Sentença de Julgado de Paz
Processo: 35/2018-JPBBR
Relator: CRISTINA EUSÉBIO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
DANOS E PRIVAÇÃO DE USO DO VEÍCULO
Data da sentença: 09/19/2018
Julgado de Paz de : OESTE - BOMBARRAL
Decisão Texto Integral:

Proc. n.º35/2018
SENTENÇA
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RELATÓRIO:
A E B, identificados a fls.1,3 e 83, propuseram, em 19 de Fevereiro de 2018 contra C seguros S.A.. melhor identificada a fls. 3 e 81 a presente acção declarativa de condenação, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhes a quantia de 1.739,52 € (Mil, setecentos e trinta e nove euros e cinquenta e dois cêntimos) a título de indemnização por danos patrimoniais, decorrentes de acidente de viação.
Para tanto, alegaram os factos constantes do seu Requerimento Inicial de fls. 3, que se dá por integralmente reproduzido.
Juntaram 14 documentos (fls. 4 a 20) que igualmente se dão por reproduzidos.
Regularmente citada, veio a demandada apresentar contestação de fls. 58 a 63 defendendo-se por excepção e impugnação pela improcedência da acção.
Juntou 4 documentos ( fls. 37 a 59).
Tendo a Demandada afastado o recurso à Mediação, procedeu-se á marcação da Audiência de Discussão e Julgamento, para o dia 4 de Setembro de 2018.
Procedeu-se à realização da Audiência de Julgamento, com observância do formalismo legal, conforme da respectiva acta melhor se alcança.
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Ao tribunal cabe decidir a) a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação; b) da obrigação da Seguradora indemnizar o Demandante pelos danos verificados c) Quantificação dos danos
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O Julgado de Paz é competente em razão do valor, da matéria e do território.
Não existem nulidades que invalidem o processado.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.
Não existem excepções de que cumpra conhecer ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito da causa, porquanto as mesmas se encontram decididas por despacho de fls. 93. com a admissão da intervenção principal da demandante B, proprietária do veículo em causa.
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FUNDAMENTAÇÃO
MATÉRIA DE FACTO
Com interesse para a decisão da causa, ficaram provados os seguintes factos:
1. A demandante B é proprietária do veículo ligeiro de mercadorias de matricula KA, Marca -------- Modelo --- , matriculado em 1994. (cfr. doc. fls. 85) (doravante designado por KA)
2. O veículo referido em 1, era habitualmente conduzido pelo 1º demandante, sendo este o tomador do seguro obrigatório titulado na Apólice n.º 90. ------- da D Seguros. (doc. fls. 9 e 65)
3. No dia 11 de Maio de 2016, o veículo RL (doravante RL) embateu no veiculo KA, em circunstâncias não apuradas nos presentes autos.
4. Por via de contrato de seguro, a demandada assumiu a responsabilidade civil emergente de acidentes de viação da circulação do veículo RL.
5. Pela Convenção de indemnização directa ao segurado celebrada entre ambas as companhias seguradoras, foi definida a responsabilidade do veículo RL na produção do acidente de viação.
6. A D Seguros procedeu á peritagem do veículo KA em 13 de Maio de 2016, orçando a sua reparação no valor de 1317,49€. – (cfr doc fls 5 )
7. Na sequência da peritagem realizada, os serviços técnicos da D Seguros S.A. entenderam que o veículo KA deveria ser considerado como uma perda total. (doc. fls 65 a 67)
8. Os referidos serviços técnicos, atribuíram ao veículo o valor de 800,00€ (valor venal) sendo o valor dos salvados de 120,00€; (cfr. doc. fls. 74)
9. Os demandantes não aceitaram o valor proposto pela companhia seguradora, tendo reclamado por cartas datadas de 7 de Junho de 2016 e 4 de Agosto de 2016 dirigidas à D Seguros que as fez presentes à aqui demandada; (doc fls 10 e 12)
10. Por carta datada de 6 de Julho de 2016, a aqui demandada propôs aos demandantes a regularização do sinistro pela quantia de 800,00€ ficando o salvado na posse dos demandantes; (doc fls 75)
11. Em 11 de Julho de 2017, a demandada remeteu ao 1º demandante, carta na qual apresenta a proposta definitiva nos mesmo termos da certa referida em 10. (cfr. doc. 16)
12. O demandante é mecânico de profissão exercendo a sua actividade por conta própria.
13. Após o acidente o KA podia circular mas a porta do lado esquerdo não fechava.
14. Em data não concretamente apurada, o demandante reparou o veículo na sua oficina, encontrando-se o mesmo em circulação, até esta data.
15. De 11 de Maio a 16 de Maio de 2016, o demandante alugou uma viatura pelo preço de 119,00€.(doc. fls 4).

Não provados:
1 – Que os demandantes tenham despendido a quantia de 1317,50€ acrescida de IVA para reparar o veículo;
2 – A data concreta em que o veículo foi reparado.

MOTIVAÇÃO
A convicção probatória do tribunal, de acordo com a qual se selecciona a matéria dada como provada ou não provada, ficou a dever-se ao conjunto da prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomados em consideração os factos que resultam por acordo nos termos do disposto no art. 574º CPC -factos n.º 3,4 e 5 - e dos documentos constantes de cada item dos factos provados.
Foram ouvidos os demandantes, nos termos do disposto no art. 57º da LJP tendo referido que o veículo se encontra reparado e que é usado diariamente pela demandada nos seus trajectos. Mais referem que o acidente ocorreu no dia 11 de maio de 2016 e após peritagem (ocorrida no dia 13), o demandante “pôs o carro a andar, mas a porta não fechava, pelo que não tinha as condições mínimas.” Mais referiram que apenas cerca de 1 ano depois é que o reparam, sem que, no entanto, pudessem concretizar o valor concreto de tal reparação.
Assumiram uma postura defensiva e reprovável quando o tribunal, oficiosamente, os instou a apresentar documentos comprovativos da referida reparação, alegando que a mesma tinha sido feita na oficina do demandante e que poderia apresentar uma factura do valor que entendesse e ainda que não tinha documentos da aquisição das peças que foram utilizadas, mantendo que pretendiam que lhes fosse pago o valor do orçamento.
Foram ouvidas duas testemunhas indicadas pela demandante que, em suma explicaram os procedimentos adoptados pela demandada na tentativa de indemnizar os demandantes, bem como foi obtido o valor venal da viatura e como concluíram pela perda total, confirmando os documentos juntos aos autos.

FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE DIREITO
O Demandante ancora o seu pedido no facto de o condutor do veículo RL ser, no seu entender, o único culpado no acidente ocorrido. Por sua vez a demandada não contesta a responsabilidade pela ocorrência do acidente nem a sua dinâmica, aceitando pagar o valor dos danos sofridos pelo demandante. A divergência entre as partes radica tão somente, na determinação e quantificação daqueles danos e no valor indemnizatório, - sendo que os demandantes pretendem a reparação do veículo que a demandada considera enquadrar-se na previsão legal de perda total.
Assim, cumpridos que se encontram os requisitos da responsabilidade civil (facto, dano, imputação do facto ao agente, ilicitude, a culpa e o nexo de causalidade) dos quais depende a obrigação de indemnizar e perante o contrato de seguro celebrado validamente, cumpre apenas determinar a extensão dos danos decorrentes do acidente de viação e o quantum indemnizatório.
Para tanto havemos de nos reportar á matéria provada e não provada nos presentes autos. Assim,
- Dos danos no veículo KA
O art.º 41º do Decreto- Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, contém regras de definição da indemnização por perda total aplicáveis no âmbito do procedimento de proposta razoável previsto no Capítulo III do referido diploma legal.
Não tendo as partes chegado a acordo no aludido procedimento, recorrendo o demandante à via judicial, relevam apenas as regras gerais enunciadas nos art.ºs 562º e 566º do Código Civil.
Decorre destes preceitos que se deverá, em regra, proceder à restauração natural [colocando o lesado na situação anterior à ocorrência do dano] e só excepcionalmente haverá lugar à indemnização pecuniária - sucedâneo a que se recorre apenas quando aquela é materialmente impraticável, não cobre todos os danos ou é demasiado onerosa para o devedor.
De todo o modo, os demandantes alegaram que procederam á reparação do veiculo, peticionando que a demandada proceda ao seu pagamento - que computam no valor do orçamento.
Em face da efectiva reparação do veículo, ao tribunal não basta, então, a mera estimativa ou orçamento pois caberia aos demandantes provar o valor da reparação dos danos decorrentes do acidente.
No entanto, ainda que instados pelo tribunal para que juntassem documento comprovativo do pagamento da reparação, estes não o fizeram, não provando, pois o valor efectivamente despendido na reparação dos danos que o veículo apresentava por força do acidente.
Sem esta prova essencial, o pedido apenas poderá proceder na parte que resulta da confissão da demandada, ou seja, o valor indemnizatório assumido pela demandada - em cuja contestação requer a improcedência apenas parcial do pedido, nos termos da sua assunção de responsabilidade.
- Da privação de uso do veículo
Quanto á privação de uso diga-se que hoje é, comum e maioritariamente aceite na nossa jurisprudência, que o simples uso, constitui uma vantagem patrimonial suscetível de avaliação pecuniária.
Nesse sentido o Ac. RP. de 15.03.2005, in www.dgsi.pt, “o lesado durante o período de imobilização da viatura, ficou privado das utilidades que este poderia proporcionar-lhe; e isto constitui um prejuízo, uma realidade de reflexos negativos no património do lesado.
Resulta provado que o veículo não deixou de circular, no entanto não estaria na total disponibilidade do seu possuidor na medida em que a porta não fechava.
O que motivou o aluguer de uma viatura pelo período de 4 dias, sendo esse prejuízo o peticionado a titulo de privação de uso do veículo por referência às datas apostas no documento de fls 4 que não foi impugnado pela demandada.
Não tendo a demandada posto á disposição do demandante um veículo de substituição, este pedido haverá de proceder, na medida em que é um dano derivado da ocorrência do sinistro em causa.

Decisão:
Nos termos e com os fundamentos invocados, decido declarar a presente ação parcialmente procedente, porque parcialmente provada e em consequência condena-se a demandada a pagar ao demandante a quantia de €919,00 (novecentos e dezanove euros) a título de indemnização por danos decorrentes de acidente de viação incluindo a privação de uso do veículo.

As custas serão suportadas por ambas as partes, em razão do decaimento na proporção de 48% para o Demandante e 52% para a Demandada, declarando-se ambas partes vencidas (Art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro e n.º 3 do art.º 446.º, do C.P.C.).

Registe.


Bombarral , 19 de Setembro de 2018
(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – Art.º 138.º/5 do C.P.C.)

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(Cristina Eusébio)