolvida em situações de jogo, daí o descalabro da situação. Admite que o condomínio viveu uma situação grave, pois pensavam ter tudo em dia e tiveram de emitir quotas extra por causa de dívidas que desconheciam, como é o caso dos elevadores. Referiu que esta situação foi decidida em assembleia, por isso surgiu a ação. Esta embora seja parte, teve um depoimento claro, esclarecedor e isento, pelo que auxiliou na prova dos factos com os n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,10, 11, 12, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37 e 38.

A testemunha, J., é o procurador dos demandados há mais de 25 anos, motivo pelo qual tem conhecimento direto dos factos. Referiu que foi por eles encarregue da fração, tratando dos arrendamentos, rendas pagamentos de IMI, despesas de condomínio, e tudo mais necessário. A anterior administradora era também cliente dele, quer por motivos pessoais, quer por motivos profissionais, pois geria na zona de Coimbra mais de 50 condomínios. Tinha confiança na pessoa, pois até ao início de 2014 nunca teve motivo para desconfiar, no entanto nessa altura começou a agir de forma estranha, foi quando deixaram de a patrocinar. Quanto aos demandados foi dado ordem de pagamento do ano de 2013, o que fez por meio de cheque, mas a maioria das vezes era mesmo em numerário, por isso quando aquela telefonou a dizer que iam buscar o pagamento, não estranhou procederam como das outras vezes, só que ela não entregou o recibo, como costumava fazer, embora sempre demorasse a fazê-lo. O seu depoimento foi claro, esclarecedor e isento. Auxiliando na prova dos factos n.º 5,12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37 e 38.

A testemunha, S., é funcionária do escritório do procurador, há mais de 20 anos, tendo conhecimento pessoal dos factos devido á sua atividade. O seu depoimento foi claro e isento. Explicou como se processou durante o tempo em que trabalha no escritório as relações entre o casal, ora demandado, e a antiga administração. Esclareceu que é o escritório que gerem tudo o que diz respeito a esta fração, desde arrendamentos, as despesas, aos recebimentos, e na sua maioria são as funcionarias que o fazem. Teve um depoimento claro e isento, explicando o que sucedeu em relação ás quantias peticionadas, auxiliando na prova dos factos com os n.º 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30 e 31.

A testemunha, M., é funcionária do escritório do procurador há mais de 20 anos, tendo conhecimento pessoal dos factos pela atividade que aí exerce. O seu depoimento foi claro e isento. Explicou como se processou durante o tempo em que trabalha no escritório as relações entre o casal, ora demandado, e a antiga administração. Esclareceu que é o escritório que gerem tudo o que diz respeito a esta fração, desde arrendamentos, as despesas, aos recebimentos, e na sua maioria são as funcionarias que o fazem, de acordo com as instruções dos procuradores. Foram elas que durante anos diretamente trataram dos pagamentos da fração J, pois os senhores são emigrantes. Teve um depoimento claro e isento, explicando o que sucedeu em relação ás quantias peticionadas, auxiliando na prova dos factos n.º 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30 e 31.

III- DO DIREITO:

O caso em apreço prende-se com o que vulgarmente se designa por quotas de condomínio.

Questões: excepção de cumprimento da obrigação por pagamento ou não pagamento.

Compete aos condóminos suportar as despesas e serviços comuns do edifício (art.º 1421 do C.C.), desde que devidamente aprovadas pela assembleia de condóminos.

No caso em apreço as partes não colocam em causa que a assembleia de condóminos tenha aprovado, de forma regular, as quotas ordinárias que estão a ser peticionadas aos demandados.

Na realidade, neste edifício ocorreu uma mudança de administração, note-se que faz parte das funções que são atribuídas por lei ao administrador, enquanto órgão executivo, cobrar as receitas, ou sejam as quotas (art.º 1436 alíneas d) e e) do C.C.).

No âmbito das respectivas funções, a nova administradora verificou as contas do edifício e detectou várias irregularidades, tal como é referido na ata 23 da assembleia de condóminos realizada a 15/01/2015, e desse facto deu conhecimento á assembleia, a qual no caso dos demandados entendeu proceder á cobrança judicial das quotas que estão a ser peticionadas nos presentes autos.

Foi apurado que os demandados são condóminos ausentes (art.º 1432, n.º 9 do C.C.) nomeadamente estão emigrados, mas constituíram um procurador legal, para tratar de todos os assuntos relativos á fração J.

Quer isto dizer que são os procuradores, por mandatado representativo (art.º 1157 e 258 do C.C.) atribuído por daqueles, que exercem junto da assembleia de condóminos a função que em concreto competia aos demandados, nomeadamente participar nas votações, impugnar as deliberações e acatar as mesmas, desde que devidamente aprovadas.

Em relação ao ano de 2013, está provado que os demandados, através do seu procurador, no escritório de advocacia deste, procedeu ao pagamento da quantia de 481,93 €, por meio de cheque, documento junto a fls. 28 e 103 a 104.

Ora o cheque é um meio de pagamento, e somente após boa cobrança se pode dizer que o pagamento foi realizado.

No caso concreto, pela análise do verso deste documento, a fls. 104, constata-se que a referida quantia foi levantada pela pessoa que todos descreveram como sendo a antiga administradora do condomínio demandante. Conclusão a que se chegou pois tratava-se de um cheque ao portador, emitido a 7/02/2013, o qual tinha no verso a identidade da pessoa que procedeu á apresentação do mesmo, C., bem como o n.º de conta onde devia ser creditado, e dele não consta qualquer carimbo bancário que indiciasse existir falta de verba na conta.

Todavia, pela análise dos extratos bancários referentes aos anos de 2013 e 2014, juntas de fls. 131 a 151, constata-se que a referida quantia de 481,93€, não entrou na conta do condomínio.

Na verdade, se analisarmos os extratos de conta dos anos de 2013 e 2014, podemos verificar que foram realizados alguns movimentos muito estranhos. Nomeadamente, verifica-se que houve transferências de outro condomínio para o condomínio demandante, e também que houve depósitos de outros condomínios para este, é o caso do documento a fls. 137, referente ao mês de julho/2013, assim como no mês de setembro/2013, e dezembro/2013, movimentos que não se realizaram somente nestes meses, mas também noutros.

Perante tais factos, não pode ser imputado aos demandados que não tenham procedido ao pagamento da quantia referente às quotas ordinárias e respetivo seguro do ano de 2011/2012, uma vez que a verba saiu daquela conta, mas terá sido usada para um fim estranho á mesma. Aliás, se há a imputar qualquer responsabilidade por este facto é em relação há pessoa que usou a verba para um fim diferente daquele que lhe foi confiado.

Na realidade, o administrador desempenha a função de gerir o condomínio (art.º 1430 e 1436 do C.C.), o que deve fazer segundo as indicações da assembleia de condóminos. No entanto, se não exercer cabalmente a função, tal não pode ser imputado á assembleia, a qual é um órgão distinto, e muito menos aos condóminos em termos individuais, mas apenas a quem se desviou do caminho que lhe foi previamente indicado e para o qual foi eleito.

Quanto ao ano de 2013, foi, igualmente, provado que a antiga administradora, tinha por hábito telefonar para o escritório ou enviava email, da pessoa que exercia o cargo de procurador dos demandados, facto que era do seu conhecimento pessoal á largos anos, avisando que iria um colaborador seu, buscar o pagamento do condomínio referente á fração J.

Ora mais uma vez isso se passou, e como de costume as funcionárias do procurador entregaram a quantia ao senhor que, também, já conheciam, limitando-se aquele a rubricar o documento, junto a fls. 106, que lhe foi apresentado, como sinal de que se tinha ali deslocado para ir buscar a verba que lhes fora indicada como correspondente aquela fração.

Este foi o procedimento habitual durante anos, pelo que não estranharam o procedimento, até porque até este momento não havia razões que levassem o procurador dos demandados a agir de outra forma, pelo que de boa-fé entregaram a quantia que lhes estava a ser solicitada para pagar as quotas e o seguro do ano de 2012/2013 da fração J.

Porém, pela análise do extrato bancário do condomínio, verifica-se que mais uma vez aquela verba não entrou nas contas deste, e não sabem onde foi parar uma vez que foi pago em numerário, pelo que não se consegue seguir o rasto da quantia.

Ora os demandados não devem ser penalizados por factos que em nada contribuíram. Acresce que esta situação não é o mesmo que não tenham procedido ao respetivo pagamento, após serem interpelados para o efeito, pois está provado que o seu procurador agiu em representação deles, da mesma forma tal como fazia há largos anos, ou seja, entregou as verbas peticionadas para efeitos de pagamento, confiando que á mesma seria dado o destino indicado.

Para além disso, foi admitido pela atual administradora, como resulta, também, da ata da assembleia de condóminos realizada a 14/05/2014, que estes movimentos estranhos, fizeram suspeitar os condóminos de desvios de verbas, motivo pelo qual a exoneraram das funções e apresentaram queixa-crime contra a dita senhora, conforme aquela admitiu ter prestado declarações no âmbito dos autos de inquérito n.º …., PCBR.

Do exposto se extrai a conclusão que aquela pessoa não terá exercido a função para a qual foi eleita em termos adequados e de forma diligente, por isso não deve ser imputado aos demandados a falta da quantia peticionada nos autos, mas sim á antiga administradora do condomínio demandante, que extraviou as verbas que lhe foram entregues.

DECISÃO:

Nos termos expostos, julga-se a ação improcedente, e procedente a exceção de cumprimento da obrigação, absolvendo-se assim os demandados dos pedidos.

CUSTAS:

São da responsabilidade do demandante na quantia de 35€ (trinta e cinco euros), a realizar no prazo de 3 dias úteis, sob pena da aplicação da sobretaxa diária no valor de 10€ (dez euros).

Em relação aos demandados proceda-se em conformidade com o art.º 9 da Portaria n.º 1456 de 28/12.

Proferida e notificada nos termos do art.º 60, n.º 2 da L.J.P.

Coimbra, 11 de maio de 2018

A Juíza de Paz
(redigido pela signatária, art.º 131, n.º5 do C.P.C.

(Margarida Simplício)