Sentença de Julgado de Paz
Processo: 83/2014-JP
Relator: FERNANDA CARRETAS
Descritores: INFILTRAÇÕES
Data da sentença: 09/29/2016
Julgado de Paz de : ÓBIDOS
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
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RELATÓRIO:
A – COMÉRCIO DE ILUMINAÇÃO E DECORAÇÃO, LDA., identificada a fls. 1, intentou, em 19 de junho de 2014, contra Sr. B, melhor identificado, também, a fls. 1, a presente ação declarativa de condenação, pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 6.600,00 € (Seis mil e seiscentos euros), relativa ao orçamento para reparação dos danos verificados na fração autónoma de sua propriedade em consequência de deficiência das canalizações da fração de que é proprietário.
Para tanto, alegou os factos constantes do seu Requerimento Inicial de fls. 1 a 2, que se dá por reproduzido, dizendo, em síntese e no que à presente decisão importa, que: é proprietária da fração autónoma, designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão, destinado a comércio, do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, designado por Edifício --------, sito na Azinhaga do ------, ----- -------, Prazeres de Aljubarrota, concelho de Alcobaça; o Demandado é proprietário da fração autónoma, designada pela letra “C”, correspondente ao primeiro andar esquerdo do mesmo prédio; em 2011, o Demandado sofreu na sua fração autónoma rotura na canalização, a qual provocou danos na fração da Demandante; o Demandado, tendo sido informado da situação, mandou reparar a sua fração, não tendo feito diligências para reparar os danos causados na fração da Demandante, não tendo acionado o seguro da sua fração ou procedido às reparações necessárias; em consequência a fração da Demandante sofreu danos ao nível das paredes, tendo ficado completamente danificada e sem condições de habitabilidade, não sendo possível rentabilizar o espaço comercial; o Demandado foi interpelado, por diversas vezes pelos sócios da Demandante, nunca tendo dado qualquer resposta ou procedido à reparação dos danos causados; a Demandante procedeu ao pedido de um orçamento para reparação dos danos causados pela fração do Demandado, o qual ascende à quantia de 6.600,00 € (Seis mil e seiscentos euros).
Juntou 11 documentos (fls. 3 a 17 e 36 a 37 e verso) que, igualmente, se dão por reproduzidos.
O Demandado foi, pessoal e regularmente citado, para contestar no prazo, querendo, nada tendo dito.
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Cabe a este tribunal decidir se o Demandado deve ser responsabilizado pelo pagamento da quantia necessária para a reparação dos danos causados na fração autónoma propriedade da Demandante e, na afirmativa, em que medida.
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Tendo a Demandante optado pelo recurso à Mediação para resolução do litígio, foi agendado o dia 30 de junho de 2014 para a realização da sessão de Pré-Mediação, a qual não se realizou, por falta injustificada do Demandado.
Os autos ficaram, então, a aguardar a designação de data para a realização da Audiência de Julgamento, o que, atentos os constrangimentos verificados com a disponibilidade de recursos humanos, só nesta data foi possível levar a efeito, tendo sido designado o dia 19 de setembro de 2016 para a realização da Audiência de Julgamento e não antes, face à situação de acumulação em exercício de funções com o Julgado de Paz do Seixal, facto pelo qual o tribunal apresentou já o seu pedido de desculpas aos intervenientes processuais, tendo, igualmente, explicado as razões que conduziram à delonga processual.
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Aberta a Audiência e estando apenas presentes os representantes legais da Demandante – Sra. D. C e Sr. D - foi esta suspensa, ficando os autos a justificação da falta por parte do Demandado, tendo-se designado, de imediato, a presente data para a sua continuação e não antes, em virtude de se tornar necessária a junção de documentos imprescindíveis à decisão.
O Demandado não justificou a sua falta, pelo que se profere sentença.
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Estando reunidos os pressupostos da estabilidade da instância, cumpre apreciar e decidir:
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FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE FACTO
A convicção probatória do Tribunal, de acordo com a qual seleciona a matéria dada como provada ou não provada, ficou a dever-se ao conjunto da prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomada em consideração a confissão por parte do Demandado, por ausência de contestação escrita e falta, injustificada, à Audiência de Julgamento, e o documento de fls. 3 a 6 e 36 a 37 e verso, quanto à titularidade do direito de propriedade, considerando-se provados todos os factos alegados pela Demandante.
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Com interesse para a decisão da causa ficaram provados os seguintes factos:
1. A Demandante é proprietária da fração autónoma, designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão, destinado a comércio do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, designado por Edifício -----------, sito na Azinhaga do ---------, ----- --------, Prazeres de Aljubarrota, concelho de Alcobaça (Doc. n.º 1 e de fls.36 a 37 e verso); -
2. O Demandado é proprietário da fração autónoma designada pela letra “C”, correspondente ao primeiro andar esquerdo (idem);
3. No ano de 2011, o Demandado sofreu uma rotura da canalização da sua fração autónoma;
4. A qual provocou infiltrações para a fração autónoma, propriedade da Demandante;
5. Danificando irremediavelmente todas as paredes e tetos;
6. A reparação de tais danos e bem assim da reparação da “fuga de humidade” foi orçamentada no montante de 6.600,00 € (Seis mil e seiscentos euros);
7. A reparação dos danos (substituição de paredes em pladur e pintura da loja) foi orçamentada em 3.500,00 € (Três mil e quinhentos euros);
8. O Demandado foi interpelado, por diversas vezes, pelos sócios da Demandante, nunca tendo dado qualquer resposta quanto ao assunto;
9. A administração do condomínio contactou o Demandado, via correio eletrónico, na tentativa de obter alguma resposta, tendo este informado que o seguro contratado para a fração autónoma de que é proprietário não cobria tais danos;
10. Em data que não foi possível apurar, o Demandado procedeu à reparação das canalizações da fração autónoma de que é proprietário, mas nada fez quanto à fração autónoma, propriedade da Demandante.
Não resultaram provados quaisquer outros factos, alegados pelas partes ou instrumentais, relevantes para a decisão da causa.
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FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE DIREITO
A relação material controvertida envolve danos causados na fração autónoma de que a Demandante é proprietária, causados por infiltrações provenientes da fração autónoma de que o Demandado é proprietário.
Na verdade, tendo a fração autónoma, propriedade do Demandado, provocado infiltrações e, por consequência, danos na fração autónoma, propriedade da Demandante, o certo é que, apesar de reiteradamente interpelado, até pela administração do condomínio, a resolver a situação nada fez, tendo, já após a entrada do processo, em data que não foi possível apurar, procedido à eliminação das infiltrações, mas sem que, por algum modo, resolvesse a questão da reparação dos danos causados à Demandante.
A Demandante formula pedidos que teremos de apreciar à luz do disposto no art.º 483.º e seguintes do Código Civil e bem assim das normas relativas à propriedade horizontal, essa figura jurídica que tantas dores de cabeça dá aos condóminos, quando estes não assumem as suas responsabilidades recíprocas.
Ora, dispõe o art.º 483.º, do Código Civil (CC) que “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” (Bold nosso).
Assim, são requisitos da responsabilidade civil e, por consequência, da obrigação de indemnizar, além do dano, o facto, que se analisa numa conduta humana dominável pela vontade; a ilicitude, traduzida na violação de direitos subjetivos absolutos, ou de normas destinadas a tutelar interesses privados; a imputação psicológica do facto ao lesante, sob a forma de dolo ou de mera culpa e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, que pode afirmar-se, quando se prove, que a conduta do lesante, considerada ex ante (antes) e tendo em conta os conhecimentos concretos do mesmo, era adequada à produção do prejuízo efetivamente verificado, nos termos do disposto no Art.º 563.º do C.C. (cfr. Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, 1, 4.ª ed., 471 e ss. e 578).
Estes requisitos, estabelecidos no n.º 1 do art.º 483.º do C.C. para a obrigação de indemnizar, são cumulativos.
Por outro lado, dispõe o n.º 1, do art.º 1422.º do CC que “Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.”. É especialmente vedado aos condóminos “Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício.” (n.º 2, al. a) do mesmo dispositivo legal).
Neste caso, foi violado o disposto no art.º 1422.º do CC, uma vez que o Demandado não procedeu à conservação e manutenção da sua fração autónoma de forma a evitar o prejuízo da Demandante.
E, verificam-se todos os requisitos da obrigação de indemnizar.
De facto o Demandado tem demonstrado intolerável desrespeito pelos direitos da Demandante, desconhecendo-se por que razão não assumiu já a sua obrigação de ressarcir esta pelos prejuízos sofridos – que é o que se espera de qualquer pessoa de bem.
Efetivamente, limitou-se o Demandado e, ainda assim, tardiamente, a reparar a causa das infiltrações, menosprezando a sua obrigação de reparar – também – os danos sofridos pela fração autónoma, propriedade da Demandante.
E, da sua postura processual decorre, inequivocamente, que não está disposto a assumir a sua responsabilidade, pelo que não obstante o disposto no n.º 1, do art.º 566.º, do CC, que institui o direito à reconstituição natural, ou seja, o lesante deverá repor a situação ao estado em que se encontrava quando o dano ocorreu, o certo é que, face à recusa reiterada do Demandado em cumprir a sua obrigação, fica a Demandante com o direito de reparar, por si, os danos e de exigir ao Demandado o pagamento da quantia necessária para o efeito.
Face ao que antecede, não pode deixar de proceder o pedido formulado pela Demandante, quanto à reparação dos danos sofridos pela fração autónoma de que é proprietária.
Todavia, verifica-se que a Demandante formula o pedido no montante de 6.600,00 € (Seis mil e seiscentos euros), a qual inclui a “reparação da fuga de humidade”, estando orçamentado a este título o montante de 3.100,00 € (Três mil e cem euros).
Ora, conforme os representantes legais da Demandante declararam, tal reparação mostra-se já efetuada, pelo que o Demandado deve ser condenado apenas no pagamento da quantia necessária para a reparação dos danos sofridos pela fração autónoma da Demandante, no montante de 3.500,00 € (Três mil e quinhentos euros), o qual não foi impugnado.
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DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgando a presente ação parcialmente procedente, porque parcialmente provada, decido condenar o Demandado a pagar à Demandante a quantia de 3.500,00 € (Três mil e quinhentos euros), necessária para a reparação dos danos sofridos pela fração autónoma de que esta é proprietária.
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Custas a suportar pela Demandante e pelo Demandado, em razão do decaimento e na proporção respetiva de 50% para cada parte (art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro).
Face ao que antecede, notifique o Demandado para o pagamento da quantia de 35,00 € (Trinta e cinco euros), relativa às custas da sua responsabilidade, no prazo de três dias úteis, contados da notificação, sob pena de aplicação da sobretaxa de 10,00 € (Dez euros) por cada dia de atraso, até ao limite de 140,00 € (Cento e quarenta euros).
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Registe.
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Óbidos, 29 de setembro de 2016
(Juíza de Paz que redigiu e reviu em computador – Art.º 131.º/5 do C.P.C.)
(Nomeada em outubro de 2015)

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(Fernanda Carretas)