Sentença de Julgado de Paz
Processo: 81/2017-JPALQ
Relator: CARLA ALVES TEIXEIRA
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO / RENDAS EM ATRASO / INDEMNIZAÇÃO PELA MORA / JUROS LEGAI
Data da sentença: 06/18/2018
Julgado de Paz de : OESTE - ALENQUER
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

Relatório:
A e B, intentaram contra C, a presente acção declarativa, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 4.350,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, que não calcula e, ainda, das rendas vencidas e vincendas acrescidas da respectiva indemnização por mora.
Alegam, para tanto, que celebraram com a Demandada um contrato de arrendamento, tendo por objecto a fracção autónoma que descrevem, e de que são proprietários, sendo o valor da renda mensal de € 400,00, que a Demandada não pagou nos meses de Abril a Setembro de 2017, e ainda parte da renda de Agosto e Setembro de 2016, no valor total de € 2.250,00. Alegam, ainda, que para além das rendas não pagas até à data, em 6 outros meses, que identificam, a Demandada não pagou as rendas nas suas datas de vencimento, pelo que peticionam, também, uma indemnização correspondente a 50% do valor das mesmas, no total de € 2.100,00.
Juntaram 6 documentos.
A Demandada foi regular e pessoalmente citada e não apresentou contestação, nem juntou documentos.
Os Demandantes prescindiram da fase da mediação, pelo que se procedeu à marcação da audiência de discussão e julgamento, que se realizou com observância do formalismo legal, não tendo a Demandada comparecido à mesma.
A Demandada não apresentou qualquer justificação para a sua falta à primeira data agendada para a audiência.
**
Estão reunidos os pressupostos de regularidade da instância e não há excepções, nulidades ou questões prévias de que cumpra conhecer.
**
Fixa-se à causa o valor de € 4.350,00 (quatro mil, trezentos e cinquenta euros) - cfr. artigos 306º n.º 1, 299º n.º 1, 297º n.º 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei 54/2013, de 31 de Julho (de ora em diante abreviadamente designada LJP).
**
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:

A) FACTOS PROVADOS:
A) Com relevo para a decisão da causa, resultaram provados os seguintes factos:

1 – Pela Ap. ----- de 2010/05/19, encontra-se inscrita a favor dos Demandantes, a aquisição da fracção autónoma designada pela letra “J”, do prédio urbano sito D, lote 3, 4º andar direito, freguesia de ---------, concelho de Caldas da Rainha, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ----- daquela freguesia e descrito na Conservatória do Registo Predial de Caldas da Rainha com o número ------.
2 - Em 01 de Abril de 2012, os Demandantes cederam o gozo e fruição da fracção autónoma supra identificada, à Demandada, pelo período de 5 anos, renovável por períodos de 1 ano.
3 – Pelo menos a partir de Agosto de 2016 o valor da renda mensal acordado era de € 350,00, com vencimento no primeiro dia útil do mês a que dissesse respeito.
4 – Nos meses de Agosto e Setembro de 2016, a Demandada apenas efectuou o pagamento da quantia de € 550,00, tendo ficado em dívida o valor remanescente de € 150,00.
5 – A Demandada não efectuou o pagamento das rendas de Abril a Setembro de 2017, inclusive.
6 - Nos meses infra descritos, a Demandada efectuou o pagamento da renda nas seguintes datas:
a) Mês de Julho de 2016: paga em 22.07.2016;
b) Mês de Novembro de 2016: paga em 02.12.2016;
c) Mês de Dezembro de 2016: paga em 08.01.2017;
d) Mês de Janeiro de 2017: paga em 08.02.2017;
e) Mês de Fevereiro de 2017: paga em 08.03.2017;
f) Mês de Março de 2017: paga em 08.04.2017;
7 – Os Demandantes enviaram em 26.04.2017 e em 16.06.2017 as comunicações que constam de fls. 16 a 18 e 21 a 22 à Demandada, interpelando-a para o pagamento das quantias ora peticionadas.

B) Não existem factos não provados.
**
C) MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal relativamente aos factos provados ficou a dever-se à confissão, pela Demandada, dos factos alegados pelos Demandantes, atendendo a que esta se encontrava pessoal e regularmente citada, não apresentou contestação e faltou injustificadamente à audiência de julgamento, fazendo assim operar o efeito cominatório da sua revelia, nos termos do disposto no art. 58.º n.º 2 da LJP, que dispõe que: “Quando o demandado, tendo sido pessoal e regularmente citado, não comparecer, não apresentar contestação escrita, nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor”.
Há que referir que quanto ao facto n.º 3, não obstante os Demandantes terem alegado que o valor da renda mensal era de € 400,00, a verdade é que resulta das comunicações de fls. 16 a 18 e 21 a 22 que o valor era de € 350,00, sendo que os próprios Demandantes efectuam todos os seus cálculos com base numa renda de € 350,00 (cfr. artigos 5º b), 7º a 13º, 15º e 16º do seu Requerimento Inicial), pelo que se detecta que a menção a € 400,00 se terá tratado de um lapso, sendo certo que, ainda que assim não fosse, não poderia o Tribunal condenar além do valor que foi peticionado e que teve por base uma renda de € 350,00 – cfr. o disposto no artigo 609º n.º 1 do CPC.
Quanto ao facto n.º 1, uma vez que o mesmo não é passível de prova por confissão, resulta da certidão do Registo Predial junta a fls. 12.
**
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO:
Pretendem os Demandantes que a Demandada seja condenada a pagar-lhes o valor de várias rendas vencidas e vincendas como contrapartida do gozo e fruição da fracção autónoma descrita no Facto Provado n.º 1, acrescidas de juros de mora, e de uma indemnização por mora correspondente a 50% do valor devido sobre as rendas em dívida e sobre outras rendas pagas após a data de vencimento.
Analisemos, então, cada uma das pretensões dos Demandantes.
**
1 – Quanto ao valor de € 2.250,00 a título de rendas vencidas:
Resulta do art. 1022º do Código Civil (CC) que “Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição”, dizendo-se arrendamento quando versa sobre coisa imóvel, como é o caso – cfr. artigo 1023º do CC.
Está, assim, provado que os Demandantes, na qualidade de senhorios, e a Demandada, na qualidade de arrendatária, celebraram um contrato de arrendamento, tendo por objecto a fracção autónoma identificada no facto provado n.º 1.
Provou-se, também, que a renda mensal acordada era de € 350,00 que deveria ser paga pela arrendatária no primeiro dia útil do mês a que dissesse respeito.
Nos termos do disposto no artigo 406.º do CC, os contratos deverão ser pontualmente cumpridos, por ambos os contraentes, devendo as partes reger-se pelo princípio da boa-fé no seu cumprimento - cfr. artigos 762.º e 763.º do CC.
No contrato de arrendamento, “a primeira e mais elementar obrigação de todo o locatário, como tal enunciada na alínea a) do art. 1038º do C.C., é a de pagar oportunamente o aluguer ou renda estipulada” (Manual do Arrendamento Urbano, Jorge Henrique da Cruz Pinto Furtado, 3ª Edição, Almedina, p. 766).
Tal obrigação resulta da natureza onerosa e sinalagmática do contrato de arrendamento, e deve ser cumprida no tempo e lugar devidos – cfr. artigos 1022º e 1039º do CC.
Cabia à Demandada, enquanto devedora, fazer prova do cumprimento da obrigação, ou seja, do pagamento atempado das rendas que são peticionadas nos presentes autos, por se tratar de um facto extintivo do direito que os Demandantes pretendem fazer valer, prova essa que não fez.
Assim, resultou provado que a Demandada não pagou parte das rendas de Agosto e Setembro de 2016 no valor de € 150,00 e, bem assim, as rendas dos meses de Abril a Setembro de 2017, no valor total de € 2.250,00 (€ 350,00 x 6 + € 150).
Não tendo a Demandada cumprido a sua obrigação de pagamento das rendas, nem tendo alegado qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado pelos Demandantes, têm estes direito a exigir judicialmente o seu cumprimento – cfr. artigos 342.º e 817º do CC.
Conclui-se, assim, pela procedência, na totalidade, do pedido de pagamento das rendas vencidas e não pagas, no valor de € 2.250,00.
**
2 – Quanto ao valor de € 2.100,00 a título de indemnização pela mora no pagamento das rendas:
Nos termos do disposto no artigo 1041º nº 1 do CC “constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento”.
No caso, não é sequer peticionada a resolução do contrato de arrendamento, pelo que se encontram reunidos os pressupostos de aplicação do disposto na referida disposição legal.
Assim, não tendo a Demandada procedido ao pagamento das rendas referidas no ponto anterior até à data, constituiu-se e encontra-se em mora quanto ao respectivo montante de € 2.250,00 – cfr. o disposto nos artigos 804º n.º 2 e 805º n.º 2 a) do CC.
Porém, os Demandantes apenas peticionam a indemnização correspondente a 50% do valor das rendas dos meses de Abril a Setembro de 2017, cujo montante é de € 2.100,00, sendo, por conseguinte, o valor da indemnização de € 1.050,00, pelo que terá de ser este o limite da condenação – cfr. artigo 609º n.º 1 do CPC.
Provou-se, ainda, que nos meses identificados no Facto Provado n.º 6 a Demandada procedeu ao pagamento das rendas, no total de € 2.100,00 em prazo superior a 8 dias após a data de vencimento, pelo que, também quanto a estes montantes é devida a indemnização correspondente a 50% do valor das rendas – cfr. artigo 1041º n.º 1 e 2 do CC.
Face ao exposto, e porque a Demandada se constituiu em mora relativamente a cada uma das rendas supra referidas, conclui-se que assiste aos Demandantes o direito de exigir o pagamento da quantia de € 1.050,00 correspondente a 50% do valor das rendas que se encontram em dívida entre Abril e Setembro de 2017 e, bem assim, a quantia de € 1.050,00 correspondente a 50% do valor das rendas identificadas no Facto provado n.º 6, que foram pagas em prazo superior a 8 dias após o seu vencimento, no total de € 2.100,00.
**
3 – Quanto aos juros de mora à taxa legal:
Os Demandantes pedem, ainda, a condenação da Demandada no pagamento de juros de mora “vencidos e vincendos à taxa legal”, não tendo contabilizado qualquer montante a esse título.
Nas obrigações pecuniárias, os juros correspondem à indemnização devida pelos danos causados ao credor, em consequência da mora – cfr. artigos 804º n.º 1 e 806 n.º 1 e 2 do do CC.
Porém, no âmbito do contrato de arrendamento, a Lei já prevê a indemnização a que o senhorio terá direito em caso de mora do arrendatário, e que corresponde a 50% do valor em dívida, como se viu – cfr. o disposto no artigo 1041º do CC.
Ora, atendendo a que os Demandantes vieram pedir a indemnização moratória acima aludida, e que tal indemnização cumpre a mesma função ressarcitória dos juros de mora, substituindo-se a estes no caso da mora do locatário, não poderão ambas as pretensões cumular-se.
Face ao exposto, não procede o pedido de condenação da Demandada em juros de mora à taxa legal.
**
4 – Quanto às rendas vencidas e vincendas após a entrada da acção:
Por último, e quanto ao pedido de condenação nas rendas vencidas e vincendas após a entrada da acção, resulta do disposto no artigo 557º, nº 1 do CPC, que tratando-se de prestações periódicas, se o devedor deixar de pagar, podem compreender-se no pedido e na condenação tanto as prestações já vencidas como as que se vencerem enquanto subsistir a obrigação, in casu, até à cessação do contrato de arrendamento.
Procede, assim, também este pedido.
**
Responsabilidade tributária:
Atento o disposto no artigo 527º n.º 1 e 2 do CPC aplicável ex vi do artigo 63º da LJP, declaram-se ambas as Partes vencidas, pelo que vão ambos condenados em custas na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 10% para os Demandantes e 90% para a Demandada, sem prejuízo da dispensa de que esta beneficia no âmbito da protecção jurídica que lhe foi concedida.
Assim, nos termos conjugados dos artigos 1º, 2º, 8º, 9º e 10º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro, alterada pela Portaria n.º 209/2005 de 24.02, deverá ser restituída a quantia de € 28,00 aos Demandantes.
**
Dispositivo:
Julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e, em consequência disso:
A) condeno a Demandada a pagar aos Demandantes:
i) a quantia de € 2.250,00 (dois mil, duzentos e cinquenta euros) correspondente às rendas dos meses de Agosto e Setembro de 2016 e Abril a Setembro de 2017 inclusive;
ii) a quantia de € 2.100,00 (dois mil e cem euros) correspondente à indemnização legal de 50% sobre o valor das rendas dos meses de Julho de 2016 e Novembro de 2016 a Setembro de 2017, inclusive.
iii) o valor das rendas vencidas e vincendas desde a data da entrada da presente acção (19.09.2017) e até à cessação do contrato de arrendamento.

B) Absolvo a Demandada do demais peticionado.
Custas na proporção de 10% para os Demandantes e de 90% para a Demandada.
**
Registe e notifique.
Bombarral, 18.06.2018

A Juíza de Paz

Carla Alves Teixeira
(que redigiu e reviu em computador – artigo 131º n.º 5 do CPC)