Sentença de Julgado de Paz
Processo: 70/2014-JP
Relator: LUIS FILIPE GUERRA
Descritores: DIREITOS E DEVERES DOS CONDÓMINOS
Data da sentença: 01/05/2015
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

Proc. nº 70/2014

I. RELATÓRIO:
A, com os demais sinais identificativos nos autos, propôs a presente acção declarativa resultante de direitos e deveres de condóminos contra B, na qualidade de administradora do condomínio do prédio urbano sito na Rua C, na cidade do Porto, melhor identificada a fls. 45, pedindo a notificação da demandada para apresentar a documentação em falta, a fim de que possa aferir-se se os montantes apresentados nos relatórios de contas correspondem ou não à verdade e para que os condóminos fiquem cientes de que não estão a ser prejudicados no seu património.
Para tanto, o demandante alegou os factos constantes do requerimento inicial de fls. 2 a 4, que aqui se dão por reproduzidos, tendo juntado ao mesmo quatro documentos.
Regularmente citada, a demandada apresentou a contestação de fls. 29 a 36, que aqui se dá por reproduzida, arguindo a ilegitimidade do demandante, pugnando pela improcedência da acção e pedindo a sua condenação como litigante de má fé.
Realizou-se a sessão de pré-mediação, logo seguida da mediação, mas as partes não lograram chegar a acordo.
Foi, por isso, marcada e realizada a audiência de julgamento, segundo as regras legais.
Começando por apreciar as questões que se prendem com a regularidade da instância, temos que este julgado de paz é competente em razão do objecto, do valor, da matéria e do território (cfr. artigos 6º nº 1, 8º, 9º nº 1 c) e 11º nº 1 da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho).
Por outro lado, as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias.
Porém, no que respeita à legitimidade das partes, a questão é mais complexa, sendo certo que a demandada suscitou a ilegitimidade do demandante, tendo o tribunal que se pronunciar desde já sobre esta questão:
O artigo 1405º, nº 1 do Código Civil dispõe que os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas e nos termos dos artigos seguintes. Neste caso, a pretensão do demandante assenta, em abstracto, no direito à informação do condómino, na modalidade de direito ao exame dos documentos que suportam as contas do condomínio. Trata-se de um direito que se pode retirar, por um lado, do disposto no artigo 1436º j) do Código Civil e, por outro, da aplicação analógica do artigo 214º e segs. do Código das Sociedades Comerciais (cfr. artigo 10º do Código Civil). Por sua vez, os artigos 573º a 575º do Código Civil dão também corpo ao direito à informação, nomeadamente no que respeita à concreta pretensão deduzida pelo demandante.
Porém, se bem que a demandada seja parte legítima na presente acção, por efeito do disposto no artigo 1437º, nº 2 do Código Civil, este é um caso de litisconsórcio necessário activo, por força do disposto no citado artigo 1405º, nº 1 do Código Civil (cfr. artigo 33º, nº 1 do Código de Processo Civil). De facto, os direitos que cabem ao proprietário singular têm de ser exercidos em conjunto pelos comproprietários. Por outro lado, neste caso, não parece possível convidar a parte a suprir a falta de legitimidade, nos termos dos artigos 6º e 278º, nº 3 do CPC, mediante a dedução do respectivo incidente de intervenção de terceiro, porque o artigo 39º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 54/2013, de 31 de Julho, se opõe a essa solução, uma vez que não admite o litisconsórcio sucessivo, mas apenas o inicial, salvo para regularizar uma situação de litisconsórcio necessário, o que tem de ocorrer no prazo de dez dias após a decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa.
Assim sendo, sem prejuízo do disposto na parte final deste último preceito legal, considero o demandante, parte ilegítima e, consequentemente, absolvo a demandada da instância (cfr. artigo 278º, nº 1 d) do CPC).
Custas pelo demandante (cfr. artigo 8º da Portaria nº 1456/2001, de 28 de Dezembro).
Registe e notifique.
Porto, 5 de Janeiro de 2015

O Juiz de Paz,
(Luís Filipe Guerra)