Sentença de Julgado de Paz
Processo: 456/2013-JP
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
Data da sentença: 08/01/2013
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral:
Sentença
(n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)

Processo n.º x
Matéria: Responsabilidade civil contratual e extracontratual.
(alínea h) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho)
Objecto:. Pedido de indemnização por interrupção de trânsito.
Valor da acção: € 540,00 (Quinhentos e quarenta euros).
Demandante: A
Mandatário:B
Demandados: C
Do requerimento inicial: de fls. 1 a fls. 5.
Pedido: a fls. 4.
Junta: 7 documentos.
Contestação: Não foi apresentada Contestação.
Tramitação:
Foi realizada sessão de mediação em 30 de maio de 2013, não tendo as partes logrado obtenção de acordo susceptível de pôr fim ao litigio, pelo que foi marcada audiência para o dia 21 de junho de 2013, pelas 13:00h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito.
Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 36 a 38.
Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – A demandante é concessionária de serviço de transportes públicos de passageiros de superfície;
2 – No exercício da sua atividade está subordinada ao cumprimento dos horários aprovados para as respetivas carreiras;
3 – No dia 16 de março de 2013, operava ao serviço público na carreira x, chapa x, o x número x propriedade da demandante, doravante designado apenas x;
4 – Cerca das 13:25horas, quando o x n.º x circulava no largo da boa Hora (à Ajuda), em Lisboa, com destino à x, efetuando o percurso de recolha, a sua marcha foi interrompida por obstrução do Veículo de matrícula BG , com registo de propriedade, à data dos fatos, a favor da demandada;
5 – O BG encontrava-se estacionado de forma a impedir a marcha do x, tendo sido removido pelo reboque da PSP (crf. Docs 1,2,3,4 e 5, a fls. 14 a 18);
6 – O BG estava estacionado, numa zona em que a via circunscreve uma ligeira curva, desalinhado relativamente aos dois veículos estacionados de ambos os lados do BG (crf. Doc 4 fls. 17);
7 – A obstrução da via pelo GB obrigou o x n.º x, da carreira x, chapa x, a ficar imobilizado no local da obstrução (Largo da Boa Hora, à Ajuda, durante uma hora e dez minutos;
8 – Devido à impossibilidade do x n.º x prosseguir a sua marcha o x com chapas x, da mesma carreira, ficou igualmente impedido de prosseguir a sua marcha (crf. Doc. 2 e 3, fls. 16 e 17);
9 – Os horários a cumprir por ambos os xx nas três paragens seguintes, até ao local de recolha, chegaram com o atraso correspondente ao tempo em que ficaram com a passagem obstruída;
10 - A demandante fez deslocar ao local um técnico de controle e comando de tráfego;
11 – No período da paralisação o guarda freio não pode desempenhar a sua função, nomeadamente a eventual venda de bilhetes;
12 – A demandante estima em €90,00 o prejuízo relativo à venda dos bilhetes;
13 – O incumprimento dos horários origina reclamações e insatisfação dos utentes;
14 – A demandante sentiu-se ofendida na sua imagem pelo atraso com que os xx chegaram às paragens seguintes;
15 – A demandante estima em €80,00 as despesas decorrentes do acionamento do sistema de controle de tráfego e da deslocação do técnico;
16 – A demandante estima em €250,00 o dano moral decorrente violação da boa imagem de cumpridora dos horários estabelecidos para as paragens dos dois elétricos em causa;
17 – A demandante estima em €120,00 o prejuízo económico decorrente da alteração dos horários de trabalho dos x x.
Com relevância para a decisão da causa não se considera não provados quaisquer factos.
Para tanto concorreram as declarações das partes proferidas em audiência, o depoimento das testemunhas apresentadas pela demandante e os documentos junto aos autos e indicados nos respetivos factos.
Do Direito.
Na presente acção, visa-se efectivar a responsabilidade civil por facto ilícito.
Exige-se, pois, que se mostrem preenchidos os pressupostos daquele tipo de responsabilidade previstos no artº 483º, nº 1 do CC: o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, pressupostos de cuja verificação, simultânea, depende a existência da responsabilidade civil extracontratual ou por factos ilícitos. Neste tipo de responsabilidade, a culpa não se presume, a não ser nos casos especialmente previstos na lei. É o que resulta do disposto no nº 1 do artº 487º. Um desses casos é o previsto no artº 493º, nº 1, segundo o qual, quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel com o dever de a vigiar, e bem assim tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua. Se é o agente que provoca os danos com o emprego das coisas, então vigora o regime geral da responsabilidade civil. Como ensina o Prof. Antunes Varela, se a responsabilidade assenta sobre a ideia de que não foram tomadas as medidas de precaução necessárias para evitar o dano, a precaução recai em pleno sobre a pessoa que detém a coisa. Essa pessoa será, por via de regra, o proprietário. No caso, está provado que o veículo em causa nos presentes autos (veículo de matrícula BG), foi estacionado, pela demandada, no Largo da Boa Hora (à Ajuda), em Lisboa, em violação do disposto no n.2 do artigo 3.º, do CE (2 As pessoas devem abster-se de actos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança ou a comodidade dos utentes das vias.), e que tal infração provocou a interrupção da marcha de dois x, provocando um atraso de uma hora e dez minutos, nas respetivas paragens, com as consequências resultantes dos factos supra dados por provados.
Quanto ao preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil supra enunciados, da matéria de facto provada resulta que houve uma infração ao CE, da qual resultou prejuízos para a demandante, sendo de imputar os factos ilícitos à proprietária do veículo em causa, pelas razões já explicitadas. Contudo, os valores indemnizatórios reclamados, resultam de uma estimativa feita pela demandante, não só relativamente aos danos materiais quanto morais.
Quanto à fixação do montante relativo aos danos materiais, estipula o n.º 3, do artigo 566.º, do Código Civil, que “Se não poder ser averiguado o valor exato dos danos (como é o caso, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provado”.
Quanto aos danos morais, rege o disposto no art.º 496º, n.º1, do mesmo diploma legal, onde se estipula que “na fixação da indemnização pelos danos não patrimoniais deve atender-se àqueles que, pela sua gravidade, aferida em termos objectivos, mereçam a tutela do direito”. O montante pecuniário desta indemnização deve fixar-se, também, equitativamente, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias a que se reporta o artigo 494º, ex vi art.º 496º, n.º 3, 1ª parte, do mesmo diploma, ambos do Código Civil. Deste modo, as circunstâncias a que, em qualquer caso, o artigo 496º, nº 3, do citado diploma, manda atender são o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. No caso dos autos não se coloca em dúvida que existam danos morais, que assumem uma gravidade bastante para justificar a fixação duma indemnização. Ou seja, no estado atual das sociedades contemporâneas, incluindo a nossa, a exigência do cidadão relativamente à prestação do serviço público é cada vez maior, sendo a pressão social sobre as empresas que prestam serviços públicos, quaisquer que sejam, é proporcional. Deste modo, qualquer cidadão que, por cometimento de uma infração impeça o prestador de um serviço público de cumprir cabalmente as obrigações que lhe competem, deve ser censurado também proporcionalmente. No caso, da audição das partes resultou claro que, a demandada, ao invés de reconhecer a sua falta, desenvolveu uma narrativa, acompanhada de documentos, no sentido de fazer crer que quem “estava mal era o x que não devia passado àquela hora”. O não reconhecimento da infração é, no caso, valorado negativamente por este tribunal, face à evidência da mesma. Deste modo e em conformidade com o supra exposto, entende-se justo e equitativo os montantes pedidos pela demandada, quer a título de danos materiais quer a título de danos morais.
Decisão.
Em face do exposto, considero a presente ação procedente por provada e em consequência condeno a demandada a pagar à demandante a quantia de €540,00 (quinhentos e quarenta euros), acrescidos de juros à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento conforme pedido.
Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero a demandada parte vencida, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso.
Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação à demandante.
Julgado de Paz de Lisboa, em 01 de Agosto de 2013
A Juíza de Paz
Maria Judite Matias