Sentença de Julgado de Paz
Processo: 65/2018-JPMMV
Relator: ISABEL BELÉM
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
Data da sentença: 05/30/2018
Julgado de Paz de : MONTEMOR-O-VELHO
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA
Proc. N.º 65/2018-JP

I - IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandantes: A, titular do NIF XXX XXX XXX, com residência na Rua Dr. X, nº 22, Santo Varão e B, titular do NIF XXX XXX XXX, com residência na Rua Dr. X, nº 22, Santo Varão.

Demandada: C – Construção Civil, Ldª, NIPC XXX XXX XXX, com sede na Rua da XX, nº XX, Cernache, Coimbra.

II - OBJECTO DO LITÍGIO
Os Demandantes intentaram, em 12 .03.2908, contra a Demandada, ação declarativa pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 4.797, equivalente ao valor necessário à reparação/eliminação dos defeitos que a obra executada pela Demandada apresenta.
Para tanto, alegaram os factos constantes do Requerimento Inicial de fls. 1 a 6, cujo teor se dá por reproduzido e juntou documentos (fls. 7 a 15).
Citada a Demandada esta apresentou contestação.
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com obediência às formalidades legais como da ata se infere, tendo o demandante juntado documentos.
Valor da ação: € 4.797,00
A alínea c) do nº 1 do artigo 60º da Lei nº 78/2001, de 13/7, alterada pela Lei 54/2013, 31/7, estatui que, nas sentenças proferidas, deve constar uma “sucinta fundamentação”, o que se procurará fazer de seguida.

III - FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Da matéria carreada para os autos, ficou provado que:
1) Os Demandantes são donos e legítimos proprietários de um prédio urbano composto por casa de habitação, garagem e jardim, descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis de Montemor-o-Velho sob o n.º XXXX/20XXXXX2 – B, da freguesia de Santo Varão, concelho de Montemor-o-Velho;
2) Necessitando a sua habitação de uma intervenção e beneficiação, a nível de pintura exterior e também de pintura de muro de vedação, bem como uma intervenção nos telhados, que consistiu na sua limpeza e aplicação de produto impermeabilizante, os Demandantes contrataram a empresa Demandada, para executar trabalhos de construção civil;
3) Assim sendo e após os Demandantes adjudicarem a execução dos trabalhos à empresa Demandada, esta procedeu à realização da empreitada, previamente acordada com estes, que consistia não só em pinturas, como no fornecimento da tinta, tendo ainda acordado, que esta seria, da marca CIN;
4) No âmbito do mesmo contrato, ficou ainda a Demandada de proceder à reparação das paredes exteriores que se encontravam fissuradas;
5) Estes trabalhos orçaram e foram adjudicados pelos Demandantes à Demandada, pela quantia total de 4.783,74 €;
6) Quantia essa, que já se encontra totalmente paga em numerário pelos Demandantes à Demandada, em duas tranches, sendo a primeira de 1.000,00 € aquando do início dos trabalhos em Julho de 2016 e a segunda, no valor de 3.783,74 €, no fim dos mesmos, em Agosto do mesmo ano; ou seja a quantia total de 4.783,74 €.
7) Isto apesar de ter sido só emitida, pela empresa Demandada, em 04/08/2016, a fatura nº 4, no valor de 2.460,00 €;
8) A Demandada iniciou os trabalhos no mês de Julho de 2016, de 2016, tendo procedido à colocação de massas nas paredes e procedido à pintura das paredes de empena da casa de habitação bem como do muro de vedação e ainda de limpeza do telhado;
9) A conclusão dos trabalhos, ocorreu na 1ª semana de Agosto de 2016;
10) Volvidos cerca de dois meses depois, verificaram os Demandantes, o aparecimento de imensas bolhas de ar e empolamentos em duas das paredes intervencionadas;
11) E disso deram conta à Demandada a, qual através do seu representante CP, se deslocou ao local para ver as anomalias;
12) Tendo este sugerido a intervenção de um técnico da empresa fornecedora da tinta, designadamente, da CIN, para aquilatar o grau de degradação das paredes pintadas, bem como, propor uma solução no sentido da resolução desta questão;
13) Nesta sequência, deslocou-se um técnico da CIN, à casa dos Demandantes, no dia 21 de Setembro de 2016, para se aperceber do que correu mal naquela pintura, estando ainda presentes, a Demandante A e o representante da Demandada e responsável pela aplicação da tinta, Sr. CP;
14) Tendo, este Técnico (CIN) elaborado um relatório junto a fls. 12 a 14 que se dá o seu conteúdo por integralmente reproduzido;
15) Tais paredes exteriores (sul e oeste), em alguns pontos, apresentavam, à data da visita técnica, elevado índice de humidade;
16) A tinta utilizada para a repintura da casa exige que a sua aplicação seja feita de acordo com procedimentos específicos, designadamente que as paredes se encontrem reparadas, secas e limpas, livres de contaminantes;
17) A Demandada assumiu a responsabilidade na deficiência da execução da obra e prontificou-se a corrigir e retificar essas anomalias;
18) Volvidos quase dois anos após a execução da obra, a sua correção continua por realizar, apesar de ter sido já várias vezes interpelado pelos demandantes nesse sentido, não só telefonicamente, mas também pessoalmente e por email.
19) A pintura realizada pela Demandada, se tem vindo a deteriorar, com a consequente infiltração de águas pluviais no interior da habitação dos Demandantes, apresentando já, algumas paredes interiores, sinais evidentes de humidade, designadamente, bolor e manchas negras;
20) Necessitando a casa de habitação dos Demandantes de uma intervenção célere, no sentido de resolver os defeitos e danos causados pela empresa Demandada, os demandantes refutam agora, qualquer intervenção da Demandada;
21) Os Demandantes solicitaram um orçamento, a um pintor da sua confiança, para a reparação total e integral dos trabalhos mal realizados pela Demandada;
22) Esses trabalhos orçaram na quantia de 3.900,00 €, mais IVA à taxa legal em vigor, ou seja, à quantia total de 4.797,00 €, a qual inclui a pintura integral de todas as fachadas intervencionadas, para que a cor do edifício não fique “remendada” e fique com uma cor uniforme;
23) Neste momento, não existe um clima de confiança que permita aos Demandantes proporcionar à Demandada a correção das anomalias que se verificaram em obra, por esta não ter feita a intervenção nas devidas condições;

B - Factos não provados:
Com interesse para a causa, não se provaram quaisquer outros factos relevantes para a decisão da causa, designadamente que a Demandada tenha lavado todas as paredes e pedras com máquina de pressão de água e tenha procedido à devida reparação das paredes e que as massa de reparação tenham sido indicadas e compradas pelos Demandantes; que a tinta aplicada (repintura) tenha sido aplicada de acordo com os requisitos de aplicação recomendados pela CIN; Que aquando da repintura já havia humidade retida nas paredes.

C- Convicção:
A convicção do Tribunal para a factualidade dada como provada foi adquirida através da análise crítica e ponderada, à luz das regras da lógica e das máximas da experiência de vida, do teor dos documentos juntos aos autos, e, ainda, das declarações das partes, e dos depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência final.
Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do Código de Processo Civil, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam o que os Demandantes alegaram e resultaram da instrução e discussão da causa.
Os factos sob a os nºs 1) a 14) resultam da admissão dos mesmos pelas partes nos seus articulados, não tendo sido impugnados e confirmados pelos Demandantes em declarações bem como pela testemunha MIQS, sendo que os facto 1) e 14) resultaram ainda, respetivamente do teor do doc. De fls. 7 e 12 a 14.
Refira-se que a Demandada não nega a celebração do contrato de empreitada, no essencial o que nega é a sua responsabilidade pelos defeitos apresentados por entender que o problema se deve à humidade retida nas paredes, pela qual não é responsável.
Quanto aos factos 15) e 16) resultam da conjugação do relatório de fls.12 com as declaração da testemunha AJM, técnico da CIN.
.A testemunha e técnico da Cin no seu depoimento referiu que desconhece os procedimentos adotados pela Demandada e se esta cumpriu ou não os requisitos técnicos de aplicação da tinta, o que consta no relatório acerca dos procedimentos adotados, diz a testemunha, resultam das declarações do representante da Demandada no local. designadamente desconhece se as paredes foram previamente tratadas e preparadas, designadamente se foi retirada toda a tinta velha danificada o que, em caso negativo, sempre poderia interferir com a nova provocando as bolhas de ar.
Refere ainda a testemunha que quando as paredes a pintar se apresentam fissuras é essencial a reparação prévia das mesmas. A existência de fissuras nas paredes externas indiciam a probabilidade de as paredes absorverem humidades, e qualquer profissional sabe que essas fissuras terão de ser reparadas com massas adequadas e deixar secar as paredes e as massas antes de proceder á pintura. Qualquer humidade que ocorra antes durante ou após a colocação das massas de reparação ou da pintura sem que se encontrem perfeitamente secas podem originar o empolamentos verificados na obra. A este propósito disse ainda a testemunha que a Cin disponibiliza um serviço gratuito de medição da humidade das paredes aos profissionais de pintura, desconhecendo se o Demandado o solicitou ou não.

Quanto ao facto 17) resultou das declarações de parte corroboradas pela testemunha AM que confirmou que no dia visita técnica e face ao verificado, a Demandada, na pessoa do seu representante CP se prontificou a fazer as necessárias reparações.
Os factos 18), 19), 20) e 23) resultam das declarações de parte e do depoimento da testemunha MIS, mãe da Demandante.
Os factos elencados em 21) e 22) resultam do teo do orçamento de fls. 15, cujo conteúdo se dá por reproduzido.
Quanto aos factos não provados resultaram da total ausência de prova. Refira-se que a Demandada, não obstante ter contestado a ação, não compareceu à audiência de julgamento nem apresentou qualquer prova.

IV – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Da qualificação do contrato
Para a decisão da causa, importa antes de mais saber qual a natureza do contrato celebrado entre Demandantes e Demandada, nomeadamente se corresponde a um contrato de empreitada de consumo, abrangida pelo Decreto-Lei nº 67/2003 que procedeu à transposição da Diretiva 1999/44/CE, de 25/5/1999, estabeleceu um regime especial da venda e outros contratos de consumo, tendo por objetivo assegurar a proteção dos interesses dos consumidores nesses contratos.
Dos factos provados apurou-se que a Demandante adjudicou à Demandada a realização de trabalhos de pintura dos muros de vedação, das paredes exteriores, com reparação das fissuras, e limpeza e impermeabilização do telhado, pelo preço de €4.783,74.
Sendo pacífico que o regime do D.L. 67/2003 é aplicável ao contrato de construção de imóvel, desde que o dono da obra seja consumidor, entendemos que a aplicação do mesmo não é de excluir nas empreitadas de reparação.
Seguindo a posição de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. III, 10ª edição, página 562, entendemos que a atual redação do citado artigo 1.º-A, n.º 2 do D.L. n.º 67/2003, permite abranger não apenas a empreitada de construção, mas também a empreitada de reparação ou modificação, sob pena da alteração apesar de significativa em termos de redação, não ter significado prático.
É incompreensível que o mesmo regime não seja aplicável quando o dono da obra contrata a reparação do imóvel. Essencial é que se esteja perante uma relação de consumo entre o dono da obra e o empreiteiro. Esta relação ocorre sempre que o empreiteiro exerça com caráter profissional essa atividade e o dono da obra seja um consumidor, visando a mesma fins não profissionais.
No caso dos autos a Demandada é uma sociedade que tem por objeto a construção civil e o contrato aqui em causa de pintura exterior da habitação foi celebrado, a título oneroso, no âmbito da sua atividade.
O artigo 1.º B, alínea a), do D.L. nº 67/2003, define consumidor como “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º1 do artigo 2º da Lei n.º 24/96, de 31 de julho.”
Este artigo 2.º n.º 1 da referida Lei de Defesa dos Consumidores, estipula: “Considera- se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios.”.
Ora, os Demandantes não são profissionais e os serviços foram prestados na sua casa de habitação, pelo que não restam dúvidas que se aplica ao caso concreto, o D.L. 67/2003, ou seja, estamos perante o subtipo contratual de empreitada de consumo.
Da Responsabilidade da Demandada
Da relação jurídica emergente de uma empreitada, derivam obrigações recíprocas e interdependentes: Do lado do empreiteiro (aqui Demandada), a principal obrigação é a de obter um certo resultado material, que se traduz na execução da obra nas condições convencionadas, e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (artº 1208º do C.C.). Do lado do dono da obra (aqui Demandante), em contrapartida, impende o dever principal de, caso aceite a obra, pagar o preço ajustado o que, na ausência de convenção ou uso em contrário, deve ser efetuado no ato daquela aceitação (artº 1211º nº 2 do C.C.).

No caso dos autos, resultou inequivocamente provado o cumprimento da obrigação contratual dos Demandante, com o pagamento do preço acordado.

Por sua vez, do lado da Demandada empreiteiro resulta que a obra apresenta patologias, como resulta dos factos provados, as paredes sul e poente intervencionadas pela Demandada apresentam-se com bolhas de ar e empolamentos.

Ora tais patologias integram o conceito de vícios a que alude o artigo 1208.º do C.C.

Como refere P. Romano Martinez “…os vícios correspondem a imperfeições relativamente à qualidade normal, enquanto que as desconformidades são discordâncias com respeito ao fim acordado. O conjunto dos vícios e das desconformidades constituem os defeitos da coisa. Os dois elementos fazem parte do conteúdo do defeito, determinam-se através do contrato e dependem da interpretação deste.”

É o caso dos autos, já que as bolhas de ar na pintura das paredes, além do prejuízo estético, conduzirão, com o decurso do tempo, à queda da pintura nesses locais por estar descolada e permitirão a infiltração de agentes causadores de erosão (areias, água, calor etc.) que contribuirão para um processo degradação mais acelerada das paredes.

A Demandada alega não ser responsável porquanto tais anomalias se ficarem a dever à humidade que se encontra retida nas paredes.

Ora, ficou demonstrado que as paredes apresentam, elevado índice de humidade, em 26 de setembro de 2016, data em que foi realizada a visita técnica.

Porém, não foi possível concluir que essa humidade já se encontrasse retida nas paredes intervencionadas aquando da pintura e menos ainda a causa dessas humidades. Não foi possível determinar se a humidade resultou de infiltrações de águas às quais a Demandada seja completamente alheia, ou se essa humidade ocorreu antes, durante ou após a aplicação das massas de reparação e da pintura.

De todo o modo, ainda que assim não fosse, há que ter em consideração que a Demandada assumiu a realização da obra por ser pessoa com conhecimentos especiais em matéria de pintura.

Estando vinculado a uma obrigação de resultado, o empreiteiro/Demandada goza de liberdade de atuação quanto ao modo de o atingir, devendo, porém, respeitar e proceder de harmonia com as regras de arte, as normas técnicas e os conhecimentos científicos e técnicos, aplicáveis à atividade em que se integra a obra (pintura).

A testemunha, técnico da CIN referiu que as paredes têm de estar livres de quaisquer impurezas ou contaminantes antes de se proceder à pintura com a tinta que foi aplicada. Mais esclareceu que quando as paredes se encontram fissuradas é essencial a sua reparação prévia e certificação de que as paredes se encontram secas. Por isso a CIN disponibiliza um serviço gratuito de medição da humidade das paredes aos profissionais de pintura, desconhecendo se o Demandado o solicitou ou não.

Ora, sendo dever Demandada executar o serviço segundo as regras da arte, se a pintura para ser corretamente executada necessitava de obedecer a certos procedimentos a Demandada devia tê-los adotado, designadamente certificar-se que as paredes estavam devidamente secas, a não ser que a Demandante estando devidamente esclarecida ou informada dispensasse a Demandada de os adotar, o que não ficou demonstrado.
Aos Demandantes apenas competia o ónus de alegar e provar o defeito ou a falta de conformidade (342º,1 do CC), a qual se presume, não lhe competindo demonstrar a causa do defeito.
Cabendo ao empreiteiro aqui Demandada provar a ausência do nexo de imputação à sua pessoa dessa falta de conformidade.
Para afastar tal presunção o empreiteiro teria que provar a causa do defeito, sendo-lhe esta completamente estranha, pois que, só assim se exonerará da responsabilidade pelo defeito existente na obra.
Ora, considerando a factualidade provada e a presunção em causa, importa concluir que o incumprimento defeituoso dos trabalhos supra descritos, é imputável à Demandada.
Do Pedido de indemnização
Provada a responsabilidade da Demandada, cabe agora decidir se os Demandantes podem pedir uma indemnização direta e exclusivamente destinada à reparação/eliminação, por terceiro, dos defeitos que esta apresenta.
O artigo 3.º do citado DL 67/2003 dispõe que o “ vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue ” (aplicável também nas situações de empreitada, cfr. artigo 1.º nº 2 do mesmo diploma).
O artigo 4.º, n.º 1 do diploma em questão dispõe, por sua vez, que “ em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato ”.
Por seu turno, o n.º 5 do citado artigo 4.º estatui que “ o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais ”.
Há ainda que atender ao disposto no artigo 12.º da Lei n.º 24/96 (LDC), na redacção do Decreto-Lei 67/2003, que atribui ao “ consumidor direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos ”.
Tem-se entendido, porém que os direitos de indemnização estabelecidos no artigo 12.º da LDC se destinam a obter outros ressarcimentos, nomeadamente lucros cessantes e danos emergentes, mas já não o pagamento do custo de uma reparação dos defeitos.
Pelo que, perante a existência dos defeitos na obra executada o dono da obra aqui Demandantes teriam que lançar mão dos direitos que o artigo 4.º, nº 1 do DL 67/2003 põe à sua disposição, o que não acontece no caso dos autos.
Como é referido no Ac. Relação de Guimarães de 12.7.2016 (Jorge Seabra), este enquadramento legal genérico é passível de ser afastado, em especiais circunstâncias, como são os casos, que a jurisprudência vem admitindo, de declaração de não satisfação da reparação ou substituição da coisa, de transformação da mora da vendedora em incumprimento definitivo ou de urgência da reparação dos defeitos.
Portanto, o que se impõe é que o consumidor (dono da obra) alegue as razões pelas quais desiste do programa contratual ou das possibilidades da sua reposição do modo mais “reconstituinte” possível.
Significa isto não que o dona da obra em certas circunstância pode pedir o custo de reparação dos defeitos.
Necessário é que resulte da factualidade provada o excecional circunstancialismo capaz de justificar a pretensão dos Demandantes no sentido de ser a Demandada condenada a pagar o valor ou custo da reparação dos defeitos em causa.
Dos factos provados resulta que a Demandada assumiu a obrigação de reparar e que apesar disso e de ter sido interpelado para o efeito ainda não procedeu a qualquer reparação, e que os os Demandantes refutam agora qualquer intervenção da Demandada na reparação por já não confiarem na qualidade dos seus trabalhos.
Porém dos factos provados não resulta demonstrado que a Demandada tenha manifestado uma qualquer recusa definitiva e inequívoca quanto à reparação dos defeitos, ou que esta se encontre numa situação de incumprimento definitivo, mas apenas de simples mora/atraso na reparação ou eliminação reclamada ou que esta mora tenha sido transformada em incumprimento definitivo através da respetiva interpelação admonitória, ou ainda que os Demandantes tenham perdido o interesse, objetivamente apreciado (artigo 808º do C.C.).
A interpelação admonitória pressupõe que o credor tenha ainda qualquer interesse no cumprimento, sendo pacifico o entendimento que, para produzir os efeitos de incumprimento e resolução estabelecidos na norma, a interpelação admonitória, deve, além de fixar um prazo razoável para o cumprimento, informar com clareza que a inexecução da prestação dentro desse prazo terá como consequência ter-se a mesma como definitivamente não cumprida, isto é, deve conter uma intimação clara e inequívoca para cumprir sob pena de se ter como verificado o incumprimento definitivo.
Pelo que no caso dos autos temos que a Demandada se encontra em mora e não em incumprimento definitivo. Cabia aos Demandantes, perante os atrasos na reparação das anomalias, procederem a uma última e derradeira tentativa de interpelação da Demandada para reparação dos defeitos num determinado prazo, com a advertência de que se não cumprisse dentro desse prazo a obrigação da Demandada se tinha por definitivamente, para que, então, lhes fosse possível exigir a indemnização correspondente ao valor da reparação. Ora, como vimos, isso não aconteceu.
Finalmente, quanto à perda de interesse objetivo dos Demandantes em a Demandada proceder à reparação, Se é verdade que facilmente se constata pela pretensão dos Demandantes deduzidas na presente ação que estes não têm interesse em que seja a Demandada a proceder à eliminação dos defeitos, essa falta de interesse não tem, porém, qualquer fundamento objetivo perante a matéria apurada, pelo que também por este motivo não é possível concluir pela verificação duma situação de incumprimento definitivo.
Não estando apurada uma situação de incumprimento definitivo da obrigação da Demandada a eliminar os defeitos da obra que realizou, não têm os Demandantes direito a reclamar o pagamento da quantia necessária para eles procederem à sua reparação por si próprios ou através da contratação de terceiro.
Por outro lado ainda, também não se verifica qualquer situação de urgência a justificar quer a ação direta, quer o estado de necessidade – artigos 336º e 339.º do C.C., urgência que a existir levaria a que os Demandantes procedessem à reparação (depois de avisada a Demandada), como seria o normal, caso se tratasse de defeitos verdadeiramente urgentes, impeditivos da quotidiana e usual utilização do imóvel.
Isto posto, os Demandantes. não efetuaram a prova, como lhes competia, de uma situação de incumprimento definitivo ou de situação de urgência, por forma a justificar a procedência do pedido de condenação no custo das reparações dos defeitos, pelo que o pedido terá de improceder.

V – DECISÃO
Em face do exposto, julgo a presente ação improcedente, por não provada, e, em consequência absolvo a Demandada do pedido

Custas: Custas totais pelos Demandantes, que deverá proceder ao pagamento da quantia de € 35,00, no prazo de 03 (três) dias úteis subsequentes à notificação da presente Decisão, sob pena da aplicação de uma sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso, reembolsando-se a Demandada da quantia de €35,00.
Registe e notifique.

Montemor-o-Velho, 30 de maio de 2018
A Juíza de Paz coordenadora,

(Isabel Belém)
Processado por meios informáticos e
revisto pela signatária. Verso em branco.
(artigo 18º da LJP)