Sentença de Julgado de Paz
Processo: 168/2017-JPLSB
Relator: MARIA JUDITE MATIAS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO / ILEGITIMIDADE PASSIVA / FIXAÇÃO EQUITATIVA DA INDEMNIZAÇÃO
Data da sentença: 01/25/2018
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral: Valor da acção: €4.201,50 (quatro mil, duzentos e um euro e cinquenta cêntimos).

Demandante: A, Rua X, Centro Comercial das X,000000 Lisboa.
Mandatário: Dr. B, com domicílio profissional em Av.ª X, 15, 00000000 Lisboa.
Demandados:
1) C, Rua X, Lisboa;
2) D, Rua X Lisboa.
Mandatário: Dr. E, Advogado, com domicílio profissional na Av.ª X Lisboa.
Do requerimento inicial: Fls. 1 a 9;
Pedido: Fls.8
Junta: 14 documentos e Procuração Forense.
Contestação: A fls. 38 e segs.

Tramitação
A demandante recusou a mediação.
Foi marcada audiência de julgamento para o dia 16 de novembro de 2017, pelas 14h, sendo as partes notificadas para o efeito.

Audiência de Julgamento.
A audiência decorreu conforme acta de fls. 73 a 76.
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Fundamentação fáctica.
Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos:
1 – Em 22 de maio de 2014, cerca das 19h e 30m, ocorreu um acidente de viação no qual foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matrícula JZ, doravante JZ, licenciado para o serviço de táxi na praça de Lisboa, à data dos factos propriedade da demandante, e o veículo pesado de passageiros, autocarro, de matrícula HWB, doravante HWB, registado em Espanha, à data dos factos propriedade de F, com seguro na D, com sede em Espanha, pela Apólice ZZZZZZZZZZ (cfr. doc. 1. Fls. 10 e 10V, doc. 2 a fls. 11, doc. 3, 4 e 5 a fls. 12 a 19, e doc. 1, a fls. 42, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2 – O HWB era conduzido por G e o JZ era conduzido por H (cfr. doc. 3);
3 – No dia e hora referido supra ponto 1, o JZ circulava na Av.ª da Liberdade, no sentido Restauradores/Praça Marquês de Pombal, na via mais à direita das quatro ali existentes (cfr. doc. 3);
4 – O HWB circulava no mesmo sentido, e seguia na faixa contígua à faixa onde circulava o JZ (cfr. doc. 3);
5 – Em dado momento o HWB invadiu a faixa onde circulava o JZ embatendo na lateral esquerda deste veículo, empurrando-o contra o lancil (cfr. doc. 3);
6 – Do embate resultaram danos no JZ, os quais foram constatados pelo perito da segunda demandada que os avaliou em €2.101,50 (cfr. doc, 5 e 6, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7 – A demandante despendeu a quantia de €2.101,50 com a reparação do JZ (cfr. doc,. 7, 8, 9 e 10);
8 – O JZ ficou reparado em 05 de junho de 2014, tendo estado paralisado durante 14 dias (docs. 3, 5 e 6);
9 – JZ está ao serviço em dois turnos.

Factos não provados.
Não foi provado que o veículo de matrícula HWB estivesse seguro na D, com a apólice ZZZZZZZ.

Motivação.
A convicção do tribunal fundou-se nos documentos apresentados e referidos nos respectivos factos, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual e nos depoimentos das testemunhas apresentadas. A demandante apresentou como testemunha o motorista do JZ, o qual confirmou os factos do requerimento inicial, explicou a dinâmica do acidente, tendo deposto de forma calma, tranquila, mostrou-se isento, tendo convencido o tribunal da dinâmica do acidente, esclarecendo que o condutor do autocarro (HWB), imagina que por distracção, ou porque calculou mal a distância, deixou o autocarro invadir a faixa de rodagem na qual circulava o táxi, empurrando-o contra o passeio. Confirmou que o táxi laborava em dois turnos e ao ser questionado sobre o rendimento do mesmo, disse que, dependendo dos dias, podia ser €85,00, €90,00, €95,00. Acresce que, a declaração amigável assinada pelos condutores é esclarecedora, dado que o desenho constante da mesma mostra à evidência que o autocarro invadiu a faixa de rodagem onde se circulava o JZ.

Do Direito.
Da alegada ilegitimidade da D,
Estabelece o artigo 30º, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção dado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, doravante CPC, aplicável ex vi artigo 63º, da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho, alterada pela Lei 54/2013, de 31 de julho, doravante LJP: “1 – O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer.
2 – O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha. 3 – Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.”
O litígio em apreço reporta-nos à determinação da responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação. É consabido que por via do contrato de seguro automóvel a companhia de seguros assume a responsabilidade que cabe ao segurado. Contudo, é necessário que exista o contrato de seguro. Ora, no caso, a demandante não logrou provar que existia essa relação contratual, pelo que a demandada D, não é sujeito da relação jurídica nem tem interesse em contradizer, não estando preenchidos os requisitos decorrentes do referido artigo 30.º do CPC, e se conclui que a segunda demandada é parte ilegítima na presente ação, o que configura uma exceção dilatória, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da instância, de conhecimento oficioso, conforme estipulam os artigos 278º, n.º 1, al. d), 576º, n.º 2, 577, al. e), e 578º, todos do CPC, na redacção dada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.

Da legitimidade do demandado C.
Nos presentes autos pretende a demandante ser indemnizada pelos danos resultantes de um acidente de viação ocorrido entre uma viatura destinada ao serviço de táxi, à data dos factos sua propriedade, e uma viatura matriculada em Espanha, e com seguro cuja apólice é de uma companhia de seguros XXX. Assim, face aos factos dados por provados e atento o teor do artigo 90.º do DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto, compete ao C a satisfação das indemnizações aos lesados por acidentes ocorridos em Portugal, que se apurem serem devidas nos termos legais e regulamentares do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.

Do mérito da causa.
A pretensão indemnizatória da demandante resulta do facto de imputar ao condutor do HWB, melhor supra identificado em factos provados, a responsabilidade pela ocorrência do acidente em apreço, enquadrando o litígio no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, disciplinada nos artigos 483.º e segs. do Código Civil. É consabido que, para que se conclua pela existência de responsabilidade civil por factos ilícitos é, necessário um comportamento humano dominável pela vontade; ilicitude, ou seja, a violação de direitos subjectivos absolutos, ou normas que visem tutelar interesses privados; um nexo causal que una o facto ao lesante – a culpa (o juízo de censura ou reprovação que o direito faz ao lesante por este ter agido ilicitamente, quando podia e devia ter agido de outra forma) e outro que ligue o facto ao dano, de acordo com as regras normais de causalidade. Quanto à dinâmica do acidente, não temos dúvida alguma de que o condutor do veículo HWB, invadiu a faixa de rodagem por onde circulava o JZ, empurrando-o contra o passeio. Face à matéria assente, há que concluir que a responsabilidade do acidente em apreço, se deve exclusivamente à conduta do condutor do veículo HWB, o qual ao invadir a faixa de rodagem onde se encontrava o JZ a circular violou os artigos 13.º, n.1, 15.º n.º 1, e n.º 2 do artigo 18.º, todos do Código da Estrada. Nos termos do art. 562º do C.Civil a obrigação de indemnizar visa, desde logo, a reconstituição da situação que existiria na esfera jurídica do lesado, no caso de não se ter verificado o evento que obriga à reparação. São assim, indemnizáveis, os danos de carácter patrimonial, quer os prejuízos emergentes quer os lucros cessantes, sejam danos presentes ou futuros, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 564º do Código Civil. Está provado que a demandante despendeu a quantia de €2.101,50 com a reparação do JZ, e que deixou de auferir o rendimento do táxi durante os catorze dias que esteve imobilizado, peticionando, a título de paralisação, a quantia de €2.100,00, correspondentes a €150,00 por cada dia de paralisação (14 dias). Estes danos resultam da impossibilidade de utilização do JZ na atividade a que se destinava (táxi), danos indemnizáveis e consequência directa e adequada do sinistro. Estabelece o art. 566.º, n.º 1 do Código Civil que, quem estiver obrigado a reparar /indemnizar um dano deve reconstituir a situação que existiria na esfera jurídica do lesado, no caso de não se ter verificado o evento que obriga à reparação. Não sendo possível a reconstituição natural, será a indemnização fixada em dinheiro sendo indemnizáveis os danos patrimoniais, incluindo prejuízos emergentes e lucros cessantes. Ocorre que, os danos reclamados a título de privação do uso do veículo, estão interligados com a impossibilidade de utilização do mesmo para o fim a que se destinava, danos resultantes de prejuízo decorrente da privação do uso no âmbito do exercício da actividade a que estava adstrito o aludido veículo, danos indemnizáveis e consequência directa e adequada do sinistro cuja responsabilidade a demandada assumiu. Sendo certo que não se provou o valor exato dos danos, o montante indemnizatório deve ser fixado com recurso à equidade, nos termos do nº 3 do art. 566º. Atentos os factos provados e o depoimento da testemunha H, Deste modo, atento os factos provados, afigura-se que a quantia pedida pela demandante é justa e equitativa.

Decisão.
Em face do exposto, condeno o demandado C, a pagar à demandante a quantia de €4.201,50 (quatro mil duzentos e um euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora até integral pagamento;
Reiterando o supra exposto, declaro a demandada D, absolvida da instância.

Custas.
Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero o demandado parte vencida, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso. Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação à demandante.

Julgado de Paz de Lisboa, em 25 de janeiro de 2018
A Juíza de Paz
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Maria Judite Matias