Sentença de Julgado de Paz
Processo: 65/2017-JPFNC
Relator: LUÍSA ALMEIDA SOARES
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL; DIFAMAÇÃO; DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data da sentença: 03/27/2018
Julgado de Paz de : FUNCHAL
Decisão Texto Integral: AGRUPAMENTO DE
CÂMARA DE LOBOS E FUNCHAL
Julgado de Paz do Agrupamento dos Concelhos de Câmara de Lobos e Funchal
Rua dos Ilhéus, n.º 1 – C - 9000-176 Funchal - Tel.: 291 754 418 - Fax: 291 754 397 - E-mail: correio.funchal@julgadosdepaz.mj.pt


SENTENÇA
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I. RELATÓRIO
A) IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
Demandante: A, casada, portadora do cartão de cidadão n. ° 0, emitido pela República Portuguesa e válido até 06/08/2018, com o N.I.F. 0, residente no X Caniço.

Demandada: B, solteira, maior, portadora do cartão de cidadão n.°0, válido até 07/10/2019, com o N.I.F. — 0, residente na Rua X, São Martinho, Funchal.
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B) PEDIDO
A Demandante propôs contra a Demandada a presente ação declarativa enquadrada nas alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, com os fundamentos constantes do requerimento inicial que aqui se dá por integralmente reproduzido, peticionando seja a Demandada condenada a pagar-lhe a) a quantia de 3.000€ (três mil euros), a título de todos os danos causados com a conduta praticada pela Demandada; b) No pagamento de todas as custas e demais encargos legais com a presente lide; c) deve a Demandada ser condenada a elaborar missiva a ser remetida para o conselho diretivo da Escola Básica do 2.° e 3.° ciclos dos X, desmentindo todas as acusações e insinuações que fez sobre as condutas profissionais e pessoais da Demandante.
Juntou 7 (sete) documentos.
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A mediação não se realizou uma vez que o Ilustre Mandatário da Demandada comunicou aos autos que não poderia comparecer na mesma e requereu fosse agendada data para audiência de julgamento.
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Regularmente citada, a Demandada contestou, com os fundamentos que aqui se dão por reproduzidos, impugnando toda a matéria vertida no requerimento inicial, exceto os artigos 1.º e 2.º.

No decorrer da 1.ª sessão de julgamento a Demandante juntou aos autos documentos sobre os quais a Demandada se pronunciou por escrito, tendo junto também documentos que foram objeto de contraditório (cfr. atas de julgamento).
A Demandada pugnou pela não admissibilidade do documento n.º 9 junto na audiência de julgamento e para a qual lhe foi deferido prazo para se pronunciar. Entende que o documento referente a processo disciplinar instaurado à Demandada pela presidente do conselho executivo, C, pelas afirmações constantes do documento por aquela enviado à coordenadora do departamento das ciências exatas, em virtude de serem suscetíveis de atentar contra a dignidade pessoal e profissional da Demandante, não é admissível como prova, sendo ilegal por ter caráter confidencial.
Verifica-se que nenhuma prova foi produzida pela Demandada no sentido da confidencialidade do documento referido e por outro lado, é a própria quem junta o relatório final e a decisão do processo disciplinar com a medida de repreensão escrita, suspensa pelo período de um ano.
Entende este Tribunal que tendo a Demandada apresentado como prova “o mais”, terá necessariamente de improceder a não admissibilidade de “o menos”, até porque o documento junto pela Demandante como 9 em nada acrescenta ao documento que a própria Demandada junta.
Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, indefere-se o requerido pela Demandada e admite-se como prova o documento n.º 9 junto na audiência de julgamento pela Demandante.
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II- SANEAMENTO
Estão reunidos os pressupostos da estabilidade da instância: o Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou quaisquer questões prévias que cumpra conhecer.
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III- VALOR DA AÇÃO
Fixa-se em €3.035,00 (três mil e trinta e cinco euros) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.º 1 e 2, 299.º, e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho).
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IV- OBJETO DO LITÍGIO
O objeto do litígio entre as partes circunscreve-se a apurar a conduta da Demandada face à Demandante e proceder ao seu enquadramento legal.
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V – QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos importa apreciar da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual e, na positiva, quais as consequências daí resultantes.
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VI- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com relevância para a decisão da causa, de acordo com a prova documental e testemunhal carreada para os autos, resultaram os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS
1. A Demandante e a Demandada são docentes de matemática na Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos dos X e pertencem ao grupo 500.
2. A Demandante tem grande paixão pela sua profissão e por tudo o que a envolve.
3. No dia 12.09.2016, a Demandante foi eleita, por unanimidade dos votos, delegada do grupo 500 de matemática do 3.° ciclo.
4. No dia 09.11.2016, a Demandada remeteu um email à Coordenadora do Departamento das Ciências Exatas, da Natureza e das Tecnologias da Escola EB 2.º e 3.º Ciclos da Escola dos X, professora D.
5. No email referido em 4., escrito pela Demandada, constam expressões como “postura desadequada da Delegada do Grupo de Matemática, A”, “o sucesso dos alunos foi seriamente prejudicado devido à incompetência e falta de organização da delegada”, “esta teve uma grande falta de respeito”, “a colega teve a ousadia”.
6. A Demandada frequentava em média três vezes por semana o ginásio.
7. O email referido em 4. criou um grande mal-estar, com sentimentos de isolamento, angústia, perturbação, desânimo, revolta, profunda tristeza à Demandante, fez com que tivesse receio que o seu bom nome fosse afectado, alterou as suas rotinas e determinou diminuição das suas idas ao ginásio.
8. O email referido em 4. gerou um mal-estar, generalizado, no grupo docente afeto à Demandante e a Demandada.
9. No dia 10.11.2016 foi convocada por email uma reunião, que ocorreu no dia 14.11.2016, estando presentes a Demandante, a Demandada, a coordenadora de departamento das ciências exatas, da natureza e tecnologias, professora D, a professora E, e a Presidente do Conselho Executivo, tendo como ponto único “analisar o conteúdo de exposição referente às coadjuvâncias”, que foi alterado a pedido da Demandante para “análise do conteúdo da exposição referente às coadjuvâncias enviada à professora D através de correio eletrónico, no dia nove de novembro, de dois mil e dezasseis, pela professora B”.
10. Da ata da reunião referida em 9 consta que “A presidente iniciou a reunião referindo que esta tem como propósito analisar o conteúdo da exposição da professora B, que compreende acusações muito graves à professora A, colocando em causa a sua dignidade pessoal e profissional. De destacar a acusação de que esta é incompetente e desorganizada, no âmbito das suas funções enquanto delegada de grupo. Refere, ainda, que o sucesso dos alunos foi comprometido devido a esta situação (…)”.
11. Da ata da reunião referida em 9. resulta que “Subitamente, a professora B abriu a porta e, nesse momento, a sua irmã que estava junto da porta, no exterior, proferiu a seguinte afirmação «-Obrigada B pela ajuda!», batendo, em seguida, com a porta.”. Na mesma ata consta que a Demandante afirmou “relativamente às acusações que me são dirigidas nestes termos “incompetência e falta de organização”, considero-me ofendida no meu bom nome e profissionalismo, uma vez que estas poderão ser passiveis de matéria criminal, a saber: difamação. (…) Para concluir, desejaria que este assunto fosse alvo de um esclarecimento e de um pedido de desculpas, por escrito, e dirigido à minha pessoa, enquanto delegada de grupo, à coordenadora de departamento e à presidente do conselho executivo.”
12. No dia 15.11.2016 foi convocada por email uma reunião que se realizou no dia 18.11.2016, sendo o ponto um da ordem de trabalhos “informação sobre o conteúdo do correio electrónico enviado pela professora B à Coordenadora de Departamento de Ciências Exatas, da Natureza e das Tecnologias, professora D” e o ponto dois “Parecer dos elementos do grupo sobre a distribuição e funcionamento das coadjuvâncias”.
13. Da ata da reunião referida em 12. consta que a Demandante “manifestou uma grande angústia e revolta, atendendo à gravidade e à falta de veracidade das mesmas,” que “(…) a professora A afirmou sentir-se injuriada e exige, em prol do seu bom nome e da sua dignidade profissional, um pedido de desculpa redigido e enviado para a coordenadora do departamento, visto que oralmente a professora Isabel Xavier já o fez no final desta reunião.” e que “a presidente do Conselho Executivo, professora C, expressou a sua desolação em relação aos assuntos abordados no correio electrónico e atitude de resistência da professora B, em não reconhecer a gravidade das suas palavras, afirmando que as acusações não têm qualquer fundamento nem enquadramento na cultura da nossa escola (…)”.
14. As atas das reuniões referidas em 9 e 12 não se mostram assinadas pela Demandada e foram-lhe remetidas pela presidente do conselho executivo por email de 24.11.2016 que foi lido em 24.11.2016.
15. O email referido em 4. foi do conhecimento das professoras que compõe o grupo de matemática e da presidente do conselho executivo na Escola onde lecionam a Demandante e a Demandada e de alguns amigos destas.
16. Em 21.11.2016, às 20h28 o Mandatário da Demandada dirigiu fax à presidente do conselho executivo da Escola Básica dos 2.º e 3º ciclos dos X, onde solicitou a emissão de fotocópia simples das atas de 14 e 18 de novembro de 2016 e referiu “(…) quanto ao segmento exarado “o sucesso dos alunos foi seriamente prejudicado devido à incompetência e falta de organização da delegada”, não vai fazer, nem lhe passa pela cabeça fazer qualquer pedido de desculpas ou de retractação, pois não teve qualquer intuito malévolo ou nocidendi de ofender quem quer que fosse, nomeadamente a professora, A e, nesta sequência, e por referência ao referido segmento de escrita, limitou-se a exercer o seu direito de crítica e observação, dizendo e efluviando, não mais do que tal, que aquele episódio era e fora organizado de forma incompetente e nunca querendo atingir a idoneidade moral e profissional de quem quer que fosse.”
17. Em 06.12.2016 através de Oficio n.0 foi solicitado ao Diretor Regional de Inovação e Gestão a instauração de processo de inquérito relativamente ao conflito gerado entre a Demandante e a Demandada.
18. Em 06.01.2017 foi instaurado processo disciplinar à Demandada pela presidente do conselho executivo, C, pelas afirmações constantes do documento por aquela enviado à coordenadora do departamento das ciências exatas, em virtude de serem susceptíveis de atentar contra a dignidade pessoal e profissional da Demandante, pelas situações ocorridas na reunião de esclarecimento de 14.11.2016 e pelo não cumprimento das orientações emanadas através de correio eletrónico relativas à assinatura das atas das reuniões de esclarecimento datadas de 14.11.2016 e de 18.11.2016.
19. Por decisão datada de 13.07.2017 foi aplicada a sanção disciplinar de repreensão escrita, suspensa pelo período de um ano, à Demandada.
20. Após a primeira audiência de julgamento nos presentes autos, a Demandada dirigiu à presidente do conselho executivo, no dia 20.02.2018, requerimento datado de 19.02.2018 onde reconhece que algumas das palavras contidas no email referido em 4. e 5. à coordenadora do seu departamento foram impróprias e injustas apenas causadas por impulso face aos factos que ali enuncia e termina dando a conhecer que pediu desculpas pessoalmente à Demandante e reconhece que após os incidentes durante o presente ano letivo esta desempenhou com competência e organização as funções de delegada de que teve conhecimento.
21. A Demandada é professora de matemática há 23 anos e detentora do grau académico de mestrado em matemática obtido em 2002 na Universidade da Madeira, tendo exercido já funções como avaliadora interna do grupo de matemática na Escola Básica 2.º e 3.º Ciclos dos X e onde foi, durante cerca de dez anos, diretora de turma.
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FACTOS NÃO PROVADOS
22. A Demandante exerce funções desde 1996.
23. A Demandante exerce funções na Escola Básica dos 2.º e 3.º ciclos dos X desde 2005.
24. A reunião havida no dia 14.11.2016 decorreu de acordo com as retificações que a Demandada fez e juntou a fls. 67 a 70.
25. Com o conhecimento do email referido em 4. a Demandante teve agravamento de sintomas da doença de vertigens de que padece desde há vários anos.
26. O email referido em 4 foi do conhecimento de todos os colegas da Demandante.
27. Os colegas da Demandante alteraram a atitude para com esta após terem conhecimento do email referido em 4.
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Ouvidas nos termos do artigo 26.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, Demandante e Demandada confirmaram o teor dos seus articulados, tendo a Demandada referido que, por várias vezes, desde o final do ano passado, tem procurado a Demandante para lhe pedir desculpa caso a sua conduta a tenha ofendido. Afirmou ser professora de matemática há 23 anos e detentora do grau académico de mestrado em matemática obtido em 2002 na Universidade da Madeira, tendo exercido já funções como avaliadora interna do grupo de matemática na Escola Básica 2.º e 3.º Ciclos X e onde foi cerca de dez anos diretora de turma.
Explicou o que motivou o envio do email – que elaborou de madrugada,- que consta dos autos em 07.10.2016, foi o acumular de algumas situações que revelavam desorganização não na docência mas na coordenação e que influenciavam negativamente o seu trabalho, como por exemplo o facto de entrarem colegas para coadjuvância na sua sala de aula sem ser previamente avisada o que gera confusão entre os alunos. Asseverou que reconhece a Demandante como uma boa profissional, organizada e competente enquanto docente, a quem conhece desde os tempos da Faculdade, e que a situação em causa nos autos se deveu a uma circunstância concreta que lhe mereceu crítica profissional por revelar enquanto Delegada desorganização ao distribuir as coadjuvâncias da disciplina de matemática, entendendo que esta violou para consigo os deveres de informação, cooperação e colaboração. A Demandada mostrou-se arrependida por ter enviado à Escola onde ambas trabalham o email de fls. 8, no entanto referiu várias vezes nas duas audiências de julgamento – o que aliás reiterou na sua contestação e na carta que o seu mandatário escreveu em seu nome a se mostra junta ao autos- que não havia nada de mal no que escreveu por ser apenas uma opinião sobre uma atuação profissional (ou falta dela) por parte da Demandante, e que a mesma revelou, no âmbito da sua função de Delegada, ao distribuir as coadjuvâncias da disciplina de matemática e ao pedir os sumários sem ter estado na sala, desconhecimento, desorganização e falta de respeito para consigo.
A Demandante foi ouvida em declarações de parte à matéria das alíneas b), c) e e) do pedido.
Explicou que a situação a fez sentir triste, revoltada pelo facto de ter ajudado tanto a Demandada, sendo certo que nunca faltou ao trabalho. Referiu que temeu que o seu bom nome enquanto professora fosse afetado por ter tido sempre uma boa profissional.
Asseverou que o facto de ter sido enviado o mail constante dos autos à Escola onde trabalha levou a que entrasse numa grande tristeza, emagreceu, isolou-se no quarto, deixou de fazer a sua rotina diária como ir ao ginásio, - o que tinha de fazer por recomendação médica e onde ia pelo menos 3 vezes por semana - deixou de ajudar as filhas com os trabalhos escolares e que isso também afetou a sua relação matrimonial. Que chorava muito em casa e que apenas não entrou em depressão por ter bons amigos que a apoiaram e aconselharam. Explicou que tentou sempre manter-se forte emocionalmente, na Escola, para não exteriorizar o que sentia, sendo que piorava quando encontrava a Demandada.
Referiu que algumas das pessoas/colegas com quem falava diariamente ou tomava um café, se afastaram de si quando a Demandada enviou o email para a Escola. No entanto, não soube explicar em que atos concretos se traduziu essa alteração comportamental pelo que a descrição que fez não colheu credibilidade perante o Tribunal.
Acrescentou que inicialmente não falava na Escola sobre o assunto do email nem questionou as pessoas que se afastaram de si.
Relativamente ao conhecimento que teve do email junto aos autos referiu que soube no próprio dia, quando chegou à Escola, e a Coordenadora do Departamento a chamou e lhe contou que tinha recebido um email da Demandada e que lho mostrou.
Mais acrescentou que, no dia 18.11.2016, houve uma reunião da Escola Básica dos 2.º e 3º ciclos dos Louros onde se manifestou sobre o email como se sentindo revoltada, angustiada, triste, traída.
Explicou que as coadjuvâncias foram definidas no início do ano letivo, em reunião de grupo. Depois a Coordenadora do Departamento, a Professora D, foi ajustando outras coadjuvâncias e que cada uma das professoras tem no horário. Referiu ainda que existem quatro tempos no horário que, na altura, eram destinados a apoio para alunos. Que com a Professora D completou uns artigos, fazendo os ajustes e que entregou na sala de professores os horários às colegas para verificarem essas alterações. Entende, por isso, que não existiu qualquer desorganização ou má informação prestada aos colegas sobre as coadjuvâncias que cada uma devia ter e que fez o seu trabalho. Relativamente ao que motivou o email da Demandada à Escola, explicou que a Professora D falou com a Professora E e deu-lhe ordens para fazer coadjuvância, à 5.ª feira, na sala da Demandada, o que a Demandante desconhecia e que só soube quando a Professora E falou consigo e lhe transmitiu essa informação. Nesse momento, a Demandante perguntou-lhe se a Demandada já sabia ao que aquela terá respondido que tinha acabado de vir da sala dela. Concluiu que a Professora E foi à sala de aula da Demandada sem o seu consentimento e o seu conhecimento.
Confirmou que pediu à Demandada os sumários para por no “Place” o que fez na qualidade de Delegada.
A testemunha da Demandante F, professora, afirmou conhecer quer a Demandante quer a Demandada. Esclareceu que leciona a disciplina de português e que conheceu a Demandante na Escola dos Louros há 11 anos, tendo com ela trabalhado em co-docência. Que reconhece a competência da Demandante e a vê como boa profissional, não a revendo quer dentro, quer fora da sala, em expressões como “incompetente”, “postura desadequada”, “desorganização”, “faltar ao respeito”, “ser ousada”.
Explicou ter conhecimento de um email que foi escrito pela Demandada porque se comentou na Escola que as colegas tinham tido um desentendimento a partir de uma situação com um aluno e que tinham ficado desavindas, mas desconhece o teor do mesmo. Que nos anos de 2016/2017 se encontrava com a Demandante com regularidade, almoçando juntas e que em outubro de 2016 a notou mais triste, mais calada, menos comunicativa, mais reservada e que quando lhe perguntou o porquê a Demandante lhe disse que se devia ao que tinha sucedido com a Demandada. Que a Demandante é uma pessoa reservada que, por regra, não comenta a sua vida. Explicou não saber se houve alterações na vida pessoal da Demandante e que na sua opinião os colegas não mudaram a ideia profissional que tinham em relação àquela, nem nunca ouviu qualquer comentário. Descreveu o meio escolar como já tendo sido melhor mas que entende não haver um ambiente hostil, sendo que regra geral as pessoas conversam entre si. Do que conhece da Demandada acha-a uma boa pessoa, justa. Esclareceu que sabe que a Demandante padecia, já antes dos factos em causa nos autos, de vertigens mas que desconhece se teve com isso agravamento dos sintomas.
A testemunha da Demandante G, professora, referiu que conhece as partes há alguns anos. Que vê a Demandante e a Demandada como boas professoras e boas profissionais a quem entregaria os seus filhos. Explicou que teve conhecimento do email enviado pela Demandada, segundo julga, à Professora D, uma vez que é do grupo de matemática, tendo estado presente numa segunda reunião em que o assunto foi abordado. Referiu que a Professora D se dirigiu depois à direção. Que terá havido uma primeira reunião onde não esteve e onde o assunto também foi abordado. Confrontada com o documento 3 de fls. 8 confirmou ser a ata da reunião onde esteve e que no final da reunião, oralmente, a Demandada pediu desculpa à Demandante. Questionada, afirmou que as partes estiveram presentes na reunião em que ela própria esteve (por ser do departamento de matemática e foi quem redigiu a ata), a presidente do conselho executivo e a coordenadora do grupo de matemática, assim como o grupo todo de matemática. A reunião teve como objetivo cada elemento do grupo dar uma opinião sobre o email enviado pela Demandada à Escola, o que fizeram e ficou em ata, tendo sido opinião de quase todos que a Demandada teve um momento menos bom, que faltou à verdade quando afirmou aqueles factos sobre a Demandante. Explicou que a Demandada entendia que não tinha de pedir desculpa porque continuava com a mesma opinião sobre a Demandante, que esta tinha agido incorretamente, que tinha sido incompetente por não a ter avisado das coadjuvâncias. Referiu que não é normal haver uma reunião por causa de um email mas que este não foi um email qualquer pelo seu teor. Explicou que na reunião ninguém defendeu apenas uma das partes. Acrescentou que o que consta do email da Demandada em nada alterou a opinião que tem quer dela, quer da Demandante, uma vez que ambas fazem um bom trabalho. Afirmou que é muito desagradável que uma professora diga mal da outra porque as pessoas se retraem e o pensamento será sempre “se diz isto da outra, dirá mal de mim”.
Que nessa mesma reunião onde esteve presente se discutiu o assunto das coadjuvâncias porque não estavam a correr bem. Mas que estas situações são normais atendendo a que também o seu próprio horário sofreu muitas alterações pelo facto de a Demandada estar de baixa médica.
Relativamente ao problema das coadjuvâncias referiu que tendo os factos ocorrido em outubro o que sucedeu se deveu a que, sendo início do ano lectivo, os horários não estavam ainda bem definidos, e que a si própria já sucedeu várias vezes entrar alguém na sala sem ser previamente avisada mas que isso não é motivo para o teor do email que a Demandada escreveu. Referiu que entende que as acusações que são feitas no email em causa nos autos não têm fundamento porque os factos a que se refere não se devem a desorganização da Demandante. Que tendo a própria testemunha sido Delegada, nunca lhe coube informar os colegas que teriam na sala um outro professor em coadjuvância. Explicou que teve conhecimento que foi feita uma queixa por um encarregado de educação contra a Demandada. Referiu que inicialmente foi avaliadora interna da Demandante e que depois passou a ser a Demandada e que após o sucedido a Demandante pediu para ser outra pessoa a avaliá-la por poder existir constrangimento.
Explicou que conhece a Demandante por ter sido sua madrinha de casamento e saber, por isso, que, após o email, aquela começou a isolar-se, a estar mais em casa, deixou de sair (o que sucedia antes com frequência), de ir ao ginásio (chegou a ouvir a Demandada afirmar que não lhe apetecia ir) e de fazer caminhadas. Asseverou ao Tribunal ser visita frequente da casa da Demandante desde há muitos anos, apercebendo-se que a Demandante tem duas filhas e que mudou o relacionamento que tinha com elas. Esta parte do depoimento da testemunha veio a revelar-se inverosímil, uma vez que o marido da Demandante referiu que a testemunha tinha estado em sua casa no Natal, porque era dia de aniversário da Demandante.
Afirmou que a Demandante padece de vertigens e desequilíbrio e que nessa fase do email houve um agravamento desse problema. Referiu posteriormente que já em várias alturas viu a Demandante ter agravamento da sua saúde no que respeita a vertigens mas não depois do email. Nesta parte o depoimento da testemunha não mereceu credibilidade por ser manifestamente contraditório e incoerente. Mais acrescentou que segundo sabe a Demandante não faltou às aulas e que alguns colegas passaram a ter uma atitude mais fria com ela, o que segundo a sua opinião aconteceu porque quando duas colegas se desentendem as pessoas tendem a afastar-se para não tomar posição. Segundo a sua opinião, alguns dos colegas depois do email duvidaram da competência da Demandante e o assunto começou a ser conversado e espalhado. Num primeiro mês, o assunto ficou reservado, mas logo a seguir espalhou-se, sendo que continua a ser comentado. Esta parte do depoimento não se revelou credível atendendo a que testemunha não soube precisar quais os colegas que “tiveram uma atitude mais fria” ou em que é que consistiram essas alterações de atitude. É da opinião dos colegas que este assunto devia terminar e a Demandante pedir desculpa pelo que fez.
Confrontada com o documento de fls. 8 confirmou ser esse o email, em que a Demandada falava sobre a Demandante e mais dois colegas, a coordenadora e a professora E.
Confirmou que diariamente convive com a Demandante e que após ter conhecimento do email a notou mais triste, mais enervada, não queria que ninguém falasse sobre o assunto, e chorava. Acrescentou que daquilo que conhece da Demandante esta é uma pessoa reservada.
A testemunha H, professora de ensino especial, referiu ser amiga e colega da Demandante há vinte anos e colega da Demandada há três anos. Que as vê como duas excelentes profissionais. Referiu ter conhecimento do email de fls. 8 porque a Demandante lhe ligou muito perturbada no início do ano letivo a pedir-lhe para se encontrarem fora da escola, no pingo doce, onde lhe mostrou o teor do email, com acusações graves como “incompetente e desorganizada” e que a aconselhou a resolver o problema dentro do grupo. Referiu desconhecer com chegou o email em causa nos autos ao conhecimento da Demandante. Entende que a Demandada só escreveu o email por saturação, por cansaço por motivos anteriores que teve a ver com um problema relacionado com uma queixa de um encarregado de educação em que aquela foi visada e em que a Demandante como Delegada esteve envolvida.
Explicou que, fruto do email, a Demandante, apesar de reservada na Escola, no período pós laboral mostrou desgaste, chorava muito, ligava à testemunha à noite para desabafar, a relação com o marido degradou-se, descarregou nele e nas filhas, deixou de fazer atividades.
Referiu que enquanto professora de educação especial e antiga coordenadora dos currículos alternativos, entende as coadjuvâncias como uma mais-valia. Que sempre trabalhou em regime de coadjuvância, de pares dentro da sala de aulas, às vezes com mais duas ou três pessoas, e que nunca teve problemas em relação a outros professores. Explicou ser difícil organizar as coadjuvâncias com antecedência porque há uma série de procedimentos. Que nunca poderá ser atribuída a desorganização às Delegadas porque quem decide as coadjuvâncias é sempre um órgão da direção que estipula as horas eventualmente com a ajuda da coordenadora. Relativamente ao dever de informação explicou que tanto poderia ser a Delegada a informar a Demandada, como a coordenadora, a Professora D. O que poderá ter existido é falta de comunicação, não de organização. Referiu que quando tem coadjuvâncias, ela própria, muitas vezes, avisa a professora a cuja sala irá, por uma questão de educação. Que já lhe aconteceu entrarem na sala sem a avisar mas que não fez disso um problema.
Relativamente ao teor do email de fls. 8 (com o qual foi confrontada) na sua opinião nada justifica as expressões e acusações aí utilizadas, sendo que a Demandada devia ter dialogado com a Demandante e não proceder de forma pública como fez. Sobre o email desconhece se toda a Escola soube do mesmo, se os colegas mudaram a sua atitude, mas que quem trabalhou com a Demandante sabe o quão profissional ela é e que na sua opinião o email não mudaria o que os colegas pensam profissionalmente daquela. Afirmou que depois do email ter sido enviado, nunca ouviu ninguém duvidar da competência da Demandante. Pensa que o que mudou foi a auto estima, auto confiança, a vontade de fazer por parte da Demandante e que a nota mais reticente em relação a fazer as tarefas na Escola, questionando-se, por vezes, sobre o que vão pensar.
Referiu que um dos hobbys da Demandante é o ginásio onde ia 3 a 4 vezes por semana, considerando tratar-se até de um “refúgio” pelo desgaste provocado pela escola. Que com o email permaneceu esse gosto mas a vontade de sair de casa e de fazer atividades foi afetada. Disse desconhecer quantas vezes deixou de ir ao ginásio mas sabe que o deixou de fazer com a mesma frequência porque ia para casa e lhe ligava para desabafar. Explicou que, sendo uma pessoa reservada, a Demandante procurava aparentar boa disposição, cumprindo as suas funções mas que quem a conhecia sabia que não era esse o seu verdadeiro estado e que estava destroçada e desmoralizada. Confirmou que a Demandante tem problemas vertiginosos mas que não sabe se houve algum agravamento.
A testemunha da Demandante e seu marido, I teve, por vezes, um depoimento confuso, sem conhecimento concreto dos factos. Referiu que viu o email muito tempo depois do que aconteceu, porque a Demandante não lhe quis dizer o que se passava. Relativamente ao email disse que se referia a coisas que se tinham passado numa reunião e a atas, tendo ideia que a Demandada tinha chamado “mentirosa” à Demandante, e de ter dito coisas que esta não disse.
Apenas soube explicar que a Demandante se isolava no quarto, não queria falar com ninguém, não apoiava as filhas agora com 13 e 17 anos e não partilhava o que sentia. Afirmou que esse comportamento se prolongou durante dois ou três meses e que chegou a sugerir à Demandante acompanhamento psicológico. Explicou que conhece a Demandante desde que começou a ser professora e que nunca teve conhecimento de qualquer queixa sobre o seu trabalho.
Que a Demandante deixou de ir ao ginásio durante semanas, o que fazia 3 ou 4 vezes por semana e às vezes também ao sábado. Referiu que as vertigens de que a Demandante padece se agravaram muito desde o email e que chegou a ficar acamada. No entanto não soube explicar em que mês ou ano isso aconteceu e afirmou que a Demandante não faltou às aulas.
Afirmou que costumam receber pessoas em casa mas não é habitual ter em casa a visita das testemunhas G e H, que só ali estiveram no dia do aniversário da Demandante em 25 de dezembro, razão pela qual o Tribunal desvalorizou nesta parte o depoimento das mesmas quando descreveram alterações na dinâmica familiar daquela e factos que alegadamente presenciaram.
A testemunha da Demandada, J, professora e colega daquela e da Demandante, afirmou que não teve conhecimento da situação do email, nem que tenham sido proferidas quaisquer expressões injuriosas pela Demandada à Demandante. Esclareceu que toda a gente falou no caso de ter havido uma queixa por parte de um encarregado de educação que se dirigiu diretamente ao conselho executivo da Escola, não tendo, na sua opinião, o procedimento posteriormente adotado sido o mais correto uma vez que a Presidente tomou partido do encarregado de educação o que despoletou depois a situação que existe entre a Demandante e a Demandada. Explicou que ouviu dizer que a Demandante, por ser Delegada da disciplina foi chamada ao conselho executivo por causa dessa situação. Que relativamente às coadjuvâncias não tem conhecimento de nada em particular. Na opinião da testemunha a Escola onde trabalha, assim como as partes, não vive um ambiente saudável, existindo muita maledicência, tendo sido desde há alguns anos criados dois grupos mas não por causa desta situação. Referiu que não teve conhecimento do email enviado pela Demandada à Coordenadora. Explicou que não costuma frequentar a sala de professores e raramente tem contacto com colegas, falando mais com a Demandada por fazerem parte dos mesmos conselhos de turma e ter por ela empatia. Referiu que não tem estado com a Demandante ultimamente por não terem os mesmos conselhos de turma. Que relativamente ao assunto em discussão nos autos nunca ouviu falar de mudanças anímicas da Demandante. Referiu ter sido testemunha no processo disciplinar da Demandada junto da Inspeção Regional de Educação. Explicou ter tido um desentendimento muito grave com a Sr.ª Presidente da Escola, a Professora C e ter vivido um “inferno” na Escola pelo que quando a Demandada lhe pediu para ser testemunha acedeu de imediato. Na opinião da testemunha a Presidente da Escola teve um comportamento desigual em relação às partes. Ouviu dizer na Escola que existiram reuniões posteriores à receção do email entre os membros do Conselho executivo e as colegas da disciplina de matemática, mas sendo do grupo de português não esteve presente em nenhuma.
A testemunha da Demandada, K, professora de profissão e sua irmã, afirmou que vive com a Demandada e a acompanha diariamente quer na parte emocional, quer na parte profissional. Afirmou que a irmã escreveu um email à Professora D por causa das coadjuvâncias, tendo previamente tentado falar com esta mas que não foi possível.
Explicou que o desentendimento da Demandada com a Demandante se deveu a falta de comunicação desta enquanto Delegada que levou a que uma colega entrasse na sala de aulas sem a ter avisado. Uma outra questão teve a ver com o facto de a Demandante ir fazer coadjuvância à turma mas faltou a duas aulas e pediu à Demandada os sumários para por no “Place”, o que a revoltou e indignou. Que, na sua opinião, o email apenas pôs em causa a organização das coadjuvâncias e não a Demandante enquanto docente. Referiu que, poucos dias depois do envio do email, a Demandada foi chamada à Escola para uma reunião e que a acompanhou, esperando dentro da Escola pelo fim da reunião uma vez que conhecia as funcionárias. Que nessas circunstâncias de tempo e lugar ouviu risos, gente a falar ao mesmo tempo (discursos impercetíveis), cadeiras a arrastar e que uma funcionária dizia para a outra “há ali reunião”. Explicou que a determinada altura ouviu uma voz mais grossa, que reconheceu como sendo da Demandante, afirmar “eu quero justiça terrena” e que ficou assustada. Referiu que quando viu a irmã sair com uma “cara de arrasada”, e porque percebeu que a Presidente não estava a deixar a Demandada explicar a situação, abriu a porta e disse “obrigada C pela ajuda que está a dar à minha irmã”. Referiu que na primeira reunião não esteve presente mas que a irmã chegou a casa a chorar e que lhe disse sentir-se humilhada. Que nessa reunião a Demandada não pediu desculpa à Demandante o que só fez na segunda reunião porque foi obrigada pela Presidente a fazê-lo perante todas as colegas.
Mais acrescentou que a Demandada afirmou que pretendia com o email chamar a atenção à Escola, porque havia grande desorganização da Escola e da delegada de grupo, a Demandante. Mais esclareceu que a Demandada foi visada num processo disciplinar o que a perturbou muito. Que algumas colegas lhe chegaram a ligar a dizer que a Demandada estava a ser humilhada. Explicou que a Demandada chegou a falar com a coordenadora mas que de nada adiantou e que a presidente professora C sempre tomou posição a favor da Demandante. Referiu que não assistiu à redação do email pela Demandada nem ao seu envio, sendo que lhe disse que iria escrever e enviar o email porque não tinha tido resposta da coordenadora D.
Tendo-lhe sido exibido o email de fls. 8, confirmou que foi esse o email que foi enviado pela Demandada.

O Tribunal analisou ainda todo o acervo documental junto aos autos, quer pela Demandante, quer pela Demandada, designadamente: ata de 11.09.2016 (eleição da Demandante como delegada); email datado de 07.10.2016; ata de 18.11.2016; carta enviada pelo Mandatário da Demandada à Presidente do conselho executivo da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos dos Louros por fax de 21.11.2016; declaração emitida pela Presidente do conselho executivo da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos dos Louros que atesta a instauração de inquérito à Demandada; print do ginásio frequentado pela Demandante com indicação da frequência no mês de outubro de 2016; convocatória datada de 10.1.2016 para reunião no dia 14.11.2016; ata da reunião de 14.11.2016; despacho de instauração de processo disciplinar de 06.01.2017; ata de 14.11.2016 retificada pela Demandada; decisão de processo disciplinar datada de 13.07.2017; requerimento subscrito pela Demandada e dirigida à Presidente do Conselho Executivo da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos X, datada de 19.02.2018 e com carimbo da referida Escola de 20.02.2018.

Para dar como provados os factos 1 a 21 o Tribunal valorou as declarações das testemunhas da Demandante e da Demandada, exceto na parte em que se revelaram contraditórias ou confusas e que se assinalaram supra. Valorizou-se o teor dos documentos juntos aos autos e enunciados supra, com exceção da ata que a Demandada indica no próprio documento ter retificado.

A matéria não provada em 22 a 27 resultou da circunstância de, sobre ela, não ter sido produzida prova bastante capaz de fundamentar a convicção do tribunal, sequer com apelo às regras da experiência, tendo em conta a distribuição do seu ónus nos termos previstos no Código Civil. Nenhuma prova foi feita que permitisse ao Tribunal concluir pelo número de anos em que a Demandante é professora ou desde quando exerce as suas funções na Escola da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos dos X. Relativamente à ata rectificada pela Demandada e por si junta aos autos não resulta da prova que as modificações que aí fez sejam verdadeiras e que a reunião tenha decorrido como descreve, desde logo porque não é isso que resulta do relatório do processo disciplinar onde se dá como provado que a Demandada não assinou as atas apesar de para tanto lhe terem sido enviadas. Por outro lado, pese embora fossem várias as testemunhas que afirmaram que a Demandante padece desde há vários anos de vertigens, nenhuma prova resultou que permitisse ao Tribunal concluir por um agravamento dessa situação clinica após o conhecimento do email pela Demandante, limitando-se as testemunhas a dizer que a tinham visto doente mas muitas vezes antes dos factos descritos nos autos.
Quanto ao alegado conhecimento de toda a comunidade escolar do email de fls. 8 redigido e enviado pela Demandada, tal não resultou provado uma vez que apenas se apurou do depoimento das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento que tiveram conhecimento do email os membros do grupo de matemática, a presidente do conselho executivo e alguns amigos da Demandante.
Não resultou igualmente provado que os membros da comunidade escolar, designadamente professores, tivessem alterado a sua atitude ou opinião profissional sobre a Demandante, sendo que todas as testemunhas, inclusive as da Demandada afirmaram que a reconhecem como boa profissional e competente e, por outro lado, nenhuma prova foi feita no sentido de concretizar quem teve alteração de comportamento ou em que consistiu essa alteração.
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VII – ENQUADRAMENTO JURÍDICO LEGAL
Com base na matéria de facto provada, cumpre apreciar os factos e aplicar o direito.
A presente ação funda-se na responsabilidade civil por factos ilícitos decorrente de uma alegada conduta injuriosa ou difamatória perpretada pela Demandada, enquadrando-se, em termos de competência material deste Tribunal, nas alíneas c) e d) do n.º 2, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
Estando em causa um pedido de indemnização civil fundado na prática de crime, para que seja possível julgar tal pedido é necessário, antes de mais, decidir se houve ilícito criminal (J.O. Cardona Ferreira, Julgados de Paz, Coimbra Editora, 3.ª edição).
Nos termos do artigo 180.º n.º 1 do Código Penal, “quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, ou reproduzir uma tal imputação ou juízo, é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias”, sendo que “à difamação e à injúria verbais são equiparadas as feitas por escrito…” (artigo 182º do mesmo Código).
Conforme se decidiu no Acórdão da Relação de Lisboa de 06.02.1996 (in www.dgsi.pt) Difamar e injuriar mais não é, basicamente, que imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, entendida aquela como o elenco de valores éticos que cada pessoa humana possui, tais como o carácter, a lealdade, a probidade, a rectidão, ou seja a dignidade subjectiva, o património pessoal e interno de cada um, e esta última como sendo o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, bom-nome, o crédito, a confiança, a estima, a reputação, ou seja a dignidade objectiva, o património que cada um adquiriu ao longo da sua vida, o juízo que a sociedade faz de cada cidadão, em suma a opinião pública.
No Acórdão da Relação de Évora, de 02.07.1996 (in www.dgsi.pt), onde se escreveu Um facto ou juízo, para que possa ser havido como ofensivo da honra e consideração a qualquer pessoa, deve constituir um comportamento com objecto eticamente reprovável, de forma a que a sociedade não lhe fique indiferente, reclamando a tutela penal de dissuasão e repressão desse comportamento. Supõe, pois, a violação de um mínimo ético-necessário à salvaguarda sócio-moral da pessoa, da sua honra e consideração.
Peticiona a Demandante a condenação da Demandada no pagamento de uma indemnização por danos por si sofridos, cabendo analisar a sua pretensão à luz do instituto da responsabilidade civil.
Segundo os ensinamentos de Almeida Costa existe responsabilidade civil quando uma pessoa deve reparar um dano sofrido por outra. A lei faz surgir uma obrigação em que o responsável é devedor e o lesado credor. Trata-se, portanto, de uma obrigação que nasce directamente da lei e não da vontade das partes, ainda que o responsável tenha querido causar o prejuízo (Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 6.ª Edição, Almedina, 2006, páginas 433-435).
Assim, a principal função da responsabilidade civil é reparar danos, daí que não havendo danos não há responsabilidade civil.
Importa, no entanto, referir que quanto à sua natureza ou origem a responsabilidade civil pode ser contratual (obrigacional) ou extracontratual (extra-obrigacional).
A responsabilidade contratual tem a sua origem no incumprimento de uma obrigação (o devedor não cumpriu a obrigação a que estava adstrito) a qual pode advir de um contrato, de um negócio unilateral ou da lei, enquanto a responsabilidade extracontratual abarcará situações de violação de direitos absolutos ou da prática de atos que causam prejuízos a outrem.
No âmbito da responsabilidade extracontratual pode considerar-se a responsabilidade por facto ilícito (o agente tem de atuar com culpa), pelo risco (o agente responde mesmo sem culpa) e por facto lícito danoso (permite-se a interferência em interesses alheios, mas que gera como contrapartida a obrigação de indemnizar pelos danos causados).
No caso em apreço, a ausência de qualquer vínculo especial entre as partes e a eventual ocorrência de culpa, permite-nos concluir que a obrigação de indemnizar está associada à responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.
O normativo geral que permite fundamentar a responsabilidade civil por factos ilícitos é o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil, segundo o qual aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
A propósito do mencionado normativo legal refere Antunes Varela (João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 10.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2000, página 525; Pires de Lima e Antunes Varela, Código civil Anotado, Volume I, 4ª Edição, Coimbra Editora, 1987, página 471), que a simples leitura do preceito mostra que vários pressupostos condicionam, no caso geral da responsabilidade por factos ilícitos, a obrigação de indemnizar imposta ao lesante. Cada um desses pressupostos desempenha um papel especial na complexa disciplina das situações geradoras do dever de reparação do dano.
Assim, a responsabilidade civil por factos ilícitos estabelece como pressupostos da obrigação de indemnizar, o facto voluntário, a ilicitude, o nexo de imputação do facto ao lesante (culpa), o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Em primeiro lugar, o facto do agente tem de ser um facto voluntário, isto é, um facto dominável, controlável pela vontade humana. Não tem que se tratar de um ato representado ou querido pelo agente, já que, desta forma, ficariam de fora os atos negligentes. Este facto voluntário pode, ainda, ser um facto positivo (consiste numa ação), ou um facto negativo (consiste numa abstenção ou omissão), quando haja, por força da lei ou de negócio jurídico, o dever de praticar o ato omitido (artigo 486.º do Código Civil).
A obrigação de indemnizar exige ainda que se trate de um facto ilícito, consistindo a ilicitude na reprovação da conduta do agente no plano geral e abstrato da lei, antes da culpa que se reporta a um comportamento concreto.
Um das três formas gerais de ilicitude consagradas é a violação de disposições legais de proteção (artigo 483.º do Código Civil), (a título exemplificativo: leis penais, de trânsito, de certas actividades como a construção civil, electricidade), a mesma abrange a proteção de interesses coletivos e, simultaneamente, proteção interesses particulares sem que se confira qualquer direito subjetivo.
Acresce como terceiro pressuposto da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, geradora da obrigação de indemnizar, a culpa ou nexo de imputação do facto ao lesante. A culpa é a censurabilidade relativa à atuação do agente, que poderia e deveria agir de outro modo, sendo a sua conduta reprovada. Contudo e para que se possa formular esse juízo dirigido ao agente é imprescindível que o mesmo seja imputável (conforme resulta do disposto no artigo 488.º do Código Civil, consiste na capacidade de entender e querer). Segundo Antunes Varela, diz-se imputável a pessoa com capacidade natural para prever os efeitos e medir o valor dos actos que pratica e para se determinar de harmonia com o juízo que faça acerca deles (João de Matos Antunes Varela, in obra citada, página 563).
Independentemente de culpa só existe obrigação de indemnizar nos casos especificados na lei (artigo 483.º, n.º 2 do Código Civil). O juízo de censura a formular, apreciado em abstrato (segundo a diligência de um bom pai de família – artigo 487.º, nº 2 do Código Civil), pode revestir as modalidades de dolo ou de negligência.
O dolo pode manifestar-se sob a forma de dolo direto (quando o agente representa no seu espírito determinado efeito da sua conduta e quer esse efeito como fim da sua atuação apesar de conhecer a ilicitude desse resultado), necessário (quando o agente embora não queira diretamente o efeito previu-o como consequência necessária da sua conduta), ou eventual (quando o agente representa no seu espírito o efeito como consequência eventual ou possível da sua conduta, ou seja, o agente conforma-se com a verificação do resultado).
A negligência ou mera culpa divide-se em negligência consciente (quando o agente prevê a produção do facto ilícito como um efeito eventual ou possível mas não se conforma com a verificação do resultado e não toma as providências necessárias para o evitar) e na negligência inconsciente (quando o agente não prevê sequer a produção do facto ilícito como possível, trata-se de imperícia ou inaptidão).
Em quarto lugar, exige-se a existência de um dano, uma lesão no interesse juridicamente tutelado. Antunes Varela define o dano como a perda in natura que o lesado sofreu, em consequência de certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar. É a lesão causada no interesse juridicamente tutelado, que reveste as mais das vezes a forma de uma destruição, subtracção ou deterioração de certa coisa, material ou incorpórea (João de Matos Antunes Varela, in obra citada, página 598). Tal dano que terá de se aferir em concreto, pode traduzir-se num dano patrimonial ou num dano não patrimonial. É em função do dano que o instituto da responsabilidade civil extracontratual realiza a sua finalidade essencialmente reparadora ou reintegrativa (neste sentido Mário Júlio de Almeida Costa, in ob. cit., página 590).
Por último, exige-se, ainda, um nexo de causalidade entre o facto e o dano, tendo o nosso legislador consagrado a teoria da causalidade adequada na sua vertente negativa (artigo 563.º do Código Civil), que sustenta que uma condição só deve ser tida como causa de dano se, segundo a sua natureza geral, se revelar apropriada para o provocar (cf. Manuel de Andrade, Teoria Geral das Obrigações, 3.ª edição, Livraria Almedina, Coimbra, 1966, página 355).
O nexo de causalidade, como facto constitutivo do direito do lesado, tem ainda de ser provado por este (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).
À responsabilidade civil por ofensas à personalidade física ou moral (artigo 7.º, n.º 2, 1ª parte do Código Civil) são aplicáveis, em termos gerais, os artigos 483.º e seguintes do Código Civil, sendo que o bom nome surge expressamente tutelado no artigo 26.º, n.º 1, da CRP, e artigo 484.º do Código Civil (neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos do STJ de 09.07.1976, de 03.10.1995 in www.dgsi.pt).
Também o artigo 12.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem (aplicável ex vi artigo 8.º n.º 1 da CRP), protege entre outras, a honra e reputação das pessoas, prevendo que ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Sendo que contra intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.
Gomes Canotilho e Vital Moreira ("Constituição da República Portuguesa Anotada", 3ª edição revista, Coimbra Editora, pág 177), entendem o direito à integridade pessoal como sendo um direito organicamente ligado à defesa da pessoa enquanto tal, compreende-se não apenas a forma enfática utilizada pela Constituição, («...é inviolável»: nº 1) mas também a protecção absoluta que lhe confere, não podendo ser afectado mesmo no caso de suspensão de direitos fundamentais na vigência de estado de sítio ou de estado de emergência (artigo 19º, nº 6).
E acrescentam: Este direito vale, naturalmente, não apenas contra o Estado mas, igualmente, contra qualquer outra pessoa.
Beleza dos Santos ("Algumas considerações jurídicas sobre os crimes de difamação e de injúria" in RLJ, Anº 92, nº 3152, págs. 164 e segs.) refere-se à honra e consideração devidas a qualquer ser humano como a honra refere-se ao apreço de cada um por si, a auto-avaliação no sentido de não ser um valor negativo, particularmente do ponto de vista moral. A consideração ao juízo que forma ou pode formar o público no sentido de considerar alguém um bom elemento social (..)O sentimento da honra e o apreço pela consideração dos outros não se encontram dissociados na generalidade das pessoas, antes se combinam, por modo que um dos motivos por que se aprecia a própria dignidade é o da consideração pública e uma das razões por que esta pode procurar-se é a de confirmar e estimular a afirmação do próprio valor perante nós mesmos. Em alguns casos predomina o desejo de a pessoa valer por si, em outros o de se fazer valer aos olhos dos outros.
Tem-se entendido na jurisprudência dos tribunais superiores que para subsumir o facto praticado à previsão do artigo 484.º do Código Civil basta que se verifique a mera culpa, não sendo de exigir que a afirmação ou difusão do facto seja voluntário, no sentido de haver, por parte de quem afirma ou difunde esse facto, a intenção de prejudicar o bom nome da pessoa a quem é imputado o facto afirmado ou difundido, pouco importando que o facto afirmado ou divulgado corresponda ou não à verdade, contanto que seja suscetível, dadas as circunstâncias do caso, de abalar o prestígio de que a pessoa goze, ou o bom conceito em que seja tida no meio social em que vive ou exerce a sua atividade. Assim, a gravidade do dano há-de aferir-se por um padrão objectivo que tenha em conta o circunstancialismo de cada caso, e não por padrões subjectivos resultantes de uma sensibilidade embotada ou, ao invés, especialmente sensível, cabendo ao tribunal dizer, em cada caso, se o dano, dada a sua gravidade, merece ou não tutela jurídica.
Na doutrina, sobre a questão, Mário Júlio Almeida Costa (cfr. "Direito das Obrigações", 4ª edição, pág. 371.), considerando a ofensa do crédito ou do bom nome como um dos casos especiais de ilicitude, entende que parece indiferente, todavia, que o facto afirmado ou difundido seja verdadeiro ou não. Apenas interessa que, dadas as circunstâncias concretas, se mostre susceptível de afectar o crédito ou reputação da pessoa visada (...). Antunes Varela (cf. "Das Obrigações em Geral" - Vol I, 7ª edição, Coimbra, 1973, págs. 539 e segs.) por sua vez considera quanto aos factos antijurídicos previstos na lei que além das duas directrizes de ordem geral fixadas no artigo 483.º sobre o conceito da ilicitude como pressuposto da responsabilidade civil, o Código trata de modo especial alguns casos de factos antijurídicos.
"O primeiro é o da afirmação ou divulgação de factos capazes de prejudicarem o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa
. Pires de Lima e Antunes Varela (cf. Código Civil Anotado, volume I, 4.ª edição revista e atualizada, págs. 485 e 486) entende que pouco importa que o facto afirmado ou divulgado corresponda ou não à verdade, contanto que seja susceptível, dadas as circunstâncias do caso, de diminuir a confiança na capacidade e na vontade da pessoa para cumprir as sua obrigações (prejuízo do crédito) ou de abalar o prestígio de que a pessoa goze ou o bom conceito em que seja tida (prejuízo do bom nome) no meio social em que vive ou exerce a sua actividade.

Finda a incursão teórica sobre o enquadramento jurídico da questão que opõe a Demandante e a Demandada, cumpre descer ao caso concreto que nos cabe julgar.

Alega a Demandada que apenas deu a sua opinião sobre a conduta profissional da Demandante nas funções que exerce enquanto Delegada e não enquanto docente.
Como se decidiu, entre outros, no Acórdão do STJ de 27.05.1997, (in Col. Jur. - Acórdãos do STJ, Ano V, Tomo II, págs. 102 e segs.) e decorre do seu sumário, I - O direito-dever de expressar o pensamento não está, nem pode estar, sujeito a qualquer tipo de censura; mas identicamente tem de ser exercido com claro índice cívico, de respeito do Homem pelo Homem; III - O direito de livre expressão não é absoluto devendo respeitar o direito à honra e ao bom nome, salvo casos excepcionais. IV - A expressão de facto verdadeiro, se injustificada, pode ser passível de sanção legal. V - O dever de indemnizar não está dependente de intencionalidade ofensiva bastando a mera culpa (...) VII - A informação deve pautar-se por regras éticas e deontológicas rigorosas, adequadas a uma natural convivência cívica.
Também do Acórdão do STJ de 05.03.1996 (in CJ - Acórdãos do STJ -, Ano IV, Tomo I, 1996, págs. 122 e segs.) resulta que III- O conceito de honra importa sempre um juízo de valor, pelo que a formulação de tal juízo implica matéria de direito. IV - Havendo conflito entre direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, a sua harmonização concreta depende de critérios metódicos, abstractos, tal como o princípio de concordância prática ou a ideia do melhor equilíbrio possível entre os direitos colidentes. V - A liberdade de expressão deverá ser exercida sem subordinação a qualquer forma de censura, autorização, caução ou habilitação, mas com respeito pela Constituição e leis ordinárias. VI - É ilícita a conduta que atinge a honra de outrem já que atribui a este factos desonrosos, sem apoio em fontes seguras e já depois de terem sido objecto de desmentidos credíveis. VII - É assim devida indemnização quanto a danos não patrimoniais.
Por sua vez Antunes Varela ensina (cf. Das Obrigações em Geral, 7ª edição, vol. I, pág. 559) que para haver culpa, no caso de afirmação ou divulgação de factos susceptíveis de prejudicar o crédito ou o bom nome de alguém, basta, em princípio, que o agente queira afirmar ou difundir o facto, pouco importando que ele soubesse ou não que, em consequência disso, o lesado perderia um negócio vantajoso ou uma colocação rendosa ou veria desfeito o seu noivado. Desde que o agente conheça ou devesse conhecer a ilicitude ou o carácter danoso do facto, é justo que sobre ele recaia o encargo de reparar os danos efectivamente causados por esse facto.
Resultando dos factos provados que no email de fls. 8 a Demandada escreveu sobre a Demandante expressões como “postura desadequada da Delegada do Grupo de Matemática, A”, “o sucesso dos alunos foi seriamente prejudicado devido à incompetência e falta de organização da delegada”, “esta teve uma grande falta de respeito”, “a colega teve a ousadia”, sempre essas afirmações – conhecidas por muitos ou por poucos – seriam suscetíveis de atingir o bom nome profissional, a honra e consideração que são devidas à Demandante e merecem a proteção da Lei, não podendo ser entendidas como liberdade de expressão da Demandada que poderia ser exercida sem respeito pela Constituição e pelas leis ordinárias. E na verdade, diga-se, a referida conduta e as expressões escritas pelas Demandada foram objecto de censura pelas próprias colegas que testemunharam em julgamento e que consta das atas juntas aos autos que, apesar de a entenderem como boa profissional, expressaram que não procedeu corretamente.
Como se pode ler no Acórdão do STJ de 27.05.97 (in www.dgsi.pt), a imputação do facto ao agente pressupõe, naturalmente, um juízo jurídico-normativo a realizar, na falta de outro critério geral, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (nº 2 do artigo 487º do C. Civil), ou seja, em abstracto, de acordo com a conduta normal do cidadão comum, e com a ética, a deontologia, o civismo exigíveis à generalidade das pessoas.
A conduta e atitude da Demandada, ao enviar o email de fls. 8 para a Coordenadora do Departamento das Ciências Exatas, da Natureza e das Tecnologias, professora D, - mesmo que o teor do email não viesse a ser conhecido pela comunidade escolar – são à luz do direito vigente reprováveis e conduzem à verificação de responsabilidade civil extracontratual civil por factos ilícitos por preencher os seus pressupostos.
Revelam-se atentórias do bom nome a reputação da Demandante as expressões que a Demandada utilizou no seu email que se mostra junto a fls. 8, por serem diminutivas das capacidades intelectuais da Demandante, por porem em causa a sua competência enquanto delegada, por serem inverosímeis face à prova que foi produzida em sentido contrário. Como se referiu no Acórdão do STJ de 10.03.1973 (in BMJ n.º 225, pág. 222 e segs) "atribuir a alguém uma conduta contrária e oposta àquela que o sentimento da generalidade das pessoas exige do homem medianamente leal e honrado, é atentar contra o seu nome, reputação e integridade moral".
Sem necessidade de mais considerandos, entendendo os já descritos como bastantes e elucidativos, conclui-se que as expressões utilizadas pela Demandada no email que dirigiu à Coordenadora do Departamento de Ciências Exatas, da Natureza e das Tecnologias da Escola EB 2.º e 3.º Ciclos da Escola dos Xs em 09.11.2016 referindo-se à Demandante, são de natureza manifestamente ilícita e subsumíveis à previsão do artigo 484.º do Código Civil, sendo geradoras de responsabilidade civil da Demandada, mesmo que se entendesse – o que não resultou dos autos – que inexistisse por parte desta a intenção de prejudicar no seu bom nome a reputação a Demandante, afetando-a na sua honra e consideração, porquanto sempre existiria mera culpa, o que apenas relevaria em termos de graduação indemnizatória.
No caso em apreço, e considerando que se trataram de expressões proferidas em email dirigido a uma coordenadora de grupo e que foram objeto de análise em duas reuniões de grupo, puderam ser lidas por vários colegas, pelo que não pode deixar de se considerar que a ofensa foi praticada através de meio que facilitou a sua divulgação, sendo ainda certo que a Demandada conhecia a falsidade das imputações, sendo disso prova o pedido de desculpas que consta da ata junta aos autos, que reiterou, segundo explicou ao Tribunal, no final do ano passado e que formalizou na primeira sessão de julgamento e também por escrito junto da presidente do conselho executivo.
Estamos perante ações, factos positivos (afirmações injuriosas), que importam a violação de um dever geral de abstenção, de um dever de não ingerência na esfera de ação do titular do direito absoluto, neste caso dos direitos de personalidade da Demandante (A. Varela, Das Obrigações em Geral, vol I, pág 527). É, pois de concluir pela ilicitude da conduta da Demandada e pela sua culpabilidade.
Relativamente aos danos apurados em sede de matéria dada como provada, in casu são de natureza não patrimonial e nessa medida resultam da lesão de bens estranhos ao património do lesado, designadamente, os direitos de personalidade e não sendo estes prejuízos avaliáveis em dinheiro, a atribuição de uma soma pecuniária legitima-se não pela ideia de indemnização ou restituição, mas pela ideia de compensação (neste sentido Mota Pinto, Teoria Geral e o Acórdão do STJ de 16.12.1993. Os danos não patrimoniais são indemnizáveis desde que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigo 496.º n.º 1 do Código Civil), sendo que de acordo com o n.º 4 do artigo 496.º do Código Civil a gravidade se mede por um padrão objetivo, devendo o dano deve ser de tal modo grave que justifique a indemnização, embora se devam ter em conta as circunstâncias concretas.
Com ensina Antunes Varela e outros civilistas, a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo, que tenha em conta o circunstancialismo de cada caso e não por padrões subjetivos, resultantes de uma sensibilidade embotada ou, em contrapartida, especialmente sensível, cabendo ao tribunal dizer, em cada caso, se o dano, dada a sua gravidade, merece ou não tutela jurídica.
Por último é ainda necessária a existência de nexo de causalidade entre o facto e os danos ocasionados. Ora, foi a conduta da Demandada – expressões no email de fls. 8 - que determinou os danos morais sofridos pela Demandante, pelo que se mostra estabelecido um nexo de causalidade.
No caso dos autos os danos traduziram-se em isolamento, angústia, revolta, profunda tristeza e determinou diminuição das suas idas ao ginásio, danos que merecem a tutela do direito, havendo por isso que compensá-los com uma indemnização.
A título de indemnização a Demandante pede a condenação da Demandada no valor de 3.000,00€ (três mil euros).
Ora a indemnização deve sempre que possível reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (artigos 562.º a 564.º e 566.º do Código Civil) e, não obstante a dificuldade da avaliação dos danos morais, há que determinar, o quantum indemnizatório. Por um lado, atender à sensibilidade do lesado, ao sofrimento por ele suportado (físico e psicológico) à sua situação sócio-económica, e por outro, há que ter em linha de conta o grau de culpa do agente, a sua situação sócio-económica e as demais circunstâncias do caso.
Face à factualidade assente, atendendo aos danos sofridos pela Demandante e ao facto de não resultar provado que toda a comunidade escolar tenha tido conhecimento do email de fls. 8 enviado pela Demandada à coordenadora de grupo e também ao facto de não se ter provado que os colegas alteraram a sua conduta e opinião para com a Demandante ou que tenha tido um agravamento do seu estado de saúde devido ao teor do referido email, atenta a jurisprudência dos Tribunais superiores, um julgamento equitativo baseado no bom senso e na justa ponderação da prova, julgamos adequado fixar à Demandante, a título de compensação por danos não patrimoniais sofridos em consequência dos factos praticados pela Demandada, a indemnização no montante de €500,00 (quinhentos euros).
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Peticiona ainda a Demandante a condenação da Demandada a elaborar missiva a ser remetida para o conselho diretivo da Escola Básica do 2° e 3° ciclos dos Louros, desmentindo todas as acusações e insinuações que fez sobre as condutas profissionais e pessoais da Demandante.

Resulta da matéria provada que a Demandada pediu oralmente desculpa à Demandante no decorrer da reunião de 18.11.2016. Posteriormente e no final do passado ano, tendo já sido citada para o presente processo, a Demandada pediu novamente desculpa à Demandante na Escola X onde ambas trabalham. No início da audiência de julgamento a Demandada pediu desculpa à Demandada perante os Ilustres Mandatários, a Juíza de Paz e a Sr.ª Técnica de Atendimento, mas sempre afirmando que só o fez porque a Demandante não lhe comunicou as coadjuvâncias e lhe pediu os sumários sem ter ido à sala de aulas. Após a primeira audiência de julgamento nos presentes autos, a Demandada dirigiu à presidente do conselho executivo no dia 20.02.2018 requerimento datado de 19.02.2018 onde reconhece que algumas das palavras contidas no email dirigido à Sr.ª coordenadora D foram impróprias e injustas apenas causadas por impulso face aos factos que ali enuncia e termina dando a conhecer que pediu desculpas pessoalmente à Demandante e reconhece que após os incidentes durante o presente ano letivo esta desempenhou com competência e organização as funções de delegada de que teve conhecimento.
Desde o dia 09.11.2016, data em que a Demandada remeteu um email à Coordenadora do Departamento das Ciências Exatas, da Natureza e das Tecnologias, professora D, que a sua conduta se vem modificando alternando entre o assumir das expressões como injustas e menos próprias e o afirmar perentoriamente que nem lhe passa pela cabeça fazer qualquer pedido de desculpas ou de retractação, pois não teve qualquer intuito malévolo ou nocidendi de ofender quem quer que fosse, nomeadamente a professora, A e, nesta sequência, e por referência ao referido segmento de escrita, limitou-se a exercer o seu direito de crítica e observação, dizendo e efluviando, não mais do que tal, que aquele episódio era e fora organizado de forma incompetente e nunca querendo atingir a idoneidade moral e profissional de quem quer que fosse.
Analisando o teor da comunicação que dirigiu à Presidente do Conselho Executivo da Escola dos X em 20.02.2018, (6 dias antes da segunda sessão da audiência de julgamento), se a Demandada começa por reconhecer que algumas palavras (sem as precisar) contidas no email de 09 de novembro (sem especificar o ano) foram impróprias e injustas, não menciona uma única vez o nome da Demandante, e depois justifica-as por factos que imputa novamente a terceiros “acontecimentos ocorridos (…) na sua sala de aulas”, “não ter tido informação antecipada (…)”, “não ter havido justificação para as suas ausências (…)”. Por outro lado refere na comunicação que juntou aos autos que “após os incidentes (…) a delegada desempenhou com competência e organização as funções de delegada de que teve conhecimento.”
Ora, resulta pois que a Demandada apesar de verbalizar pedido de desculpa continua a entender que a sua conduta e as expressões que escreveu no email de 09.11.2016 são justificadas por determinado contexto que o antecedeu e por essa razão se refere a “após esses incidentes (…)”, não se retratando verdadeiramente das concretas expressões com que ofendeu a honra e consideração profissional da Demandante.
Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, decide-se condenar a Demandada a elaborar missiva a ser remetida para o conselho diretivo da Escola Básica do 2° e 3° ciclos dos Louros, desmentindo todas as acusações e insinuações que fez sobre as condutas profissionais e pessoais da Demandante.

VIII – RESPONSABILIDADE POR CUSTAS:
As custas serão suportadas pela Demandante e pela Demandada, em razão do decaimento na proporção respetiva de 83% e 17% (artigos 527.º, 607.º, n.º 6 do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, com a redação da Lei 54/2013 de 31 de julho - e artigo 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro).
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IX- DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência decido:
1. Condenar a Demandada B a pagar à Demandante A, a quantia de €500,00 (quinhentos euros);
2. Condenar a Demandada B a elaborar missiva a ser remetida para o conselho diretivo da Escola Básica do 2° e 3° ciclos dos X, desmentindo todas as acusações e insinuações que fez sobre as condutas profissionais e pessoais da Demandante.
3. Condenar a Demandante A e a Demandada B nas custas da presente ação na proporção do respetivo decaimento que se fixa, respetivamente em 83% e 17%.
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Tendo a Demandante liquidado com a sua contestação o valor de €35,00 (trinta e cinco euros), deverá liquidar a quantia de €23,10 (vinte e três euros e dez cêntimos) no prazo de 3 (três) dias úteis a contar do conhecimento da presente decisão, fazendo prova junto deste Tribunal.
Em relação à Demandada, tendo liquidado 35,00€ com a contestação, proceda-se em conformidade com o artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001 de 28/12, devolvendo-se a quantia de €23,10 (vinte e três euros e dez cêntimos).
Registe e notifique.
Funchal, 27 de março de 2018

A Juíza de Paz


Luísa Almeida Soares
(Processei e revi. Art.º 31 n.º 5 CPC/Art.º 18 LJP)