Sentença de Julgado de Paz
Processo: 117/2015-JPSXL
Relator: SANDRA MARQUES
Descritores: PAGAMENTO DE RENDAS EM ATRASO - PAGAMENTO DE SERVIÇOS PRESTADOS AO LOCADO E NÃO LIQUIDADOS RELATIVOS AO FORNECIMENTO DE ÁGUA
ELETRICIDADE E GÁS NATURAL- INDEMNIZAÇÃO PELO ATRASO NO PAGAMENTO- PAGAMENTO DAS RENDAS REFERENTES AO PERÍODO DO PRÉ-AVISO EM FALTA.
Data da sentença: 12/01/2015
Julgado de Paz de : SEIXAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
(n.º 1, do artigo 26.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, na redação que lhe foi dada pelas alterações constantes da Lei N.º 54/2013, de 31 de Julho, doravante designada abreviadamente LJP)
Demandantes (2):
1) A, casado, titular do cartão de cidadão n.º ---------------, natural de-----------------, Lisboa, contribuinte fiscal n.º ----------------; e
2) B, casada, titular do BI n.º ---------------, natural de -------------------, Lisboa, contribuinte fiscal n.º -----------------, ambos residentes na Rua ----------, --------, -----------, -------------- Fernão Ferro.
Demandados (2):
1) C, casado, titular do cartão de cidadão n.º ---------------, emitido em -----------, natural de ---------------, Lisboa, nascido em -----------, contribuinte fiscal n.º -----------, beneficiário da Segurança Social n.º -------------------; e
2) D, casada, titular do cartão de cidadão n.º --------------, emitido em ------------, natural do ------------, Lisboa, nascida em ---------------, contribuinte fiscal n.º -------------, beneficiária da Segurança Social n.º ---------------, ambos com última morada conhecida na Praceta ----------------, N.º -----, -------, -------, Amora.
Defensora oficiosa nomeada a ambos os Demandados: E, advogada, com domicílio profissional na Rua -------------, ------, ---, ------------ Seixal.
Valor da ação: €2809,32 (dois mil oitocentos e nove euros e trinta e dois cêntimos).

Do Requerimento Inicial:
Alegam, em resumo, os Demandantes, que celebraram em 20 de Novembro de 2012 com os Demandados, contrato de arrendamento urbano relativo à fração autónoma designada pelas letras “BB”, correspondente ao ----- andar letra -- do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Praceta -----------, N.º ----, -----, freguesia da Amora, concelho do Seixal, assumindo no mesmo os Demandados a posição de inquilinos, e os Demandantes de senhorios. Mais disseram que, nos termos do contrato celebrado, foi convencionada entre as partes a renda mensal de €365 (trezentos e sessenta e cinco euros). Mais disseram que ainda na pendência do contrato de arrendamento, os Demandados acumularam várias dívidas de fornecimento e abastecimento de água, eletricidade e gás, entre Dezembro de 2012 e Setembro de 2014, suportadas pelos Demandantes, num total de €667,87 (seiscentos e sessenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos), tendo os Demandados assinado documento de assunção dessa dívida em 26 de Setembro de 2014, obrigando-se a liquidá-la no prazo máximo de 120 dias, sob pena de aplicação de penalização, tendo liquidado apenas €365 (trezentos e sessenta e cinco euros) em 7 de Fevereiro de 2015 já após termino do prazo. Acrescentaram que, para além desses valores, os Demandados também não liquidaram €165,02 (cento e sessenta e cinco euros e dois cêntimos) referentes à fatura de Novembro de 2014 de fornecimento de gás natural. Alegaram, ainda, que os inquilinos não liquidaram a renda respeitante ao mês de Fevereiro de 2015, e que abandonaram o local arrendado através da remessa de carta datada de 1 de Março de 2015, só remetida em 9 de Março de 2015, com as chaves do imóvel lá dentro, não cumprindo com o período de pré-aviso de 120 dias de antecedência para denúncia do contrato.

Pedido:
Requerem a condenação dos Demandados a pagarem-lhes o montante de €€2809,32 (dois mil oitocentos e nove euros e trinta e dois cêntimos), relativos a rendas em atraso, indemnização pelos serviços prestados ao mesmo e não liquidados relativos ao fornecimento de água, eletricidade e gás natural, período de pré-aviso em falta, e penalização pelo incumprimento.

Contestação:
Regularmente citada por via postal em 29 de Julho de 2015 (cfr. fls. 114), a ilustre defensora oficiosa nomeada aos Demandados apresentou contestação em 10 de Agosto de 2015 (cfr. fls. 94), alegando, em suma, que, encontrando-se os Demandados ausentes em parte incerta, e na ausência de qualquer contacto com os mesmos, encontrar-se impossibilitada de contestar a matéria dos autos, por desconhecer a mesma, requerendo que se decidisse o que se tivesse por conveniente.

Tramitação:
Os Demandantes aceitaram a utilização do serviço de mediação, a qual foi inicialmente agendada para o dia 10 de Abril de 2015 (cfr. fls. 30), posteriormente desmarcada por falta de citação dos Demandados.
Após diversas dificuldades de citação dos Demandados, e impossibilidade da mesma, foi-lhes nomeada ilustre defensora oficiosa em 24 de Julho de 2015 (cfr. fls. 85), após cuja citação e apresentação de contestação nos termos supra expostos, impossibilidade anterior dos Demandantes (cfr. fls. 92) e de agenda, foi agendada audiência de julgamento para o dia 28 de Setembro de 2015 (cfr. fls. 96), posteriormente adiada para o dia 19 de Outubro de 2015, por indisponibilidade da ilustre defensora oficiosa na primeira data designada (cfr. fls. 106 e 109), e remarcada para a presente data por doença da Juíza de Paz titular do processo em 19 de Outubro de 2015 (cfr. fls. 117 a 118). À presente audiência compareceram os Demandantes e a ilustre defensora oficiosa nomeada aos Demandados, tendo sido ouvidos, produzida prova testemunhal, e apresentadas breves alegações, após o que foi a audiência suspensa por trinta minutos para ponderação da prova produzida e redação da presente. Retomada a audiência, na presença dos supra indicados, foi proferida a presente sentença – cfr. ata de fls. anteriores.

Factos provados:
Ponderada a prova consubstanciada nos documentos juntos, nas declarações da parte e a prova testemunhal produzida, há que considerar provada a seguinte factualidade com interesse para a decisão da causa:
1 – Os Demandantes são proprietários da fração designada pelas letras “BB”, correspondente ao ------------------------ do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Praceta ---------------, N.º -----, --------, freguesia da Amora, concelho do Seixal, inscrita na matriz predial sob o artigo -----;
2 - Em 20 de Novembro de 2012, foi celebrado contrato de arrendamento para fins habitacionais da fração supra descrita, nos termos do qual
3 – os Demandantes contrataram na qualidade de senhorios, e os Demandados na qualidade de inquilinos,
4 – contrato esse celebrado com a duração de cinco anos, renovável sucessivamente,
5 - com início no dia 1 Dezembro de 2012 e termino em 30 de Novembro de 2017,
6 - ficando estipulada a renda mensal no montante de €365 (trezentos e sessenta e cinco euros),
7 - a pagar até ao primeiro dia útil do mês a que respeitar,
8 – por meio de transferência bancária para a conta dos Demandantes;
9 – Posteriormente, as partes acordaram que a renda seria liquidada pelos Demandados diretamente à imobiliária “F”, sita no Seixal,
10 – até ao dia 8 do mês a que respeitasse;
11 – Em 26 de Setembro de 2014, os Demandados deviam aos Demandantes um total de €667,87 (seiscentos e sessenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos),
12 - relativos a rendas até então em atraso no valor de €130 (cento e trinta euros), e
13 – de consumos efetuados pelos Demandados e suportados pelos Demandantes: de água de Novembro de 2012 a Julho de 2013 no valor de €212,36 (duzentos e doze euros e trinta e seis cêntimos), de eletricidade de Fevereiro a Abril de 2013 no valor de €196,82 (cento e noventa e seis euros e oitenta e dois cêntimos), e de gás de Julho a Setembro de 2014 no valor de €128,69 (cento e vinte e oito euros e sessenta e nove cêntimos);
14 – Os Demandados comprometeram-se a liquidar o valor de €667,87 (seiscentos e sessenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos) aos Demandantes no prazo máximo de 120 dias a contar de 26 de Setembro de 2014,
15 – sob pena de aplicação de uma penalização no valor de 50% do montante em dívida;
16 – Os Demandados só liquidaram por conta dessa dívida o valor de €365 (trezentos e sessenta e cinco euros) em 7 de Fevereiro de 2015;
17 - Os Demandados não liquidaram a quantia de €365 (trezentos e sessenta e cinco euros) relativos à renda do mês de Fevereiro de 2015;
18 – Os Demandados abandonaram o locado no dia 9 de Março de 2015,
19 – remetendo nessa data à imobiliária “F” as chaves do locado dentro de envelope registado,
20 – com a indicação do imóvel a que respeitavam,
21- e que nessa data denunciavam o contrato, com efeitos imediatos;
22 – Os Demandados também não liquidaram os consumos por si efetuados de gás natural do locado relativos ao período de 27 de Setembro de 2014 a 31 de Outubro de 2014, no montante de €36,33 (trinta e seis euros e trinta e três cêntimos),
23 – já liquidado pelos Demandantes.

Tendo sido nomeada ilustre defensora oficiosa aos Demandados, que contestou e compareceu à audiência de julgamento, não operam, nem a cominação constante do artigo 58.º, n.º 2 da LJP, nem é admissível confissão sobre os factos não impugnados nos termos do artigo 574.º, n.º 4 do Código de Processo Civil atual, por não se tratarem de factos do conhecimento pessoal da ilustre defensora oficiosa nomeada. Assim, cabia aos Demandantes o ónus de provar os factos que alegaram – conforme artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil -, o que estes fizeram, mas apenas nos termos supra expostos.
Para a matéria dada como provada e não provada, atendendo ao princípio da livre apreciação das provas que vigora no nosso direito, consagrado no artigo 607.º do Código de Processo Civil atual, teve-se em consideração: os documentos juntos ao processo, com especial destaque para o contrato de arrendamento e o documento de assunção de dívida assinado pelos Demandados, conjugados com as declarações dos Demandantes e a prova testemunhal efetuada pelo representante legal da imobiliária “F”.

Fundamentação:
É questão a decidir nos presentes autos: se os Demandados são, ou não, devedores aos Demandantes das rendas, serviços de água, eletricidade e gás, acrescidos de indemnização pelo atraso no pagamento, e ainda das rendas relativas ao período de pré-aviso em falta.
Dos factos provados decorre que em 20 de Novembro de 2012 foi celebrado entre os Demandantes, enquanto senhorios, e os Demandados, como inquilinos, um contrato de arrendamento para habitação. A este contrato aplica-se, quanto à sua substância, forma e efeitos, o novo Regime do Arrendamento Urbano aprovado pela Lei N.º 6/2006 de 27 de Fevereiro, na redação então em vigor da Lei N.º 31/2012 de 14 de Agosto.
Uma das obrigações a que os inquilinos se obrigaram, nos termos de tal contrato, foi a de pagar a renda aos senhorios, no valor devido e no tempo e lugar acordados – nos termos do disposto nos artigos 1038.º e 1039.º, ambos do Código Civil. Não obstante, a renda vencida em 8 de Fevereiro de 2015, referente a esse mesmo mês, não foi liquidada pelos inquilinos, encontrando-se com essa renda em atraso desde essa data, até que abandonaram o locado, em 9 de Março de 2015, e assim se mantêm até hoje.
No que à indemnização no valor de 50% das rendas em atraso respeita, a mesma tem cabimento legal no artigo 1041.º, n.º 1 do Código Civil, o qual estipula que, em caso de mora do locatário/ inquilino, tem o locador/ senhorio, o direito a exigir, para além das rendas em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido. Ora, o locatário entra em mora, quando a obrigação tem prazo certo e não é cumprida no mesmo – cfr. artigo 805.º, n.º 2, alínea b), do mesmo diploma. Assim, resultando provado que a obrigação de pagamento das rendas referentes ao mês de Fevereiro de 2015, fixada ao dia 8 do mês a que respeitava, não foi cumprida em prazo pelos locatários, dúvidas não existem que há mora destes, pelo que podem os Demandantes exigir dos Demandados uma indemnização no valor de 50% do que é devido, correspondente, nos presentes autos, ao valor de €182,50 (cento e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos).
A segunda das obrigações em apreciação respeita aos serviços de água, eletricidade e gás do local arrendado durante a vigência do contrato. Relativamente aos encargos com água, eletricidade e gás, nada tendo sido estipulado no contrato de arrendamento, tais encargos correm por conta dos arrendatários, os ora Demandados, nos termos do disposto no artigo 1078.º, n.ºs 1, 2, 5 e 6 do Código Civil.
Existem aqui dois momentos, distintos: um período, respeitante às dívidas até 26 de Setembro de 2014, num total de €667,87 (seiscentos e sessenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos), que os Demandados assumiram e declararam dever, comprometendo-se a liquidá-lo no prazo de 120 dias, sob pena de aplicação de penalização de 50% do valor; um segundo, relativo aos consumos de gás desde essa data, que os Demandantes apenas provaram ser de €36,33 (trinta e seis euros e trinta e três cêntimos).
Assim, quanto ao primeiro, face à prova produzida, são os Demandados devedores dos consumos efetuados, não liquidados atempadamente, num total de €302,87 (trezentos e dois euros e oitenta e sete cêntimos), acrescido da indemnização acordada pelas partes, de 50% do valor em dívida, não liquidado em prazo, no montante de €333,93 (trezentos e trinta e três euros e noventa e três cêntimos).
No entanto, quanto ao segundo, os Demandantes apenas efetuaram prova, relativamente ao período após 26 de Setembro de 2014, de fornecimento de gás no montante de €36,33 (trinta e seis euros e trinta e três cêntimos). Assim, a título de encargos com água, eletricidade e gás do locado, são os Demandados devedores aos Demandantes do valor total de €339,20 (trezentos e trinta e nove euros e vinte cêntimos), acrescido da respetiva indemnização de €333,93 (trezentos e trinta e três euros e noventa e três cêntimos).
Quanto ao terceiro pedido, relativo ao período de pré-aviso em falta, o artigo 1098.º, n.º 2, a) do Código Civil, especifica que, nos contratos com prazo certo, a denúncia do contrato pode ser efetuada a todo o tempo, decorrido um terço do prazo inicial de duração do contrato, mediante comunicação do arrendatário ao senhorio, com antecedência não inferior a 120 dias do termo pretendido do contrato, produzindo essa denúncia efeitos no final de um mês do calendário gregoriano. O n.º 3 do mesmo artigo especifica que a falta de cumprimento da antecedência prevista no n.º 2 não obsta à cessação do contrato, mas obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta. Deste modo, resultando provado que os inquilinos abandonaram o locado, sem pré-aviso, em Março de 2015, data em que também procederam à entrega das chaves, a referida denúncia produz efeitos a partir do final do mês de Março de 2015, tendo o contrato cessado em 31 de Março de 2015, pelo que não foi efetuado pré-aviso com nenhuma antecedência, sendo os inquilinos responsáveis pelo período referente ao pré-aviso em falta, de 120 dias, correspondente a quatro meses. Resultando também provado que a renda mensal era no valor de €365 (trezentos e sessenta e cinco euros), o montante total em divida pelos inquilinos aos Demandantes, pela inobservância da antecedência de 120 dias em falta, é no montante total de €1460 (mil quatrocentos e sessenta euros).

Decisão:
O Julgado de Paz é competente e inexistem questões de conhecimento oficioso que cumpra apreciar.
Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo a ação parcialmente procedente, por provada, e em consequência, condeno os Demandados a pagarem aos Demandantes a quantia de €2680,63 (dois mil seiscentos e oitenta euros e sessenta e três cêntimos) a título de renda em atraso do locado, relativa ao mês de Fevereiro de 2015, serviços de fornecimento de água, eletricidade e gás do locado não liquidado, indemnização pelo atraso no pagamento, e pelo período de pré-aviso em falta.

Custas:
Nos termos dos n.ºs 8.º e 10.º, da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, os Demandados são declarados parte vencida, pelo que ficam condenados nas custas da presente ação, no montante de €70 (setenta euros), a pagar no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta decisão, neste Julgado de Paz, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10 (dez euros) por cada dia de atraso.
Reembolse-se os Demandantes, nos termos do disposto no n.º 9.º da mesma Portaria.
Esta sentença foi proferida e notificada aos presentes, nos termos do artigo 60.º, n.º 2, da LJP.
Notifique o Ministério Público junto do Tribunal do Seixal, face ao que consta do artigo 60.º, n.º 3 da LJP.

Registe.
Seixal, Julgado de Paz, 1 de Dezembro de 2015
(processado informaticamente pela signatária)

A Juíza de Paz

Sandra Marques