Sentença de Julgado de Paz
Processo: 64/2013-JP
Relator: ELISA FLORES
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO
Data da sentença: 08/12/2013
Julgado de Paz de : CARREGAL DO SAL
Decisão Texto Integral:
ATA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO

Aos doze dias do mês de agosto de dois mil e treze, pelas 15:30 horas, realizou-se no Julgado de Paz de Carregal do Sal, a Audiência de Julgamento do Processo n.º x, em que são partes:
Demandantes: 1 - A e 2 - B
Demandados: 1 - C e 2 - D
Realizada a chamada verificou-se que se encontravam presentes, a demandante, que exibiu procuração do 1.º demandante com poderes especiais outorgada pelo seu marido, aqui 1.º demandante,e os Ilustres Defensores Oficiosos, Dr. F, advogado estagiário, com substabelecimento com reserva, que ora junta aos autos, e G, nomeados aos demandados a fls. 70 e 71 dosautos.
O Julgamento foi presidido pela Ex.ma Senhora Juíza de Paz, Dra. Elisa Flores.
Aberta a Audiência, foi pedida a palavra pela demandante, e tendo-lhe sido concedida, requereu a justificação da falta do seu marido, aqui 1.º Demandante que se encontra emigrado na Suíça e que, por esse motivo não pode comparecer à Audiência de hoje.
Dada a palavra aos Ilustres Defensores nomeados aos demandados, para se pronunciar, que, no uso da palavra, disseram:”Nada ter a opor à justificação da falta do demandante.”
Tendo a Exma. Senhora Juíza de Paz proferido a seguinte despacho:
“Embora as partes tenham de comparecer pessoalmente, seria extremamente gravoso exigir ao demandante que se desloque do estrangeiro para o efeito, e porque a esposa, também demandante nos presentes autos, exibiu procuração que o mesmo lhe outorgou, considera-se a falta justificada, prosseguindo a Audiência.”
Não sendo possível a tentativa de conciliação pelo facto dos demandados estarem ausentes e não tendo sido apresentadas testemunhas, a Audiência prosseguiu, dando a Sra. Juíza de Paz a palavra às presentes, em declarações de parte.
Seguidamente, e após uma pequena suspensão, a Sra. Juíza de Paz proferiu a sentença anexa à presente ata e que dela faz parte integrante, e explicitou-a aos presentes.
Nada mais havendo a salientar a Sra. Juíza de Paz deu como encerrada aAudiência.
Para constar se lavrou a presente Ata que vai ser devidamente assinada.
A Juíza de PAZ, Elisa Flores
A Técnica do Atendimento, Márcia Marques
SENTENÇA
RELATÓRIO
A, portador do Cartão de Cidadão n.º x, emitido pela República Portuguesa, válido até 09-01-2017 e B, portadora do Bilhete de Identidade n.º xx, emitido em 30-03-2007, pelo SIC de Viseu, ambos com residência em Carvalhal Redondo, Nelas, propuseram contra C, portador do passaporte CV, com titulo de residência n.º x, emitido pelo SEF da Reboleira, válido até 29/10/2013 e contribuinte nº yyy, com última residência conhecida em São Marcos, Agualva Cacém, e contra D, portadora do Cartão de Cidadão n.º xxxx, emitido pela República Portuguesa, válido até 06-05-2014 e contribuinte nº yyyy, com última residência conhecida em São Marcos, Cacém, a presente ação declarativa, enquadrada na alínea g) do nº 1 do art.º 9.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, pedindo que sejam solidariamente condenados no pagamento das quantias em dívida respeitante a rendas vencidas e período de pré-aviso em falta até à data da propositura da presente ação, que ascendem a € 2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros), acrescida de juros legais vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
Para o efeito, alegaram os factos constantes do requerimento inicial de fls. 4 a 6 e juntaram3 documentos, que aqui se dão por reproduzidos.
Não tendo sido possível citar os demandados, por se encontrarem ausentes em parte incerta, face ao disposto no n.º 2 do art.º 46.º da Lei n.º78/2001, de 13 de julho e ao abrigo do artigo 15.º do Código de Processo Civil, aplicável ao caso por força do artigo 63.º daquele diploma legal, e por não haver Ministério Público junto dos Julgados de Paz, foram nomeados defensores oficiosos,o Sr. Dr. F, ao demandado, e à demandada o Sr. Dr. G (cf. fls. 70 e 71 e 99 e 100 dos autos) que, citados em sua representação, contestaram (cf. fls. 89 e 90 dos autos) e compareceram à Audiência de Julgamento.
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
1º- Encontra-se inscrita e descrita em nome do demandante a fração autónoma designada pela letra “B”, correspondente a uma garagem, destinada a comércio, do prédio urbano,constituído no regime jurídico de propriedade horizontal, sito no Casal de São Brás, concelho de Amadora e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de São Brás sob o n.º 0 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Amadora, sob o n.º x;
2.º-Fração que objeto do Alvará de Licença de Utilização nº 00, emitido pela Câmara Municipal da Amadora;
3.º-Os demandantes são casados entre si, no regime supletivo de comunhão de adquiridos;
4.º- A referida fração foi adquirida por doação já na pendência do casamento;
5.º- Por contrato celebrado em .../.../..., a demandante ora aqui demandante, deu de arrendamento ao primeiro demandado a fração autónoma suprarreferida, para o exercício da atividade de comércio de oficina e reparação automóvel;
6.º- O contrato foi celebrado pelo prazo de 5 anos, renovável automaticamente por períodos anuais e teve o seu início em .../.../...;
7.º- Foi convencionada a renda anual de € 4.200,00, a ser paga em duodécimos mensais de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), com vencimento no 1.º dia útil do mês que respeitar;
8.º- Estipularam as partes outorgantes que o pagamento seria efetuado através de depósito ou transferência bancária para a conta do Banco J, da qual os demandantes são titulares;
9.º-O primeiro demandado, apesar de ter usufruído integral e efetivamente do locado desde o início do contrato, não efetuou o pagamento das rendas respeitantes aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2013;
10.º-Sendo que no dia 2 de abril de 2013 procedeu à entrega das chaves do locado;
11.º- Sem regularizar os meses de renda em atraso cujo valor ascende a €1.050,00 (mil e cinquenta euros);
12.º- Nem denunciou o contrato de arrendamento através de comunicação escrita com antecedência de 120 dias;
13.º- Pelo que, se encontra também em dívida o montante de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros) pela falta de pré-aviso;
14.º- Perfazendo o montante global em débito de € 2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros);
15.º- Por sua vez, a demandada, D, constituiu-se “….fiadora e principal pagadora,…. obrigando-se solidariamente [com o demandado], “…no exato cumprimento de todas as obrigações [aí previstas]…., durante o seu prazo inicial e suas eventuais renovações…”, tal como consta do da cláusula Décima-quinta do Contrato de arrendamento;
16.º-Renunciando expressamente ao benefício de excussão prévia;
17.º- Apesar de interpelado telefonicamente, e sempre ter prometido efetuar o pagamento das rendas em atraso, até ao momento o demandado não regularizou a situação junto dos demandantes;
18.º- Os demandantes não conseguiram interpelar a 2.ª demandada.
Motivação dos factos provados:
Atendeu-se ao conjunto de prova produzida pelos demandantes, designadamente às declarações da demandante e aos documentos que juntaram aos autos e que não foram impugnados.
Fundamentação de direito: Entre as partes foi celebrado um contrato escrito de arrendamento não habitacional, com prazo certo, e que se destinava ao exercício da atividade de comércio de oficina e reparação de automóvel.
Contrato que se regia pelas regras relativas ao arrendamento previstas no Código Civil, doravante designado simplesmente C. Civ., e pelo Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro (embora neste tipo de contratos, para fins não habitacionais, haja grande liberdade contratual no estabelecimento do respetivo clausulado).
Deste contrato, emergem direitos e obrigações para ambas as partes, entre as mais relevantes, ao senhorio entregar e proporcionar o gozo da coisa, nas devidas condições e para o fim a que se destina, no caso, a atividade comercial, e ao arrendatário, entre outras obrigações, a de pagar a correspondente retribuição, (cf. artigos 1022º, 1023º, 1069º,1031º e 1038º do C. Civ).
Mas o demandado não cumpriu integralmente com esta sua obrigação, na medida em que à data em que desocupou o locado se encontravam rendas em dívida e não pagou as rendas correspondentes ao período de aviso prévio a que legal e contratualmente se encontrava vinculado por força da denúncia do contrato (cf. n.º 2 da cláusula Quarta e cláusula Décima-quarta do contrato de arrendamentoe artigo 1100º do C. Civ.).
De facto, nos termos do nº 2 da cláusula Quarta e nº 3 do artigo 1098º do C. Civ., aplicável por força do disposto no nº 2 do artigo 1100º do mesmo diploma, após seis meses de duração efetiva do contrato, o arrendatário pode denunciá-lo a todo o tempo, mediante comunicação ao senhorio com uma antecedência não inferior a 120 dias do termo pretendido do contrato, produzindo essa denúncia efeitos no final de um mês do calendário gregoriano. A inobservância da antecedência prevista acima não obsta à cessação do contrato, mas obriga ao pagamento das rendas correspondentes ao período de pré-aviso em falta.
Embora com conhecimento e anuência do proprietário, seu marido, ora também demandante, e as rendas constituíssem rendimento familiar (o depósito teria de ser, e foi, efetuado em conta comum do casal), faltava legitimidadeà contraente senhoria para a celebração do contrato. De facto, a doação ao demandante marido foi-lhe já na pendência do casamento, cujo regime de bens é o supletivo [cf. artigos 1717º e 1722º, alínea b) do C. Civ.].
Mas, embora à demandante faltasse legitimidade para o ato, o certo é que o arrendatário usufruiu do locado plenamente e sem qualquer limitação, no período supramencionado, até que o denunciou por iniciativa e razões próprias. Neste caso, terá de considerar-se que o contrato foi integralmente cumprido pela senhoria, nos termos doartigo 1034º, nº 2 do C. Civ., pelo que é exigível ao arrendatário o correspondente cumprimento, quer do pagamento da renda quer do restante clausulado.
Assim, o demandado deve aos demandantes a quantia €1.050,00 (mil e cinquenta euros) respeitante às rendas dos meses de janeiro, fevereiro e março de 2013 e ainda a importância de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros) pela falta do pré-aviso de 120 dias.
Este contrato de arrendamento foi também, como se referiu, subscrito pela segunda demandada, na qualidade de fiadora, e principal pagadora, pelo que obedece ao requisito formal exigido no artigo 628.º, n.° 1 do C. Civ.).
Assim, a demandada, na qualidade de fiadora das obrigações pecuniárias do demandado, e declarando-se principal pagadora, garante a satisfação do direito de crédito e encontra-se pessoalmente obrigada perante os demandantes, sendo solidariamente responsável pelo cumprimento dessa obrigações (cf. artigos 627.º e seg.s do C. Civ.).
De referir ainda que a demandada renunciou ao benefício de excussão prévia, previsto no artigo 638º do C.Civ.
Para além do exposto, faltando culposamente ao cumprimento da obrigação o devedor torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo-lhe o ónus de provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua (cf. 798º e 799º do C. Civ), o que aqui se não verificou.
E, de acordo com o disposto nos artigos 804º e 806º do mesmo Código, verificando-se um retardamento do pagamento do preço, por causa imputável ao devedor constitui-se este em mora e, consequentemente, na obrigação de reparar os danos causados ao credor.
Tratando-se de obrigações pecuniárias, a indemnização corresponderá aos juros a contar do dia da constituição em mora.
E tendo afiança o conteúdo da obrigação principal, cobre além das consequências legais e contratuais a reparação dos danos causados pela mora (cf. artigos627.º e634.º do C.Civ.).
Assim, têm os demandantes, efetivamente, direito, como peticionaram, ao pagamento pelos demandados de juros de mora, à taxa legal.
Contudo, não tendo sido provada a interpelação do demandado e não tendo conseguido interpelar a demandada, só têm direito aos juros, desde a citação, 22/07/2013, até efetivo e integral pagamento(cf. artigos 804º, 805º, n.º 1 e 1806º, todos do C. Civ.)
Em face do exposto, julgo a ação procedente, por provada, e em consequência, condeno solidariamente os demandados, C e D:
- No pagamento aos demandantes da importância de € 2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros), acrescida de juros, à taxa legal, desde 22 de julho de 2013 até efetivo e integral pagamento;
Nas custas totais (declarando-os parte vencida), de que se encontram isentos por força do disposto na alínea l) do nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de fevereiro, aplicável aos Julgados de Paz por força do artigo 63º da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, interpretado como se referindo à “…normatividade aplicável no processamento jurisdicional civilístico e não apenas código de processo civil” (cf. artigos 9º e 10º do Código Civil e Deliberação nº 5/2011, 8 de fevereiro de 2011 do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz).
Proceda-se ao reembolso aos demandantes, nos termos do artigo 9º da Portaria 1456/2001, de 28 de dezembro).
Registe e notifique.
A Juíza de Paz, Elisa Flores
Processado por computador (art.138º, nº5 do C P C)