Sentença de Julgado de Paz
Processo: 30/2017-JPPRT
Relator: LUÍS FILIPE GUERRA
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL – ÓNUS DA PROVA – DIREITO DE REGRESSO
Data da sentença: 03/29/2018
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

I. RELATÓRIO:
A, com os demais sinais identificativos nos autos, intentou a presente ação declarativa respeitante à responsabilidade civil extracontratual contra B, melhor identificado a fls. 2, pedindo a condenação do mesmo a pagar-lhe a quantia de 3.543,30 €, acrescida de IVA, à taxa legal em vigor, referente à reparação do seu veículo, bem como a pagar-lhe o montante indemnizatório de 750,00 € respeitante aos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da privação do veículo das despesas médicas.
Para tanto, o demandante alegou os factos constantes do requerimento inicial de fls. 2 e 3, que aqui se dá por reproduzido, tendo juntado ao mesmo três documentos.
Regularmente citado, o demandado apresentou a contestação de fls. 14 a 18, que aqui se dá por reproduzido, pugnando pela improcedência da ação e requerendo a intervenção acessória provocada da sua seguradora, C.
Foi admitido o chamamento da referida seguradora, tendo a mesma vindo a apresentar a contestação de fls. 30 a 34, que aqui se dá por reproduzida, oferecendo o merecimento aos autos.
Não se realizou a sessão de pré-mediação, dado que o demandado afastou expressamente essa possibilidade.
Foi, por isso, marcada e realizada a audiência de julgamento, segundo as regras legais.

II. SANEAMENTO DO PROCESSO:
Verificam-se os pressupostos de regularidade da instância, nomeadamente:
Este julgado de paz é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território (artigos 6º nº 1, 8º, 9º nº 1 h) e 12º nº 2, respetivamente, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho).
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras nulidades, exceções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
Isto posto, fixa-se o valor da presente ação em 4.293,30 €.
Assim, cabe apreciar e decidir:

III. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA:
Discutida a causa, ficaram provados os seguintes factos:
1. No dia 15 de Novembro de 2016, pelas 12.30h, na Rua Z, na cidade do Porto, ocorreu um acidente de viação entre o veículo motociclo, com a matrícula FF, conduzido pelo demandante, e o demandado, enquanto peão.
2. No local do acidente existem quatro vias de trânsito, três no sentido Palácio de Cristal/Rotunda da Boavista e uma no sentido contrário, sendo por esta que circulava o veículo do demandante.
3. O acidente deu-se cerca de cem metros após o demandante ter iniciado a marcha, com a abertura do sinal verde no semáforo da Rotunda da Boavista (Praça Mouzinho de Albuquerque), em direção ao Palácio de Cristal e a pouco mais de 50 metros da passadeira que existe mais à frente, junto à Confeitaria Z.
4. O demandante deparou-se com um peão, ora demandado, já no meio da via de trânsito por onde seguia, a efetuar a travessia da mesma fora da passadeira.
5. De imediato, o demandante reduziu a velocidade e buzinou, mas o demandado continuou a travessia da via, tapando-lhe a passagem, dado haver carros estacionados à sua direita, não conseguindo aquele evitar a colisão.
6. Na sequência do embate, tanto o demandante como o demandado caíram e sofreram ferimentos, tendo sido ambos transportados de ambulância para o Hospital de Santo António.
7. A Polícia de Segurança Pública deslocou-se ao local e tomou conta da ocorrência.
8. Em consequência do referido acidente, o demandante sofreu variados hematomas e teve que ser suturado com cinco pontos no sobrolho esquerdo, tendo ficado com o olho fechado durante cinco dias.
9. O motociclo acima identificado era o meio de transporte habitual do demandante para o trabalho e ficou sem condições de segurança para circular desde a data do acidente até à sua reparação cerca de mês e meio depois.
10. A reparação do referido motociclo teve um custo não concretamente apurado.
11. O demandante colheu o demandado quando este, já após haver transposto as três vias de trânsito no sentido Palácio de Cristal-Rotunda da Boavista, completava a travessia da quarta via de trânsito, no sentido contrário, da Rua Júlio Dinis.
12. O estado do tempo era bom e o local é uma reta com grande visibilidade.
13. O demandado celebrou com a Z, atualmente denominada C., um contrato de seguro multirriscos, titulado pela apólice nº 0, mediante o qual transferiu para esta a responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos por si causados a terceiros por atos ou omissões cometidos no decurso da sua vida privada.
14. O referido contrato encontrava-se válido e em vigor à data dos factos acima descritos.
15. A cobertura dos danos decorrentes da responsabilidade civil extracontratual do demandado ficava excluída, entre outros, no caso de atos intencionais ou temerários das pessoas cuja responsabilidade era garantida, bem como os praticados em estado de inconsciência voluntariamente adquirida.
16. O capital máximo em risco para a cobertura de responsabilidade civil familiar correspondia ao valor de 25.000,00 €, com uma franquia contratualmente estabelecida com o tomador do seguro no montante de 100,00 €.
17. Antes do acidente acima descrito, o demandado vinha a circular a pé pelo passeio situado do lado esquerdo da Rua Júlio Dinis, atento o sentido de marcha do motociclo do demandante, quando decidiu proceder ao atravessamento da referida artéria.
18. O demandado desceu daquele passeio e atravessou a via destinada à circulação de transportes públicos e ciclomotores e, em seguida, atravessou ambas as vias destinadas ao trânsito automóvel em geral, fazendo-o pelo meio dos veículos que ali se encontravam imobilizados.
19. Os referidos veículos imobilizados encobriram o demandado, não sendo o mesmo visualizável pelo demandante.

Os factos provados assentam quer no acordo das partes (n.os 1 e 2) quer, em especial nos depoimentos tanto do demandante como do demandado, com base nos quais foi possível reconstituir a dinâmica do acidente, percebendo-se que este último atravessou a Rua Júlio Dinis, no sentido este-oeste, quando o trânsito estava parado no semáforo vermelho, por entre os carros imobilizados no sentido Palácio de Cristal-Rotunda da Boavista, posto o que iniciou a travessia da última via de trânsito que lhe faltava cruzar, no momento em que o demandante já ali circulava a pouca distância, provindo da Rotunda da Boavista, impossibilitando a este evitar a colisão, apesar do sinal sonoro e da travagem a que o mesmo recorreu, tendo ambos caído ao solo, com a subsequente perda de consciência do demandado, que só soube que tinha sido colhido por um motociclo já no hospital, uma vez que não o viu aproximar-se. Também foi possível apurar que o demandante arrancara momentos antes da Rotunda da Boavista, depois da abertura do sinal verde. Em qualquer caso, foram também valorados criticamente os depoimentos das testemunhas D, amigo do demandado, E, gestor de sinistros, e F, perito averiguador, tendo este último sido determinante para estabelecer a distância para as passadeiras mais próximas a partir do local do acidente e confirmar a versão das partes, enquanto os outros dois pouco trouxeram de relevante para a descoberta da verdade.
Finalmente, foram também valorados os documentos constantes dos autos, nomeadamente o auto policial de participação de acidente e a apólice de seguro (condições gerais e particulares).
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa, mormente que o demandante circulasse com velocidade excessiva e de forma imprudente, que o demandado tivesse atravessado a rua a menos de cinquenta metros da passadeira mais próxima e que não tivesse olhado para a direita quando iniciou a travessia da via de trânsito por onde circulava o demandante, nem que este tivesse suportado o custo da reparação do motociclo, no montante de 3.543,30 €.

IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA:
O artigo 483º do Código Civil estabelece o princípio geral da responsabilidade civil extracontratual. Deste preceito legal, em conjugação com o artigo 563º do mesmo código, pode-se concluir que a responsabilidade civil depende da verificação cumulativa de cinco requisitos: o facto, a ilicitude, a culpa, os danos e o nexo de causalidade entre o facto ilícito e estes últimos. A culpa é, porém, dispensada nos casos de responsabilidade pelo risco (cfr. artigos 503º e 506º do Código Civil).
Neste caso, o facto é o acidente de viação aqui em apreço e a ilicitude do mesmo decorre desde logo de ofender a integridade física do demandante e danificar o veículo que este conduzia, além de resultar de uma infração ao Código da Estrada, como se explicita mais adiante.
Por outro lado, o artigo 487º, nº 1 do Código Civil faz recair sobre o lesado o ónus da prova da culpa do lesante, salvo havendo presunção legal de culpa. Neste caso, não intervém aqui qualquer presunção legal de culpa, já que não foram alegados nem provados os factos de que a lei retira a mesma (cfr. artigo 350º do Código Civil). No entanto, verificada a prática de infração às regras do Código da Estrada que seja causal do acidente, pode-se presumir a culpa do respetivo infrator (cfr. artigo 351º do Código Civil). Ora, por um lado, os artigos 12º, nº 1 e 24º, nº 1 do Código da Estrada prescrevem, respetivamente, que “os condutores não podem iniciar ou retomar a marcha sem assinalarem com a necessária antecedência a sua intenção e sem adotarem as precauções necessárias para evitar qualquer acidente” e que “o condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente”; e por outro, o artigo 101º, n.os 1 a 3 do Código da Estrada estipula que “Os peões não podem atravessar a faixa de rodagem sem previamente se certificarem de que, tendo em conta a distância que os separa dos veículos que nela transitam e a respetiva velocidade, o podem fazer sem perigo de acidente; o atravessamento da faixa de rodagem deve fazer-se o mais rapidamente possível;
os peões só podem atravessar a faixa de rodagem nas passagens especialmente sinalizadas para esse efeito ou, quando nenhuma exista a uma distância inferior a 50 m, perpendicularmente ao eixo da faixa de rodagem”.

Além disso, o artigo 1º, al. q) do Código da Estrada define o conceito de utilizadores vulneráveis: “peões e velocípedes, em particular, crianças, idosos, grávidas, pessoas com mobilidade reduzida ou pessoas com deficiência”.
Procurando subsumir a factualidade apurada às normas jurídicas acima transcritas, não se pode imputar ao demandante a violação das regras dos artigos 12º, nº 1 e 24º, nº 1 do Código da Estrada, desde logo porque este foi surpreendido pelo surgimento do demandado, de entre os veículos que circulavam em sentido contrário, tendo travado e buzinado, sem conseguir, contudo, evitar o embate. Assim, quando retomou a sua marcha, com a mudança do sinal luminoso para verde, na Rotunda da Boavista, não era visível nem previsível o atravessamento da via pelo demandado. Além disso, o demandante circulou apenas cerca de cem metros até ao embate, pelo que não é crível que o mesmo seguisse em velocidade excessiva, como o demandado sustentou não a partir de dados da perceção, mas sim por dedução “a posteriori”. De resto, para a tese do demandado ser sustentável, no sentido de que o motociclo ainda não tinha retomado a sua marcha quando iniciou a travessia da via, aquele teria que percorrer a distância que o separava de si em breves segundos, já que uma via de pouco mais de três metros de largura se atravessa normalmente nesse lapso de tempo. Ora, para isso, o demandante precisava de ter percorrido essa distância à velocidade média aproximada de 100km/h, o que é difícil de conceber atendendo a que o motociclo retomara a sua marcha cerca de cem metros antes e que, nesse caso, o demandado teria necessariamente que o ouvir. Além disso, se assim fosse, o rasto de travagem do motociclo seria certamente mais longo, a sua queda mais estrepitosa e a sua imobilização a maior distância.
Na verdade, discutida a causa, ficou a ideia que o demandado não se apercebeu da aproximação do motociclo, mas que tinha todas as condições para o poder fazer, uma vez que o mesmo já se encontrava a rolar na sua via de trânsito quando aquele iniciou o atravessamento da mesma. De qualquer modo, o facto de o demandado não ter visto a aproximação do motociclo não significa por si só que não tenha olhado antes de iniciar a travessia da referida via, uma vez que o olhar o pode ter traído, bastando, para isso, que tenha colocado a mira mais além ou mais aquém do local onde estava o motociclo naquele instante. De resto, o demandado depôs no sentido de ter olhado para a sua direita antes de ter invadido a via de trânsito por onde circulava o motociclo, sendo o seu depoimento verosímil nessa parte. Nessa conformidade, o demandado foi o único responsável pelo acidente em apreço, por ter desrespeitado o comando do artigo 101º, nº 1 do Código da Estrada (mas já não o nº 3 do mesmo preceito legal, uma vez que não se provou que houvesse passadeira a menos de cinquenta metros do local da travessia).
Isto posto, definido o caráter ilícito e culposo (sob a forma negligente) da conduta do demandado, resta apreciar, por um lado, a extensão dos danos causados ao demandante e, por outro, a cobertura destes pelo contrato de seguro que o mesmo tinha celebrado com a assistente.
No que respeita aos danos, deve desde logo referir-se que o demandante não logrou provar que fosse o proprietário do motociclo por si conduzido. Na verdade, no auto policial de participação de acidente surge identificado como proprietário do referido motociclo pessoa diferente do demandante, aparentemente seu irmão (face à coincidência de apelidos). Aliás, o demandante referiu, no seu depoimento, que o motociclo tinha um valor estimativo porque era do seu irmão. Ora, para que essa informação conste do auto policial é porque o motociclo está registado em nome do citado G, derivando daí uma presunção de propriedade que não foi ilidida. Nessa medida, o demandante carece de legitimidade para deduzir o pedido de indemnização referente aos danos materiais causados ao referido veículo, já que não foi ele o lesado. É certo que poderia ter sido o demandante a suportar o custo da reparação do motociclo, estando ele desembolsado do respetivo valor, mas essa factualidade não foi alegada nem se provou. Deste modo, nessa parte, não pode o pedido indemnizatório deduzido pelo demandante proceder. De resto, também não se provou o montante desse prejuízo, tanto mais que o orçamento apresentado foi impugnado e que não se demonstrou que o motociclo tivesse sido reparado na mesma oficina que elaborou aquele.
Por seu turno, é evidente, face às consequências pessoais que o acidente teve para o demandante e tendo em conta o disposto no artigo 496º, nº 1 do Código Civil, que o demandante tem direito a uma compensação pecuniária pelos danos não patrimoniais por si sofridos. O valor da compensação deve ser fixado por equidade, atendendo aos critérios fixados no artigo 494º do Código Civil, por remissão do nº 3 do artigo 496º do mesmo código. Neste caso, o demandante pediu o valor indemnizatório global de 750,00 €, tanto para os danos não patrimoniais como para os danos patrimoniais, decorrentes da privação do veículo e das despesas médicas, pelo que importa determinar uns e outros. Ora, o demandante não fez qualquer prova de ter suportado despesas médicas, já que se apurou apenas que o mesmo foi tratado em regime de ambulatório no Centro Hospitalar do Porto. Por outro lado, o demandante esteve privado do uso do referido motociclo durante cerca de mês e meio, sendo esse o seu meio de transporte habitual (mas não o único disponível, uma vez que tem um veículo automóvel usado normalmente pela sua esposa, segundo o mesmo admitiu no seu depoimento). A este respeito, é nossa opinião, na esteira de doutrina e jurisprudência significativas (cfr. A. S. Abrantes Geraldes. Temas da Responsabilidade Civil, Vol. I., 3ª edição, Coimbra, Almedina, 2007, págs. 59 e ss.) que o lesado não tem que provar a existência de lucros cessantes para ser ressarcido do dano de privação do uso. Basta que o lesado prove que fazia uso do veículo para que exista um prejuízo patrimonial decorrente da privação das utilidades que o mesmo lhe proporcionava. Se o lesado provar, além disso, que teve lucros cessantes, então o seu dano será substancialmente superior. Porém, na ausência destes, o valor do dano de privação do uso não é, ainda assim, sempre igual, já que será necessário indagar que tipo de utilização fazia o lesado do veículo e, portanto, qual a falta que o mesmo lhe faz. Deste modo, tudo ponderado, afigura-se equitativo fixar o valor indemnizatório devido pela privação do uso em 225,00 € (5,00 € x 45 dias). Neste caso, não obsta ao ressarcimento do demandante o facto de o mesmo não ser o proprietário do motociclo, já que era ele o seu utilizador habitual, designadamente por lhe ter sido cedido pelo seu titular, sendo, portanto, o lesado pela sua imobilização forçada.
Deste modo, por exclusão de partes, a compensação pecuniária pedida pelo demandante pelos seus danos não patrimoniais cifra-se em 525,00 €. Ora, esse valor é aceitável à luz dos critérios legais, considerando as injúrias corporais sofridas pelo mesmo e os tratamentos a que teve que se submeter.
Finalmente, o demandado alegou e provou que tinha transferido para a assistente a obrigação de indemnização decorrente da sua responsabilidade civil extracontratual. Por sua vez, esta declinou a mesma, invocando que se verificava uma causa de exclusão contratual, concretamente a prática de atos intencionais ou temerários das pessoas cuja responsabilidade se garante. Contudo, o contrato não fornece uma definição do que se deve entender por atos intencionais ou temerários, pelo que se tem que recorrer ao seu significado comum. Desde logo, o ato ilícito praticado pelo demandado não foi intencional, já que este não visou causar danos ao demandante, sendo os mesmos resultantes da sua conduta negligente. Por outro lado, o adjetivo “temerário” significa “ousado perante um perigo quase certo; audacioso; intrépido; arrojado” e ainda “que corre riscos considerados desnecessários; arriscado; perigoso; imprudente” (cfr. https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/temer%C3%A1rio). Deste modo, não parece que se possa entender que o atravessamento de uma via citadina, fora da passadeira, sem que houvesse obrigação legal de usar a mesma, constitua um ato temerário. A conduta do demandado foi certamente negligente, porque o mesmo podia e devia ter previsto que o seu atravessamento cortaria a linha de marcha do motociclo conduzido pelo demandante, mas não se retira daí que houvesse um perigo quase certo de atropelamento por ter atravessado a rua naquele local. Por outro lado, atravessar uma rua urbana não é por si só um ato audacioso, intrépido, arrojado, arriscado ou perigoso, dependendo muito das condições em que se faz. Neste caso, o demandado aproveitou-se do facto do trânsito estar parado perante o semáforo vermelho para iniciar a travessia, pelo que não se afigura que a sua conduta tenha sido imprudente ao ponto de constituir uma temeridade. Nessa medida, não se verifica a exclusão contratual invocada pela assistente, devendo a mesma garantir o risco por si assumido até ao montante dos danos causados pelo demandado ao demandante.

V. DECISÃO:
Nestes termos, julgo a presente ação parcialmente procedente e provada e, consequentemente, condeno o demandado a pagar ao demandante a quantia indemnizatória global de 750,00 € (setecentos e cinquenta euros), sem prejuízo do seu direito de regresso em relação à assistente, mas absolvendo-o do demais peticionado.
Custas por demandante e demandado na proporção do respetivo decaimento, fixando as mesmas em 80% para o primeiro e 20% para o segundo (cfr. artigos 607º, nº 6 do CPC e 8º da Portaria nº 1456/2001, de 28 de Dezembro).
Registe e notifique.
Porto, 29 de Março de 2018

O Juiz de Paz,


(Luís Filipe Guerra)