Sentença de Julgado de Paz
Processo: 74/2017-JPAGB
Relator: CRISTINA POCEIRO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CONTRATO DE SEGURO
Data da sentença: 02/19/2018
Julgado de Paz de : AGUIAR DA BEIRA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
I – RELATÓRIO:
Identificação das partes:
Demandante:
A, portador do Cartão de Cidadão nº 000, válido até 13/02/2022, emitido pela República Portuguesa, com residência na Rua X, Trancoso;
Demandados:
1º- B, sociedade comercial anónima com o número único de matrícula e de pessoa coletiva 0000, com sede na Rua X, Porto;
2º- C, fundo público autónomo com o número de identificação fiscal 0000, com sede na Rua X, Porto, e
3º- D, portador do Cartão de Cidadão número 000000, válido até 20/11/2021, emitido pela República Portuguesa e do número de identificação fiscal 00000, com residência no X, Outeiro de Gatos;

Objeto do litígio:
O demandante instaurou a presente ação declarativa de condenação, enquadrada na alínea h) do nº 1 do artigo 9º da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, pedindo, com base nos fundamentos constantes do respetivo requerimento inicial, que aqui se reproduzem, que a mesma seja julgada procedente e, em consequência, a primeira demandada B, condenada a pagar ao demandante a quantia de € 6.038, 92 (seis mil e trinta e oito euros e noventa e dois cêntimos), acrescida do valor que se vencer a título de privação de uso até efetiva reparação e de juros legais desde citação e até efetivo e integral pagamento; subsidiariamente e para o caso de não se provar a existência de seguro válido e eficaz, os segundo e terceiro demandados, C e D, condenados a pagar ao demandante a quantia de € 6.038, 92 (seis mil e trinta e oito euros e noventa e dois cêntimos), acrescida do valor que se vencer a título de privação de uso até efetiva reparação e de juros legais desde citação e até efetivo e integral pagamento.Para tanto, o demandante alegou os factos constantes do respetivo requerimento inicial, de fls. 2 a 3/verso dos autos, segundo os quais, resumidamente, no dia 21-06-2017, o demandante e o terceiro demandado conduziam, em sentidos contrários, os respetivos veículos na Estrada X, freguesia de X, concelho de Trancoso, tendo embatido na ponte existente ao Km 12,500, em virtude de o terceiro demandado não ter reduzido a velocidade e não lhe ter cedido prioridade na passagem da ponte, apesar de o demandante nela ter entrado primeiro; que na sequência da colisão o respetivo veículo sofreu diversos danos na parte da frente e que está privado do seu uso desde o acidente, pretendendo ser indemnizado dos respetivos prejuízos; que o veículo do terceiro demandado teria seguro de responsabilidade civil junto da primeira demandada; mas, caso assim não fosse, deveriam ser responsabilizados os segundo e terceiro demandados.
Juntou seis documentos e procuração forense ao requerimento inicial e cinco documentos na audiência de julgamento, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Tramitação e Saneamento:
O demandante, após a instauração da ação, prescindiu da resolução do litígio através do serviço de mediação existente neste julgado de paz.
Os demandados, pessoal e regularmente citados, apresentaram as respetivas contestações, cujo teor aqui se reproduz integralmente.
A primeira demandada B defendeu-se por exceção e por impugnação, alegando, resumidamente, a não existência de seguro válido e eficaz quanto ao veículo do terceiro demandado D na data do acidente dos autos e, por outro lado, que desconhece as circunstâncias do acidente mas que, de acordo com a versão do dito terceiro demandado, este já se encontrava a sair da ponte quando o veículo do demandante estava a entrar na mesma, o que é confirmado pela posição dos veículos, competindo ao demandante aguardar que o veículo do terceiro demandado saísse da ponte, concluindo pela improcedência da ação e respetiva absolvição do pedido. Juntou seis documentos e procuração forense, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
O segundo demandado C defendeu-se por exceção e por impugnação, alegando, resumidamente, a existência de seguro válido e eficaz quanto ao veículo do terceiro demandado D na data do acidente dos autos e, por outro lado, que desconhece as circunstâncias do acidente mas que, de acordo com os documentos juntos aos autos, o veículo do aludido terceiro demandado já se encontrava a circular na ponte e a sair da mesma quando o veículo do demandante iniciou a sua travessia; o demandante deveria ter cedido passagem ao veículo conduzido pelo terceiro demandado, sendo o demandante o único e exclusivo responsável pelo acidente dos autos, concluindo pela procedência da exceção alegada e pela improcedência da ação, com a consequente absolvição do pedido. Juntou procuração forense, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. Por sua vez, o terceiro demandado D defendeu-se por impugnação, alegando, resumidamente, que quando iniciou a travessia da ponte a mesma estava livre e que, quando já estava próximo da saída, o demandante em vez de parar e lhe ceder passagem iniciou a sua travessia, indo embater no seu veículo, concluindo pela improcedência da ação e respetiva absolvição dos pedidos. Juntou três documentos e procuração forense à respetiva contestação e sete documentos na audiência de julgamento, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. Tendo sido dado cumprimento ao princípio do contraditório quanto à matéria de exceção, o demandante nada disse. Na audiência de julgamento, as partes foram ouvidas, nos termos do disposto no artigo 57º, nº 1, 1ª parte da Lei nº 78/2001, de 13 de julho e, realizada a tentativa de conciliação, nos termos do nº 1 do artigo 26º da dita Lei, a mesma não se mostrou possível, mantendo as partes as respetivas posições vertidas nos seus articulados. A audiência de julgamento decorreu com observância dos legais formalismos, conforme resulta da respetiva ata dos autos, tendo sido agendada a sua continuação nesta data para prolação da presente sentença. Mantêm-se os pressupostos de regularidade e validade da instância, pois, o julgado de paz é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território (artigos 6º, nº 1, 8º, 9º, nº 1, alínea h) e 12º, nº 2, todos da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, na redação que lhes foi conferida pelo artigo 2º da Lei nº 54/2013, de 31 de julho). As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou questões prévias de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Valor da ação: Fixa-se o valor da presente ação em € 6.038, 92 (seis mil e trinta e oito euros e noventa e dois cêntimos), em conformidade com a posição das partes e as disposições conjugadas dos artigos 296º, nº 1, 297º, 299º, nº 1, 305º e 306º, todos do Código Processo Civil, aplicáveis por força do artigo 63º da Lei 78/2001, de 13 de julho, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 2º da Lei nº 54/2013, de 31 de julho.
Questões a decidir: a existência de contrato de seguro; a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação e da obrigação de indemnizar por parte dos demandados. Assim, cumpre apreciar e decidir:

II - FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Discutida a causa, consideram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da mesma:
1. No dia 21 de junho de 2017, pelas 13:30 horas, na Estrada X, freguesia de X, concelho de Trancoso, ocorreu um acidente de viação em que intervieram o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, X, matrícula VO, propriedade e conduzido pelo demandante e o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, X, matrícula ID, propriedade e conduzido pelo demandado D;
2. O embate dos referidos veículos ocorreu ao Km 12.500 da ponte existente na referida Estrada Municipal 591, que apresenta a largura máxima de 4,40 metros e 40 (quarenta) metros de comprimento, e fica situada antes da localidade da Cogula, atento o sentido de marcha Estrada X – Cogula;
3. Antes da referida ponte não existe qualquer sinal de trânsito de cedência de passagem em qualquer dos respetivos sentidos;
4. A referida ponte apresenta-se em linha reta, seguida por faixa de rodagem com duas vias de trânsito, em ambas as respetivas saídas;
5. Os veículos X VO e X ID têm largura não concretamente apurada, mas de pelo menos 2,20 metros e cerca de três metros de comprimento, sendo impossível o cruzamento destes veículos na referida ponte do local do acidente;
6. O demandante circulava na referida Estrada X no sentido Estrada Nacional X – Cogula e o demandado D no sentido Cogula - Estrada Nacional X, ambos pelas respetivas vias de trânsito da direita;
7. Na ocasião da colisão dos referidos veículos, nenhum outro veículo circulava na referida Estrada em ambos os referidos sentidos de marcha;
8. O demandante circulava no veículo X VO a uma velocidade não concretamente apurada, mas não superior a 40Km/hora;
9. O demandado D circulava no veículo X ID a uma velocidade não concretamente apurada, mas não superior a 60Km/hora;
10. Quando o demandado D iniciou a travessia da referida ponte conduzindo o veículo X ID não existia qualquer veículo a circular dentro dela ou a entrar na dita ponte, desde logo o veículo X VO conduzido pelo demandante;
11. Quando o demandado D se aproxima com o veículo X ID da saída da referida ponte, atento o seu sentido de marcha, o veículo X VO conduzido pelo demandante inicia a travessia da dita ponte, não tendo imobilizado o respetivo veículo antes da entrada da ponte, atento o seu sentido de marcha;
12. Nessa sequência, o demandado D acionou o sistema de travagem do veículo X ID e o demandante acionou o sistema de travagem do veículo X VO, mas não conseguiram imobilizar os respetivos veículos antes da colisão;
13. Nessa sequência, os dois veículos embateram com as respetivas frentes um no outro, ficando ambos imobilizados dentro da ponte, imediatamente antes da respetiva saída, atento o sentido de marcha do X ID, com as respetivas frentes encostadas uma na outra;
14. Em consequência da referida colisão, o veículo X VO ficou com danos na parte da frente, designadamente capo, farol, grelha, radiador, matrícula, travessas, ventoinha, friso, tubo de refrigeração, e impedido de circular;
15. O custo da reparação dos danos indicados no parágrafo anterior foi orçamentado no valor total de € 3.538,92 (três mil, quinhentos e trinta e oito euros e noventa e dois cêntimos), IVA incluído;
16. Para efetuar a reparação do veículo X VO são necessários quatro dias;
17. Até ao presente, o veículo X VO não foi reparado;
18. O demandante usava o veículo X VO para efetuar serviços agrícolas relacionados com um lagar de azeite que explora, designadamente para transportar azeitona;
19. O demandante teve de recorrer a carros emprestados para transportar azeitona para o referido lagar de azeite;
20. Até 27 de abril de 2017, entre o demandado D e a demandada B existiu um acordo de transferência da responsabilidade civil automóvel por danos causados a terceiros, respeitante ao veículo X ID, titulado pela apólice nº 000000;
21. O pagamento do prémio da referida apólice nº 0000 era mensal, com vencimento no dia 28 de cada mês, a pagar através de débito direto na conta que o demandado D era titular, com o IBAN PT0000000, na X;
22. Os prémios da apólice nº 0000 referentes aos períodos de 28-04-2017 a 27-05-2017, 28-05-2017 a 27-06-2017 e 28-06-2017 a 27-07-2017 não foram pagos até às respetivas datas de vencimento (28-04-2017, 28-05-2017 e 28-06-2017), por insuficiência de fundos na referida conta a debitar;
23. Quanto aos prémios referidos no parágrafo anterior, a demandada B enviou ao demandado D os respetivos avisos de pagamento nºs 0000, 00000 e 000000, a efetuar, por acordo e pela autorização nº 0000000, através de débito na referida conta, com indicação da data de vencimento, o período a que respeitava, a data da resolução por falta de pagamento, o respetivo montante, com discriminação de todas as parcelas (prémio, bónus, adicionais, taxas legais e selo da apólice);
24. Os avisos referidos no parágrafo anterior foram enviados ao demandado D com mais de 30 (trinta) dias de antecedência, respetivamente em 11-03-2017, 15-04-2017 e 13-05-2017;
25. Em 21 de junho de 2017, o prémio da apólice nº 0045.11.312613 não se encontrava pago pelo demandado D desde 28-04-2017;
26. Em 06 de julho de 2017, o demandado D fez o pagamento dos valores respeitantes aos avisos de pagamento dos prémios dos períodos de 28-04-2017 a 27-05-2017, de 28-05-2017 a 27-06-2017 e de 28-06-2017 a 27-07-2017, referidos nos anteriores parágrafos 22 e 23, no valor total de € 103,82, por transferência bancária;
27. Em 01 de setembro de 2017, a demandada B emitiu o recibo de estorno nº 0000 a favor do demandado D, no valor total de € 103,82, respeitante ao aludido período de 28-04-2017 a 27-07-2017;
28. A demandada B comunicou ao demandado D a não existência de seguro válido e eficaz;---
29. Em sede extrajudicial, a demandada B invocou, perante o demandante, a não existência de seguro válido e eficaz e o demandado C declinou a responsabilidade pelo acidente dos autos;

E consideram-se não provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa:
a) Que à data do acidente dos autos, em 21 de junho de 2017, o veículo X de matrícula ID tinha a sua responsabilidade civil automóvel por danos causados a terceiros transferida para a demandada B, através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 0000;
b) Que o demandante, ao aproximar-se do Km 12.500, imediatamente após entrar na ponte, apercebe-se da presença do veículo X a circular em sentido contrário ao seu a uma velocidade superior a 60 Km/h;
c) Que não obstante a presença do demandante na via, o condutor do veículo X entra na ponte e nem sequer diminui a velocidade que imprimia ao veículo;
d) Que o veículo propriedade do demandante se encontrava imobilizado na via;
e) Que o condutor do veículo X embateu num veículo totalmente imobilizado, sem sequer ter acionado os órgãos de travagem do seu veículo;
f) Que o demandante utilizava diariamente o veículo X VO para todas as suas deslocações pessoais;
g) Que o demandante foi obrigado a recorrer a boleias e a deixar de efetuar certas deslocações por não ter meio de transporte disponível
h) Que o demandante teve um prejuízo mensal no valor de € 500,00 (quinhentos euros) pela privação do uso do veículo X VO;

Motivação dos factos provados: A convicção do tribunal fundou-se na apreciação e conjugação crítica de toda a prova produzida e analisada em sede de audiência de julgamento, ou seja, nos documentos juntos aos autos pelas partes, na prova testemunhal apresentada, nas declarações do demandado D e do demandante. Ponderou-se também a conduta processual das partes, particularmente no que respeita aos factos que foram admitidos por acordo, bem como aos confessados, conforme resulta das respetivas posições vertidas nos seus articulados e na ata da audiência de julgamento.Foram ainda considerados pelo tribunal, os factos adquiridos nos termos do disposto no artigo 5º, nº 2, alíneas a) e b) do Código do Processo Civil, e atendeu-se às regras respeitantes ao ónus da prova, de acordo com os artigos 341º e seguintes do Código Civil. A factualidade dada como provada foi corroborada atendendo à conjugação dos aludidos meios de prova, tendo a prova testemunhal e por declarações de parte sido, criticamente, apreciadas pelo tribunal, ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova (artigo 396º do Código Civil e artigos 466º, nº 3 e 607º, nºs 4 e 5, ambos do Código do Processo Civil). Atendeu-se também às regras de experiência comum (artigo 351º do Código Civil e referido artigo 607º, nº 4, parte final). Quanto aos documentos juntos aos autos, atendeu-se particularmente aos documentos de fls. 4 a 8/verso, 30 a 34/verso, 40 a 43, 105, 106 e 108 a 118 dos autos. Isto é, ao Certificado de Matrícula de fls. 4; à participação de acidente de viação de fls. 4/verso a 6/verso, elaborada, em 21-06-2017, pelo Posto Territorial de Trancoso da Guarda Nacional Republicana; às fotografias de fls. 7 e 7/verso, 40, 41, 105, 106, 108 a 114; ao orçamento e relatório de peritagem de fls. 8, 8/verso e 115 a 118; à apólice de seguro nº 00000 de fls. 30; aos avisos de débito nºs 00, 00 e 00 de fls. 31 a 33/verso, respetivamente; ao comprovativo de pagamento de fls. 34; ao recibo de estorno nº 000 de fls. 34/verso; e às cartas emitidas pelo C, datadas de 09-10-2017, de fls. 42 e 43. Com efeito, a realidade que tais documentos demonstram foi corroborada pelos demais meios probatórios produzidos em audiência de julgamento e também resulta comprovada quando conjugados entre si.

A testemunha E, comum a todas as partes, salvo à demandada B, mostrou ter conhecimento direto e pessoal dos factos em discussão nos presentes autos, por força do exercício das suas funções de guarda principal no Posto Territorial de Trancoso, da Guarda Nacional Republicana, uma vez que foi ao local do acidente para elaborar a participação do acidente de viação, que inclui fotografias, confirmando que as mesmas correspondem aos documentos de fls. 4 a 7/verso dos autos. Mais declarou não ter qualquer interesse no desfecho desta causa e prestou depoimento de forma clara, tranquila e isenta, afigurando-se o respetivo depoimento credível, especialmente atenta a invocada razão de ciência. Por sua vez, a testemunha F, apresentada pelo demandante, apesar de ter declarado que presenciou o acidente dos autos, por no momento se encontrar junto a uma janela da sua casa, situada no local do acidente, o respetivo depoimento apenas se afigurou credível no que respeita à descrição do próprio local do acidente, pois, declarou que aí reside há cerca de seis anos. Com efeito, apesar de ter declarado não ter qualquer interesse no desfecho desta causa, não prestou depoimento de forma clara, tranquila e isenta, pois, revelou nervosismo, insegurança e contradição nos esclarecimentos prestados, não conseguiu olhar para os interlocutores quando faziam a instância, respondendo quase sempre de olhos fixos na mesa da sala de audiência e esfregando as mãos, evidenciando sinais de desconforto. O demandado D prestou depoimento e declarações de forma clara, tranquila e espontânea, incluindo quanto aos factos que lhe eram desfavoráveis, mostrando-se as respetivas declarações coerentes entre si e também quando conjugadas com os supra referidos documentos e as regras de experiência e da lógica. O demandante também prestou declarações de forma clara e tranquila. Contudo, não conseguiu convencer o tribunal da sua versão dos factos, designadamente no que respeita a ter sido o seu veículo X a entrar primeiro na ponte do local do acidente e a ficar imobilizado imediatamente a seguir à entrada da ponte atento o seu sentido de marcha, tendo sido o veículo X a embater nele, ficando o tribunal convencido do contrário quanto a tais factos, uma vez que tal versão não se afigurou verossímil quando conjugada com os demais meios de prova produzidos e com as ditas regras de experiência e da lógica. Além de que a testemunha que apresentou não corroborou essa sua versão dos factos, já que tanto disse que os veículos dos autos entraram ao mesmo tempo na ponte e que nenhum dos veículos parou, como que foi o veículo X a entrar primeiro na ponte aqui em causa. Tendo demandante e demandado D interesse direto no desfecho desta causa, impõe-se ponderar e conjugar as respetivas declarações com os demais meios de prova dos autos e também conjugá-las entre si, tendo sido consideradas, precisamente, na medida em que se mostravam coerentes em si mesmas, entre si e com os demais meios de prova produzidos nos autos, especialmente os documentos e as regras de experiência. Assim, considerando também a relevância dos princípios da imediação na produção da prova oral e da livre e fundada convicção do julgador, os supra referidos factos foram considerados provados atendendo à conjugação dos apontados meios de prova nos termos seguintes e que, sucintamente (artigo 60º, nº 1, alínea c) da Lei nº 78/2001, de 13 de julho), se passam a indicar, consignando-se que, doravante, o veículo X de matrícula VO e o veículo X de matrícula ID serão designados, respetivamente, apenas por veículo X e veículo X:

Parágrafo 1: factos admitidos por acordo das partes e também corroborados pelos documentos de fls. 4 a 6/verso dos autos;

Parágrafo 2: factos admitidos por acordo das partes; também corroborados pelo documento de fls. 4/verso a 6/verso dos autos; quanto à localização da ponte, a testemunha E referiu que, atento o sentido de marcha EN 102 – Cogula, não se está ainda na localidade da Cogula, pois, as habitações começam depois da ponte, aplicando-se o limite geral de velocidade de 90Km/hora; e os demais inquiridos referiram também que a velocidade máxima permitida no local seria 90Km/hora, por se estar fora da localidade e por não existir no local qualquer outro sinal a proibir uma velocidade máxima inferior à referida;

Parágrafo 3: todos os intervenientes ouvidos em audiência afirmaram, sem dúvidas, que antes da ponte aqui em causa não existe qualquer sinal de cedência de passagem, em qualquer dos seus sentidos de marcha, o que é corroborado pelas fotografias de fls. 40, 41, 105, 110 a 113 dos autos; as testemunhas referiram ainda que apenas se lembravam que existia um sinal de perigo a informar da passagem estreita, do estreitamento da via aqui em causa, no sentido de marcha EN 102 – Cogula; Parágrafo 4: esta factualidade está demonstrada nas fotografias de fls. 40, 41, 105, 110 a 114 dos autos; Parágrafos 5 e 6: quanto à largura e comprimento dos veículos dos autos e respetiva via de trânsito de circulação resultaram das declarações do demandante e do demandado D; a impossibilidade de cruzamento dos veículos dos autos na ponte (embora resultando da conjugação destes factos com os indicados no parágrafo 2) e os sentidos de marcha dos veículos foram admitidos por acordo das partes; Parágrafos 7, 8 e 9: factos que resultaram das declarações conjugadas do demandante e do demandado D, pois, ambos confirmaram que não circulava mais nenhum veículo naquela Estrada Municipal (e ponte) na ocasião do acidente e que conduziam ambos “devagar”; o demandante referiu que conduzia a 20 ou 30 Km/hora e que o demandado Dconduzia a mais velocidade, a 50Km/hora quando embateram (o que referiu por mais de uma vez) e talvez a 60 Km/hora antes de entrar na ponte; por sua vez, o demandado Desclareceu que circulava a cerca de 60 Km/hora antes de entrar na ponte e referiu que quando entrou na ponte reduziu a velocidade porque a sua carrinha é larga e a ponte é estreita e que quando embateram iria a cerca de 50 Km/hora; e embora tivesse dito que o demandante também deveria conduzir a cerca de 50 Km/hora, o certo é que disse também que, quando estava dentro da ponte, lhe pareceu que o demandante ia encostar e parar à direita da respetiva faixa de rodagem para lhe ceder passagem na saída da ponte; ambos referiram que o embate se deu a baixa velocidade, daí os estragos apresentados na frente dos veículos, senão seriam muito maiores; o que também faz sentido se atentarmos na posição final que os veículos apresentam nos documentos acima elencados, especialmente no croqui de fls. 6 elaborado pela testemunha E e as fotografias de fls. 7 (“foto n.º 4”) e 109 dos autos, que exibem os veículos com as frentes encostadas uma à outra; a testemunha E também confirmou que os veículos se encontravam tal como estão exibidos nas fotografias da participação de fls. 7 e 7/verso dos autos; por outro lado, atentas as regras da experiência, se os veículos circulassem a velocidade superior à indicada, ao acionarem os sistemas de travagem, poderia haver marcas de travagens no piso, o que não ocorreu, pois, a testemunha E confirmou a sua inexistência, o que também é possível confirmar nas fotografias de fls. 40 e 41 dos autos; Parágrafos 10 a 13: factos provados pela conjugação das declarações do demandado Dcom o croqui da participação de fls. 6 dos autos e as fotografias de fls. 7, 7/verso, 40, 41 e 109 dos mesmos; o demandado D esclareceu que quando circulava antes da ponte não se encontrava nenhum veículo a circular na ponte; que quando se aproximou da entrada da ponte reduziu a velocidade porque a via é mais estreita e a sua carrinha X é larga, o que exige ter maior cuidado e atenção; que no momento em que entrou na ponte o veículo X não se encontrava dentro da ponte, nem parado na ponte, pois, viu-o fora da ponte; que por isso mesmo entrou na ponte, pois, sempre lhe ensinaram na escola de condução que, na falta de sinal, tem prioridade de passagem o veículo que primeiro entra na ponte (via estreita); que quando se encontrava mais ou menos a meio da ponte o veículo X, parecendo que se ia encostar à direita e parar para lhe ceder passagem, acaba por entrar na ponte; que o veículo X não parou à entrada da ponte; que quando se aproxima da saída, com a entrada inesperada do veículo X, apesar de ter travado, não conseguiu evitar a colisão; Por sua vez, o demandante também esclareceu que acionou o travão de mão, o travão de pé e que segurou o volante; que parou a seguir à entrada da ponte porque foi ele o primeiro veículo a entrar na ponte e, por isso, não tinha que ceder passagem ao veículo X, mas como o veículo X não conseguiu parar, veio embater nele. Contudo, o tribunal não ficou convencido quanto a esta versão da colisão, pois, se de facto o demandante, como afirmou, circulasse a 20, 30 Km/hora, se tivesse apercebido do X a cerca de 5 a 7 metros antes da entrada da ponte atento o seu sentido de marcha (e não imediatamente após entrar na ponte como havia alegado), encontrando-se, nesse momento, o X ainda fora da ponte, a cerca de 40 ou 50 metros da ponte, parecendo-lhe que o X não reduziu a velocidade e que iria entrar na ponte, declarando ainda que ali se dão muitos acidentes e que até já pediu a colocação de sinais de trânsito de cedência de passagem naquele local, então, teria sido diligente e prudente ter parado à entrada da ponte e cedido a passagem ao veículo X, o que o demandante não fez, tendo arriscado a entrar na ponte e lá dentro imobilizar o veículo, segundo disse, quando o podia ter feito fora da ponte, evitando a colisão dos veículos; ou até ter tentado recuar, o que admitiu nem sequer ter tentado, por achar que era uma manobra perigosa. Ora, se atentarmos nos supra referidos documentos, conjugando-os com a demais factualidade provada respeitante às características da ponte, com 40 metros de comprimento, constata-se que o veículo X, tendo cerca de três metros de comprimento, percorreu apenas cerca de três metros de comprimento da ponte, uma vez que, após a colisão, se encontra imobilizado imediatamente após a entrada da ponte, atento o seu sentido de marcha; que, por isso, o veículo X percorreu os restantes cerca de trinta e sete metros de comprimento da ponte, pois, após a colisão, ficou imobilizado imediatamente a seguir ao veículo X, já que as suas frentes ficaram encostadas uma à outra, como se vislumbra nas fotografias indicadas, logo encontrava-se a pouco mais de três metros da saída da ponte, atento o seu sentido de marcha, portanto, encontrava-se praticamente a concluir a travessia da ponte. Por outro lado, atenta a velocidade dos veículos, o facto de ambos terem acionado os respetivos sistemas de travagem e de os para-choques serem feitos, normalmente, em material que permite algum amortecimento aquando do embate, permitem explicar a circunstância de os veículos terem ficado imobilizados com as respetivas frentes encostadas uma à outra. Caso o veículo X estivesse previamente parado na entrada da ponte e o veículo X viesse a velocidade superior a 60 Km/hora e não tivesse reduzido a velocidade, indo embater no veículo X, este poderia ser projetado para trás, ora tal também não se verificou, como resulta das fotografias indicadas e foi confirmado por demandante, demandado e testemunha E.

Parágrafos 14 a 19: factos provados pela conjugação das declarações do demandante com o orçamento de fls. 8, o relatório de peritagem de fls. 8/verso e 115 a 118 dos autos e as fotografias de fls. 7 (“foto n.º 4”), 106, 108 e 109 dos autos; estes documentos demonstram que o veículo X ficou com danos na parte da frente; indicam as peças a substituir e que são necessários quatro dias para efetuar os trabalhos de reparação; por outro lado, o demandante esclareceu que ainda não procedeu à reparação do veículo X; que este veículo é o “carro do lagar” de azeite que o demandante explora, usando-o para fazer os transportes da azeitona para o dito lagar, pelo que, teve que pedir carros emprestados para ir buscar a azeitona. Estas declarações mostraram-se credíveis, pois, o demandante explicou que, apesar de ser sargento reformado da Guarda Nacional Republicana e presidente da Junta de Freguesia de Cogula, o lagar de azeite foi “herança do sogro” e que, por isso, se dedica à sua exploração; que passa no local do acidente “todos os dias” porque o lagar de azeite fica antes da ponte aqui em causa. Além do mais, não foi feita qualquer contra-prova de tal factualidade. Parágrafos 20 a 27: estes factos foram aceites pelo demandado D, pois, não os impugnou na respetiva contestação e reconheceu-os, expressamente, em audiência de julgamento. Sendo que, disse, peremptoriamente, que, na data do acidente, não tinha carta verde nem dístico do veículo X, e que só depois do acidente dos autos é que procedeu ao pagamento das três mensalidades aqui em causa, únicas que tinha em dívida, bem como confirmou o teor dos documentos de fls. 30 a 34/verso dos autos. Ademais, uma vez que a participação do acidente de viação de fls. 4/verso a 6/verso não refere a existência de seguro quanto ao veículo X, a testemunha E também esclareceu que, no dia do acidente, o demandado D não tinha o documento do seguro do X e como lá tinha o computador portátil, fez de imediato a pesquisa nas bases de dados da “X” pela respetiva matrícula e o resultado obtido foi “anulado”; que, por isso, o demandado D foi notificado para depois comprovar a existência de seguro, o que não fez, tendo-lhe sido levantado o competente auto de contra-ordenação. Por outro lado, tendo o demandante e o demandado C invocado a existência de seguro válido e eficaz respeitante à transferência da responsabilidade civil automóvel por danos causados a terceiros pelo veículo X para a demandada B, competia-lhes o ónus de provar tal factualidade, o que não lograram alcançar nos autos. Parágrafos 28 e 29: estes factos foram aceites pelo demandado D na respetiva contestação, incluindo através da junção dos documentos de fls. 42 e 43 dos autos, o que reiterou em audiência. Assim, através da apreciação e conjugação dos indicados meios de prova, ficou o tribunal convencido da demonstração da realidade dos factos que deu como provados acima elencados (artigo 341º do Código Civil).

Motivação dos factos não provados:

Quanto aos factos não provados, assim foram considerados por, no entender do tribunal, da prova globalmente produzida e analisada em audiência de julgamento, os mesmos não terem sido corroborados pelos supra referidos meios de prova ou ter sido demonstrado exatamente o contrário. Assim, atenta a factualidade dada como provada sob os anteriores parágrafos 20 a 27 e pelos fundamentos supra expostos resulta, consequentemente, como não provada a factualidade indicada sob a alínea a), sendo desnecessário tecer mais considerações quanto a esta questão. Quanto à factualidade vertida sob as alíneas b) a h) competia ao demandante provar tal factualidade, o que não logrou alcançar nos autos. Sendo que, quanto à indicada sob as alíneas b) a e) também resultou provado o contrário, designadamente atenta a factualidade dada como provada sob os anteriores parágrafos 10 a 13 e respetivos fundamentos supra expostos. A versão da dinâmica da colisão apresentada pelo demandante no respetivo requerimento inicial e mantida nas respetivas declarações em audiência não convenceu o tribunal, não só pelos fundamentos que anteriormente se deixaram explicados, mas também porque tal versão não foi corroborada pela testemunha F apresentada pelo demandante que, segundo a própria declarou, teria presenciado o acidente dos autos. Nas respetivas declarações o demandante manteve a versão que foi o seu veículo X o primeiro a entrar na ponte e que, por isso mesmo, não tinha que ceder passagem ao veículo X, pois, quando estava a entrar na ponte o veículo X ainda se encontrava a cerca de 40, 50 metros antes da ponte, atento o sentido de marcha deste último, e que, por isso, era o veículo X que tinha que parar para lhe ceder a passagem. Se tivesse sido assim, então, não se perceberia por que razão o veículo X teria percorrido 50 metros antes da ponte e ainda mais 37 metros da ponte para ir embater num veículo que se encontrava imobilizado na saída da ponte, atento o seu sentido de marcha. Esta versão não se mostra coerente com as regras de experiência. Até porque, também o demandado D esclareceu que há cerca de três, quatro meses que ali passava porque andava a trabalhar em Pinhel, logo, também conhecia o local e o estreitamento da via na ponte do acidente. Ademais, o acidente ocorreu em junho, pelas 13:30 horas, em pleno dia, e o tempo estava bom (conforme refere a participação de fls. 5/verso e se pode verificar também pelas fotografias de fls. 40 e 41 dos autos), tendo ambos os condutores condições ambientais que proporcionavam uma boa visibilidade da ponte onde ocorreu o acidente. O depoimento da testemunha F, quanto à dinâmica do acidente, também não mereceu credibilidade pelas razões já acima elencadas, mas também porque ao longo do seu depoimento de concreto pouco disse a respeito da colisão dos veículos dos autos, respondendo às questões que lhe eram colocadas sempre em abstracto, isto é, referindo-se à generalidade dos comportamentos dos condutores que atravessam a ponte, que uns param, outros fazem marcha atrás, outros sinais de luzes, que deve ser o bom senso dos condutores a determinar quem passa primeiro na ponte. Quanto à concreta situação da colisão dos autos, disse designadamente que o veículo X não parou, que ia distraído com alguma coisa; que houve o embate e “nenhum parou”, mas logo de seguida disse que o veículo X estava parado; que “entraram os dois ao mesmo tempo” na ponte do local do acidente (declaração que manteve quando questionado a tal respeito pelos demais Ilustres Mandatários); que a velocidade não sabia, mas que o veículo X “reduziu, reduz-se sempre, senão seria pior”; que se o veículo X tem travado não tinha batido, para logo de seguida dizer, referindo-se ao veículo X, que “até pode ter prioridade, mas não ia bater” e que o veículo X devia ter parado antes de entrar na ponte; que se fosse condutor do veículo X tinha parado antes de entrar na ponte. Finalmente, questionado pelo tribunal a respeito de qual foi o veículo que entrou primeiro na ponte, respondeu, olhos postos na mesa da sala de audiência, que foi o veículo X; e quando interpelado de novo a tal propósito, encostou-se na respetiva cadeira, cruzou os braços no peito e manteve que foi o veículo X que entrou primeiro na ponte. Ora, este comportamento da testemunha indica insegurança, desconforto e autoproteção, o que se compreende, pois, antes tinha dito que os veículos entraram os dois ao mesmo tempo na ponte, declaração que também manteve quando questionado pelos demais Ilustres Mandatários. Ora, como estas declarações da testemunha F são contraditórias entre si quanto ao mesmo facto, resulta que a testemunha não sabe qual dos veículos dos autos entrou primeiro na ponte, não se mostrando, assim, corroborada a versão do demandante de que teria sido o primeiro a entrar na ponte. Por outro lado, quanto à factualidade vertida sob as alíneas f) a g), o demandante apenas disse que o veículo X era o “carro do lagar” e que o usava para transportar a azeitona; que não alugou outro veículo porque é “muito caro”, mas não referiu sequer qualquer valor diário ou mensal de aluguer, nem juntou aos autos qualquer documento quanto a tal questão, apenas dizendo que o valor pedido de € 500,00 era “por baixo”, mas, como referido, não o demonstrou em audiência através de qualquer meio de prova (não basta alegar, é preciso provar). Ora, a testemunha F nada soube esclarecer quanto a esta concreta matéria, tendo apenas dito que não sabia se o demandante já tinha reparado o veículo X e que nunca mais o viu a circular. Conforme supra referido, a demais factualidade alegada pelas partes não foi considerada relevante para a decisão da causa.


III - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
A responsabilidade civil é fonte da obrigação de indemnizar, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 227º, 483º e seguintes, 798º e seguintes e dos artigos 562º e seguintes, todos do Código Civil (diploma ao qual pertencem todas as normas que de seguida sejam indicadas sem expressa menção da respetiva fonte legal). No caso dos autos, atenta a factualidade considerada provada acima enumerada, estamos perante uma situação a equacionar no âmbito da responsabilidade civil extracontratual ou delitual. Esta, por sua vez, pode ser uma responsabilidade por culpa, quando se censura o agente por ter atuado de um modo diferente do que podia e devia ter feito, tendo na sua base o princípio da culpa; ou objetiva ou pelo risco, que tem na sua base a ideia de que se alguém tira proveito de uma particular fonte de riscos, parece justo que suporte os encargos com a indemnização dos danos a que dê causa, mesmo sem culpa, pois, o que mais importa é a reparação do dano. Regra geral, são requisitos, cumulativos, da responsabilidade civil os seguintes: o facto humano voluntário (dominável ou controlável pela vontade); qualificável como ilícito (contrariedade ao Direito pela violação do direito de outrem ou de disposição legal destinada a proteger interesses alheios ou pelo abuso do direito); o nexo de imputação do facto ao agente (censurabilidade do comportamento ilícito, por dolo ou negligência, por se afastar da diligência de um bom pai de família em face das circunstâncias do caso concreto); o dano (lesão do bem ou interesse juridicamente protegido, com caráter patrimonial ou não patrimonial) e o nexo de causalidade entre o facto e o dano (há causalidade adequada quando, em abstrato, certa causa se revele apropriada para produzir determinado efeito). Ou seja, constituem requisitos cumulativos para a efetivação da responsabilidade: 1) o facto; 2) a ilicitude; 3) a imputação do facto ao agente; 4) o dano; e 5) o nexo de causalidade entre o facto e o dano. Nas situações de responsabilidade civil pelo risco, dispensa-se apenas o referido requisito da culpa.Verificados todos os referidos requisitos, o sujeito lesante deve indemnizar o sujeito lesado. O sentido e o fim da indemnização é a criação da situação em que o lesado estaria presentemente, no momento em que a ação de responsabilidade civil é julgada, se não tivesse tido lugar o facto lesivo, isto é, da situação hipotética ou provável e não a reconstituição da situação anterior à lesão, ou seja, a criação da situação atual provável. A indemnização apenas existe em relação aos danos (reais) que o lesado, provável ou presumivelmente, não teria sofrido se não fosse a lesão, neles compreendendo não só os prejuízos causados (danos emergentes) como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (lucros cessantes), incluindo os danos futuros desde que previsíveis (artigo 564º). Quando a reconstituição natural não seja possível, a indemnização pecuniária deve ser calculada pela diferença entre a situação real em que o facto deixou o lesado e a situação hipotética em que ele se encontraria sem a ocorrência do dano. E, se não puder ser averiguado o valor exato dos danos imputados ao concreto facto lesante, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (artigo 566º).

Da existência de contrato de seguro quanto ao veículo X ID:
O demandante no respetivo requerimento inicial deduz um pedido principal contra a demandada B, no pressuposto de, à data do acidente, o demandado D ter transferido para aquela a responsabilidade civil automóvel por danos causados a terceiros pelo veículo X ID, através do contrato de seguro titulado pela apólice nº 00000. No entanto, quanto a tal apólice, a demandada B alegou a exceção de inexistência de seguro válido e eficaz na data do acidente, pelo que, conforme supra enunciado importa apreciar e decidir sobre a questão da existência de contrato de seguro válido e eficaz à data do acidente, uma vez que a sua existência é pressuposto prévio e necessário à responsabilização de tal demandada, o que faremos antes de se apreciarem os supra referidos requisitos gerais e cumulativos da responsabilidade civil. Assim, de acordo com o artigo 150º do Código da Estrada (Decreto – Lei nº 114/94, de 03 de maio e respetivas alterações, incluindo a do Decreto – Lei nº 40/2016, de 29 de julho), de modo a poderem transitar na via pública, para garantia da responsabilidade civil pela utilização de veículos a motor impõe-se a obrigação de seguro, isto é, a contratação de um seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel. E tal obrigação impende desde logo sobre o proprietário, nos termos do artigo 6º, nº 1 do Regime do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel (Decreto – Lei nº 291/2007, de 21 de agosto e respetivas alterações). De acordo com a factualidade dada como provada sob os parágrafos 20 e seguintes, no dia do acidente dos autos a referida responsabilidade civil automóvel do veículo X ID não se achava transferida para a demandada B, pois, o demandado D, dono de tal veículo, tendo acordado que o prémio da apólice nº 0045.11.312613 seria pago em prestações mensais, não procedeu ao pagamento da prestação mensal vencida em 28-04-2017, bem como das prestações mensais vencidas em 28-05-2017 e 28-06-2017. Ora, segundo o Regime Jurídico do Contrato de Seguro (Decreto – Lei nº 72/2008, de 16 de abril, e respetivas alterações) “a cobertura dos riscos depende do prévio pagamento do prémio” (artigo 59º), vigorando o princípio “no premium, no risk”, ou seja, não há cobertura do seguro, dos riscos cobertos pelo seguro, enquanto o prémio ou respetiva fração acordada entre as partes não estiver pago. E a falta de pagamento de uma fração do prémio no decurso de uma anuidade “determina a resolução automática do contrato na data do vencimento” de tal fração (artigo 61º, nº 3, alínea a) do referido Regime), ou seja, ocorre a resolução automática do contrato por força da lei (independentemente, portanto, da vontade das partes). Foi o que ocorreu no caso concreto dos autos, porquanto, como o demandado D não procedeu ao pagamento da fração que se vencia no dia 28-04-2017, o contrato de seguro foi extinto por força da aludida resolução automática legalmente determinada. Daí que, o demandado D não tivesse em seu poder a respetiva carta verde e o resultado na pesquisa junto da base de dados “X” acessível à GNR tivesse dado o resultado “anulado” quanto ao veículo X ID na data do acidente.
Assim sendo, por força das disposições acima indicadas, a demandada B não pode ser responsável por garantir o pagamento de qualquer indemnização eventualmente devida ao demandante, uma vez que alegou e provou factos extintivos dessa obrigação, em virtude de ter demonstrado que, na data do acidente, o veículo X não beneficiava de seguro válido e eficaz. Decorre do referido regime legal ser absolutamente necessário o pagamento prévio da fração do prémio do seguro (mensal, no caso dos autos) para que se verifique a subsequente continuação da cobertura do risco, ou seja, para assegurar a não resolução automática e imediata do contrato de seguro (neste sentido, vide acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 16-01-2014, proferido nos autos do processo 291/12.4TBRMZ.E1, disponível para consulta pública no sítio da internet www.dgsi.pt). Por sua vez, quer o demandante, quer o C, apesar de terem alegado a existência do referido seguro, válido e eficaz, não provaram tal factualidade nos autos, como lhes competia para fazer valer a sua pretensão (neste sentido, vide acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 27-05-2004, proferido nos autos do processo 0432881, disponível para consulta pública no sítio da internet www.dgsi.pt). Assim, como à data do acidente de viação dos autos, a responsabilidade civil emergente da utilização do veículo X ID não estava transferida para a demandada B, através de contrato de seguro válido e eficaz, por forma a que a referida seguradora pudesse ser obrigada a indemnizar os danos sofridos pelo aqui demandante, conclui-se que a ação tem que improceder, por não provada, quanto ao pedido principal de condenação da dita demandada B.

Da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil e, consequente, obrigação de indemnizar pelos segundo e terceiro demandados:
Assim, na improcedência do pedido principal deduzido contra a demandada B, impõe-se, agora, apreciar o pedido subsidiário de condenação do segundo demandado C e do terceiro demandado D, uma vez que a reparação dos danos causados por “ (…) responsável incumpridor da obrigação de seguro de responsabilidade civil automóvel, é garantida pelo C (...)”, nos termos dos artigos 47º e seguintes do referido Regime do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel. Ora, como acima se referiu, era sob o demandado D que recaía a obrigação de segurar o veículo X. Mas, só no caso de se apurar que o demandado D é responsável civil do acidente dos autos, se poderá concluir também pelo fundado acionamento e procedência da garantia de reparação de danos através do demandado C. Assim, quanto aos danos provenientes de acidentes causados por veículos, a normatividade vigente, contempla a possibilidade de responsabilização do lesante, quer por via da responsabilidade por culpa (artigo 483º), quer pelo risco (artigo 503º e 506º), importando, assim, verificar se estão preenchidos no caso concreto dos autos os respetivos pressupostos legais no que respeita à conduta do demandado D, a fim de apurar se o mesmo é civilmente responsável pelo acidente de viação dos autos, tendo a obrigação de indemnizar os danos sofridos pelo demandante. O demandante funda o seu pedido no facto de o demandado D não ter adequado a velocidade que imprimia ao veículo X na travessia da ponte e ter entrado na ponte do local do acidente dos autos depois dele, quando lhe deveria ter cedido passagem, uma vez que era impossível o cruzamento dos dois veículos dos autos na referida ponte, circunstâncias que provocaram a colisão, considerando-o como o único culpado e causador do acidente. Ora, o demandado D é o dono do veículo X e era ele que o conduzia quando se deu a colisão dos autos, pois, circulava no local porque andava a trabalhar em Pinhel. Assim, no momento do acidente, era o próprio demandado D que, por sua vontade, controlava a condução, circulação e utilização do veículo X na Estrada Municipal X aqui em causa, que controlava a velocidade que imprimia ao veículo e que decidiu atravessar a ponte nas condições dadas como provadas nos autos. Assim sendo, conclui-se pela verificação de um facto humano que era dominável e controlável pela vontade do aqui demandado D. Quanto à contrariedade ao Direito, segundo o artigo 483º, nº 1, há ilicitude quando o agente violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, sendo entendimento que se integram na segunda hipótese designadamente as disposições do Código da Estrada. Como tais normas visam garantir a segurança rodoviária, a sua violação permite, desde logo, concluir pela verificação do requisito da ilicitude. De acordo com a factualidade dada como provada quanto ao local do acidente, trata-se de uma ponte que fica situada antes da localidade da Cogula, tendo todos os intervenientes ouvidos em audiência afirmado que o limite máximo de velocidade permitida é de 90Km/hora, por referência aos comuns veículos ligeiros de passageiros. Ora, ficou provado que o demandado D conduzia um veículo ligeiro de mercadorias, sem reboque (como se pode comprovar pelas fotografias de fls. 7 e 41 dos autos) e circulava a velocidade não concretamente apurada, mas não superior a 60Km/hora, pelo que, não podia circular a velocidade superior a 80Km/hora (artigo 27º, nº 1 do Código da Estrada), logo, a sua conduta não desrespeitou o limite máximo de velocidade permitida no local do acidente. Contudo, no caso concreto, importa ainda ponderar se a velocidade que o demandado D imprimia ao veículo X era excessiva, atendendo especialmente ao estreitamento da faixa de rodagem na ponte e impossibilidade de cruzamento de veículos na mesma, e da qual tinha prévio conhecimento. O demandado D esclareceu que antes de entrar na ponte circulava a cerca de 60Km/hora, diminuiu a velocidade quando entrou na ponte e terá embatido a cerca de 50Km/hora (o que foi corroborado pelo demandante), pois, apesar de ter travado, não conseguiu evitar a colisão, atenta a entrada inesperada na ponte por parte do veículo X conduzido pelo demandante. Ora, apesar de se ter provado que nenhum outro veículo circulava naquela Estrada Municipal X no momento do acidente e de resultar da participação do acidente de viação de fls. 4/verso a 5/verso dos autos que o tempo estava bom, era pleno dia (13:30 horas) e havia boa visibilidade no local do acidente, entende-se que, no caso concreto, o demandado D não adequou e não moderou especialmente a velocidade, atendendo essencialmente à circunstância do estreitamento da via na ponte, que era dele conhecida, pois que, há pelo menos três meses que ali passava em trabalho para Pinhel, pelo que, tinha obrigação de imprimir ao veículo X uma velocidade que lhe permitisse parar o veículo em segurança, ou seja, no caso concreto, sem embater com o veículo X do Demandante à saída da ponte, atento o seu sentido de marcha, o que não fez. Até porque circulava com carga (paletes “amontoadas”) na carrinha (conforme fotografias de fls. 7 (“foto nº 3”) e 41 dos autos) e bem sabia que também circulava sem seguro, pelo que, lhe era exigível maior cuidado, diligência e prudência na condução. Ainda que o demandado D tivesse ficado convencido que o demandante ia parar à entrada da ponte para lhe ceder passagem, prosseguiu com a marcha do X, não conseguindo moderar a velocidade de modo a parar o veículo em condições de segurança, a fim de evitar a colisão. Sendo certo que, atentas as suas próprias declarações, quando entrou na ponte ainda viu o veículo X fora da ponte, devendo ter moderado a velocidade de forma a parar o veículo X sem embater, na hipótese de o condutor daquele não lhe ceder passagem, como veio a ocorrer. A conduta do demandado D, neste particular, não respeitou as normas dos artigos 24º e 25º, nº 1, alínea i), ambos do Código da Estrada, pois que, o legislador considera excessiva a velocidade sempre que o condutor não possa fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, devendo moderar especialmente a velocidade nas pontes. No caso concreto, o dever de moderar especialmente a velocidade mostra-se ainda mais necessário e prudente pelo facto de faixa de rodagem na ponte dos autos não permitir a circulação simultânea dos veículos que transitem em sentidos opostos. Diferentemente ocorre no que respeita à questão da prioridade na passagem da ponte. Com efeito, conforme resulta dos factos provados, era impossível o cruzamento dos veículos dos autos na faixa de rodagem da ponte do local do acidente e não existia na estrada qualquer sinal de cedência de passagem em qualquer dos respetivos sentidos de marcha. Assim, de acordo com o disposto nos artigo 33º, nº 1, alínea b) do Código da Estrada, não sendo possível o cruzamento entre dois veículos que transitem em sentidos opostos, quando a faixa de rodagem for demasiadamente estreita, deve ceder a passagem o condutor do veículo que chegar depois ao troço ou, se se tratar de via de forte inclinação, o condutor do veículo que desce. Atenta a factualidade dada como provada, por um lado, a ponte dos autos apresenta-se em linha reta, aplicando-se a regra de que tem obrigação de ceder a passagem o condutor que chegar depois ao troço. Por outro lado, quem entrou primeiro na ponte foi o condutor do veículo X, sendo o demandado Dque se encontrava a circular na ponte quando o demandante inicia a travessia da mesma, pelo que, era o demandante condutor do veículo X que tinha o dever de ceder a passagem ao aludido demandado e não o contrário. Sendo que, para tal efeito, deveria ter abrandado a marcha e parado e, em caso de cruzamento de veículos, recuar, por forma a permitir a passagem do outro veículo (artigo 29º, nº 1 do Código da Estrada). É jurisprudência pacífica que a violação de normas estradais concomitante à produção de um acidente de viação faz presumir a culpa do condutor infrator, por decorrência das regras de experiência comum.“O efeito danoso causado pelo acidente só pode ser objecto de um juízo de censura, se resultar de uma causa imputável àquele que o produziu, causa essa que se pode expressar, nos termos da lei, numa condução contravencional, ou, então, na falta de atenção, imperícia, inconsideração ou violação dos deveres gerais de diligência na direcção de um veículo. (…)Acontece que em matéria de responsabilidade civil resultante de acidente de trânsito, em que os danos foram provocados por violação objectiva de uma norma do CE, vigora a presunção “juris tantum” de negligência, contra o autor material da contravenção, dispensando-se, pois, a prova, em concreto, da falta de diligência.” (Gregório Silva Jesus, “Infracções estradais causais nos acidentes de viação”, in Direito Estradal, pág. 30 e 31, CEJ, 2016).
No caso dos autos, resulta comprovado que ambos os condutores dos veículos intervenientes no acidente dos autos violaram normas estradais e, ambos agiram com culpa, pois, ambos agiram de um modo diferente do que podiam e deviam ter feito, pois, o demandado D não reduziu, nem moderou especialmente a velocidade que imprimia ao veículo X de maneira a parar em segurança e evitar a colisão com o veículo X, e o demandante não parou antes da entrada da ponte para ceder passagem ao veículo X, de maneira e evitar a colisão com o mesmo. Não agiram como um bom pai de família teria agido na situação concreta, isto é, com razoabilidade, prudência e diligência (artigo 487º, nº 2), pois, adotaram ambos uma conduta negligente, uma vez que omitiram a diligência devida e adequada a prever ou evitar o resultado ilícito, concluindo-se, necessariamente, pela existência de concorrência de culpas na produção do acidente aqui em causa (adiante nos pronunciaremos em que respetiva medida). Na verdade, conforme se expôs, nenhum dos veículos aparece subitamente à frente um do outro, ambos os condutores se avistaram a pelo menos 20 metros de distância, como resulta da factualidade provada e da conjugação das respetivas declarações, pelo que, a velocidade do veículo X não foi indiferente ao processo causal, circulando a uma velocidade mais reduzida (especialmente moderada) seria possível evitar o embate ou atenuar as suas consequências; o mesmo se diga quanto ao facto de o veículo X não ter cedido passagem àquele. Além disso, não se provou que qualquer factor alheio aos veículos e condutores dos autos tenha dado causa ao acidente. Não se olvida ainda que, mesmo a considerar-se que o demandado Dnão agiu com culpa (o que não ficou demonstrado nos autos), ainda assim sempre poderia ser responsabilizado por força do disposto no artigo 503º, nº 1, uma vez que, no momento do acidente, era o dono do veículo X, tinha o poder de facto sobre o mesmo, utilizava-o no seu trabalho, respondendo pelos riscos inerentes à sua utilização (riscos do próprio veículo e/ou do condutor). Aliás, como era dono do veículo, tal facto faz presumir que o veículo circulava sob sua direção efetiva e no seu próprio interesse. Quanto aos danos, atenta a factualidade dada como provada, ficou demonstrado que o veículo X ficou danificado na parte da frente, o que o impede de circular, sendo necessários quatro dias para a sua reparação e a substituição das peças constantes do orçamento de fls. 8 e 115 a 118 dos autos, com indicação do respetivo custo total da reparação de € 3.538,92 (três mil, quinhentos e trinta e oito euros e noventa e dois cêntimos), bem como que até à presente data o demandante ainda não reparou o veículo X, logo, que desde a data do acidente até ao presente está privado do respetivo uso.Por fim, quanto ao nexo de causalidade entre o facto e o dano, há causalidade adequada quando, em abstrato, certa causa se revele apropriada para produzir determinado efeito, ou seja, não basta que, em concreto, uma certa causa tenha sido condição de um determinado efeito, pois, para que se possa considerar causa adequada é também necessário que, em abstrato, pela sua natureza geral, se revele apropriada para o produzir, pelo que, considera-se que, em abstrato, quer a velocidade a que o demandado D conduzia o veículo X, quer a inobservância da regra da cedência de passagem na ponte dos autos, são causas adequadas para o resultado da colisão dos veículos e, consequentemente, dos danos sofridos pelo veículo X. Atento o exposto, conclui-se que se verificam, no caso concreto, todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, devendo o demandado D ser considerado responsável civil do acidente e, consequentemente, é fundado o acionamento da garantia de reparação de danos através do C, estando obrigados, solidariamente, a indemnizar o aqui demandante (lesado) pelos danos sofridos. “Na verdade, a responsabilidade do Fundo resulta, prima facie, do incumprimento da obrigação de segurar, pelo que o proprietário do veículo deve ser também chamado à demanda.
Estamos perante um caso de solidariedade imprópria ou imperfeita, na medida em que, externamente, a responsabilidade dos obrigados é solidária (obtida sentença favorável, o lesado pode exigir de qualquer deles a satisfação total do seu crédito). No entanto, satisfeita a indemnização pelo Fundo de Garantia Automóvel, este fica sub-rogado nos direitos do lesado, sendo solidariamente responsáveis, pelo pagamento ao Fundo de Garantia Automóvel, o detentor, o proprietário e o condutor do veículo cuja utilização causou o acidente, independentemente de sobre qual deles recaia a obrigação de seguro - art. 54° nºs 1 e 3 do Dec. Lei 291/2007, de 21 de Agosto.”, conforme acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 11-11-2009, proferido nos autos do processo 3/08.7TBMRA-A.E1 (no mesmo sentido, vide acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 11-01-2005, proferido nos autos do processo 3013/04), ambos disponíveis para consulta pública no sítio da internet www.dgsi.pt. Importa, agora, apurar em que concreta medida estão obrigados a indemnizar, atenta a considerada concorrência de culpas. De acordo com o disposto no artigo no artigo 570º do Código Civil, “Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.”. Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, “Para que o tribunal goze da faculdade conferida no nº 1, é necessário que o acto do lesado tenha sido uma das causas do dano, consoante os mesmos princípios de causalidade aplicáveis ao agente (…). Deve, além disso, o lesado ter contribuído com a sua culpa para o dano (…). A culpa do lesado tanto pode reportar-se ao facto ilícito causador dos danos, como directamente aos danos provenientes desse desse facto.” (vide in Código Civil Anotado, Vol. I, pág 587 e 588, 4ª edição, Coimbra Editora). Atento quanto já se expôs, considera-se que o facto de o demandante não ter cedido passagem na saída da ponte do local do acidente ao veículo X do demandado, atento o sentido de marcha deste, também deu causa à colisão dos respetivos veículos. Quanto à culpa, reiteramos os fundamentos anteriormente expostos, considerando-se que, no caso concreto, o grau de culpa é diferente, essencialmente pelo facto de atento o local do acidente e a dinâmica do mesmo dada como provada, se concluir que o demandante era o condutor que se encontrava em posição e condições de mais facilmente imobilizar o seu veículo antes da colisão, pois, circularia a uma velocidade inferior ao demandado D e, estando já o veículo X a percorrer a ponte, deveria ter-lhe cedido a passagem e, dessa forma, evitar a colisão, pelo que, se considera adequada uma repartição da culpa na proporção de 70% para o demandante e 30% para o demandado D. No que respeita aos concretos danos apurados, embora não tenha sido pedida a reparação do veículo, o pedido de pagamento do valor do custo da reparação contém-se ainda no quadro da reconstituição natural da situação que existiria se não tivesse ocorrido o sinistro, sendo também uma forma de reparar o dano e que terá sido tida pelo demandante (lesado) como a mais adequada para alcançar tal efeito, sendo fundado tal pedido, não se tendo também os demandados insurgido contra o mesmo (a este respeito, vide acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 14-10-2010, proferido nos autos do processo 403/2001.P1.S1 e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 25-05-2017, proferido nos autos do processo 12795/15.2T8ALM.L1-2, ambos disponíveis para consulta pública no sítio da internet www.dgsi.pt).---
Por outro lado, quanto à privação da possibilidade de uso do veículo, é maioritariamente aceite pela jurisprudência, que a simples privação do uso é um dano patrimonial, susceptível de avaliação pecuniária, devendo ser indemnizado como contrapartida pela perda da capacidade de utilização normal durante o período de privação. Segundo o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 10-09-2013, proferido nos autos do processo 438/11.8TBTND.C1, também disponível para consulta pública no referido sítio da internet, “1. Na reparação do dano consistente na privação do uso do veículo por parte do lesado, em consequência de um sinistro rodoviário, podem equacionar-se duas distintas situações: - uma delas em que se apura a concreta existência de despesas feitas pelo lesado em consequência dessa privação, como será por exemplo o caso mais comum em que o lesado se socorre do aluguer de veículo de substituição, contratando esse aluguer junto de empresas do ramo; - uma outra situação em que não se apuram gastos alguns mas apenas que o lesado utilizava o veículo nas suas deslocações habituais (para fins profissionais ou de lazer) e que não lhe foi facultada pelo lesante viatura de substituição, tendo o mesmo ficado, por isso, impedido de fazer essas deslocações ou tendo o mesmo continuado a fazê-las socorrendo-se para o efeito de veículos de terceiros familiares e amigos que, a título de favor, lhe cederam por empréstimo tais veículos. 2. Na primeira das apontadas situações, o lesado tem direito à reparação integral dos gastos/custos que teve por via da dita privação. 3. Já na segunda, a medida da indemnização terá que ser encontrada com recurso à equidade, pois que deve concluir-se pela existência de um dano que se traduziu na impossibilidade do lesado o utilizar nas suas deslocações diárias, profissionais e de lazer, havendo que encontrar em termos quantitativos um valor que se mostre adequado a indemnizar o lesado pela paralisação diária de um veículo que satisfaz as suas necessidades básicas diárias. (…)”.
Ora, no caso dos autos, o demandante esclareceu que o veículo X era o carro do lagar de azeite e que o utilizava para transportar a azeitona. Sabe-se que esta é uma atividade sazonal, pois que só decorre durante alguns meses do ano. No entanto, atentas as regras de experiência, quem explora um negócio também utiliza normalmente o veículo, mesmo fora do concreto período em que tal atividade possa decorrer com mais intensidade. Contudo, não ficou provado que o demandante também utilizasse o veículo para deslocações pessoais e diárias, pois, nada disse a tal respeito, não concretizando qualquer outra utilidade do veículo, senão a utilização para o transporte da azeitona.
Por outro lado, não se provaram concretas despesas de aluguer de outro veículo pelo demandante, e também não se provou que o prejuízo decorrente da privação do uso do veículo X ascendesse ao valor mensal peticionado de € 500,00, pois, designadamente não foi alegado ou provado qualquer valor diário ou mensal de aluguer de um veículo similar àquele, pelo que, haverá que fazer uso da equidade, conforme disposições conjugadas dos artigos 4º, alínea a) e 566º, nº 3. Assim, atendendo a que a atividade do lagar de azeite é essencialmente sazonal, parece-nos que a utilidade a retirar do veículo X desde a data do acidente até ao presente não terá sido exatamente a mesma durante todo esse período. Contudo, considerando que apenas a possibilidade de uso configura em si mesma uma vantagem, por referência ao valor peticionado de € 500,00 mensais, que se considera excessivo, não tendo sido produzida prova quanto ao valor mensal peticionado, fixa-se, por equidade, o dano de privação de uso no valor mensal de € 330,00 (trezentos e trinta euros), correspondente a € 11,00 (onze euros) por dia, por se ter como um valor adequado e razoável ao caso concreto dos autos. Ademais, uma vez que, até ao presente, o demandante ainda não reparou o veículo, e não resultou apurado quando pretende fazê-lo, bem como atendendo a que o próprio demandante concorreu para a produção do dano, se considera excessivo o pedido de condenação dos demandados no pagamento do valor que se vencer a título de privação de uso até efetiva reparação, já que esta está, exclusivamente, dependente da vontade do próprio demandante, pelo que, de acordo com o disposto no referido artigo 570º, nº 1, parte final, se considera adequado fixar tal indemnização desde o acidente até à presente data, correspondente a oito meses de privação de uso, no total de € 2.640,00 (dois mil, seiscentos e quarenta euros), acrescida ainda de quatro dias de privação, que são os necessários à reparação do veículo X, no valor de € 44,00 (quarenta e quatro euros), no total de € 2.684,00 (dois mil, seiscentos e oitenta e quatro euros). Atento o exposto, devem os demandados C e D ser condenados a pagar ao demandante a quantia de € 1.061,68 (mil e sessenta e um euros e sessenta e oito cêntimos) quanto ao custo de reparação (€ 3.538,92 x 30%) e a quantia de € 805,20 (oitocentos e cinco euros e vinte cêntimos) quanto à privação de uso (€ 2.684,00 x 30%), no total de € 1.866,88 (mil, oitocentos e sessenta e seis euros e oitenta e oito cêntimos). Acresce ainda que, a simples mora no cumprimento da obrigação (incluindo de indemnizar), constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor. Aquele fica constituído em mora designadamente depois de ter sido judicialmente interpelado para cumprir, mas tratando-se, como no caso dos autos, de responsabilidade por facto ilícito (igualmente se pelo risco), o devedor só se constitui em mora desde a citação (artigos 804º, nº 1 e 805º, nºs 1 e 3). A obrigação de indemnizar, apesar de se considerar de valor, acaba por se traduzir no pagamento de uma quantia pecuniária, pelo que, são devidos juros legais, à taxa de 4%, a contar do dia da constituição em mora (559º, 806º, nºs 1 e 2 e Portaria nº 291/2003, de 08 de abril), isto é, desde a data da respetiva citação (em 11-12-2017 o demandado C e em 12-12-2017 o demandado D) até efetivo e integral pagamento.

IV- Decisão:

Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência:

a) Absolvo a demandada B, dos pedidos contra si deduzidos;

b) Condeno, solidariamente, os demandados C e D, a pagar ao demandante a quantia global de € 1.866,88 (mil, oitocentos e sessenta e seis euros e oitenta e oito cêntimos), a título de indemnização civil por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora legais, à taxa de 4%, desde a data da respetiva citação até efetivo e integral pagamento, absolvendo-os do demais peticionado. As custas totais, no valor de € 70,00 (setenta euros), são repartidas pelo demandante e pelos demandados C e D, na proporção da respetiva responsabilidade, que declaro consequentemente partes vencidas, o demandante na proporção de 70% (€ 49,00) e os aludidos demandados na proporção de 30% (€ 21,00), atento o disposto no artigo 527º, nºs 1 e 2 e 607º, nº 6, ambos do Código do Processo Civil, aplicáveis por força do artigo 63º da Lei 78/2001, de 13 de julho, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 2º da Lei nº 54/2013, de 31 de julho, sendo que a importância devida pelo demandante (€ 14,00) deve ser paga nos três dias úteis imediatamente subsequentes ao do conhecimento da presente decisão, sob pena da aplicação e liquidação de uma sobretaxa de € 10,00 por cada dia de atraso, até ao valor de € 140,00 (conforme artigos 1º, 8º e 10º, todos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, na redação que lhe foi conferida pela Portaria nº 209/2005, de 24 de fevereiro), e sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficia o demandado D.
Reembolse-se a demandada B no valor de € 35,00 e o demandado C no valor de € 14,00 (atenta a supra indicada proporção da sua responsabilidade), nos termos do artigo 9º da mesma Portaria.
Notifique e registe.

Aguiar da Beira, 19 de fevereiro de 2018
A juíza de paz,
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(Cristina Maria da Costa Rodrigues Poceiro)
Processado por meios informáticos (artigo 131º, nº 5 do Código de Processo Civil), versos em branco e revisto pela signatária.---