Sentença de Julgado de Paz
Processo: 46/2018-JPCRS
Relator: ELISA FLORES
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRA CONTRATUAL
Data da sentença: 06/13/2018
Julgado de Paz de : CARREGAL DO SAL
Decisão Texto Integral:
II ATA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
Aos treze dias do mês de junho de dois mil e dezoito, pelas 16:00 horas, realizou-se no Julgado de Paz de Carregal do Sal, a continuação da Audiência de Julgamento do Processo n.º46/2018 - JPCRS, em que são partes: ---------------
Demandantes: A e mulher B;--------------------------------------------------
Demandada: Cª de Seguros C.------------------------------------------------
Realizada a chamada verificou-se que apenas se encontravam presentes os Demandantes e o seu ilustre mandatário.---------------------------------------
O Julgamento foi presidido pela Ex.ma Senhora Juíza de Paz, Dra. Elisa Flores. ----
A Ex.ma Senhora Juíza de Paz proferiu a sentença anexa à presente ata e que dela faz parte integrante e entregou uma cópia aos presentes.-----------------------
Nada mais havendo a salientar a Sra. juíza de Paz deu como encerrada a Audiência. --------------------------------------------------------------------
Para constar se lavrou esta Ata que vai ser devidamente assinada. --------------
A Juíza de Paz, Elisa Flores ----------------------------------------------------
O Técnico de Apoio Administrativo, Miguel Alberto Baptista Mendes --------------
SENTENÇA
RELATÓRIO
A, e mulher B, propuseram contra Cª de Seguros C, a presente ação declarativa enquadrada na alínea h) do nº 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 2.012,53 (dois mil e doze euros e cinquenta e três cêntimos), a título de indemnização pelos prejuízos resultantes do sinistro ocorrido nos quartos da sua habitação.-------------------
Para o efeito alegaram os factos constantes do requerimento inicial de fls. 4 a 9 e juntaram 9 documentos, que aqui se dão por reproduzidos. ---------------------
A demandada apresentou contestação, nos termos constantes de fls. 67 a 73 dos autos, impugnando os factos alegados pelos demandantes e concluindo pela improcedência da ação. Juntou 5 documentos, que aqui também se dão por reproduzidos. -----------------------------------------------------------------------------------------------------
O litígio não foi submetido a mediação. ------------------------------------------
Em Audiência de julgamento ambas as partes apresentaram prova testemunhal. -----
Valor da ação: Fixo em 2.012,53 (dois mil e doze euros e cinquenta e três cêntimos). ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
O artigo 60º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua alínea c), prescreve que do conteúdo da sentença proferida pelo juiz de paz faça parte uma sucinta fundamentação. Assim: ---------------------------------------------------------------------
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: ------------------------------------------Consideram-se provados para os presentes efeitos, os seguintes factos: -----
1.º- Os demandantes são donos e legítimos proprietários, do prédio urbano, sito na Rua da Fonte n.º1, Pisão, União das freguesias de D, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1088.º, da extinta freguesia de E, anteriormente artigo 1373º, e descrita na Conservatória de Registo Predial de F sob o n.º 1136/20090330; ------
2.º- Em 15 de julho de 2012 o demandante marido na qualidade de tomador do seguro e segurado, celebrou com a demandada um contrato de seguro Multirriscos denominado “C Casa”, titulado pela Apólice n.º XXXXXXXXX; --------------------
3.º- Contrato que teve início às 21:10h desse mesmo dia e foi celebrado até às 24h00 de 14/07/2013, sendo automática e anualmente renovável a partir de 15/07/2013; ------------------------------------------------------------------
4.º- Tendo por objeto o referido imóvel [ponto 1.º supra] sito na Rua da Fonte, 1, F; ----------------------------------------------------------------------------
5.º- E pelo qual o demandante procurou garantir diversos riscos, tais como, tempestades, inundações, danos por água e outros; ----------------------------
6.º- Entre as partes cobertas contratadas inclui-se a cobertura denominada de “B, TEMPESTADES”, pelo capital seguro de € 50 000,00 (cinquenta mil euros), e que refere o seguinte:--------------------------------------------------------------
“ 1. Garante os danos causados aos bens seguros em consequência direta de: ---
a) Tufões, tornados e toda a ação direta de ventos fortes ou choque de objetos arremessados ou projetados pelos mesmos (sempre que a sua violência destrua ou danifique instalações, objetos ou árvores num raio de 5 kms envolventes dos bens Seguros);-----------------------------------------------
Em caso de dúvida poderá o Segurado fazer prova, por documento emitido pela estação meteorológica mais próxima, de que no momento do sinistro os ventos atingiram intensidade excecional (velocidade superior a 100 km/hora); -----------
b) Alagamento pela queda de chuva, neve ou granizo, desde que estes agentes atmosféricos penetrem no interior do edifício seguro em consequência de danos causados pelos riscos mencionados em a), na condição de que estes danos se verifiquem nas 48 horas seguintes ao momento da destruição parcial do edifício; -
c) Ocorrência de nevões. -------------------------------------------------
1. São considerados como constituindo um único e mesmo sinistro os estragos ocorridos nas 48 horas que se seguem ao momento em que os bens seguros sofram os primeiros danos. -----------------------------------------------------------
2. Não ficam garantidos os danos causados: --------------------------------
a) Por ação do mar e outras superfícies de águas naturais ou artificiais, sejam de que natureza for, mesmo que estes acontecimentos resultem de temporal; ----
b) Em construções que não tenham sido dimensionadas de acordo com a regulamentação vigente à data de construção e cuja estrutura, paredes exteriores e cobertura não sejam maioritariamente construídas com materiais resistentes (designadamente madeira, placas de plástico, betão armado, alvenaria e telha cerâmica), ou em quaisquer objetos que se encontrem no interior dos edifícios ou construções acima mencionadas: ---------------------------------------------
c) Em bens móveis existentes ao ar livre; -----------------------------------
d) Em dispositivos de proteção (tais como toldos e marquises), muros, vedações, portões, os quais ficam, todavia cobertos, se forem acompanhados de destruição total ou parcial do imóvel, caso este seja objeto do seguro. ----------
É considerada destruição parcial do imóvel sempre que os danos nele causados resultem numa indemnização de valor superior a 5% do valor seguro fixado nas Condições particulares para o edifício. ----------------------------------------
e) Pela deterioração gradual dos bens seguros devido à ação prolongada e contínua da água, seja qual for a origem da sua proveniência.” ------------------
7.º- Na noite de 10 para 11 de dezembro de 2017, Portugal foi atingido pela tempestade denominada “Ana”, formada a Noroeste da Península Ibérica, que se caracterizou pela precipitação intensa e fortes rajadas de vento; -------------------
8.º- O distrito de G foi um dos distritos mais afetados e para o qual foi emitido alerta vermelho pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) devido à chuva intensa e às rajadas de vento forte; ----------------------------------------------
9.º- Segundo o Parecer do mesmo Instituto, nos autos a fls. 280, na referida Rua da Fonte, onde se situa o objeto segurado, entre as 20:00h do dia 10 de dezembro e as 08:00h dia 11 de dezembro de 2017 o vento terá soprado moderado a forte (30 a 50Km/h) do quadrante oeste, tornando-se moderado no início da madrugada e fraco a moderado (<20Km/h) a meio da madrugada e “…a quantidade de precipitação terá atingido valores de 40 a 50 milímetros; --------------------------
10.º- Sendo que o mesmo é ainda de parecer que a intensidade máxima instantânea do vento “…tenha atingido valores de 80 a 90Km/h no final do dia 10…” e a “de precipitação tenha atingido 8 a 10 milímetros em 10 minutos no final do dia 10, podendo pontualmente ter ultrapassado ligeiramente os 10 milímetros em 10 minutos.”; ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
11.º- Como consequência direta das rajadas de vento e da precipitação, entrou água na habitação dos demandantes, concretamente, em três quartos da referida habitação que se situam a norte; ----------------------------------------------------------
12.º- Danificando carpetes e paredes dos três quartos; ------------------------
13.º- No dia 12 de dezembro de 2017, os demandantes comunicaram o sinistro à demandada através do seu mediador de seguros; -------------------------------
14.º- Na sequência desta Participação do sinistro, a demandada encarregou uma empresa especializada, denominada “H”, para proceder à averiguação do sinistro e para determinar os prejuízos; --------------------------------------------------
15.º- Que enviou ao imóvel, no dia 15/12/2017, um técnico especializado em averiguação de sinistros, o I; --------------------------------------------------
16.º- De acordo com a peritagem da aludida firma, foi efetivamente verificada a afetação de água em carpetes, no pavimento de 3 quartos, sendo notórias as manchas e humidade recente; --------------------------------------------------
17.º- Nos termos do documento de confirmação da Vistoria realizada, os danos foram causados “por afetação de água nas carpetes de 3 quartos de habitação, tendo entrada através dos peitoris exteriores das janelas da habitação, no seguimento da tempestade “Ana” na região, nos dias 10 e 11-12-2017, acompanhada de ventos muito fortes, conforme noticiado pelos diversos meios de comunicação social”; ----------------------------------------------------------
18.º- Mais refere que é necessário proceder à limpeza/substituição das carpetes nos 3 quartos; ----------------------------------------------------------------------
19.º- Tendo o demandante manifestado perante o perito o seu acordo relativamente à tipologia e quantificação dos danos resultantes do sinistro, apondo a sua assinatura e rubrica no documento de “Confirmação de Vistoria”; ----------
20.º- E a Seguradora orçado a limpeza e substituição de carpetes nos 3 quartos na quantia de € 630,00 (valor sem IVA), incluindo a deslocação e a mão-de-obra para retirar todos os móveis e a limpeza das carpetes dos pavimentos de 3 quartos, numa área de 36 m2, incluindo ainda os produtos necessários; -----------
21.º- Por carta datada de 27 de dezembro de 2017, a demandada comunicou aos demandantes de que após análise detalhada das circunstâncias do sinistro e do relatório pericial, os danos reclamados causados pela tempestade não encontram acolhimento na Apólice contratada; --------------------------------------------
22.º- A demandada informou, ainda, que resultou da peritagem efetuada que a entrada de água na habitação ocorreu por “falta de estanquicidade dos peitoris das janelas dos quartos”; ---------------------------------------------------------------
23.º- E que tal situação não faz acionar qualquer cobertura da apólice, por se tratar de uma situação sem carácter súbito e imprevisto, antes decorrendo de falta de manutenção/conservação do objeto seguro; -------------------------------------
24.º- Tendo, nessa data, procedido ao encerramento do processo de sinistro sem emissão de qualquer valor indemnizatório; -------------------------------------
25.º- Os demandantes não aceitam a posição da demandada nem os factos em que assenta; ---------------------------------------------------------------
26.º- Por não aceitar o resultado da vistoria e o encerramento do sinistro, o demandante marido solicitou nova peritagem; ---------------------------------------------------
27.º- Por não ter obtido resposta, em 23 de janeiro de 2018, solicitou a intervenção da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões; -----
28.º- Por carta datada de 9 de fevereiro de 2018 a demandada mantém a posição de não indemnizar os danos resultantes do sinistro acrescentando, ainda que, para além da falta de estanquicidade/impermeabilização dos peitoris das janelas dos quartos, foi apontada pelo perito uma segunda origem, a possibilidade de as janelas não terem ficado devidamente fechadas aquando da tempestade; ------------------------
29.º- Em 21 de fevereiro de 2018, os demandantes enviaram “Relatório Técnico”, datado de 20 de fevereiro de 2018 e elaborado por Engenheiro Técnico Civil, J, visando a reapreciação do sinistro por parte da demandada; ----------------------------
30.º- Do relatório elaborado pelo Engenheiro Técnico Civil é feita uma caracterização da construção de onde se pode concluir que as janelas da habitação são em caixilharia de madeira e os peitoris são de granito e apresentam boa estanquidade e que no chão havia alcatifas com rodapé; ---------------------
31.º- Mais refere que a drenagem das águas pluviais é feita através de duas caleiras que as conduzem ao piso térreo de dois tubos de queda; ----------------
32.º- Quanto aos danos causados pela tempestade nos quartos da moradia dos demandantes, indica o Sr. Engenheiro que resultaram de inundações que destruíram a alcatifa dos 3 quartos e pintura das paredes manchada; ---------------------
33.º- Conclui o seu Relatório/Parecer Técnico dizendo “ Uma vez que as paredes, janelas e peitoris apresentam uma boa estanquidade, já que até à data do sinistro nunca houve qualquer infiltração, poder-se-á concluir que as inundações se deveram a uma situação excecional de mau tempo com chuva e ventos muito fortes que terão aberto parcialmente as janelas (não totalmente porque as portadas interiores em madeira as seguraram), sem que os proprietários se apercebessem, inundando a moradia nos três quartos com paredes viradas ao vendaval.”; ------------------------------------------------------------------------------
34.º- Anexo consta um orçamento no valor de €1 636,20 (sem IVA), em síntese, também a substituição das alcatifas dos quartos por plaquet flutuante, o arranjo dos rodapés e pintura das paredes com tinta plástica; ------------------------------------
35.º- Os ventos que se verificaram no dia 10 de dezembro de 2017, que surgiram de noroeste, fizeram com que entrasse água nos referidos três quartos dos demandantes; ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------
36.º- Não era previsível que tal acontecesse, pois, até aquela data, nunca tinha entrado água na casa dos demandantes; --------------------------------------------------
37.º- Os danos verificados resultam diretamente dos ventos fortes e chuva intensa que assolou o país, e principalmente o distrito de G; --------------------
38.º- Tais danos necessitam urgentemente de ser reparados, pois estão os demandantes privados de utilizarem os referidos quartos; ------------------------------------------
39.º- Os demandantes, em data que não foi possível precisar, remeteram à demandada, através do seu mediador de sinistros, um orçamento emitido pela empresa L, Lda. datado de 10 de janeiro de 2018 em que é referido “…sendo os danos causados no valor de 720,00€, mais IVA…”, não os especificando. ---------

Motivação dos factos provados: --------------------------------------------
A factualidade dada como provada resultou da conjugação dos factos aceites pela demandada, dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, e dos que, tendo-o sido, foram corroborados por outra prova, das declarações dos demandantes, que, apesar de emotivas foram claras e coerentes, logrando convencer o Tribunal da sua veracidade, sublinhando que até à data da ocorrência do sinistro água nunca entrou pelas janelas, nem posteriormente, e da prova testemunhal, tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 607º, nº 5 do Código de Processo Civil (CPC) e no artigo 396º do Código Civil (doravante designado simplesmente C.Civ). -----------------------------------------------------------
Relativamente à prova testemunhal, as testemunhas apresentadas pelos demandantes, seus vizinhos, J, engenheiro que efetuou e redigiu o Relatório Técnico referido na factualidade provada, e M, serralheiro, prestaram um depoimento credível e sobre factos de que tinham conhecimento direto, a tempestade na localidade e os danos, sendo os seus depoimentos também relevantes na descrição dos danos e respetiva causalidade pelos seus conhecimentos profissionais.----------------------------------------------------
Ambos referiram a estanquidade das janelas, que são de madeira, de abrir para dentro, com portadas, e peitoris de granito, construção habitual na zona; E o primeiro confirmou o que consta no seu Relatório e que a suposição de que as janelas poderão ter aberto parcialmente com o vento foi sua e não do demandante; Depôs ainda que quando fez a inspeção, em fevereiro, já não existia água mas havia sinais da mesma no chão e nas paredes dos 3 quartos; E o segundo depôs que quando viu a casa passado 1 dia ou 2, viu as alcatifas “todas molhadas e paredes molhadas”; Que pensa que a chuva tocada a vento, bateu nas janelas e passou por baixo, dado que têm de ter uma folga de uns 3 milímetros ou mais para não roçarem no peitoril ao abrir, espaço que em condições normais não deixa passar água; Que não lhe parece que se tenham aberto as janelas pela força do vento, logo as três; E disse ainda que a um vizinho caiu um pinheiro nessa noite; ------------------------------------------------------------------------
Quanto à testemunha apresentada pela demandada, I, perito da empresa H e que foi quem fez a perícia no imóvel segurado quatro dias após o sinistro, confirmou que foi uma noite de temporal e tiveram conhecimento de mais casos na região; Depôs que teve o cuidado de verificar se o vento e chuva fizeram mais estragos e que viu que não danificaram mais nada; Que não tem dúvida que a água veio das janelas de madeira onde havia sinais de água a 1 cm do peitoril, na parte de baixo; Que não viu vestígios de entrada de água nas paredes nem danos nestas e que mantinha o seu Relatório. Apesar de trabalhar para uma empresa em que a demandada é cliente, prestou um depoimento isento e coerente. -----------------
De referir que, apesar do demandante não o ter mencionado aquando da participação, nem na Vistoria que assinou, e esta última testemunha não ter visto água nas paredes uns dias depois, é natural que, atenta a dinâmica do sinistro que resultou dos depoimentos - água da chuva a entrar pelas janelas-, a mesma escorresse pelas paredes e que, mais tarde aparecessem as manchas de humidade que os demandantes alegam e a testemunha refere no seu Relatório técnico e confirmou em julgamento.-------------------------------------------------------
Mais foram tidos em conta, nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 5º do C P C, factos instrumentais e factos que complementam ou concretizam os que as partes alegaram e resultaram da instrução e discussão da causa, e relativamente aos quais ambas as partes tiveram a possibilidade de se pronunciar. -------------

Factos não provados e respetiva motivação: -------------------------------
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa, por prova em contrário ou falta ou insuficiente mobilidade probatória, nomeadamente que o sinistro se ficou a dever deficiências de estanquicidade, ou por negligência de alguém, que eventualmente, tenha deixado as janelas abertas ou semiabertas dos quartos. ---------------------------------
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (cf. artigo 341º do C. Civ). -------------------------------------------------------------------
De facto, os demandados não lograram prova-lo e o ónus competia-lhes como facto extintivo da sua obrigação (cf. artigo 342º, nº2 do C. Civ), sendo que quanto à estanquidade se provou o contrário e não convence que, em dia de temporal, noticiado, se esquecessem de janelas abertas em três quartos, sendo um deles aquele em que dormiam os demandantes, conforme os mesmos declararam em Tribunal. ------------------------------------------------------------------

Fundamentação de direito: --------------------------------------------------
Entre as partes foi celebrado um contrato de seguro previsto e regulado, na data do sinistro dos autos, já pelo Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de abril, com a redação introduzida pela Lei nº 147/2015, de 9 de setembro, neste caso, Multirriscos casa, contrato bilateral, oneroso, formal, de execução continuada e de adesão, através do qual a demandada se comprometeu a pagar uma indemnização ao demandante no caso de verificação de algum dos riscos cobertos.----------------------------------------------------------------------
O contrato em causa nos autos, não se enquadra em nenhum caso de seguro obrigatório, pelo que a respetiva Apólice não se encontra uniformemente aprovada.
Rege-se então pelas estipulações constantes da apólice, que terão sido negociadas e aceites pelo demandante, dado que nada alegou, ou provou, em contrário, no respeito pelo princípio da liberdade contratual e desde que não colidam com normas imperativas, e, no que não estiver especialmente estipulado, pelas disposições da Lei do Contrato de Seguro, aprovado pelo Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de abril (entretanto com nova redação introduzida) dos regimes gerais do Código Civil e Comercial e regimes comuns como a Lei das Cláusulas contratuais gerais e a Lei de Defesa do Consumidor. ----------------------------
O que está em causa nos presentes autos é determinar se na cobertura contratada, e prevista na Apólice do seguro estabelecido entre as partes, “Tempestades” estão garantidos os danos no imóvel segurado. ------------------
Os demandantes lograram fazer prova de que os alegados danos no seu imóvel resultaram diretamente dos ventos fortes e chuva intensa, que caracterizaram a tempestade “Ana” que então assolou o país, e principalmente o distrito de G, situação que se revestiu de um carácter súbito e imprevisto. -------------------
Do contrato de seguro celebrado entre as partes, titulado pela Apólice 201610965, verifica-se a cobertura “Tempestades” – Artigo 1.1, B, n.º 1, alíneas a) e b) das suas condições, sendo que os danos provados no imóvel do demandante, por nele se ter introduzido água da chuva, que por momentos foi bastante intensa, em consequência direta de ventos fortes, poderão enquadrar-se nessa cobertura. ---
A seguradora demandada estipulou nas referidas condições da apólice que “em caso de dúvida…” (realce nosso) o segurado poderia fazer prova, por documento emitido pela estação meteorológica mais próxima, de que no momento do sinistro os ventos atingiram intensidade excecional, referindo, entre parêntesis, um critério técnico, mensurável e quantificável: com velocidade superior a 100 km/hora. ----
E do Parecer do IPMA, solicitado pelo Tribunal a pedido dos demandantes, consta que na rua onde se situa o seu imóvel, objeto segurado, os ventos na data do sinistro poderão ter atingido valores [apenas] de 80 a 90Km/h. -----------------------------
Ora, é pelo confronto das cláusulas de delimitação positiva (definição) e negativa (exclusões) que se delimita os riscos cobertos, sendo que não constam das exclusões que não seriam cobertos danos provocados por ventos com velocidade superior a 100 Km. -----------------------------------------------------------
Assim, perante a ambiguidade da referida clausula terá a mesma de ser entendida com o sentido que lhes daria o contratante indeterminado normal que se limitasse a subscrevê-las ou a aceitá-la, quando colocado na posição de aderente real, prevalecendo, na dúvida, o sentido mais favorável ao aderente. -----------------
Nestes termos, e em nosso entender, tem a mesma de ser aplicada apenas como um critério, meramente indicativo, que a seguradora aceitará como objetivo, coadjuvante da prova a produzir pelo segurado quando há dúvida quanto à causalidade dos danos cuja indemnização se reivindica. -------------------------
Ora, a verificação na data do sinistro de uma tempestade denominada “Ana” resulta inequivocamente dos autos, e a própria demandada admite, e que o parecer do IPMA confirma ter tido no local momentos de vento com intensidade de 80 a 90Km/h (muito próxima dos 100Km/h que objetivamente a seguradora entende como muito intenso), e que poderá caraterizar-se como muito forte (dado que, no mesmo Parecer, o IPMA caracterizou como forte o que atingiu a velocidade de 50Km/h) e chuva muito intensa durante 10 minutos. ----------------------------
Mau tempo/tempestade coberta pela Apólice dos autos. -------------------------
E também lograram os demandantes provar que a mesma foi causa direta e adequada dos danos nas carpetes e manchas nas paredes dos 3 quartos. --------

E assim, encontrando-se reunidos os pressupostos da responsabilidade civil, atento o sinistro ocorrido, os danos supramencionados e o nexo de causalidade adequada entre ambos, para os quais não contribuiu, o lesado considera-se a demandada responsável, no âmbito do referido contrato de seguro, pelo pagamento aos demandantes uma indemnização (cf. artigos 562º, 563º, 564º, 566º e 570º, nº 1, todos do Código Civil). ---------------------------------------------------------
Nos termos do artigo 562.º e 564º do C.Civ quem estiver obrigado a reparar/indemnizar um dano deve reconstituir a situação que existiria na esfera jurídica do lesado, caso não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.

Assim, tendo esta reparação, no caso, apenas natureza indemnizatória, não têm os demandantes direito a eventuais benfeitorias, pelo que, reconhecendo-se embora razões de salubridade na utilização de parquet nos quartos em vez de alcatifas, não poderá ser a demandada condenada ao seu pagamento. ---------------------
Nestes termos, ao orçamento que estes juntaram aos autos a fls. 143, no valor de €720,00, mais IVA (valor não muito distante do do perito da demandada, que previa a limpeza das carpetes e que não incluía a pintura das paredes), condena-se a demandada no pagamento desse valor acrescido do valor necessário para os rodapés (€145,60) e para a pintura das paredes (€ 198.50), conforme Orçamento de fls.53 que serviu de base ao pedido dos demandantes, por só deste modo se reconstituir a situação à data do sinistro. ------------------------------

Decisão: ---------------------------------------------------------------------
Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, e em consequência: Condeno a demandada, Cª de Seguros C, a pagar aos demandantes, A, e mulher B, a importância de € 1064,10 (mil e sessenta e quatro euros e dez cêntimos), acrescida de IVA à taxa legal em vigor; ----------------------------------------

Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento, que se fixam em 50% para cada uma (cf. artigo 8º, 9º e 10º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro), que já se encontram pagas. -------------------------------------------
Registe e notifique, enviando cópia aos ausentes. ------------------------------------
Carregal do Sal, 13 de junho de 2018
A Juíza de Paz, (Elisa Flores)
Processado por computador (art.º 131º, nº 5 do C P C)