Sentença de Julgado de Paz
Processo: 37/2017-JPBMT
Relator: JOSÉ JOÃO BRUM
Descritores: CONTRATO PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
Data da sentença: 12/15/2017
Julgado de Paz de : BELMONTE
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
(arts. 26.º, n.º 1 e 57.º da Lei n.º 78/2001, de 13/07 – LJP, na redação da Lei n.º 54/2013 de 31/07)

Identificação das partes:

Demandante: A, casado, portador do Cartão de Cidadão n.º X, válido até 23/04/19, com o NIF n.º X, residente na Rua X Belmonte, acompanhado pelo Dr. B, Advogado, portador da cédula profissional n.º X, com escritório na Rua X, Belmonte, munido de Procuração com Poderes Especiais junta a fls. 60 dos autos.
Demandados: C, divorciado, com o NIF n.º X, residente na Rua X, Amadora, por si, e em representação de D, casada, com o NIF n.º X, residente na mesma morada, munido de Procuração com Poderes Especiais junta a fls. 46 dos autos.

OBJETO DO LITÍGIO:
O Demandante veio propor contra os Demandados a presente ação declarativa de condenação, nos termos do art. 9º, n.º 1 al. i) da Lei n.º 78/2001 de 13/07, na redação da Lei n.º 54/2013 de 31/07, pedindo:
a) Condenação dos Demandados no pagamento da quantia de €1 015,00 (mil e quinze euros) pela conceção de um Projeto de Arquitetura com Alterações de uma edificação sita na Rua X, Belmonte.
b) Condenação dos Demandados por Litigância de Má Fé em multa e indemnização condigna a favor do Demandante em montante a fixar pelo Tribunal não inferior a 6 UCs.
Para tanto, alegou o Demandante exercer a atividade profissional de Arquiteto e ter sido contatado pelos Demandados para a elaboração de projeto de arquitetura para a habitação destes, sita em Belmonte, para ser apresentado na Câmara Municipal de X.
Por vicissitudes existentes na obra, mais concretamente, existência de obras ilegais por falta de licenciamento, foi necessário proceder a um conjunto de alterações ao projeto, não procedendo os Demandados ao pagamento integral dos trabalhos realizados, considerando o Demandante ter ficado lesado no valor que peticiona nos presentes autos.
Juntou Dezanove (19) documentos que se encontram a fls. 4, 4V, 5 a 9, 9V, 10, 11 a 13, 13V, 14 e 70 a 125 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos. Valor da ação: €1 015,00 (mil e quinze euros).
Foi apresentada Contestação, junta a fls. 30, 30V, 31e 31V, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos pelo Primeiro Demandado, tendo a Segunda Demandada a ela aderido, através de Requerimento apresentado a fls. 52 dos autos. Em síntese, admitem a celebração de um contrato de prestação de serviços para a elaboração de um projeto de reabilitação do imóvel, sito na Rua X em Belmonte. Relatam que em maio de 2015 o local foi visitado para avaliação das obras a realizar. No dia 25/06/15 foi enviado e-mail contendo o orçamento referente aos projetos de alterações e obras com prazo de execução de 30 dias. No dia 01/10/15 procederam a um pagamento parcial do valor de €420,00 (quatrocentos e vinte euros). Em janeiro de 2016 o Demandado e Demandante deslocaram-se à câmara Municipal de X para levantar os documentos necessários ao projeto de arquitetura. Alega o Demandado, que desde essa data, o Demandante apenas com ele contatou casualmente, em agosto de 2016, onde foi informado da necessidade de proceder a alterações. Em 5 de dezembro, face à ausência de notícias por parte do Demandante, o Demandado entendeu prescindir dos serviços do Demandante por terem sido ultrapassados os prazos acordados para a execução dos trabalhos, quer o fixado no primeiro orçamento, 30 dias, quer do segundo que estipulava 60 dias para a realização do trabalho. Acresce, ainda, que não recebeu até à data de apresentação do seu articulado de defesa, 27/03/17, o projeto alegadamente elaborado pelo Demandante. Conclui dizendo que o Demandante não prestou os serviços acordados, pugnando desta forma pela improcedência da ação. Por fim, considera o Demandado que o Demandante deverá ser condenado em multa e indemnização a arbitrar por este Tribunal. Juntou Procuração Forense com Poderes Especiais a fls. 46 dos autos e cinco (5) documentos a fls. 32, 32V, 33 e 33V dos autos. O Demandante, no Requerimento Inicial, prescindiu da realização da Sessão de Pré-Mediação, conforme lhe permite o art.º 49º, n.º 1 da Lei dos Julgados de Paz.
Foram realizadas duas Sessões de Julgamento nos dias 25/09/17 e 26/10/17. Produzida a prova, e concedida a palavra para breves alegações, profere-se a seguinte sentença na data previamente agendada para o efeito. O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território. Não existem nulidades que invalidem todo o processado. As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.

FUNDAMENTAÇÃO
Os Factos
Factos provados:
1 – Foi apresentado pelo Demandante um orçamento para elaboração de um projeto de alterações da habitação dos Demandados, sita na Rua X, no dia 25/06/15 com um valor de €1 250,00 (mil duzentos e cinquenta euros).
2 – Foi acordado o pagamento em três prestações; as duas primeiras de €420,00 (quatrocentos e vinte euros) e a última de €410,00 (quatrocentos e dez euros).
3 – Os Demandados efetuaram o pagamento da primeira prestação.
4 – No dia 15/07/15 o Demandado forneceu os elementos solicitados pelo Demandante necessários à elaboração do projeto de alterações.
5 – Em 22/09/15 o Demandado, através de e-mail, solicitava ao Demandante a inclusão no projeto das especificações do w/c a criar, mais concretamente, zona de duche, que pode ser fechado, usando chão de cimento ou outro material, uma bancada que pode levar dois lavatórios, um bidé, uma sanita, aproveitar o espaço disponível para criar prateleiras ou arrumações.
6 – Foi acordado entre as Partes a regularização de toda a edificação sem qualquer acréscimo de custos, mas tal implicaria uma maior morosidade.

MOTIVAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
Para a convicção formada, conducente aos factos julgados provados, concorreram:
- Os documentos juntos aos autos a fls. 4, 4V, 5 a 9, 9V, 10, 11 a 13, 13V, 14 e 70 a 125 pelo Demandante e a fls. 32, 32V, 33 e 33V pelo Demandado cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos;
- As Declarações do Demandante e do Demandado;
As Partes entenderam não apresentar qualquer testemunha.

Factos não provados
Foi aceite pelos Demandados o orçamento apresentado pelo Demandante no dia 2 de setembro de 2015, datado do dia 20/08/15 no valor de €1750,00 (mil setecentos e cinquenta euros) ao qual acrescia o IVA.
Não se provaram quaisquer outros factos alegados com interesse para a decisão da causa, por falta de mobilização probatória ou mobilização probatória credível que permitisse ao Tribunal aferir da veracidade dos factos.

O DIREITO
No caso sub Júdice o Demandante peticionou a condenação dos Demandados no pagamento do valor de €1 015,00 (mil e quinze euros) pela conceção de um Projeto de Alterações a executar no imóvel, pertença dos Demandados, sito na Rua X em Belmonte. O Primeiro Demandado apresentou Contestação a fls. 30, 30V, 31 e 31V tendo a segunda Demandada, a ela aderido conforme documento a fls. 52 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os Legais efeitos. Resulta da prova produzida que as partes celebraram um contrato de prestação de serviços, nos termos do art.º 1154º do Código Civil, na medida em que nele o Demandante se obrigou a proporcionar aos Demandados o resultado do seu trabalho intelectual, mediante retribuição, conforme documentos juntos a fls. 9, 10 e 14 dos autos, os quais se dão todos aqui por integralmente reproduzidos para todos os legais efeitos. Alega o Demandante que os Demandados incumpriram o contrato, por falta de pagamento integral do mesmo, admitindo que lhe foi feito um pagamento da quantia de €420,00 (quatrocentos e vinte euros). Os Demandados entendem que razão não lhe assiste, pois consideram ter resolvido o contrato através de e-mail, datado de 05/12/16, por falta de cumprimento do mesmo por parte do Demandante, mais concretamente, por desrespeito pelo prazo de entrega do projeto de alterações. Em casos semelhantes, já se debruçou o Supremo Tribunal de Justiça, como é exemplo o Acórdão datado 02/11/06, podendo ler-se no seu Sumário: “Para justificar a resolução do contrato, a mora tem primeiro que ser convertida em incumprimento definitivo, pela interpelação admonitória a que se refere o art. 808.º 1 do C.C.. E essa interpelação admonitória tem que conter três elementos:
- A intimação para o cumprimento;
- A fixação de um termo perentório para o cumprimento;
- Admonição ou a cominação (declaração admonitória ou intimidativa) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro do prazo.”
Na senda deste Acórdão resulta claro que inexistiu incumprimento definitivo do contrato celebrado por parte do Demandante, pois o Demandado limitou-se a invocar o decurso do prazo previsto no orçamento junto a fls. 14 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos para resolver o contrato. Daqui decorre que os Demandados se encontram obrigados a cumprir o contrato, mais concretamente, a proceder ao pagamento do valor remanescente acordado. A este Tribunal resta apurar qual é o valor que não foi pago pelos Demandados. No Requerimento Inicial, mais concretamente, no art.º 7º desse articulado o Demandante refere: ”Foi acordado entre as Partes a regularização de toda edificação sem qualquer acréscimo de custos, mas tal implicaria uma maior morosidade, conforme necessidades processuais e regulamentares”. A alegação deste facto pelo Demandante possibilita a este Tribunal considerar provado que o contrato celebrado entre as Partes tinha um valor final acordado de €1 250,00 (mil duzentos e cinquenta euros). Senão vejamos. O Demandante entende que o valor acordado foi de €1750,00 (mil setecentos e cinquenta euros) o qual continha um acréscimo de custo devido a alterações ao projeto inicial, conforme orçamento datado de 20/08/15 a fls. 12 dos autos cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos. Por seu turno os Demandados sustentam que o orçamento válido por eles aprovado tem um preço de €1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), documento junto aos autos a fls. 14 cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido para todos os legais efeitos. Considerando que o acordo alegado pelo Demandante, no art.º 7 do Requerimento Inicial, se reporta ao período em que foram solicitadas diversas alterações ao projeto inicial terá de entender-se face ao acordo que as alterações não implicariam um aumento de custos. Por hipótese, admitindo que o Demandante ao referir-se à “regularização de toda a edificação” não englobava a exaustão de fumos, alteração de fachadas, criação de novas áreas, conforme relatou no âmbito das Declarações de Parte que prestou. O certo é que não provou como lhe competia, nos termos do art.º 342, n.º 1 do código Civil, que o Demandado tenha aceitado essas alterações específicas. Isto porque entendeu não apresentar qualquer testemunha que pudesse corroborar tal facto e da correspondência trocada, via e-mail, junta a fls. 4, 6, 9, 9V, 10, 11, 32, 32V, 33 e 33V, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, não se vislumbra essa aceitação. Tendo em conta o preço final acordado de €1 250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), constante do orçamento datado de 24/06/15 a fls. 14 dos autos, e o facto dos Demandados já terem pago a quantia de €420,00 (quatrocentos e vinte euros), facto este admitido por acordo das Partes, nos termos do art.º 574º, n.º 2 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do art.º 63º da Lei dos Julgados de Paz, na redação da Lei n.º 54/2013 de 31/07, há que concluir pela existência de um valor em dívida por parte dos Demandados perante o Demandante, de €830,00 (oitocentos e trinta euros), correspondente a dois pagamentos acordados de €420,00 (quatrocentos e vinte euros) e de €410,00 (quatrocentos e dez euros) não efetuados. A este valor devido ao Demandante deveria acrescer o IVA. No entanto, porque a emissão da fatura com os «requisitos legais» (artigo 19.º, n.º 2, al. a), do CIVA, na redação do D.L. n.º 197/2012, de 24 de agosto) não faz parte da prestação principal devida no âmbito de um contrato de prestação de serviços, tratando-se de um dever imposto por lei para fins fiscais, e por não se encontrar peticionado, este Tribunal não conhecerá dessa questão.

Da litigância de Má-fé
Foram formulados, quer pelo Demandante quer pelos Demandados, Pedidos de Condenação por Litigância de Má Fé.
Cumpre apreciá-los.
Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) tiver feito do processo, ou dos meios processuais, um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Se a parte agiu de boa-fé, sinceramente convencida de que tinha razão, a sua conduta é lícita, suportando o encargo das custas, consequência do risco inerente, no caso de a sua pretensão não vingar.
Ao invés, se agiu de má-fé ou com culpa, se tinha consciência de que não tinha razão ou se não ponderou com prudência as suas pretensas razões, a sua conduta é ilícita, impondo o art. 456º CPC, que seja condenada em multa e numa indemnização à parte contrária se esta o pedir.
Ora, a condenação dos Demandados advém de uma interpretação jurídica dos factos assentes fundamentada em Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, cujo conhecimento não lhes é exigível. Os Demandados alegaram todos os factos na sua versão da relação material controvertida não os deturparam ou omitiram, nem se poderá dizer que tenham feito um uso reprovável do processo pois limitaram-se a defender-se no âmbito da dialética processual.
Quanto ao pedido de condenação, por litigância de má fé do Demandante, o mesmo também não faz qualquer sentido, pois apenas alegou os factos que eram a sua “verdade” relativamente à falta de pagamento parcial dos seus honorários enquanto especialista na área da Arquitetura.
Posto o exposto, julgam-se improcedentes ambos os pedidos de condenação por litigância de má fé indo reciprocamente absolvidos Demandante e os Demandados.

DECISÃO
Face ao que antecede e às disposições legais aplicáveis, julgo a presente parcialmente procedente por provada e, em consequência:
A) Condeno os Demandados no pagamento solidário ao Demandante da quantia de €830,00 (oitocentos e trinta euros).
B) Julgo improcedentes os pedidos de condenação do Demandante e Demandados por Litigância de Má Fé.

Custas: Na proporção do decaimento que se fixa em 18% a cargo do Demandante, 82% a cargo dos Demandados. Os Demandados deverão efetuar o pagamento das custas da sua responsabilidade no valor de €22,40 (vinte e dois euros e quarenta cêntimos), atento o pagamento por eles efetuado com a apresentação da sua Contestação, no prazo de 3 dias úteis a contar do conhecimento desta decisão, sob pena de, não o fazendo, incorrerem no pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação ao abrigo dos n.º 8 e 10 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, o n.º 10 com a redação dada pela Portaria n.º 209/2005 de 24/02.
Face ao atrás exposto proceda-se ao reembolso do Demandante da quantia de €22,40 (vinte e dois euros e quarenta cêntimos), nos termos do n.º 9 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12.
Após o trânsito em julgado arquivem-se os presentes autos.


Belmonte, Julgado de Paz, 15 de dezembro de 2017
O Juiz de Paz,
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(José João Brum)