Sentença de Julgado de Paz
Processo: 13/2019-JPSXL
Relator: HELENA ALÃO SOARES
Descritores: PAGAMENTO DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA (EMPRÉSTIMO/MÚTUO)
Data da sentença: 03/12/2019
Julgado de Paz de : SEIXAL
Decisão Texto Integral: SENTENÇA
(artigo 60.º, n.º 1 da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP)).

Processo n.º 13/2019-JPSXL
Matéria: Incumprimento de obrigações pecuniárias; incumprimento contratual
(Artigo 9.º, n.º 1, alíneas a) e i) da Lei de Organização, Funcionamento e Competência do Julgados de Paz, aprovada pela Lei n.º 78/2001, de 13-07, alterada e republicada pela Lei n.º 54/2013, de 31-07 (LJP))
Objecto do litígio: Pagamento de prestação pecuniária (empréstimo/mútuo)
Demandante: A, portadora do Cartão do Cidadão n.º 000, com residência na Rua XX, Fernão Ferro
Demandado: B, com residência na Rua XX, Cruz de Pau, Amora
Valor da acção: € 14.000,00 (catorze mil euros)
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I. Dos Articulados:
A Demandante A, intentou a presente acção declarativa de condenação, pedindo a condenação do Demandado B no pagamento do valor de € 14.000,00 (catorze mil euros) acrescido de juros legais. Alega, em suma, que em 20 de Setembro de 2007, emprestou ao Demandado a quantia de €14.000,00 (catorze mil euros), por transferência bancária da sua conta poupança pessoal, da Caixa Geral de Depósitos, empréstimo este concedido durante a relação de união de facto entre Demandante e Demandado. Mais alega que não foi estabelecido um plano de pagamento entre ambos nem a sua forma de ressarcimento e que devido a dois processos que decorreram no Tribunal do Seixal e que já transitaram em julgado, não foi possível definir a forma de devolução da quantia e que aceita que a quantia seja regularizada no decorrer do ano de 2019.
O Demandado, regularmente citado em 25/01/2019, apresentou a sua contestação, alegando, em suma, a inexistência do empréstimo que a Demandante alega ter efectuado, que o Demandado e a Demandante viveram em união de facto e viviam em economia comum, que tudo o que tinham partilhavam e que durante o período em que durou a união de facto, entre o ano de 2005 e 2010, existiram inúmeros movimentos bancários entre as contas de ambos, designadamente da conta do Demandado para a conta da Demandante. Mais alega que o fluxo de transferências entre as contas de ambos era frequente, decorrendo da partilha de vida que faziam e mesmo “após ao término do relacionamento até ao processo de partilhas” foram efectuados movimentos bancários da conta do Demandado para a conta da Demandante e que não foi estabelecido qualquer plano de pagamento do alegado empréstimo porque o mesmo nunca existiu e que as questões patrimoniais existentes entre ambos foram resolvidas no âmbito do processo de partilha, no qual foi estabelecido que ambos prescindiam de tornas. Alegou ainda o Demandado que não pode confessar a dívida uma vez que a mesma não existe, pelo que entende não ter de efectuar o pagamento peticionado pela ora Demandante, considerando que todas as dívidas que eventualmente pudessem existir entre ambos, foram saldadas com o processo de partilhas, terminando pedindo que a presente acção seja julgada totalmente improcedente, por não provada e em consequência ser o Demandado absolvido do pedido contra si formulado.
II. Tramitação:
A acção foi proposta no dia 22/01/2019, pela Demandante (fls. 1 e 2).
O Demandado, regularmente citado em 25/01/2019 (cfr. fls. 23), apresentou contestação nesse mesmo dia (fls. 13 e 14).
O Demandado recusou aceder à pré-mediação (cfr. fls. 14).
Procedeu-se à marcação da audiência de discussão e julgamento.
No dia designado para a realização da audiência de julgamento (14/02/2019, pelas 14h30m), compareceram ambas as partes, não tendo sido apresentada qualquer testemunha, nem pela Demandante, nem pelo Demandado, tendo-se iniciado a audiência de julgamento. As partes foram ouvidas e durante a audiência foi requerido, por ambos, prazo para junção de documentos que não tiveram tempo para reunir até àquela data, nomeadamente bancários, com vista a apurar a verdade dos factos. Por Despacho, foi concedido prazo para a requerida junção dos documentos e foi suspensa a audiência de julgamento, tendo sido designado o dia 12/03/2019, pelas 10h00, para a sua continuação.
No prazo concedido não foram juntos quaisquer documentos pelas partes.
No dia 12/03/2019, realizou-se a continuação da audiência de julgamento, na qual compareceram ambas as partes.
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Nos termos do disposto nos artigos 297.º, n.ºs 1 e 2, 299.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 63.º da LJP, fixo à presente acção o valor de €14.000,00 (catorze mil euros).
O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objecto, do território e do valor.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, e são legítimas.

Não ocorrem excepções, nulidades, ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
III. Fundamentação:
A) De Facto:
Consideram-se provados, relevantes para o exame e decisão da causa, os seguintes factos:
1 – A Demandante transferiu da sua conta (Caixa Poupança) NIB 000 para uma conta não identificada, o valor de € 14.000,00, no dia 20/09/2007, sob o descritivo “ emp.B”.
2 – A Demandante e o Demandado vieram em união de facto entre 2005 e 2009.
3- Entre a Demandante e o Demandado eram frequentes transferências de dinheiro entre as contas de ambos, durante o período em que viveram em união de facto.
4 – Por acordo, homologado judicialmente, em 08/11/2012, foram adjudicados os bens imóveis, objecto do processo de Divisão de Coisa Comum, que correu termos no Tribunal de Família e de Menores e de Comarca do Seixal, no 3.º Juízo Cível, sob o n.º 000/2010.4TBSXL, no qual ambos os interessados prescindiram do pagamento de tornas.
Não se considerou provado que a Demandante tivesse transferido dinheiro para a conta do Demandado, a título de empréstimo.
Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes, com interesse para a decisão da causa.
Motivação da matéria de facto:
A convicção probatória do tribunal ficou a dever-se às declarações das partes e aos documentos juntos ao requerimento inicial, a fls. 3 e 4, e à contestação, a fls. 15 a 17 e aos documentos juntos a fls. 33 e 34.
B) De Direito:
No caso dos autos, o que está em causa é a existência, ou não, de um contrato de mútuo, alegadamente realizado em 20.09.2007, no valor de € 14.000,00, entre a Demandante e o Demandado.
Nos termos do artigo 1142.º do Código Civil, “Mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade”.
Quanto à forma, dispõe o art. 1143.º do C.C. que “(..) o contrato de mútuo de valor superior a €25 000 euros só é válido se for celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado e o de valor superior a 2 500 euros se o for por documento assinado pelo mutuário.”.
No caso dos autos e em conformidade com os factos dados como provados, não resultou provado a existência de um contrato de mútuo celebrado entre a Demandante e Demandado. Refira-se que, no caso concreto, atento o valor em causa, para cumprimento da sua forma legal, seria bastante a existência de um documento particular assinado pelo mutuário.
A Demandante não conseguiu provar que a transferência do valor de € 14.000,00, realizada no dia 20/09/2007, tivesse sido feita para conta do Demandado, nem que a mesma se reportava a um empréstimo de dinheiro ao Demandado, pelo que não pode proceder o seu pedido.
É de notar ainda que, segundo as regras de experiência comum, a ter a Demandante dinheiro a haver por parte do Demandado, por conta de um empréstimo realizado em 2007, é pouco provável que em 2012, aquando do processo de divisão de coisa comum, tal valor não tivesse sido tomado em consideração na adjudicação dos bens imóveis, objecto de divisão, e no direito a tornas, conforme acordo homologado judicialmente, nos termos dos factos provados.
IV. Decisão
Em face do exposto, julgo a acção totalmente improcedente, por não provada e absolvo o Demandado do pedido.
Custas
As custas serão suportadas pela Demandante, que declaro parte vencida (Art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001,de 28 de Dezembro).
Atento o pagamento da taxa de justiça inicial no valor de €35,00 (trinta e cinco euros) efetuado com a entrada do Requerimento Inicial, deverá a Demandante pagar o valor de € 35,00, no prazo de três dias úteis a contar da notificação para o efeito, sob pena de, não o fazendo, incorrer no pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação, até ao valor máximo de €140,00, ao abrigo dos n.º 8 e 10 da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, o n.º 10 na redação da Portaria n.º 209/2005 de 24/02.
Reembolse-se o Demandado, nos termos do n.º 9.º, da mesma Portaria, no montante de 35,00€.
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Esta sentença foi proferida nos termos do n.º 2, do artigo 60.º da Lei dos Julgados de Paz.
Registe.
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Seixal
12/03/2019

A Juiz de Paz Auxiliar
(Em substituição, após tomada de posse)


(Helena Alão Soares)