Sentença de Julgado de Paz
Processo: 212/2017-JPCSC
Relator: MARIA ASCENSÃO ARRIGA
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL / OMISSÃO DE REGISTO AUTOMÓVEL
Data da sentença: 06/15/2018
Julgado de Paz de : CASCAIS
Decisão Texto Integral:
ATA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
COM PROLAÇÃO DE SENTENÇA
(SESSÃO ÚNICA - Artigo 58º da LOFJP))
Proc. n.º 212/2017-JP
Data: 15 de junho de 2018----
Hora de Início: 09h45----
Hora de Encerramento: 10h00---
Parte Demandante: A---
Parte Demandada: B----
Juíza de Paz: Sra. Dra. Maria de Ascensão Arriaga ----

Técnica: Lic. Lara Colaço Palma---

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Feita a chamada verificou-se estarem presentes: ----
- A parte Demandante----
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Verificando-se a falta de comparência da parte Demandada, a Senhora Juíza de Paz explicou aos presentes que tratando-se da segunda falta do Demandado à audiência de julgamento, apesar de devidamente notificado para o efeito, não cabia novo adiamento da diligência após o que declarou aberta a audiência.
Pelo Demandante foi dito que até hoje não foi contactado pelo Demandado e que se mantém a sua situação de prejuízos que foi relatada nos autos nada mais tendo a acrescentar.
De seguida, pela Senhora Juíza de Paz, foi proferida a seguinte:
--- SENTENÇA ---
I - RELATÓRIO – As partes e o objeto do litígio
O aqui Demandante, A, com o NIF --------------, propôs a presente ação declarativa contra o aqui Demandado, B, com o NIF ---------, pedindo a condenação deste a pagar-lhe o valor de €753,65.
Alega, para tanto, que em 27.fevereiro.2006 vendeu o veículo automóvel de matrícula CE, marca e modelo X, ao aqui Demandado, B. O Demandado não efetuou o registo da viatura em seu nome. Por isso, o Demandante veio a efetuar o averbamento da transferência de propriedade na conservatória do registo automóvel em 12.outubro.2016. Alega que suportou despesas junto da Autoridade Tributária e junto da Conservatória no valor de €753,65. Juntou oito documentos (cf. fls. 2 a 9verso dos autos).
Em sede de audiência de julgamento, convidado a aperfeiçoar o R.I., referiu que demorou cerca de 10 anos a transferir a propriedade do automóvel para seu nome porque na Autoridade Tributária aparecia como sujeito passivo do Imposto de Circulação o seu filho C e, na Conservatória, o veículo estava registado no seu nome. Só percebeu a razão pela qual o imposto vinha no nome do seu filho quando aproveitou um perdão fiscal e resolveu pagar tudo tendo sido, então, informado que a mudança de nome aconteceu porque aquele uma vez pagou o imposto e forneceu o seu número fiscal. Discriminou as despesas suportadas após a venda do veículo fazendo-as corresponder aos documentos juntos, explicitando, designadamente, o teor do doc. de fls. 9 e 9 vº e reduziu o pedido para a quantia de €637,62, como tudo decorre do auto de adiamento de fls. 53/55.
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O Demandado foi regular e pessoalmente citado no Julgado de Paz (cf. certidão de citação a fls. 24/25) e não apresentou contestação.
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As partes compareceram nas sessões de pré-mediação e mediação, porém, não lograram chegar a acordo (cf. relatório de mediação a fls. 34).
Por irregularidade das notificações para julgamento remetidas ao Demandado, foram estas declaradas nulas por despacho de 25.maio.2018, tendo no mesmo sido declarado nulo todo o subsequente processado e designado o dia 04.junho.2018 para audiência de julgamento (cf. fls. 46).
O Demandado não compareceu, no passado dia 04.junho.2018, à audiência de julgamento razão pela qual a mesma foi adiada e designada a presente data.
Notificado do auto de adiamento - no qual se inclui o aperfeiçoamento do R.I. – o Demandado nada disse nem justificou a falta.
Hoje, o Demandado reiterou a falta.
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A ação tem o valor de €637,62.
O tribunal é competente (artigo 7º da Lei 78/2001, de 13.07 na redação da Lei 54/2013, de 31.07)).
Cabe apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO
Considerando o teor dos documentos juntos aos autos, que se dão por reproduzidos, e a falta de contestação do Demandado – que, conjugada com a falta injustificada à audiência de julgamento, equivale a confissão dos factos articulados pelo Demandante, ao abrigo do disposto nos nº2 do artigo 58º da Lei nº 78/2001, de 13.julho.2001, alterada pela Lei 54/2013 de 31.julho.2013 – cabe considerar provada toda a factualidade invocada que acima se deixou enunciada, mormente, quanto à aquisição, pelo Demandado, do veículo automóvel com a matrícula CE, marca e modelo X em 27 de fevereiro de 2006 (cf. doc. 1 a fls. 2), à falta de registo do veículo em nome do adquirente, à falta de pagamento do Imposto Único de Circulação, aos pagamentos efetuados pelo Demandante junto da Conservatória e junto da Autoridade Tributária.
Da factualidade alegada e provada retira-se que entre o Demandante e o Demandado foi celebrado um contrato de compra e venda de um bem móvel.
A compra e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço (cf. artigo 874º do Código Civil, doravante CC). No caso concreto, a propriedade do bem transmitiu-se por mero efeito de contrato (cf. nº1 do artigo 408º e alínea a) do artigo 879º do CC).
Para além da obrigação essencial de pagar o preço, emergiam do contrato de compra e venda, para o Demandado, dois deveres acessórios de grande relevo: (1) o de efetuar o registo obrigatório de transferência da propriedade do veículo automóvel para o seu nome na Conservatória do Registo Automóvel (cf. artigo 1º do Dec. Lei 54/75, de 12.02, que disciplina o sistema de Registo Automóvel, na redação decorrente das várias alterações legislativas até ao Dec. Lei 20/2008, de 31.01, e artigo 25º do Dec. Lei 55/75 -Regulamento do Registo de Automóveis) e (2) o de proceder ao pagamento do Imposto Único de Circulação, no prazo legalmente fixado, junto da Autoridade Tributária.
O Demandado incumpriu estes deveres e, agora, é-lhe assacada a obrigação de indemnização.
Nos termos do disposto nos artigos 483º, nº1, 486º, 562º e 563º, todos do CC, existe obrigação de indemnizar ou de reconstituir a situação que existia, sempre que alguém, agindo voluntariamente ou omitindo uma conduta devida, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente direitos ou interesses legalmente protegidos, causando com essa atuação danos na esfera de outrem. O dever de indemnizar compreende todos os prejuízos emergentes do ato lesivo e, também, os proveitos que, por essa razão, o lesado tenha deixado de obter e é fixada em dinheiro sempre que não seja possível a reconstituição natural (cf. artigos 564º e 565º do mesmo diploma).
No caso em apreço, a conduta omissiva do Demandado só a ele imputável a título de culpa e traduzida, como se disse, no incumprimento das suas obrigações declarativas e fiscais, junto da C.R.A. e da A.T., faz impender sobre si a responsabilidade por indemnizar o Demandante dos prejuízos, por este, sofridos por causa daquela omissão.
Dito de outro modo, o Demandado causou prejuízo ao Demandante porque fez impender sobre este uma obrigação de pagamento que, de facto, não lhe assistia mas à qual, por força do disposto no nº 1 do artigo 3º do Código do Imposto Único de Circulação (cf. Anexo II da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, alterada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro), não podia eximir-se perante a Autoridade Tributária. Efetivamente, ficou provado que o Demandante (não obstante o documento de fls. 9 ter sido emitido em nome do seu filho C por ter este procedido ao pagamento do Imposto com o seu nº fiscal) pagou junto da Autoridade Tributária a quantia de €314,62 relativos ao IUC dos anos de 2010 a 2015 e, bem assim, o montante de €143,50 inerente a processos de contraordenação por falta de pagamento do IUC do ano de 2016 (cf. docs. 7 e 8 a fls. 8 e 9).
O Demandante alega, ainda, e dão-se por provadas, despesas no valor de €179,50 inerentes ao averbamento da transferência de propriedade no registo automóvel (€130 - cf. doc. 5 a fls. 6), à emissão de duplicado de título (€32,50 -cf. doc. 4 a fls. 5 e, ainda, ao pedido de certidão da Conservatória de Registo Comercial de Cascais atestando a mudança de titularidade do veículo (€17- cf. doc. 6 a fls. 7). Os dois primeiros valores acabados de mencionar constituem danos sofridos pelo aqui Demandante por causa da omissão pelo Demandado do dever de registar a sua propriedade, já o mesmo não é de se dizer relativamente ao custo da certidão da Conservatória de Registo Comercial de Cascais (€17), uma vez que, tal como foi referido pelo aqui Demandante em sede de audiência de julgamento, este não é capaz de precisar o motivo pelo qual requereu tal documento, assim, não estando verificado um nexo de causalidade entre o facto ilícito praticado pelo Demandado e o dano suportado pelo Demandante, não pode aquele ser condenado no pagamento da referida quantia (cf. nº1 do artigo 483º do CC).
Em suma, ascendem os danos, sofridos e provados pelo Demandante e indemnizáveis pelo Demandado, a €620,62.

III - DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos que antecedem, com exceção do valor de €17, julgo a ação procedente e, em consequência, condeno o Demandado a pagar ao Demandante a quantia de €620,62 (seiscentos e vinte euros e sessenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da presente data e até integral cumprimento.
Por ser irrisório o decaimento, declaro parte vencida e responsável pelas custas do processo, o Demandado (artigo 8º da Portaria 1456/2001, de 28.12).
Custas do processo: €70.
Tem o Demandante direito à devolução de €35.
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O Demandado deverá pagar a segunda parcela de custas de sua responsabilidade, no valor de €35, num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, incorrendo numa sobretaxa de €10 (dez euros) por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação, até um máximo de €140 (cf. disposto nos números 8º e 10º da Portaria 1456/2001, na redação dada pela Portaria 209/2005, de 24.02). Decorridos 15 dias sobre o termo do prazo, sem que se mostre efetuado o pagamento, será extraída certidão da presente sentença e das custas e penalidades não pagas e remetida ao Ministério Público da Comarca de Lisboa Oeste – Cascais para eventual execução pelo valor em dívida (€175).
Registe e dê cópia aos presentes. Notifique o Demandado para a morada que indicou no ato de citação (cf. certidão de fls. 24).
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Da sentença que antecede ficou o Demandante notificado. ----
Para constar se lavrou a presente ata, por meios informáticos, que, depois de revisto e achado conforme, vai assinada, sendo entregue uma cópia ao Demandante.

Cascais, Julgado de Paz, 15 de junho de 2018

A Técnica A Juíza de Paz