Sentença de Julgado de Paz
Processo: 253/2013-JP
Relator: IRIA PINTO
Descritores: CONTRATO EMPREITADA
SUBEMPREITADA
Data da sentença: 06/20/2014
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: Sentença
Processo nº 253/2013-JP

………………………………, melhor identificado a fls. 1 e 3 dos autos, intentou em 10/10/2013, contra os demandados …………………………… e ………………………………………., melhor identificados a fls. 2 e 3, ação declarativa com vista a obter o pagamento de serviços, formulando o seguinte pedido:
- Serem os demandados condenados a pagar ao demandante a quantia de €1.951,74, sendo €1.616,90 de capital e €334,84 de juros à taxa legal, acrescida de juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 3 a 6 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido. Juntou 3 (três) documentos.
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Foi realizada sessão de pré-mediação, seguida de mediação, a qual resultou sem acordo (fls. 136 e 137).
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Regularmente citados (fls. 34 e 35), os demandados apresentaram a contestação, de folhas 37 a 63, que se dá por integralmente reproduzida, arguindo a exceção de ilegitimidade dos demandados, impugnando os factos constantes do requerimento inicial e peticionando a condenação do demandante a titulo de litigância de má fé no valor de €3.000,00, além de despesas e honorários ao mandatário dos demandados, requerendo ainda a suspensão da instância devido a causa prejudicial a correr termos no 3º Juízo Cível de Coimbra. Juntaram 4 (quatro) documentos. Juntaram em audiência 3 (três) documentos.
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Por Despacho de fls. 144 dos autos, que se reproduz, foi indeferida a requerida suspensão da instância.
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Foram realizadas duas sessões de audiência de julgamento, como das respetivas Atas se infere (fls. 165 a 167).

DA LEGITIMIDADE PASSIVA

Em contestação os demandados arguiram a exceção de ilegitimidade passiva.

Ora, a legitimidade afere-se pelo interesse direto na causa, o demandado é assim parte legítima quando tem interesse direto em contradizer e este interesse exprime-se pelo prejuízo que possa advir da procedência da ação. E, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (artigo 30º do Código de Processo Civil).
A ilegitimidade das partes é uma exceção dilatória de conhecimento oficioso, devendo o juiz abster-se de conhecer do pedido e conduzindo à absolvição da instância (artigos 577º, alínea e), 578º, 5763º, nº 2 do Código de Processo Civil)
Compulsados os autos, considera-se que os demandados têm interesse em contradizer, dada a configuração dada pelo demandante à relação controvertida em análise.
Pelo exposto, julga-se improcedente a exceção de ilegitimidade passiva, considerando-se os demandados como partes legítimas.

Cumpre apreciar e decidir

O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras exceções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Fixo à causa o valor de €1.951,74.
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Reunidos os pressupostos de estabilidade da instância, cumpre proferir sentença.
A alínea c) do nº 1 do artigo 60º da Lei nº 78/2001, de 13/07, alterada pela Lei 54/2013, 31/07 (Lei dos Julgados de Paz) estatui que, nas sentenças proferidas, deve constar (entre outros) uma “sucinta fundamentação”.

Fundamentação da Matéria de Facto
Factos provados
Com interesse para a decisão da causa ficou provado que:
1 - O Demandante dedica-se à atividade de águas e electricidade de construção civil.
2 – O empreiteiro Fernando Duarte contratou com o demandado-marido, para levar a cabo a empreitada de mão-de-obra no apartamento dos demandados, sito em Coimbra, na Rua ……………………., respeitante a uma habitação, tipo duplex.
3 - A intervenção do demandante foi sugerida por ……………………………, que tinha sido contratado pelo demandado, para obras de pintura e construção civil.
4 - As obras a que o empreiteiro, …………………….., se obrigou perante o demandado-marido a levar a cabo, na referida casa dos demandados, no regime de empreitada de mão-de-obra, constavam no seguinte: pintura das paredes e tetos no interior, nas casas de banho e lavabo a pintura dos tetos e a substituição das louças, bem como a colocação de azulejos novos nas paredes, colocados sobre os anteriores, e no chão, a substituição dos ladrilhos, após a sua remoção, além de intervenção na cozinha, substituição de reboco noutras zonas, além de outros serviços similares.
5 – Iniciadas as obras pelo Sr. …………… e a partir de janeiro e fevereiro de 2011 o demandante iniciou as obras na casa dos demandados, por conta e ordem do A, tendo os trabalhos sido executados, na morada atrás referida.
6 - O Demandante efetuou as ligações das louças sanitários nas casas de banho e assentamento das mesmas, além da colocação de toalheiros nas casas de banho e na cozinha executou a colocação do lava louça.
7 - Na verdade, os demandados não conheciam só vindo a conhecer mais tarde o demandante, conhecendo apenas o demandado-marido o empreiteiro ……………, que lhe foi apresentado por um amigo comum, pouco tempo antes de haver contratado, verbalmente, com ele, a empreitada.
8 – O demandado-marido acordou com o empreiteiro …………… que todos os materiais que fosse necessário aplicar ou mandar aplicar na obra, deviam ser faturados com a discriminação pormenorizada, dos tipos, quantidades, qualidades, do preço unitário, preço total, IVA, despesas, em nome do demandado-marido.
9 - Obrigando-se o empreiteiro …………….. a faturar em seu nome apenas a mão-de-obra, necessária para levar a cabo a empreitada, nomeadamente as horas gastas, o preço hora, os materiais utilizados com IVA.
10 – Os demandados pagaram ao empreiteiro ………………….os valores respeitantes à empreitada contratada, na quantia de €17.858,86.
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A fixação da matéria dada como provada resultou da audição das partes, dos factos admitidos, do depoimento das testemunhas apresentadas pelas partes, além da demais prova que a seguir se menciona.
No que concerne às testemunhas do demandante, ……………… e ………………., executantes de obras na propriedade dos demandantes, não foram consideradas como isentas e credíveis, uma vez que o primeiro e o segundo têm interesse no desfecho destes autos, expondo a versão que lhes é mais favorável, que considera que tanto as testemunhas como o demandante foram contratados diretamente pelos demandados para executarem os trabalhos especificos da profissão de cada um, pintura, carpintaria e canalização, respetivamente, não obstante não lograram convencer o tribunal, nomeadamente não convenceram acerca da contratação direta dos serviços do demandante por parte dos demandados.
Relativamente às testemunhas dos demandados, a testemunha ……………. também andou a trabalhar na obra dos autos e conhecia o demandante, pouco sabendo no entanto acerca do modo de contratação do demandante, o Sr. ……….., ……………., …………… e ……………., demonstraram credibilidade e isenção nos depoimentos, assim, a testemunha ………………. foi quem apresentou aos demandados, nomeadamente ao demandado-marido, o …………….., para incumbência da empreitada, conhecendo-o de outro trabalho anterior e comprometendo-se perante si aquele …………. a tratar de tudo o que fosse da obra, quanto a …………. o conhecimento dos trabalhos adveio da vistoria realizada às obras, na qualidade de engenheiro, expondo a falta de organização da obra, por falta de orçamento e outros documentos de obra, a testemunha …………… expôs ter realizados alguns trabalhos finais em WC, com colocação de móvel, espelho e forra adquiridos pelos demandados à empresa para a qual trabalha, por último, a testemunha …………….., que foi incumbido para fazer uma auditoria às contas respeitantes às obras realizadas, deu nota de uma reunião para apresentação de contas, na qual ……………….. apresentou o valor global da obra, que a testemunha achou exorbitante, tendo visto fichas de obras diárias onde constavam os nomes de trabalhadores e o nº de horas, o que a testemunha não conseguiu especificar, revelando no entanto este depoimento conjugado com os demais testemunhos apresentados pelos demandados que era o ……………. o responsável por toda a obra.
À prova mencionada acrescem os documentos de fls. 73 a 129, 162 e 163 juntos aos autos, o que devidamente conjugado com regras de experiência comum e critérios de razoabilidade alicerçaram a convicção do Tribunal.
Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou insuficiência de prova nesse sentido, nomeadamente o demandante não logrou provar que os demandados tenham contratado o demandante para execução de trabalhos na obra sua propriedade, mas contrataram ……………. que por seu turno contratou a mão-de-obra necessária à realização dos trabalhos.

Fundamentação da Matéria de Direito
O demandante intentou a presente ação peticionando a condenação dos demandados no pagamento dos serviços prestados constantes das faturas 0405 e 0406, ambas de 27/2/2011, alegando em sustentação desse pedido a celebração de um contrato de empreitada de mão de obra de canalização e assentamento de louças entre demandante e demandados e que estes alegadamente não pagaram.
Dispõe o artigo 405º do Código Civil sobre o princípio da liberdade contratual, com os limites previstos na lei. No âmbito dos contratos, dispõe ainda o nº 1 do artigo 406º do Código Civil que, uma vez celebrados os contratos devem ser pontualmente cumpridos, e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei, o que reflecte o princípio da força vinculativa ou obrigatoriedade dos contratos. Assim, as obrigações contratuais devem ser cumpridas nos exactos termos em que são assumidas (pacta sunt servanta) e segundo as normas gerais da boa fé.
Ainda nos termos do artigo 227º, nº 1 do Código Civil, quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na sua formação, proceder segundo as regras de boa fé.
Estamos, assim, perante o contrato de prestação de serviços que, segundo o artigo 1154º do Código Civil “… é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.”, na modalidade de empreitada que é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço (artigo 1207º do Código Civil).
Referindo-se o caso dos autos a responsabilidade contratual, a culpa do devedor, neste caso, dos demandados presume-se, incumbindo-lhes nessa medida provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procedeu de culpa sua (artigos 798º e 799º do Código Civil).
Na tese dos demandados e de acordo com a prova que produziram, os trabalhos que o demandante descreve terão sido realizados por conta e ordem do empreiteiro ………………, tendo os demandados entregue a quantia de €17.858,86 ao empreiteiro ………….., com quem contrataram a empreitada de mão-de-obra.
Na verdade, resultou assente que os demandados não conheciam o demandante, só vindo a conhece-lo mais tarde, conhecendo apenas o demandado-marido o empreiteiro ……………….., que lhe foi apresentado por um amigo comum, pouco tempo antes de haver contratado, verbalmente, com ele, a empreitada.
E, segundo ficou apurado foi só com o empreiteiro, que o demandado marido acordou a execução das obras, ignorando os demandados se o …………….., enquanto empreiteiro de tais obras, utilizou nas mesmas, colaboradores ou outros ajudantes, ignorando também os demandados em que condições …………. fez tal contratação.
Assim, vieram os demandados demonstrar que nenhuma obrigação têm para com o demandante, uma vez que contrataram a empreitada dos autos com o mencionado ……….. e não com o demandante, que terá sido contratado por aquele.
No caso dos autos, resultou assim provado que a empreitada de mão de obra na fração dos demandados foi contratada com o empreiteiro …………………………., que por sua vez contratou o ora demandante, para realizar os trabalhos de canalização e assentamento de louças na propriedade dos demandados.
Resulta assim da prova produzida, que o demandante foi subcontratado pelo empreiteiro …………….. para realizar as obras de canalização e assentamento de louças na propriedade dos demandados, os quais segundo alegam pagaram ao empreiteiro …………… a empreitada de mão-de-obra de toda a obra, tendo o empreiteiro ………………..e a incumbência de pagar quem contratou, nomeadamente o demandante.
Tal figura jurídica prevista no artigo 113º do Código Civil designa-se por subempreitada, que é o contrato pelo qual um terceiro, no caso o demandante, se obriga perante o empreiteiro, que é o …………….., a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela; figurando os demandados como donos da obra.
Ainda resulta dos autos que o demandante efetivamente realizou trabalhos de canalização e assentamento de louças na propriedade dos demandados, o que fez por por conta daquele …………………., que por sua vez recebia ordens dos demandados quando aos trabalhos de empreitada a levar a cabo.
Em consequência, improcede a pretensão do demandante, uma vez que resultou provado que os demandados contrataram os trabalhos na sua propriedade com o empreiteiro …………………….. que ficou incumbido de contratar os demais profissionais para realizar os trabalhos, tendo alegadamente sido pago pelos trabalhos respeitantes a toda a obra e a quem deverá o demandante exigir contas.
Quanto à peticionada condenação como litigante de má fé do demandante, refira-se que tal instituto radica na própria boa fé, a qual deverá sempre nortear a atividade das partes de modo a que estas, conscientemente, não formulem pedidos injustos, não articulem factos contrários à verdade e não requeiram diligências meramente dilatórias. Não agindo segundo tais ditames, ficam as partes sujeitas às sanções do artigo 542º do Código de Processo Civil.
De acordo com o nº 2 daquele artigo, deverá ser considerado litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, o que tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes, o que tiver praticado omissão grave do dever de cooperação, o que tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer ou protelar, sem fundamento sério, a ação da justiça.
Há porém que ter presente que a interpretação a dar ao artigo 542º não poderá ser restritiva, de forma a inviabilizar o amplo direito de acesso dos cidadãos aos tribunais e a permitir o pleno exercício do contraditório.
Na realidade, a apresentação de uma determinada construção jurídica, julgada manifestamente errada, não revela, por si só, que o seu autor a apresentou em violação dos princípios da boa fé e da cooperação, havendo por isso que ser-se prudente no juízo a fazer sobre a má fé processual.
No caso vertente o comportamento do demandante não é indiciador de uma litigância de má fé, julgando-se aquela pretensão improcedente.
Improcede igualmente o vertido a título de despesas e honorários a favor do mandatário dos demandados, por falta de alegação e fundamento legal.

Decisão
Em face do exposto, julgo a ação improcedente, por não provada e, consequentemente, absolvo os demandados ………………………….. e .....………………………… do pedido.

Custas
Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, condeno o demandante ………………………… no pagamento das custas totais do processo, no valor de €70,00 (setenta euros), pelo que tendo procedido ao pagamento de taxa de justiça no valor de €35,00 (trinta e cinco euros), deverá pagar o restante valor de €35,00 (trinta e cinco) euros, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso.
Devolva aos demandados o valor de €35,00 (trinta e cinco) euros.
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A Sentença (conforme A.O., processada em computador, revista e impressa pela signatária) foi proferida nos termos do artigo 60º da Lei nº 78/2001, de 13.07, alterada pela lei nº 54/2013, 31.07.
No dia e hora agendados para leitura de Sentença – 20/6/2014, pelas 16H30 – a sentença ainda não estava disponível, pelo que deverá ser notificada por via postal.
Notifique e Registe.

Julgado de Paz de Coimbra, em 20 de junho de 2014
A Juíza de Paz (em acumulação de serviço),
(Iria Pinto)