Sentença de Julgado de Paz
Processo: 116/2015-JP
Relator: ELISA FLORES
Descritores: CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA
Data da sentença: 11/06/2015
Julgado de Paz de : CARREGAL DO SAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

A, propôs contra B, Sociedade Unipessoal, Lda., a presente ação declarativa, enquadrada na alínea a) do nº 1 da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, pedindo que a mesma seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 997,20 (novecentos e noventa e sete euros e vinte cêntimos), a título de danos patrimoniais e a quantia de € 14.000,00 (catorze mil euros), a título de danos morais, num total de € 14.997,20 (catorze mil novecentos e noventa e sete euros e vinte cêntimos), acrescida de juros, desde a citação, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento.
Para o efeito, alegou os factos constantes do requerimento inicial de fls. 4 a 17 e juntou até à Audiência de Julgamento nove documentos, que aqui se dão por reproduzidos;
A demandada contestou, nos termos constantes de fls. 50 a 62 dos autos, apresentando outra versão dos factos e concluindo pela absolvição do pedido; Não juntou documentos.
O litígio não foi submetido a Mediação;
Na Audiência de Julgamento apenas o demandante apresentou prova testemunhal; Valor da ação: € 14.997,20 (catorze mil novecentos e noventa e sete euros e vinte cêntimos). O artigo 60º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua alínea c), prescreve que do conteúdo da sentença proferida pelo juiz de paz faça parte uma sucinta fundamentação. Assim:
FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Consideram-se provados, com interesse para os presentes efeitos, os seguintes factos:
1.º- O demandante é empresário no ramo do comércio alimentar, a grosso e a retalho;
2.º- Por sua vez, a demandada é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica à distribuição de produtos alimentares e não alimentares e, exploração de supermercados e outros estabelecimentos comerciais espalhados pelo País, quer diretamente, explorados pela própria, quer indiretamente através de estabelecimentos, explorados por terceiros, em regime de franquia; 3.º- No prosseguimento da sua atividade, a demandada goza de uma organização interna orientada e distribuída em diversos setores, como sejam, a direção de expansão, que se dedica à procura de novos espaços para expandir a sua rede de lojas, e no caso dos autos, é o departamento de prospeção Norte que se encarrega, de procurar espaços e encetar negociações que eventualmente possam interessar à demandada, através dos seus prospetores de lojas;
4.º- A este departamento de prospeção incumbe, no terreno, pesquisar novos clientes, novos mercados e estabelecimentos comerciais que eventualmente sejam adequados para a exploração de supermercados, quer diretamente quer em regime de franquia;
5.º- Esta atividade centra-se no contacto direto dos prospetores com proprietários ou arrendatários de diversos estabelecimentos comerciais espalhados pelo País;
6.º- Uma vez encontrado um espaço, se manifestado interesse da outra parte, a tarefa seguinte será a de realizar cálculos sobre eventuais custos a suportar, perspetiva de vendas e rentabilidade de determinada loja, onde uma série de critérios terão de ser avaliados em concreto, nomeadamente layout da loja, população, vias estradais, concorrência naquela zona, de forma a indicar quais as possibilidades de negócio que aquele estabelecimento, em concreto, poderá oferecer ao exercício da atividade da demandada;
7.º- Com os elementos recolhidos o prospetor colocará à consideração da Gerência da demandada o estudo potencial a que chegou;
8.º- Nesta procura de novos mercados, no primeiro trimestre de 2014, o departamento de prospeção da demandada contactou o demandante no sentido de perscrutar da existência de algum imóvel, destinado ao comércio, onde a demandada pudesse instalar um supermercado, com a insígnia “C”;
9.º- Alegando urgência na abertura de novas lojas no sentido da expansão da marca;
10.º- Nessa altura, o demandante informou a demandada que tinha conhecimento de que existia uma loja em XXXX-YYYY, supermercado, da sociedade “D, Lda.”, que, eventualmente poderia ser cedida, uma vez que o objetivo do seu proprietário era vender o supermercado;
11.º- Pretendendo o demandante investir na aquisição do imóvel onde estava instalado o supermercado, para posterior arrendamento a terceiros, reuniu uma primeira vez, em Coimbra com os prospetores, E e F, a pedido da demandada, a fim de conhecerem a loja em questão e de trocarem ideias sobre o eventual negócio de arrendamento/locação do supermercado à demandada;
12.º- Após essa reunião, o departamento de prospeção da demandada procedeu ao layout da loja e verificou, junto da empresa proprietária, a existência de todas as licenças necessárias para o funcionamento de um estabelecimento;
13º- Nessa reunião o demandante manifestou interesse em arrendar o supermercado à demandada, por uma renda mensal de € 9.000,00, com a garantia de permanecer por cinco anos;
14.º- Em março de 2014, o colaborador da demandada, E, informou o demandante de que a demandada apenas estaria interessada no arrendamento do supermercado com garantia de permanência por um ano;
15.º- Em abril de 2014, o demandante informou este colaborador da demandada que, em relação ao imóvel onde se encontrava instalado o supermercado da “D, Lda.” iria negociar junto de uma instituição bancária, Caixa Leasing e Factoring-Instituição Financeira de Crédito, S.A., um contrato de locação financeira imobiliária deste prédio urbano destinado a comércio (sito na Ladeira xxxx, www, freguesia de BBBBBBB e XXXXXX, Concelho de YYYYYY, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o número xxxx, da Freguesia de XXXXX e Inscrito na matriz predial sob o artigo xxxx);
16.º- E que depois o demandante sublocaria o imóvel à demandada para esta aí instalar o referido supermercado “C”, por uma renda mensal de € 7.000,00 (acrescida de IVA à taxa legal);
17.º- No desenrolar do processo, e com a concordância e presença do proprietário do supermercado, foram efetuadas várias deslocações ao mesmo por parte dos colaboradores da demandada de forma a avaliar os critérios supra mencionados no ponto 6.º supra, para apresentar um estudo potencial sobre o estabelecimento à Gerência da demandada;
18.º- Entre maio e junho de 2014, foram sendo estabelecidos contactos entre o demandante e o colaborador da demandada, E, no sentido de perceber quando é que o processo do leasing estaria decidido pela instituição bancária, porque se o negócio viesse a ser concluído e aprovado pela demandada, pretendia-se que a abertura de um supermercado da demandada no referido estabelecimento fosse rápida;
19.º- A demandada pretendia abrir lojas na zona Norte e o seu prospetor informou o demandante de que um dos pressupostos para que o acordo entre as partes fosse alcançado com a Gerência da demandada, era que a loja pudesse abrir imediatamente a seguir à realização do acordo;
20.º- Tendo o colaborador da demandada, E, disponibilizado minutas do Contrato de Locação Financeira e do contrato de sublocação ao demandante, para que este fizesse chegar à entidade bancária;
21.º- Já em abril de 2014 o colaborador da demandada havia enviado modelo de uma Declaração que a demandada exigia para celebração do negócio, e deveria constar do contrato em causa, e na qual a entidade bancária autorizaria a celebração do contrato de arrendamento do imóvel;
22.º- Pelo que o demandante, confiante na concretização do negócio, deu início junto da empresa exploradora da referida loja e junto do Banco, a todos os procedimentos necessários para a transição da mesma;
23.º- Tendo, inclusivamente, constituído, para o efeito, em 27 de junho de 2014, uma sociedade unipessoal por quotas, denominada “G, Unipessoal, Lda.”, com o NIPC xxxxxx, com sede na Estrada de xxxx, S/n, Carregal do Sal, que tem como objeto a aquisição de imóveis para arrendamento de espaços, investimentos em mercados financeiros, a administração de participações societárias, compra e venda de ações, quotas, direitos, participação em fundos, investimentos e privatizações;
24.º- E pago pela mesma, na Conservatória do Registo Predial/Comercial/Automóvel de CCCC, a quantia de € 360,00 (trezentos e sessenta euros);
25.º- O estudo potencial do estabelecimento revelou, entre outros motivos, que a loja necessitava de muitas obras de adaptação/remodelação o que implicava gastos muito elevados e não foi aceite pela Gerência da demandada, tendo sido decidido pela demandada fazer uma reavaliação do projeto;
26.º- Desconhecendo esta decisão, em junho de 2014, o demandante comunicou à demandada, via e-mail, que o processo de transição da loja estaria concluído no decorrer dessa semana, necessitando, assim, de saber em que ponto se encontrava a posição da demandada perante o que haviam acordado;
27.º Porém, não obteve qualquer resposta, o que só viria a suceder em 06 de agosto de 2014, quando o departamento jurídico da demandada, em resposta aos mandatários do demandante, vem alegar que aquela se encontrava a reavaliar a sua posição no processo das negociações e que, assim que possível, dariam conta da decisão;
28.º- O que, até à data da entrada deste processo nunca sucedeu, levando o demandante a crer, atento o lapso de tempo decorrido, que a demandada não quer realizar o negócio em causa, frustrando, assim as suas expectativas;
29.º- O demandante, confiante de que o negócio se iria realizar, despendeu várias horas do seu tempo em reuniões, percorreu vários quilómetros e teve diversos gastos;
30.º- E efetuou deslocações ao seu Banco, H, à sede regional em DDDDDD, que depois posteriormente fazia a ponte com a Caixa Leasing e Factoring-Instituição de Crédito, S.A.;
31.º- Para o efeito, o demandante deslocava-se do Carregal do Sal, local onde reside, até DDDDDD, em viatura própria, percorrendo, ida e volta, mais de 150 quilómetros;
32.º- A demandada convocou a realização de várias reuniões com o demandante de modo a diligenciar pelos termos do negócio;
33.º- Estas reuniões realizaram-se sempre em YYYYY, deslocando-se o demandante, em viatura própria, desde o Carregal do Sal, para o efeito;
34.º- Em cada uma dessas reuniões o demandante percorreu mais de 120 quilómetros de ida e volta;
35.º- O demandante reuniu várias vezes com o sócio-gerente da empresa que explorava a loja objeto do negócio, da “D, Lda.”, no sentido de lhe ser fornecida toda a documentação e informação necessárias à transição do referido imóvel para si;
36.º- As referidas reuniões realizaram-se sempre em XXXX-YYYY, local onde se situa a referida loja, deslocando-se o demandante, em viatura própria, desde o Carregal do Sal, para o efeito;
37.º- Em cada uma dessas reuniões o demandante percorreu, ida e volta, mais de 120 quilómetros;
38.º- Além das despesas com as deslocações, e com a constituição da sociedade “G, Unipessoal, Lda.”, o demandante despendeu, ainda, muitas horas do seu tempo;
39.º- Nas supra referidas deslocações ao Banco, o demandante despendeu um número de horas que não foi possível apurar;
40.º- Nas deslocações a YYYYY para reunir com a demandada, o demandante despendeu um número de horas que não foi possível apurar;
41.º- Nas reuniões com o gerente da empresa “D, Lda.” o demandante despendeu um número de horas que não foi possível apurar;
42.º- Para efetuar a constituição da dita sociedade o demandante teve necessidade de se deslocar do Carregal do Sal a Viseu, despendendo um número de horas que não foi possível apurar;
43.º- O demandante é empresário no ramo alimentar, do comércio a grosso e a retalho, sendo sócio-gerente de duas empresas, “H, Lda.” e “I, Lda.”;
44.º- O demandante tem uma vida profissional muito preenchida trabalhando, por dia, mais de 12 horas;
45.º- Sucede que o demandante despendeu nas reuniões supra mencionadas um número de horas que não foi possível apurar, ficando impossibilitado, naquele período de prestar as suas tarefas normais de sócio-gerente das referidas empresas;
46.º- O que lhe causou transtornos e desgaste físico e psicológico;
47.º- O demandante é pessoa conhecida no meio como possuindo elevado padrão de rigor e lisura profissional;
48.º- Tendo ficado transtornado, angustiado e revoltado com a frustração do negócio;
49.º- Principalmente, com o facto de a demandada ter, sem mais, deixado de lhe dar notícias, prometendo-lhe, já depois de contactada pelos seus mandatários, uma tomada de posição mais tarde, que nunca chegou.

Motivação dos factos provados:
A factualidade dada como provada resultou da conjugação dos factos admitidos por acordo, dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados, ou sendo-o, foram corroborados por outra prova, pelas declarações do demandante e do Procurador da demandada presente na Audiência de Julgamento, que é o Diretor de Expansão da demandada há um ano e foi quem “chumbou o negócio”, e pelo depoimento da única testemunha apresentada, tudo tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 655º do Código de Processo Civil (CPC) e no artigo 396º do Código Civil (doravante designado simplesmente C. Civ);
Quanto à testemunha apresentada pelo demandante, J, apesar de prestar serviço em duas empresas do demandante desde fevereiro de 2014, na qualidade de Técnico Oficial de Contas, depôs com isenção sobre os factos que veio testemunhar, e de que tinha conhecimento direto. Referiu, nomeadamente que: foi com ele que o demandante se aconselhou sobre a empresa a constituir relativamente a questões financeiras e fiscais, “A expectativa que o Sr. A transmitiu é que a empresa, mais mês, menos mês, iria produzir, existindo faturação”, disse, mas que a mesma nunca foi utilizada, só cumpre obrigações fiscais; Que o demandante passa muito tempo nas empresas e que, sendo uma das pessoas a quem o demandante informa quando está fora, apercebeu-se que se ausentou várias vezes para tratar desde assunto mas não conseguiu especificar quantas vezes e em que datas, referindo que os meses mais complicados em termos de logística são os de agosto e setembro, em que tinham sempre de ligar “ao Sr. A”, por quem tem de “passar tudo, não há negócio que se faça sem que ele dê o aval; Que este lhe deu a “expectativa” de este ser um “grande negócio” e lhe manifestou a sua “frustração”.
Factos não provados e respetiva motivação:
Por inexistência de qualquer prova ou da insuficiência da que foi apresentada, não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes com interesse para a decisão da causa, nomeadamente que em julho de 2014 foi comunicado ao demandante pelos colaboradores da demandada que a Gerência da demandada não encontrava razões de viabilidade que justificassem o negócio e que o projeto de abertura de lojas no Norte iria ser reavaliado e que só depois disso a Gerência da demandada tomaria uma decisão definitiva sobre quaisquer negociações a concretizar. E cuja prova competia à demandada, nos termos do nº 2 do artigo 342º C. Civ.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:
O demandante vem requerer que a demandada seja condenada a ressarci-lo por danos, patrimoniais e morais, no âmbito da responsabilidade pré-contratual, alegando que a mesma violou o dever de lealdade, probidade e lisura de comportamento, impostos pelo princípio da boa-fé, porquanto não só durante as negociações lhe terá criado a expectativa de realização do negócio, levando-o a ter despesas, que de outro modo não teria, como, sem qualquer justificação, uns meses mais tarde, deixou de lhe responder e, posteriormente, promete uma tomada de posição que, a ter sido tomada, nunca lhe foi comunicada, presumindo o desinteresse. Em consequência, entende que tem o direito a ser ressarcido dos danos que não teria sofrido se não tivesse entrado em negociações, bem como dos danos morais.
Alega a demandada que o demandante sabia que os prospetores da demandada não têm poderes de decisão e só a Gerência da demandada poderia gerar a sua confiança no avanço e concretização das negociações, e que só ela poderia conduzir à aceitação do referido contrato de arrendamento/locação comercial.
Refere ainda a demandada que “é comummente aceite pela nossa jurisprudência e pelo direito comparado que não são ressarcíeis, ainda que a ruptura de negociações seja injustificada, os gastos especulativos e os que consistem em risco implícito em todo o negócio como, por exemplo, os que teriam de ser sempre realizados para iniciar as negociações, como é o caso dos gastos que o demandante apresenta nos autos.
Refere o nº 1 do artigo 227º do Código Civil, que tem a epígrafe “Culpa na formação dos contratos”, ou seja, na fase preparatória do mesmo, que: “Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte.”
Pretende-se responsabilizar os contraentes por culpa, quer nos preliminares quer na formação dos contratos, protegendo a confiança, razoável e objetiva, e a expectativa legítima, das partes na celebração do contrato e evitar a rutura ilegítima das negociações.
Da factualidade assente resulta que, embora as partes não tenham chegado a acordar os elementos essenciais do contrato a celebrar, o demandante e os colaboradores da demandada estabeleceram negociações preliminares com vista à sua efetivação, tendo sido ajustados valores e períodos de garantia de permanência do supermercado, nomeadamente, sendo que a demandada, passados vários meses, suspendeu as negociações, para reavaliação do negócio, e terá desistido do mesmo, sem que tenha informado o demandante.
Ora, a boa-fé, exigida, tanto na formação como nos preliminares dos contratos, é o alicerce da confiança dos contraentes e tem subjacente um comportamento leal, onde é crucial o dever de informar e esclarecer a contraparte em tudo que é relevante para determinar a vontade de contratar.
E, na situação dos autos, os colaboradores da demandada tinham, desde logo, de informar o demandante que agiam como meros prospetores de mercado, se era o caso, a fim de que o mesmo não tomasse decisões definitivas enquanto eles não tivessem a aprovação da respetiva gerência para o negócio.
O que não fizeram. Estabeleceram contactos com o demandante, entabularam negociações, convocaram reuniões, apresentaram propostas e contrapropostas, atuando, com propriedade ou sem ela (questão do foro interno da própria demandada) como se estivessem devidamente autorizados para o efeito, e criando no demandante a convicção de que que tinham a aprovação daquela e a legítima expectativa da concretização do negócio, expectativa que está objetivada desde logo pela constituição de uma empresa com o objeto adequado ao negócio em causa, e que para nada mais foi utilizada.
Mais, suspenderam unilateralmente as negociações, e posteriormente desistiram, sem informarem o demandante.
E se a demandada tem a liberdade de não concretizar um negócio, que entendeu não lhe ser favorável, a violação, culposa, das regras da boa-fé, consubstanciada na omissão dos deveres de informação e esclarecimento que lhe competiam, nos termos já expostos, e nomeadamente através daqueles seus colaboradores, criando a confiança no demandante de que o negócio se iria realizar, dá a este o direito de ser ressarcido por danos daí decorrentes.
De facto, encontram-se também preenchidos os pressupostos cumulativos da responsabilidade civil (cf. artigo 483º do Código Civil), ou seja, prática de um ato ilícito (violação das regras da boa-fé), voluntário e culposo (culpa in contrahendo), facto imputável à demandada, e a existência de um nexo causalidade entre os factos e os danos.
E “…VIII- A jurisprudência, maioritariamente, sustenta que o dano indemnizável por violação de deveres específicos de comportamento baseados na boa-fé, no contexto de culpa in contrahendo é, em regra, o do interesse contratual negativo, ou dano de confiança, devendo o lesado ser colocado na posição em que estaria se não tivesse encetado as negociações, tendo direito a ser ressarcido do que despendeu na expectativa da sua consumação(STJ,16.12.2010:Proc.1212/06.9TBCHV.P1.S1.dgsi.Net)”- cf. Nota 80 ao artigo 227º do Código Civil Anotado, de Abílio Neto, 18ª Edição.
Ora, dos danos provados, no âmbito deste interesse contratual negativo, e nos termos dos artigos 562º e 563º do Código Civil, são ressarcíveis: o valor despendido na constituição da sociedade “G, Unipessoal, Lda.” (€ 360,00, mais o tempo despendido na viagem de ida e volta e na Conservatória e ainda gastos com a deslocação), o tempo despendido com as reuniões, em YYYY, e em DDDDDD no Banco, e em viagem de e para os locais e os gastos com as mesmas.
Contudo, à exceção do valor despendido com a constituição da referida sociedade (€ 360,00), não foi possível apurar concretamente quer o tempo, quer os valores efetivamente despendidos, não havendo, assim, elementos para fixar a respetiva quantificação, pelo que se terá de relegar a sua fixação, ou determinação, para ação de liquidação de condenação em quantia ilíquida, nos termos dos artigos 609º, nº 2 e 358º, nº 2, ambos do Código de Processo Civil (renovando-se a instância declarativa).
E ainda, como peticionado, aos juros, à taxa legal, sobre o montante em que vai já condenada a demandada e sobre o que vier a ser apurado em sede de liquidação de sentença, contados desde a citação, 06/07/2015, até efetivo e integral pagamento (cf. artigos 804º, 806º e 805º, n.º 1, todos do C. Civ.).
O demandante vem, ainda no âmbito do interesse contratual negativo, peticionar também o ressarcimento de danos morais ou não patrimoniais, referindo-se aos danos que explanou nos artigos 41º a 55º do requerimento inicial.
Ora, alguns dos danos a que se referem estes artigos, foram provados e, acima considerados a título de danos patrimoniais.
A título de danos morais, foram provados os factos constantes dos pontos 46º, 48º e 49º supra.
Quanto ao primeiro, em nosso entender, não tem relevância ou gravidade que mereça a tutela do direito (cf. nº 1 do artigo 496º do C. Civ.), analisada sobre um padrão objetivo e tendo em conta a realidade dos factos dos presentes autos. Com efeito, sendo o demandante empresário, os transtornos e desgaste físico e psicológico são habituais na sua atividade, e aqui também se verificariam mesmo se as negociações decorressem com normalidade, e, de forma legítima e informada, não tivessem levado à concretização do negócio.
Quanto à angústia e revolta do demandante com a frustração do negócio, e falta de informação, não merecem também provimento, a este título, dado que o negócio ainda estava nos preliminares (os danos causados pelo gorar da expectativa de concretização e a falta de informação durante as negociações e do desinteressa da demandada na concretização estão a ser indemnizadas a título de danos patrimoniais).
Decisão:
Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, e, em consequência:
- Condeno a demandada, B, Sociedade Unipessoal, Lda., a pagar ao demandante, A, a importância de €360,00 (trezentos e sessenta euros), acrescida de juros, à taxa legal, desde 6 de julho de 2015 até efetivo e integral pagamento; - Condeno ainda a demandada a pagar ao demandante o valor que venha a ser liquidado em sede de ação declarativa de liquidação de condenação em quantia ilíquida, e que não ultrapasse o valor de € 637,20 (seiscentos e trinta e sete euros e vinte cêntimos), pelos danos patrimoniais causados ao demandante com o tempo despendido na viagem de ida e volta e na Conservatória e ainda gastos com a deslocação, para a constituição da sociedade, o tempo despendido com as reuniões supra mencionadas, em YYYY, e em DDDDDD no Banco, e em viagem de e para os locais e os gastos com as mesmas;
- Condeno ainda a demandada a pagar ao demandante juros, à taxa legal, sobre a importância que vier a ser liquidada, desde 6 de julho de 2015 até efetivo e integral pagamento;
Absolvo a demandada do restante peticionado.
Não sendo a sucumbência total determinada ou determinável na presente ação, não é possível determinar o decaimento de cada uma das partes para efeitos de custas, assim, vão, por agora, ambas condenadas em custas, em partes iguais, que já se encontram pagas (cf. Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, artigo 527º do Código de Processo Civil e artigo 9º, nºs 1 e 3 do C. Civ.).
Registe e notifique.
Carregal do Sal, 06 de novembro de 2015
A Juíza de Paz (Elisa Flores)
Processado por computador (artigo 131º, nº5 do C P C).