Sentença de Julgado de Paz
Processo: 88/2017-JPCNF
Relator: LUÍSA ALMEIDA SOARES
Descritores: UM CONTRATO COM REGRAS DE DOIS CONTRATOS ONEROSOS: O DE COMPRA E VENDA DO MATERIAL FUNERÁRIO
- SINALAGMÁTICO E COM EFICÁCIA REAL
- E O DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
Data da sentença: 05/11/2018
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral: Processo n.º 88/2017-JP
SENTENÇA
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I. RELATÓRIO
A) IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, LDA, sociedade por quotas com o NIPC --------------, com sede na Rua --------------, Funchal.

Demandado: B, portador do cartão de cidadão n.º -----------, válido até 06.09.2020, com o NIF -------------, com residência conhecida na Rua ------------------- – Camacha, Santa Cruz.
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B) PEDIDO
A Demandante propôs contra o Demandado a presente ação declarativa enquadrada na alínea i) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, peticionando a condenação desta no pagamento de €1.289,27 (mil duzentos e oitenta e nove euros e vinte e sete cêntimos), sendo €1.260,00 (mil duzentos e sessenta euros) a título de capital e 29,27€ (vinte e nove euros e vinte e sete cêntimos) a título de juros de mora já vencidos à data da propositura da presente ação, acrescidos de juros de mora vincendos até integral e completo pagamento.
Peticiona ainda a Demandante a condenação do Demandado em todas as custas de parte que terá de suportar para ser ressarcida dos valores em dívida.
Alegou para tanto os factos constantes do requerimento inicial, de fls. 2. a 5.
Juntou 5 (cinco) documentos.

O Demandado foi declarado ausente, tendo-lhe sido nomeado defensor oficioso que, regularmente citado, não apresentou contestação escrita.

A questão em análise não foi submetida a mediação, por ter sido declarada a ausência do Demandado.
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II- SANEAMENTO
Estão reunidos os pressupostos da estabilidade da instância: o Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer.
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III- VALOR DA AÇÃO
Fixa-se em €1.289,27 (mil duzentos e oitenta e nove euros e vinte e sete cêntimos) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.ºs 1 e 2, 299.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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IV – OBJETO DO LITÍGIO
O objeto litígio entre as partes circunscreve-se ao (in)cumprimento pelo Demandado das suas obrigações decorrentes do contrato celebrado com a Demandante.
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V – QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos importa apreciar do incumprimento pelo Demandado das suas obrigações decorrentes do contrato celebrado com a Demandante, nomeadamente o pagamento dos bens vendidos e dos serviços prestados e, na negativa, as consequências resultantes do mesmo.
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VI - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, de acordo com a prova documental carreada para os autos, resultaram os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS
1. A Demandante é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à prestação de serviços na área funerária.
2. No desenvolvimento da sua atividade, a pedido do Demandado, a Demandante forneceu-lhe diversos bens e prestou-lhe serviços, constantes da fatura 6/382 emitida em 23.07.2016, com vencimento no dia 22.08.2016, no valor de €1.260,00 (mil duzentos e sessenta euros).
3. Os bens e serviços referidos em 2. foram entregues e prestados ao Demandado.
4. A Demandante, através do seu Mandatário, em 08.02.2017 escreveu uma carta ao Demandado onde solicitava o pagamento da fatura referida em 2., dando-lhe prazo de 10 dias e sob cominação de recurso judicial.
5. Até à presente data o Demandado não liquidou o valor referido em 2.

FACTOS NÃO PROVADOS
6. A carta referida em 4. foi enviada ao Demandado registada com aviso de receção.
7. A carta referida em 4. veio devolvida.
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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Para a convicção formada, conducente aos factos julgados provados em 1 a 5, concorreu o teor dos documentos juntos aos autos e a não prova de factos contrários pelo Demandado.
Os factos dados como não provados em 6. e 7. assim foram considerados atenta a ausência de prova pela Demandante a quem competia de acordo com o ónus da prova (artigo 342.º do Código Civil). Pese embora tenha junto impressos preenchidos (quer AR, quer aviso de receção), nenhum deles tem aposto carimbo de envio e nessa medida não pode considerar-se provado que tal tenha sido feito.
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VII – ENQUADRAMENTO JURÍDICO LEGAL
Entre as partes foi celebrado um contrato com regras de dois contratos onerosos: o de compra e venda do material funerário, - sinalagmático e com eficácia real, - e o de prestação de serviços, designadamente a transladação de cadáver para o cemitério (cfr. artigos 408.º, 876.º e seguintes, 1207.º e seguintes, todos do Código Civil).
Trata-se de uma união de contratos, dependentes entre si, bilateralmente, porque assim foi a vontade das partes, mas em que nenhum deles perde a sua individualidade (cf. artigo 405.º, n.º 2 do Código Civil).
Desta união de contratos resultam efeitos obrigacionais recíprocos: para uma das partes, a entrega dos bens funerários (véu, urna, flores e outros) e o serviço de transladação de cadáver para o cemitério e transporte em carro mortuário, e para a outra, a obrigação do pagamento (cf. artigos 879.º, 882.º, 1208.º e 1211.º do mesmo Código).
Nos termos do artigo 762.º do Código Civil, o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado e o contrato deverá ser pontualmente cumprido por ambos os contraentes (cf. artigo 406.º do mesmo diploma legal).
No caso em apreço, só a Demandante cumpriu, fornecendo os bens e executando os serviços descritos na fatura 6/382, em conformidade com o que foi convencionado, sem qualquer reclamação e que o Demandado não liquidou, nem alegou, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado pela Demandante à quantia em dívida.
Faltando culposamente ao cumprimento da obrigação o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo-lhe o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua (cf. artigos 798.º e 799.º do Código Civil), o que aqui não se verificou.
Se a obrigação tiver prazo certo e a prestação não for efetuada no tempo devido, por causa imputável ao devedor, fica este constituído em mora, tornando-se responsável pela reparação dos danos causados ao credor pela demora na prestação (artigos 804.º n.ºs 1 e 2 e 805.º, n.º 2 a) do Código Civil).
Tendo a obrigação natureza pecuniária, e nada tendo sido estipulado em contrário, tais danos corresponderão aos juros legais, contabilizados desde o dia da constituição em mora (artigo 806.º, n.º 1 do Código Civil).
Assente a existência de mora, torna-se necessário determinar o momento a partir do qual ela opera.
Dispõe o artigo 805.º, n.º 1, do Código Civil, que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
Porém, o n.º 2 do mesmo preceito, na sua alínea a), estabelece que, independentemente de interpelação há mora do devedor se a obrigação tiver prazo certo.
Assim, sobre a quantia em dívida são devidos juros moratórios, à taxa legal e contados desde a data de vencimento da fatura (22.08.2016) até integral pagamento.
Pelo que, a Demandante tem direito ao pagamento do preço dos bens adquiridos e serviços prestados ao Demandado, que se mostra em falta, acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa de juro legal contados desde a data de vencimento da fatura (22.08.2016) até integral pagamento.
Atento o exposto, tendo a Demandante peticionado juros sobre o capital em dívida desde a data de vencimento da fatura (22.08.2016) até efetivo e integral pagamento, pelas razões expostas, tem forçosamente tal pedido de proceder.
Assim, procedem os pedidos de condenação do Demandado no que respeita ao capital em dívida e juros de mora.
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Peticiona ainda a Demandante a condenação do Demandado em todas as custas de parte que terá de suportar para ser ressarcida dos valores em dívida.
Nos termos do disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho, o Código de Processo Civil é aplicável subsidiariamente nos Julgados de Paz, não o sendo em tudo quanto se mostre incompatível entre os dois diplomas.
Os Julgados de Paz têm uma lei própria quanto a custas, a Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro, onde as custas correspondem a uma taxa fixa de 70,00€ por cada processo tramitado, não prevendo outro valor. E será nos termos da Portaria citada, que as custas serão fixadas na presente sentença, não tendo aplicação o Regulamento das Custas Processuais, nem o disposto nos artigos 529.º n.º 4 e 533.º do Código de Processo Civil, improcedendo nesta parte o pedido.
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VIII- DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência decido:
a) Condenar o Demandado B no pagamento à Demandante A, LDA da quantia de €1.260,00 (mil duzentos e sessenta euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde 22.08.2016, à taxa legal até integral e efetivo pagamento.
b) Absolver Demandado B do demais peticionado.
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IX – RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
As custas serão suportadas pelo Demandado B, que se declara parte vencida, nos termos e para os efeitos dos n.ºs 8.º e 10.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28-12 (o n.º 10 com a redação dada pelo artigo único da Portaria n.º 209/2005, de 24-02), com custas totais €70,00 (setenta euros) a seu cargo, sem prejuízo da isenção de que beneficia por ter sido declarado ausente (alínea l) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Judiciais e Deliberação n.º 5/2011, do Conselho dos Julgados de Paz, de 8 de fevereiro de 2011).
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Proceda à devolução de 35,00€ à Demandante A, Lda, NIPC ---------, nos termos do artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28/12.
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Cumpra o disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho.

Registe e notifique.
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Funchal, 11 de maio de 2018

A Juíza de Paz


Luísa Almeida Soares
(Art.º 31 n.º 5 CPC/Art.º 18 LJP)