Sentença de Julgado de Paz
Processo: 17/2017-JPFNC
Relator: LUÍSA ALMEIDA SOARES
Descritores: DIREITOS E DEVERES DOS CONDÓMINOS; CUSTAS DE PARTE; REGULAMENTO DE CONDOMÍNIO
Data da sentença: 03/28/2018
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA
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I. RELATÓRIO
A) IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, NIPC 0, sito na Rua X Funchal, devidamente representado pela sua administradora legal, a sociedade comercial de administração de condomínios, com a firma “B”, portadora do NIPC 0, e com igual número de matrícula na Conservatória do Registo Comercial do Funchal, com sede na Rua X, freguesia de Santa Luzia, concelho do Funchal, 0 Funchal.

Demandados: C, titular do NIF 0, residente na rua X Funchal e D, titular do NIF 0, residente na Rua X, Funchal.
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B) PEDIDO
O Demandante propôs contra os Demandados a presente ação declarativa enquadrada na alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, peticionando:

a) A título de capital, a quantia de €1.156,30 (mil cento e cinquenta e seis euros e trinta cêntimos);
b) A título de multa regulamentar a quantia de €567,65 (quinhentos e sessenta e sete euros e sessenta e cinco cêntimos);
c) A título de juros de mora vencidos e vincendos, a quantia no montante que se vier a apurar por simples cálculo aritmético à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida;
d) A título das quotas de condomínio que se mostrarem em dívida até à prolação do despacho saneador sentença ou, em alternativa, até ao encerramento da discussão em audiência de julgamento, a quantia de capital, de multa, de juros de mora vencidos e vincendos nos montantes que vierem a ser apurados à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida;
e) A título de honorários de advogado, a quantia de €1.000,00 euros;
f) Custas judiciais, procuradoria condigna.
g) Pagamento da sanção pecuniária de €20,00 dia ou, subsidiariamente, no pagamento dos 5% de juros ao ano estabelecidos no artigo 829.º-A, n.ºs 1 e 4, do Código Civil.
h) Se reconheça e declare que a sentença condenatória que vier a ser proferida constitui título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens dos Demandados (artigo 710.º n.º 1 do Código Civil).

Juntou 7 (sete) documentos.
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A Demandada C foi pessoal e regularmente citada no dia 07.02.2017, não contestou, não compareceu nas duas sessões designadas para audiência de julgamento para as quais foi notificada, nem justificou a sua falta.
O Demandado D foi declarado ausente e após nomeação pela Ordem dos Advogados foi regularmente citado na pessoa do seu Ilustre Defensor Oficioso em 25.05.2017, que não contestou mas compareceu à audiência de julgamento.
Como tal, não opera a cominação constante do artigo 58.º, n.º 2 da Lei 78/2001 de 13 de julho, nem é admissível confissão sobre os factos alegados nos termos do artigo 574.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação do artigo 54/2013 de 31 de julho).
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No decurso da Audiência de Julgamento de 05.01.2018, o Demandante juntou documentos, cfr. resulta da ata de fls. 116 e 117.
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II. SANEAMENTO
Estão reunidos os pressupostos da estabilidade da instância: o Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer.
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III. VALOR DA AÇÃO
Fixa-se em € 2.720,95 (dois mil setecentos e vinte euros e noventa e cinco cêntimos) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.º 2, 299.º, 300.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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IV. OBJETO DO LITÍGIO
O objeto do litígio entre as partes circunscreve-se ao (in)cumprimento pelos Demandados das suas obrigações enquanto condóminos.
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V. QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos importa apreciar do cumprimento dos Demandados das suas obrigações de condóminos, nomeadamente o pagamento das quotas de condomínio e, na negativa, as consequências daí resultantes.
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VI. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, de acordo com a prova documental carreada para os autos, resultaram os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS
1. Pela AP. 0, de 14.07.2000, foi registada na Conservatória do Registo Predial do Funchal, sob a descrição predial subordinada número 0 a aquisição pelos Demandados da propriedade da fração autónoma designada pela letra “XXX”, X, Tipo T2, sita na rua do X Funchal, inscrito na material urbana sob o artigo X.
2. Pela AP. X, de 15.02.2017, foi inscrita na Conservatória do Registo Predial do Predial a compra da fração referida em 1. a favor de E do, em processo de execução.
3. A fração autónoma referida em 1. possui a permilagem de 40,000.
4. A fração referida em 1. tem um valor patrimonial determinado no ano de 2015 de €47.980,00.
5. Os Demandados estavam obrigados ao pagamento mensal de quotas ordinárias e/ou extraordinárias de condomínio, até ao dia 08 de cada mês a que os pagamentos diziam respeito na sede do administrador, sito na Rua X, nº 4, R/C e 1º andar, freguesia de Santa Luzia, concelho do Funchal, após o que ser-lhes-ia emitido e entregue o correspondente recibo.
6. No ano de 2014, foi aprovado o orçamento anual sendo a repartição das despesas comuns de conservação e manutenção do edifício feita em razão da permilagem de cada fração autónoma, a quota mensal ordinária a pagar no ano de 2014 pelos Demandados foi de €31,18.
7. Os Demandados não pagaram a parcela da quota ordinária referente aos meses de fevereiro a dezembro de 2014 no valor de €342,98.
8. No ano de 2015, foi aprovado o orçamento anual e sendo a repartição das despesas comuns de conservação e manutenção do edifício feita em razão da permilagem de cada fração autónoma, a quota mensal ordinária a pagar no ano de 2015 pelos Demandados foi de €31,18.
9. Os Demandados não pagaram a parcela da quota ordinária referente aos meses de janeiro a dezembro de 2015 no valor de €374,16.
10. A 17.06.2015 foi enviada pelo Mandatário do Demandante à Demandada C carta de interpelação para pagamento extrajudicial, mediante missiva registada sob o registo postal 0.
11. No ano de 2016 foi aprovado o orçamento anual e sendo a repartição das despesas comuns de conservação e manutenção do edifício feita em razão da permilagem de cada fração autónoma, a quota mensal ordinária a pagar no ano de 2016 pelos Demandados foi de €30,39.
12. Os Demandados não pagaram a parcela da quota ordinária referente aos meses de janeiro a dezembro de 2016 no valor de €364,68.
13. Em 21.05.2016 foi aprovada a constituição de um fundo de poupança, sendo as doze quotas extraordinárias devidas pelos Demandados no ano de 2016 no valor mensal de €0,79, com início a 08.01.2016, o que perfaz o valor de €9,48.
14. Os Demandados não pagaram o montante €9,48 a título de quotas extraordinárias no ano 2016.
15. No dia 20.02.2017, foi aprovado o orçamento anual e sendo a repartição das despesas comuns de conservação e manutenção do edifício feita em razão da permilagem de cada fração autónoma, a quota mensal ordinária a pagar no ano de 2017 pelos Demandados foi de €31,18.
16. Os Demandados não pagaram a parcela da quota ordinária referente aos meses de janeiro e fevereiro de 2017 no valor de €62,36.
17. Encontra-se previsto no artigo 18.º do Regulamento de Condomínio do Demandante o pagamento de uma multa no valor de 50% da quota de condomínio pelo incumprimento do pagamento da quota mensal.
18. Por declaração de 03.07.2015 (fls. 45), a empresa de administração de condomínios, B, na qualidade de administradora do Condomínio Demandante, aceitou a proposta de honorários do mandatário subscritor da presente ação, no valor de €1.000,00 (mil euros).
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FACTOS NÃO PROVADOS
19. A carta referida em 10. tem um custo associado de €65,00 derivado a serviços jurídicos prestados.
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Os factos dados como provados em 1. a 18. assim foram considerados atendendo à prova documental junta com o requerimento inicial pelo Demandante e aos documentos por si juntos na audiência de julgamento.
O Tribunal entendeu dar como não provado o facto 19. atendendo a não existir nos autos qualquer documento que comprove que o Demandante despendeu o montante peticionado a esse título, sendo que era a este quem cabia tal prova nos termos do artigo 342.º n.º 1 do Código Civil.
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VII. ENQUADRAMENTO JURÍDICO-LEGAL
Com base na matéria de facto provada, cumpre apreciar os factos e aplicar o direito, atendendo a que o Demandante peticiona a condenação dos Demandados no pagamento dos montantes fixados nos factos provados, relativos à quota-parte das contribuições referentes à fração de que estes foram proprietários até 15.02.2017.
A presente ação funda-se no incumprimento de uma obrigação dos condóminos, enquadrando-se, em termos de competência material deste Tribunal, na al. c), do n.º 1, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
O n.º 1 do artigo 1420.º do Código Civil, relativo à propriedade horizontal, define que condómino é o proprietário exclusivo da fração e comproprietário das partes comuns.
É função do administrador de condomínio, entre outras, cobrar receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme previsto no artigo 1436.º, alíneas d) e e) do Código Civil, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino.
Resulta da matéria de facto provada que pela AP. 0, de 14.07.2000, foi registada na Conservatória do Registo Predial do Funchal, sob a descrição predial subordinada número 0 a aquisição pelos Demandados da propriedade da fração autónoma designada pela letra “XX”, Bloco D 1, 1.º andar, Tipo T/2, sita na rua do X, freguesia de Santo António, 9020-393 Funchal, inscrito na material urbana sob o artigo X e que pela AP. X, de 15.02.2017, foi inscrita na Conservatória do Registo Predial do Predial, a compra da fração referida a favor de E, em processo de execução.
Decorre do n.º 1 do artigo 1424.º do Código Civil que os condóminos estão obrigados a concorrer para as despesas necessárias à gestão, fruição e conservação das partes comuns do edifício na proporção do valor das suas frações. Conforme se entendeu, entre outros, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (processo 6723/2008-6, em www.dgsi.pt) “os condóminos (…) têm a obrigação irrenunciável de comparticipar nos encargos decorrentes da conservação e fruição das partes comuns, bem como relativos ao pagamento de serviços de interesse comum, ou seja, não se podem escusar ou recusar o cumprimento desse dever jurídico, quer em termos totais como parciais.”
No caso sub judice, os condóminos do prédio em causa deliberaram as contribuições devidas a cargo dos Demandados nos termos dos orçamentos aprovados. Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Lei 268/94, de 25.10, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções.
Resultou provado que, na qualidade de condóminos, os Demandados não efetuaram o pagamento das quotas ordinárias de condomínio relativas ao período de fevereiro a dezembro de 2014 (342,98€), janeiro a dezembro de 2015 (€374,16), janeiro a dezembro de 2016 (€364,68), janeiro e fevereiro de 2017 (€62,36) e quotas extraordinárias no ano de 2016 (€9,48).
Face à alegação do Demandante de que os Demandados não efetuaram o pagamento daquelas quotas, competia aos mesmos, nos termos dos artigos 342.º, n.º 2 e 799.º ambos do Código Civil, provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso, não procederam de culpa sua ou ainda provar qualquer exceção que obstasse à apreciação do mérito da causa.
Contudo, no presente caso, não foi alegado nem resultou provado pelos Demandados qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nomeadamente que tenham efetuado o pagamento daqueles valores, pelo que nos encontramos perante uma situação de incumprimento.
O Demandante peticiona a condenação dos Demandados no pagamento das quotas que se mostrarem em dívida até à prolação do despacho saneador sentença ou, em alternativa, até ao encerramento da discussão em audiência de julgamento, a quantia de capital, de multa, de juros de mora vencidos e vincendos nos montantes que vierem a ser apurados à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida.
Tratando-se de prestações periódicas, como é o caso das prestações de condomínio dos autos, a condenação pode compreender as prestações já vencidas e as que se vencerem enquanto subsistir a obrigação (artigo 557.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
Pelo exposto condenam-se os Demandados no pagamento ao Demandante da quantia de € 1.153,66 (mil cento e cinquenta e três euros e sessenta e seis cêntimos), relativa a quotas ordinárias e extraordinárias vencidas até à propositura da ação, assim como às quotas que se venceram até 15.02.2017, data em que os Demandados deixaram de ser proprietários da fração em causa nos autos.
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Peticiona ainda o Condomínio Demandante a condenação dos Demandados nos juros de mora vencidos sobre as quotas em dívida e ainda na multa de 50% estipulada no regulamento do condomínio para o atraso pelo pagamento, assim como o que a esse título vier a ser apurado à data do encerramento da audiência de julgamento ou em data posterior aquando do efetivo e integral pagamento da totalidade dos valores pecuniários em dívida.

Conforme resulta do artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil o devedor fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para pagar. Por outro lado o n.º 2, alínea a) do mesmo diploma estabelece que há mora do devedor independentemente de interpelação, se a obrigação tiver prazo certo.
Resultou provado que os Demandados estavam legalmente obrigados ao pagamento mensal de quotas ordinárias e/ou extraordinárias de condomínio, até ao dia 08 de cada mês.
Porém para além da condenação em juros, o Demandante peticiona também o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento da quantia de €567,65 a título de multa regulamentar já vencida aquando da propositura da ação, sendo que desde essa data e até à presente sentença se venceram ainda os meses de janeiro e fevereiro de 2017, a que corresponde uma multa regulamentar, se devida, de €31,18, pelo não pagamento atempado das quotas de condomínio.
O Demandante no seu requerimento inicial procedeu ao cálculo da multa regulamentar fazendo incidir o mesmo sobre as quotas ordinárias e extraordinárias em dívida e ainda sobre os €65,00 de cobrança extrajudicial (valor este considerado não provado).
Resultou provado que se encontra previsto no artigo 18.º do Regulamento de Condomínio do Demandante o pagamento de uma multa no valor de 50% da quota de condomínio pelo incumprimento do pagamento da quota mensal, pelo que a penalização não se destina ao incumprimento das quotas extraordinárias (que muitas vezes têm até vencimento anual ou bimestral) mas sim ao incumprimento das quotas ordinárias. Muito menos se concebe poder calcular-se o valor da multa regulamentar sobre uma alegada quantia extrajudicial devida por cobrança de dívida por Mandatário.
No presente caso estamos perante uma penalização resultante da mora no pagamento das despesas do condomínio, a suportar pelo condómino incumpridor, contrariamente ao que sucede no caso da sanção pecuniária compulsória, prevista no artigo 829.º-A do Código Civil, que por sua vez procura assegurar o cumprimento da obrigação.
Conforme resulta dos artigos 810.º e 811.º do Código Civil, trata-se de uma cláusula penal moratória, que visa ressarcir o condomínio pela mora dos condóminos no pagamento das quotas.
Por sua vez, dispõe o n.º 2 do artigo 811.º do Código Civil que “O estabelecimento da cláusula penal obsta a que o credor exija indemnização pelo dano excedente, salvo se outra for a convenção das partes.”
Logo, uma vez que o Demandante peticiona a cláusula penal moratória estabelecida no artigo 18.º do Regulamento do Condomínio e que aí não se prevê a sua cumulação com os juros de mora, não podem, sob pena de duplicação de indemnizações sobre a mesma quantia, os Demandados ser condenados a pagar igualmente os peticionados juros moratórios sobre as quotas em dívida. Acrescente-se que sendo o pagamento de quotas uma obrigação de cariz pecuniário, o Demandante apenas poderá ter direito aos juros moratórios provenientes da cláusula penal estabelecida no Regulamento, conforme estipula o artigo 806.º, n.º 2, 2.ª parte do Código Civil.
Assim, o pedido de juros de mora vencidos e vincendos sobre a quantia de capital (quotas de condomínio) tem necessariamente de improceder.
Quanto ao valor peticionado a título de multa regulamentar cumpre verificar se o mesmo viola o disposto no artigo 1434.º n.º 2 do Código Civil.
Pode ler-se no sumário do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo 7837/12.6YYPRT-A.P1, de 30.09.2014 (pesquisável em www.dgsi.pt), “I - O Regulamento do Condomínio [aprovado na assembleia geral de condóminos] e as deliberações do condomínio em que foi deliberado sujeitar os condóminos a penalidades por atraso no pagamento das quotas do condomínio e de obras, estão sujeitos ao limite prescrito no nº 2 do art. 1434º do CCiv. II - O conceito de rendimento colectável [do antigo Código da Contribuição Predial] não coincide com o de valor patrimonial tributário [adoptado sucessivamente no Código da Contribuição Autárquica e no Código do IMI], pelo que se o legislador, não desconhecendo essa diferença, não alterou a redacção daquele art. 1434º nº 2, é porque pretendeu manter o limite das penas por referência ao valor colectável e não ao actual valor patrimonial tributário. III - O modo mais adequado de proceder ao cálculo do rendimento colectável é multiplicar o valor patrimonial tributário da fracção por 0,15. IV - As penas de que fala o nº 2 do art. 1434º não podem exceder ¼, ou 25%, desse rendimento”.
Também no douto Acórdão desta Relação do Porto de 20/06/2011 [proferido no proc. 1975/08.7TBPRD-B.P1 (disponível em www.dgsi.pt ) ao referir-se ao n.º 2 do artigo 1434.º refere “tal normativo tem carácter imperativo e não supletivo, dados os termos em que [a alínea] se encontra redigida, concretamente, quando nela se diz que o montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor, sendo que o uso da expressão nunca significa que esta meta tem carácter imperativo”. (...) “Como explica Sandra Passinhas, em Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pág. 273, a noção de rendimento colectável era dado pelo artigo 3º, n.º 1 do antigo Código de Contribuição Predial e corresponde ao valor da renda dos prédios arrendados e, quanto aos não arrendados, à utilidade equivalente que deles obtivesse ou tivesse possibilidade de obter quem pudesse usufruir ou usar os mesmos. Com o Código de Contribuição Autárquica, de 1/1/1989, o contribuinte passou a ser tributado pelo seu património e não pelo rendimento que obtinha dos seus prédios, isto é, a base de cálculo do imposto cobrado passou a ser o valor patrimonial atribuído ao imóvel. Por sua vez, dispunha o nº 1 do artº. 6º do citado DL. 422-C/88, que aprovou o Código da Contribuição Autárquica 1 - O valor tributável dos prédios urbanos, enquanto não for determinado de acordo com as regras do Código das Avaliações, será o que resultar da capitalização do rendimento colectável, actualizado com referência a 31 de Dezembro de 1988, através da aplicação do factor 15”. 2º - O rendimento colectável dos prédios urbanos não arrendados, reportado a 31 de Dezembro de 1988, é desde já objecto de actualização provisória de 4% ao ano, cumulativa, com o limite máximo de 100%, desde a última avaliação ou actualização, não se considerando para o efeito a que resultou da aplicação do disposto no n.º 1 do art. 69º da Lei n.º 2/88, de 28 de Janeiro. Verificamos, pois, que o conceito de rendimento colectável não coincide com o conceito de valor patrimonial tributário e que o legislador – não desconhecendo a diferença conceitual -, não alterou nem acompanhou estas alterações e alterar, por sua vez, a redacção daquele n.º 2, perante as nova(s) normas tributárias entradas em vigor -, pelo que devemos entender que se pretendeu manter o limite das penas por referência ao valor colectável e não ao valor patrimonial tributário. Doutra forma, aquela norma ficaria desprovida de qualquer utilidade e funcionalidade. No mínimo exigia-se a sua revogação. Não é suposto permanecer(em) nos códigos normas inócuas – artigos 9º e 10º do CC. (…) E sendo assim, então há que atender às normas acima expostas, que estabelecem um critério relacional entre rendimento colectável e valor patrimonial, tanto mais que o CIM sobre Imóveis manteve o conceito de tributação fiscal sobre o valor patrimonial atribuído ao imóvel que havia sido adoptado pelo CCA – conf. art.s 1º e 7º do CIMI e 1º e 7º do CCA. E assim, consideramos que devemos aplicar, por se manter intacta a filosofia tributária, o enunciado do já referenciado art. 6º do CCA. É sabido e já acima o afirmamos que o rendimento colectável é anual e corresponde ao valor da renda dos prédios arrendados e, quanto aos não arrendados, à utilidade equivalente que deles obtivesses ou tivesse possibilidade de obter quem pudesse usar ou fruir dos mesmos, nos termos do CCPredial, correspondendo a uma expectativa de rendimento anual. Por sua vez, o valor tributário não é anual nem tem referência temporal e corresponde ao valor atribuído ao prédio rústico ou urbano e que se encontra inscrito na matriz predial, sendo averbado na respectiva caderneta predial pelos serviços das finanças, servindo então de cálculo do imposto sobre imóveis, constituindo, portanto, conceitos não coincidentes. E esta divergência foi reconhecida pelo referido artigo 6º, n.º 1 do DL n.º 442-C/88. (…).”
Pires de Lima e Antunes Varela [in Código Civil Anotado, vol. III, 2.ª ed. revista e atualizada, pág. 450, anotação 2 ao artigo 1434º] e por Abílio Neto [in Manual da Propriedade Horizontal, 3.ª ed., págs. 357-358, anotação 2 ao referido preceito], referem-se ao “caráter imperativo/limitativo da referida norma legal”.
Entendemos, tal como o douto Acórdão do TRP, de 30.09.2014 (in www.dgsi.pt), que “o modo mais adequado de proceder ao cálculo do rendimento coletável é multiplicar o valor patrimonial tributário da fracção por 0,15, que é o factor referido no aludido artigo 6.º nº 1 do DL 442-C/88; depois, sobre o resultado obtido, faz-se incidir o limite de ¼, ou 25%, aferindo-se então se a penalização observa ou não o prescrito no nº 2 do art. 1434º do CCiv.”.
Cumpre verificar se a penalidade que o Demandante peticiona, viola ou não o que prescreve o nº 2 do citado artigo 1434º do Código Civil.
Vem dado como provado que a fração que foi propriedade dos Demandados até fevereiro de 2017 tem o valor patrimonial atual, determinado no ano 2015, de €47.980,00.
Aplicando-lhe o dito factor 15 [0,15], chegamos ao valor de €7.197,00. Incidindo, finalmente, a percentagem de 0,25, encontramos o valor de €1.799,25, sendo este o limite que terá de ser respeitado em termos de condenação.
Resultou provado que, na qualidade de condóminos, os Demandados não efetuaram o pagamento das quotas ordinárias de condomínio relativas ao período de fevereiro a dezembro de 2014 (342,98€), janeiro a dezembro de 2015 (€374,16), janeiro a dezembro de 2016 (€364,68) e janeiro e fevereiro de 2017 (€62,36), ou seja, um total de €1.144,18, peticionando o Demandante a condenação dos Demandados em 50% desse valor a título de multa regulamentar e que até fevereiro de 2017 ascenderia a €572,09, valor esse que, atenta a operação aritmética realizada, respeita o limite imposto pelo artigo 1434.º n.º 2 do Código Civil.
Nestes termos, à quantia de quotas ordinárias em dívida até fevereiro de 2017, €1.144,18 (mil cento e quarenta e quatro euros e dezoito cêntimos), acresce a quantia de €572,09 (quinhentos e setenta e dois euros e nove cêntimos), a título de penalidade devida pelo atraso no pagamento, procedendo, nesta parte, parcialmente o peticionado.
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Mais peticiona o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento de € 1.000,00 a título de honorários do seu Mandatário pelo patrocínio na presente ação.
Resultou provado que, por declaração de 03.07.2015, a empresa de administração de condomínios, B, na qualidade de administradora do Condomínio Demandante, aceitou a proposta de honorários do mandatário subscritor da presente ação, no valor de €1.000,00 (mil euros).
Neste Tribunal o patrocínio por Advogado, Advogado Estagiário ou Solicitador não é obrigatório, salvo nos casos previstos (artigo 38.º da Lei 78/2001 de 13 de julho), porém as partes têm direito a esse patrocínio e a fazer-se representar em juízo, tendo com isso naturalmente gastos.
Atendendo a que, por força do disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho, o Código de Processo Civil é aplicável subsidiariamente nos Julgados de Paz, poderia ponderar-se enquadrar os honorários peticionados no âmbito dos artigos 529.º n.º 4 e 533.º do Código de Processo Civil, onde se encontra previsto que as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, discriminando-se no n.º 2 deste ultimo normativo as despesas que se integram nas custas de parte e na alínea d) prevendo-se em concreto os honorários do Mandatário e as despesas por ele efetuadas.
O mesmo se diga quanto ao disposto no artigo 25.º do Regulamento das Custas Processuais, que dispõe no “1 - Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa. 2 - Devem constar da nota justificativa os seguintes elementos: (…) d) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º; e) Indicação do valor a receber, nos termos do presente Regulamento.
Estaríamos assim no campo das custas de parte, que deveriam ser suportadas pelos Demandados, após o envio da respetiva nota discriminativa.
Sucede porém, que os Julgados de Paz têm uma lei própria quanto a custas, a Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro, onde as custas correspondem a uma taxa fixa de 70,00€ por cada processo tramitado, não prevendo outro valor.
E será nos termos da Portaria citada, que as custas serão fixadas na presente sentença, não tendo aplicação o Regulamento das Custas Processuais.
Sempre se dirá que não foi junta aos autos prova da liquidação pelo Demandante dos honorários peticionados, nem tão pouco nota discriminativa do cálculo que lhe esteve subjacente, não havendo desse modo prova de que efetivamente a quantia peticionada seja aquela que o Demandante venha a suportar a título de honorários, o que lhe competia fazer (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil).
Pelo exposto, nesta parte, improcede, o pedido.
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Peticiona ainda o Demandante a condenação dos Demandados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 20,00 ao dia, indicando as razões que estiveram subjacentes ao cálculo de tal quantia.
Ora, decorre do artigo 829.º-A, n.º 1 do Código Civil que “Nas prestações de facto infungível negativo ou positivo (…), o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso (…).”
Como resulta do n.º 2 deste mesmo normativo, entendemos que o fim da sanção pecuniária compulsória é coagir o devedor ao cumprimento da obrigação e não a indemnização do credor pelo atraso no cumprimento da obrigação.
No caso que nos ocupa, trata-se do pagamento de uma quantia pecuniária, ou seja, prestação fungível, podendo ser realizada por pessoa diferente do devedor, sem que resulte qualquer prejuízo para o interesse do seu credor, não podendo ter lugar a condenação dos Demandados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória nos termos peticionados, ou seja, no valor de € 20,00 ao dia, pelo que improcede também, nesta parte, o peticionado pelo Demandante.
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Mais peticiona o Demandante que este Tribunal declare que a presente sentença constitui título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens dos Demandados.
Vejamos pois se tem acolhimento o seu pedido ou se é de considerar improcedente.
O artigo 710.º, n.º 1 do Código Civil dispõe que “A sentença que condenar à realização de uma prestação em dinheiro ou outra coisa fungível é título bastante para o registo de hipoteca sobre quaisquer bens, mesmo que não haja transitado em julgado.”
Pode concluir-se assim, que para que o credor possa constituir uma hipoteca nestes termos basta apenas uma sentença condenatória, não sendo necessário qualquer ato do juiz, nomeadamente que tal direito seja declarado em sentença, improcedendo, nesta parte, o pedido do Demandante por falta de fundamento legal.
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VIII. RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
As custas serão suportadas pelo Demandante e pelos Demandados, em razão do decaimento na proporção respetiva de 35% e 65% (Artigos 527.º, do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho - e artigo 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro).
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IX. DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência decido:
1. Condenar os Demandados C e D no pagamento ao Demandante A da quantia de €1.153,66 (mil cento e cinquenta e três euros e sessenta e seis cêntimos) a título de quotas ordinárias e extraordinárias em dívida até 15.02.2017; e da quantia de €572,09 (quinhentos e setenta e dois euros e nove cêntimos), a título de penalidade devida pelo atraso no pagamento das quotas ordinárias em dívida até 15.02.2017.
2. Absolver os Demandados C e D do demais peticionado.
3. Condenar o Demandante e os Demandados nas custas da presente ação na proporção do respetivo decaimento que se fixa, respetivamente em 35% e 65%.
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Atento o facto de o Demandado D ter sido declarado ausente, e em conformidade com a alínea l) do n.º 1 do art.º 4.º do Regulamento das Custas Judiciais, encontra-se este isento desse pagamento (cfr. Deliberação n.º 5/2011, do Conselho dos Julgados de Paz, de 8 de Fevereiro de 2011).
Deverá a Demandada C proceder ao pagamento de € 45,50 (quarenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) no prazo de 3 (três) dias úteis após o conhecimento da presente decisão, comprovando-o nos autos.

Em relação ao Demandante, proceda-se em conformidade com o artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, devolvendo-se a quantia de € 10,50 (dez euros e cinquenta cêntimos), correspondentes a 35% do decaimento na ação.
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Registe e notifique.
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Dê-se cumprimento ao disposto no artigo 60.º n.º 3 da Lei 78/2011 de 13 de julho, com a redação dada pela Lei 54/2013 de 31 de julho relativamente ao Demandado D.
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Funchal, 28 de março de 2018

A Juíza de Paz


Luísa Almeida Soares
(Art.º 31 n.º 5 CPC/Art.º 18 LJP)