Sentença de Julgado de Paz
Processo: 10/2015-JP
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: CONTRATO SEGURO - COBERTURA DE RISCO -ACIDENTE CASEIRO
Data da sentença: 06/06/2015
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

Processo n.º 10/2015-J.P.

RELATÓRIO:

O demandante, A, intentou a ação declarativa de condenação contra a demandada, Companhia de Seguros B , S. A., com sede em Lisboa, o que fez ao abrigo do art.º 9, n.º1, alínea H) da L.J.P.

Para tanto, alegou em suma que, no dia 1/02/2014 subscreveu o seguro de acidentes pessoais, titulado pela apólice n.º 022473951, cuja periodicidade do premio é anual 43,30€. O referido seguro cobre, entre outros acidentes pessoais. O demandante é desportista federado em ténis de mesa. Sucede que no 5/08/2014 lesionou a perna direita, encontrando-se a fazer abdominais, batendo com a perna no móvel da t.v., seguidamente foi ao massagista, o qual o encaminhou para o ortopedista. Este diagnosticou-lhe uma lesão parrésia do ciático poplíteo externo, recomendando-lhe hidroterapia, medicação com injecções e vitaminas e fisioterapia, tendo alta prevista em novembro/2014. No dia 13/08/2014 a demanda solicitou-lhe os relatórios médicos, e transferiu 164,76€ para a conta. No entanto, em setembro comunicou que a doença que participou não resulta de acidente, o que não é verdade. Devido a este facto o demandante ficou fisicamente limitado, não podendo continuar a praticar ténis de mesa e outras tarefas do dia a dia, por isso continuou com o tratamento recomendado pelo ortopedista. A 23/09/2014 enviou carta á demandada solicitando o pagamento das despesas médicas não reembolsadas na quantia de 345€, sob pena de recorrer aos meios judiciais, se não fosse reembolsado no prazo de 15 dias. Entretanto, fez um electromiograma, que diagnosticou achadas electrofisiológicas compatíveis com lesão neurogenia subaguda, localizada próxima ao cavado políteo, o que prova que a lesão resultou do acidente. De acordo com o prognóstico médico deverá continuar os tratamentos até maio de 2015, com fisioterapia no hospital, natação e medicação, nomeadamente vitaminas. O demandante suportou diversas despesas com tratamentos, o que perfaz a quantia de 462,19€, que reclama. Reclama, ainda, as restantes despesas com tratamentos a realizar até final de maio de 2015, na quantia de 196€. E, nos danos morais que esta situação lhe causou, nomeadamente no stress, noites mal dormidas, angustia, na quantia de 1.000€.Conclui pedindo que seja condenada no pagamento da quantia de 462,19€ de danos materiais, na quantia de 196€ para proceder á totalidade dos tratamentos que necessita, acrescida da quantia de 1.000€ de danos morais, bem como os juros, á taxa legal, desde a citação, até integral pagamento da indemnização. Juntou 31 documentos.

A demandada regularmente citada e contesta. Alega que efetivamente o demandante fez um seguro de acidentes pessoais que se encontra titulado pela apólice n.º º 022473951. No entanto, o seguro contratado não cobre os danos que sofreu. Realmente, a demandada aceita que os factos se tenham verificado como o demandante descreve, ou seja na prática, em casa, de abdominais, ou seja a fazer treinos, o que segundo a clausula 3, é um risco que se encontra excluído do seguro. Para além disso, este tipo de seguro não abrange os danos morais, que estão sempre excluídos. Acrescente-se que a razão da não cobertura fica sempre comunicado ao demandado, por carta. Conclui pela improcedência da ação. Juntou 1 documento.

TRAMITAÇÃO:
Não se realizou sessão de pré mediação por recusa expressa da demandada.
O Tribunal é competente em razão do território, do valor e da matéria.

As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.

O processo está isento de nulidades que o invalidem na totalidade.

AUDIENCIA DE JULGAMENTO:
Foi iniciada verificando-se a ausência da demandada, não obstante estar regularmente notificada para comparecer, a fls. 90 e 91. No prazo legal não foi apresentada qualquer justificação.

-FUNDAMENTAÇÃO-
I-FACTOS ASSENTES (Por Acordo):
A)Que o demandante subscreveu o seguro da demandada, de acidentes pessoais, titulado pela apólice n.º C.
B)Que o demandante estava no tapete da sala a fazer abdominais, quando escorregou e bateu com a perna direita no móvel da t.v.

II-FACTOS PROVADOS:
Todos, conforme alegados no r.i.

MOTIVAÇÃO:
O Tribunal baseou a sua decisão na análise da documentação junta pelas partes, cujo teor considero reproduzido.

I-DO DIREITO:
O caso em análise prende-se com a ocorrência de um acidente (caseiro) e a análise da apólice de seguros.

No caso concreto a demandada aceita a forma como os factos alegados pelo demandante ocorreram, assim como o problema físico que tem, no entanto alega que os danos não se encontram cobertos pelo seguro subscrito. Assim, o caso litígio resolve-se com a análise da apólice apresentada, junto aos autos de fls. 42 a 61.
O contrato de seguro é um negócio jurídico através do qual o segurador assume a cobertura de determinados riscos, comprometendo-se a satisfazer as indemnizações ou a pagar o capital seguro em caso de ocorrência de sinistro, nos termos acordados.
O risco é pois uma incerteza associada a um acontecimento futuro, seja quanto á sua realização, ao momento em que ocorre ou aos danos dele decorrentes.

Em contrapartida pela assunção do risco, a pessoa ou entidade que celebre o seguro-tomador do seguro- fica obrigada a pagar ao segurador o prémio correspondente, ou seja, o custo do seguro.

O contrato de seguro é comprovado mediante uma apólice que contem as condições do seguro acordado pelas partes, incluindo as condições gerais, especiais e particulares.

As condições gerais contêm os aspectos básicos do contrato de seguro, contendo as cláusulas típicas comuns para riscos com caraterísticas semelhantes, as condições especiais que complementam ou especificam as condições gerais e as condições particulares que adaptam o contrato á situação concreta do tomador de seguro.

Este tipo de contrato tem, ainda, uma especialidade, normalmente o cliente apenas se limita a solicitar o seguro que pretende celebrar, as restantes condições são-lhes apresentadas mediante impresso próprio, contendo já as cláusulas que o integram, sem que o tomador do seguro tenha hipótese de influenciar os termos do negócio, o que a doutrina identifica por contratos de adesão.

No caso concreto, o demandante, subscreveu um seguro ramo vida/acidentes pessoais.

Este garante o risco profissional e extra profissional, com indicação de que a pessoa segurada realiza atividades administrativas e não se desloca com frequência.

Tem uma cobertura simples, a qual inclui invalidez permanente por acidente, morte por acidente e despesas de tratamento, as quais se encontram exaustivamente descritas na cláusula 2 das condições particulares

Nas condições gerais apresenta diversas definições, nomeadamente o que se entende por acidente e sinistro, e no que respeita aos riscos cobertos pelo contrato, o que se entende por actividade profissional e extra profissional (alíneas k, L do art.º 1 da apólice).

Nas referidas condições gerais, no art.º 2, n.º1, estabelece que ficam sempre excluídas do âmbito do contrato quaisquer indemnizações por danos morais.

No caso concreto o demandante efectua um pedido por danos morais, alegando ter sofrido angustia, stress, transtornos e noites mal dormidas, com a indiferença da demandada.

O dano moral consiste numa lesão de direitos ou de interesses, insusceptíveis de avaliação pecuniária, por isso a indemnização material que possa vir a ser atribuída reveste, para o lesado, carater compensatório.

Para verificar se um dano moral é ou não juridicamente ressarcivel, temos como bitola geral o art.º 496, n.º do C.C. que dispõe apenas são indemnizáveis os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, o que significa que apenas as situações graves são tuteladas. Gravidade que se mede por um padrão objetivo, tendo em linha de conta as circunstâncias concretas do caso e aprecia-se em função da tutela do direito.

Infelizmente os danos alegados pelo demandante não se inserem na categoria de danos morais que mereçam tutela jurídica, já que noites mal dormidas todos temos, por uma razão ou por outra, angústias são constantes, e transtornos (aborrecimentos) nem se fala, é quase o nosso dia a dia, por sua vez stress são tensões provocadas por situações arrebatadoras, que criam reacções psicossomáticas ou psicológicas no organismo, pelo que o conjunto das situações descritas é suscetível de só de per si causar stress. Quer isto dizer os danos alegados não configuram a categoria de grave, por isso mesmo que a apólice não os excluísse, o próprio direito encarregava-se de o fazer.

No que diz respeito aos outros danos, de natureza patrimonial, do contrato consta, ainda, expressamente, no art.º 3, as exclusões, inerentes ao risco contratado, i.e., as cláusulas que procedem á delimitação negativa da cobertura do seguro, ou seja, que refere de forma clara o que este seguro não cobre.

E, nestas pode ver-se que se encontram excluídas os riscos provenientes de prática profissional de desportos, assim como a prática desportiva amadora federada e respetivos treinos, e ainda um conjunto de desportos considerados de risco elevado (os quais estão identificados).

No caso concreto, o demandante, no próprio r.i., art.º 6, 7, 8 e 10 alega ser desportista amador, federado, conforme documento que apresentou a fls. 9, e foi no âmbito da realização de exercícios físicos que ocorreu a lesão que descreve.

Perante o exposto, não posso deixar de concluir que a realização de treinos, ainda que de manutenção pessoal, estão excluídos do âmbito deste seguro.

De facto, não basta subscrever um seguro para considerar que um determinado risco está coberto por esse seguro específico, é preciso verificar qual a finalidade do seguro que se pretende e verificar as clausulas, em especial as que delimitam o objeto pela negativa, ou seja, que se encontram excluídas.

DECISÃO:
Nos termos expostos, julga-se a ação improcedente, em consequência absolve-se a demandada dos pedidos deduzidos.

CUSTAS:
São a suportar pelo demandante, na quantia de 35€ (trinta e cinco euros) a efetuar no prazo de 3 dias úteis a partir da notificação da presente sentença, nos termos dos art.º 8 e 10 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12 com a redação dada pela Portaria n.º 209/2005 de 24/02, sob pena de lhe ser aplicada a sobretaxa diária de 10€ (dez euros).
Proceda-se á devolução da demandada.

Funchal, 6 de junho de 2015

A Juíza de Paz

(Margarida Simplício)

(redigido e revisto pela signatária, art.º 131, n.º5 do C.P.C.)