Sentença de Julgado de Paz
Processo: 158/2014-JP
Relator: DANIELA COSTA
Descritores: INCÊNDIO EM LAREIRA
RESPONSABILIDADE
SEGURO
Data da sentença: 01/12/2015
Julgado de Paz de : TAROUCA
Decisão Texto Integral:
ATA DE LEITURA DE SENTENÇA

Aos 12 de Janeiro de 2015, pelas 15.30h, realizou-se no Julgado de Paz do Agrupamento de Concelhos de Tarouca, Armamar, Castro Daire, Lamego, Moimenta da Beira, Resende, a Audiência de Julgamento do Proc. n.º 158/2014 - JP em que são partes:
Demandante: A.
Demandada: COMPANHIA DE SEGUROS B.
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Realizada a chamada, encontrava-se presente o Demandante.
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Reaberta a Audiência, foi pela Meritíssima Juíza de Paz proferida a seguinte:
“SENTENÇA”
O Demandante intentou contra a Demandada a presente ação declarativa, enquadrável na alínea h) do nº 1 do Art. 9º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 1075,00, acrescida de juros de mora vencidos, e vincendo à taxa legal comercial, desde a propositura da acção até integral pagamento.

A Demandada apresentou contestação, conforme plasmado a fls. 10 a 14, tendo impugnado os factos vertidos no requerimento inicial.

Valor da ação: € 1.075,00

FACTOS PROVADOS:
A. O Demandante, no dia 09 de Agosto de 2014, em virtude de ir mobilar a sua sala de jantar, da sua casa sita na Quinta xxxx Lamego e a mesma se apresentar com uma mancha escura no tecto e parede do lado direito, do saco da lareira, contratou uma senhora para efetuar a limpeza da mesma;
B. A referida senhora, ao limpar o teto e parede do lado direito do saco de resguardo do tubo, que liga o recuperador à entrada do tubo e que dá saída para a chaminé, não logrou limpar as paredes negras pelo fumo;
C. Quanto mais esfregava e limpava, mais escuras ficavam as reportadas paredes;
D. A Demandada celebrou com o Condomínio do Prédio sito na Quinta xxxx, em Lamego, o contrato de seguro ramo Multiriscos Condomínio Plano 2 Condições Gerais 009 , titulado pela apólice n.° MR xxxxx;
E. No dia 11 de Agosto de 2014, o Demandante participou à sua mediadora de seguros o sinistro em causa que o fez encaminhar para a Demandada;
F. No dia 12 de Agosto de 2014, uma perita da empresa especializada para averiguação do sinistro e avaliação dos danos, “ C”, a pedido da Demandada dirigiu-se à casa do sinistrado, para efetuar a respetiva peritagem;
G. A perita D analisou a situação, tirou fotografias, mediu as paredes da sala de jantar, transmitindo ao sinistrado e sua esposa que também se encontrava presente, que iria expor o problema da situação à Demandada e para aguardarem resposta;
H. O Demandante contratou dois trabalhadores que foram obrigados a abrir o saco da lareira, para verificarem a origem da saída de fumos;
I. Os danos mencionados no item B e C foram consequência de fumos expelidos pela boca de saída de ar quente do recuperador instalado no compartimento da fracção;
J. Tal deveu-se à rotura no tubo de saída de gases do recuperador de calor, feito em inox;
K. Tal rotura foi causada pela cedência da construção do prédio edificado entre os anos de 2003 a 2005;
L. Após alguns dias, o Demandante teve conhecimento através da sua mediadora de seguros, que o sinistro, segundo informação e resposta dada pela Demandada, não se enquadrava, em virtude de esta considerar não se verificar a não existência de chama/combustão;
M. Para a reparação dos danos causados, o Demandante despendeu o valor de € 1075,00, já integralmente pagos pelo mesmo;
N. A avaliação de todos os danos e sua reparação foi efectuada pela perita da C , e importavam na quantia total de € 785,44;
O. Para efeitos de contrato de seguro e cobertura de incêndio, considera-se “incêndio” nos termos da clausula 1a ponto IV- Outras definições, das condições gerais da apólice: “A combustão acidental, com desenvolvimento de chamas, estranha a uma fonte normal de fogo, ainda que nesta possa ter origem, e que se pode propagar pelos seus próprios meios”.

FACTOS NÃO PROVADOS:
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa.
Os factos assentes resultaram da conjugação dos documentos de fls. 6, 15 a 30, 41 a 47 e dos depoimentos testemunhais prestados em sede de audiência final.
Foi ouvido o depoimento da testemunha E, de 52 anos, indicado pelo Demandante e sua mulher, tendo sido valorado, em termos probatórios, porque tem conhecimento direto da factualidade e descreveu os danos existentes no imóvel objeto do seguro.
No que concerne às declarações prestadas pela testemunha indicada pelo Demandante – F, de 39 anos, foram atendíveis pelo Tribunal na medida em que foi responsável pela limpeza do imóvel e deparou-se com os danos ali patentes. Relativamente às declarações das duas últimas testemunhas do Demandante, G, de 29 anos, e H, de 50 anos, foram tido como relevantes para a descoberta da verdade material na medida em que conhecem a casa de habitação do Demandante na medida em que efetuaram obras de reparação nas paredes e tetos da sala, onde se encontra o recuperador de calor.
Da parte contrária, foi ouvida D, de 34 anos, cujo depoimento foi fundamental para apurar a origem do fumo existente no recuperador de calor visto que foi a perita responsável pela sua determinação.
Por último, no que toca ao depoimento de I, de 48 anos, perito, foi relevante, em sede de prova, tendo confirmado a versão defendida pela testemunha anterior, embora não estivesse estado no local.
Quanto aos factos não provados, eles resultaram da ausência de prova ou de prova convincente sobre os mesmos.

ENQUADRAMENTO JURÍDICO
Nos presentes autos, está em causa a apreciação do pedido de indemnização formulado pelo Demandante, contra a Demandada, com o fim de esta ser responsabilizada pelos danos patrimoniais ocorridos na sua fração e motivados por uma alegada combustão no tubo de chaminé do recuperador de calor da sua lareira.
Para esse efeito, consubstanciou a sua pretensão no contrato de seguro ramo multiriscos celebrado entre a Demandada e o condomínio do prédio, com a cobertura, entre outras, de danos causados por incêndio.
O direito à indemnização, aqui em análise, funda-se na responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, cujo normativo vem consagrado no Art. 483º do Código Civil (adiante designado de CC), nos seguintes moldes: aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
O reconhecimento de tal responsabilidade depende da reunião de uma série de requisitos: um facto, ou seja, uma ação humana sob o domínio da vontade; a ilicitude, isto é, a violação de direitos subjetivos absolutos ou de normas que visem tutelar interesses privados; a culpa do agente que praticou o facto, ou seja, o juízo de censura ou reprovação que o Direito faz recair sobre o lesante porquanto agiu ilicitamente, quando podia e devia ter agido de outra forma e, por fim, um nexo de causalidade entre esse facto e o dano provocado, de acordo com a teoria da causalidade adequada. A culpa do lesante pode assumir duas formas: o dolo e a negligência ou mera culpa. Porém, a prova de tal juízo de censurabilidade impende sobre aquele que sofreu a lesão, isto é, o lesado, conforme o que dita o n.º 1 do Art. 487º do CC: é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção de culpa.
Sob a ótica da responsabilidade civil extracontratual, são requisitos cumulativos: um facto, ou seja, uma ação humana sob o domínio da vontade; a ilicitude, isto é, a violação de direitos subjectivos absolutos ou de normas que visem tutelar interesses privados; a culpa do agente que praticou o facto, ou seja, o juízo de censura ou reprovação que o Direito faz recair sobre o lesante porquanto agiu ilicitamente, quando podia e devia ter agido de outra forma e, por fim, um nexo de causalidade entre esse facto e o dano provocado, de acordo com a teoria da causalidade adequada.
É em relação ao primeiro pressuposto que urge, então, averiguar se ocorreu o facto, ou seja, se ocorreu uma combustão no interior do tubo de chaminé, que veio a causar prejuízos nas paredes e tetos da sala do Demandante.
Tal como decorre do contrato de seguro dos autos, considera-se “incêndio” nos termos da cláusula 1a ponto IV- Outras definições, das condições gerais da apólice: “A combustão acidental, com desenvolvimento de chamas, estranha a uma fonte normal de fogo, ainda que nesta possa ter origem, e que se pode propagar pelos seus próprios meios”.
Da matéria dada por provada, ficou assente que os danos foram consequência da saída de fumos pela boca de saída de ar quente do recuperador, cuja origem se deveu ao desencaixe do tubo de saída de gases e não em virtude de neste tubo ter ocorrido uma combustão interna.
Logo, o Demandante não logrou demonstrar que no tubo da chaminé ocorreu um incêndio e que foi este o evento causador dos danos por si alegados no requerimento inicial.
Para a formação da convicção do Tribunal, foi fundamental apurar que o tubo da chaminé em causa é feito em inox, logo, um material não combustível, e que o desencaixe do tubo não pode provocar, por si mesmo, um incêndio, mas apenas a saída anormal de fumos pela boca de saída de ar quente do recuperador, ao invés de sair pela chaminé, através daquele tubo.
Dada tal ausência probatória, não está minimamente preenchido o primeiro dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual, isto é, o facto - uma situação de foco de incêndio, motivo pelo qual não pode ser assacada qualquer responsabilidade à Demandada.
Na verdade, segundo o estatuído no n.º 1 do Art. 342º do CC, é ao autor, aquele que invoca um direito, que incumbe provar os factos constitutivos desse mesmo direito alegado, sendo que “à parte contrária recai o dever de provar, por seu turno, os factos anormais que excluem ou impedem a eficácia dos elementos constitutivos – cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª Edição, pág. 306.
Consequentemente, terá de se votar ao insucesso a pretensão do Demandante, que improcede na totalidade.

DECISÃO:
Pelo exposto e nos termos dos fundamentos de Direito invocados, julgo a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolvo a Demandada do pedido.

Custas pela parte vencida – o ora Demandante, em conformidade com os Artigos 8º e 9º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de dezembro.

Notifique.
Desta sentença consideram-se todos os presentes notificados.
Para constar se lavrou esta Ata que vai ser devidamente assinada.

Tarouca, 12 de Janeiro de 2015


Dr.ª Daniela dos Santos Costa Maria Gomes
Juíza de Paz Técnica de Apoio Administrativa
(Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico)