Sentença de Julgado de Paz
Processo: 43/2016-JP
Relator: ELISA FLORES
Descritores: AÇÃO POSSESSÓRIA (USUCAPIÃO)
Data da sentença: 11/02/2016
Julgado de Paz de : TAROUCA
Decisão Texto Integral:
ATA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
Ao segundo dia do mês de novembro de 2016, pelas 09:15h, no Julgado de Paz do Agrupamento de Concelhos de Tarouca, Armamar, Castro Daire, Lamego, Moimenta, e Resende na data designada para a realização da Audiência de Julgamento do Proc. nº 43/2016-JP, em que são partes:
Demandantes: AA e AB;
Ilustre Mandatário dos Demandantes: Dr. C, com procuração nos autos a fls. 8, com poderes especiais;
1ºs Demandados: D e E;
2ºs Demandados: F e G.
No início da sessão encontrava-se presente apenas o ilustre mandatário dos demandantes.
Presidiu à diligência a M. ª Juíza de Paz: Dr.ª Elisa Flores.
Técnica de Apoio Administrativo: Maria Gomes.
Aberta a Audiência, a M.ª Juíza proferiu a sentença anexa à presente ata e que dela faz parte integrante.
Tendo sido proferida em Audiência de Julgamento, o Ilustre Mandatário do demandante disse ficar ciente e considerar-se notificado.
Para constar se lavrou esta Ata que, depois de verificada, vai ser assinada.
Elisa Flores (Juíza de Paz)
Maria Gomes (Técnica de Apoio Administrativo)
SENTENÇA
RELATÓRIO
AA e AB, propuseram contra D e E, e F e G, a presente ação declarativa, enquadrada na alínea e) do n.º 1 do artigo 9º da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, pedindo o reconhecimento do direito de propriedade e que se declare que a parcela dos demandantes, apesar de estes não figurarem como comproprietários do prédio rústico inscrito na matriz cadastral da freguesia de Várzea de Abrunhais sob o artigo xx6-D, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº xx67/20120202, constitui, hoje, um prédio distinto e absolutamente autónomo da parte restante, com a configuração constante do artigo 5º do requerimento inicial.
Para o efeito, alegaram os factos constantes do requerimento inicial de fls. 1 a 3 e juntaram 4 documentos, que aqui se dão por reproduzidos.
Os demandados, regular e pessoalmente citados, não apresentaram contestação e faltaram reiteradamente à Audiência de Julgamento e não justificaram as respetivas faltas.
Valor da ação: 5 000,00€ (cinco mil euros).
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Consideram-se provados os seguintes factos:
1.º- Encontra-se inscrito na matriz cadastral da freguesia de Várzea de Abrunhais, concelho de Lamego sob o artigo xx6-D, em nome dos demandados, na proporção de 1/2 para cada um, o prédio rústico de cultura de regadio e árvores de fruto, sito no lugar do xxxxxx;
2.º- E também descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº xx67/20120202 da freguesia de Várzea de Abrunhais e ali inscrito sob a Ap. xx6 de2015/11/18, na mesma proporção de 1/2 para cada um dos demandados, ou seja, de F casado com G, e D casado com E;
3.º- No entanto, os demandantes são donos e legítimos proprietários de uma parcela de terreno nesse prédio rústico, com 918 m2, que veio à sua posse no ano de 1985, por doação verbal dos pais da demandante mulher, H e I;
4.º- E nessa data, há mais 30 anos, os ante possuidores, doaram, dividiram e demarcaram materialmente em três parcelas o prédio rústico descrito no nº 1.º supra, entre a demandante e os demandados, com a configuração constante do Levantamento Topográfico junto aos autos;
5.º- Sendo que a parcela dos demandantes, identificada no Levantamento Topográfico como Parcela A, tem a seguinte composição: Prédio rústico de cultura de regadio e árvores de fruto, com a área de 918 m2, a confrontar do Norte e Nascente com F e D, e do Sul e do Poente com caminho público;
6.º- Em 11 de maio de 1996 os demandantes casaram entre si, com convenção antenupcial tendo sido estipulado o regime de comunhão geral de bens;
7.º- Ao longo de mais 30 anos, a demandante e posteriormente também o marido, ora demandante, têm vindo a possuir esta parcela, distinta, autónoma e devidamente demarcada, cultivando e colhendo todos os frutos que a terra dá nas épocas própria;
8.º- Considerando-se, por si e por todos, como seus únicos donos;
9.º- De forma pública, pacífica, contínua, sem a menor interrupção;
10.º- De boa-fé eà vista de toda a gente, sem oposição de ninguém e na convicção de que lhes assiste tal direito;
11.º- Agindo uns e outros sobre as partes que lhes pertencem, por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade de que se arrogam.
Motivação dos factos provados:
Atendeu-se aos documentos dos autos, nomeadamente o Levantamento Topográfico, e à não oposição dos demandados, consubstanciada na ausência de contestação e nas faltas reiteradas à Audiência de Julgamento.
Factos não provados e respetiva motivação:
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelos demandantes por falta de mobilidade probatória.
Fundamentação dedireito:
Os demandados, pessoal e regularmente citados, não apresentaram contestação, não compareceram à Audiência de Julgamento, e não justificaram as respetivas faltas, pelo que, de acordo com o disposto no nº 2 do artigo 58º, por força do disposto nos nºs 3 e 4 do mesmo artigo, da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 2º da Lei nº 54/2013, de 31 de julho, consideram-se confessados os factos articulados pelos demandantes.
Os demandantes visam com a presente ação adquirir por usucapião uma parcela do prédio descrito no nº1.º da factualidade assente, identificada como Parcela A no Levantamento Topográfico e descrita no nº 5 supra, por dele se ter autonomizado.
Apurado ficou que desde 1985 aquele imóvel se encontra dividido, informalmente, em três prédios perfeitamente autónomos, individualizados e demarcados, passando a demandante desde então e mais tarde também o marido, a explorar exclusivamente a sua parcela, com a configuração que hoje tem.
Sendo que estes, por si e pelos seus antecessores, se encontram já há mais de 30 anos na sua posse, posse não titulada, atendendo a que se tratou de doação verbal.
E têm exercido a posse, por forma correspondente ao direito de propriedade, assumindo-se como legítimos proprietários, e praticando atos correspondentes ao exercício desse direito;
O instituto da usucapião tem eficácia constitutiva, permitindo adquirir o direito sobre o qual foi constituída, e liga-se à posse, pública e pacífica, como um dos seus efeitos (cf. 1287º, 1297º e 1300º, todos do C. Civil).
E tem de se prolongar, de forma contínua, por um determinado prazo. Na situação dos autos, a mesma tem uma duração temporal largamente superior à legalmente exigida, uma vez que se trata de posse de boa-fé (cf. 1296º também do C. Civil).
A posse é pública se é exercida de modo a que todos aqueles que possam invocar um direito contraditório com a coisa possam ter conhecimento dela. E é pacífica se adquirida sem violência. No caso dos autos resulta que a posse dos demandantes preenchem ambos os requisitos.
E presume-se que quem pratica os atos materiais, o “corpus”, tem igualmente o “animuspossidendi”, presunção que não foi elidida pelos demandados.
Mas a mesma não opera, contudo, automaticamente, pelo mero decurso do prazo, necessita de ser invocada.
Assim sendo, o exercício efetivo e com carácter de reiteração, público e de boa-fé, da posse da parcela por estes, como titulares de um direito de propriedade, por mais de vinte anos, confere-lhes o direito de adquirir esse mesmo direito, nos termos do artigo 1287º e seguintes do C. Civil, por se encontrarem preenchidos os seus requisitos.
Por outro lado, é a jurisprudência maioritária de que não são impedimento as regras que visam evitar o fracionamento excessivo de prédios rústicos, porque cedem perante os direitos adquiridos por usucapião, forma de aquisição originária da propriedade (cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12/01/2006, P. nº 0536437, inwww.dgsi.pt).
Decisão:
Em face do exposto, julgo a ação procedente, por provada, e em consequência:
a) Declaro que pertence exclusivamente aos demandantes, AA e AB, por se ter autonomizado, por via da usucapião, do prédio originário, prédio rústico inscrito na matriz cadastral da freguesia de Várzea de Abrunhais sob o artigo xx6-D, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº xx67/20120202, o seguinte prédio, identificado no Levantamento Topográfico como Parcela A:
- Prédio rústico de cultura de regadio e árvores de fruto, com a área de 918 m2, a confrontar do Norte e Nascente com F e D, e do Sul e do Poente com caminho público;
b) Condeno os demandados no reconhecimento e aceitação da constituição e existência deste prédio referido na alínea antecedente [a)] como autónomo e distinto do prédio rústico originário, assim como o direito de propriedade exclusiva dos demandantes sobre o mesmo.
Dada a natureza do processo, custas totais pelos demandantes.
Registe e notifique.

Tarouca, 2 de novembro de 2016
A Juíza de Paz, Elisa Flores
Processado por computador (artigo 131º/5 do C.P.C.)