Sentença de Julgado de Paz
Processo: 297/2016-JPCBR
Relator: MARGARIDA SIMPLÍCIO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE VIAÇÃO
Data da sentença: 02/26/2018
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

RELATÓRIO:

A demandante, C., NIF. …, residente na rua da …., no concelho de Coimbra, representada por patrono oficioso.

Requerimento Inicial: A 11/10/2015, pelas 21h e 25m, na estrada nacional 111, ao km 33.700 S. João do Campo, ocorreu um acidente entre a demandante e J., condutor do veículo segurado na demandada. O veículo segurado na demandada tem a matrícula QR, cujo seguro é titulado pela apólice n.º …. Do acidente resultaram danos patrimoniais para a demandante, bem como a perda total do veículo. A 25/11/2015 as partes acordaram o valor de 11.000€ tendo em consideração que houve perda total do veículo, ficando os salvados na posse da demandante, ficando os outros danos patrimoniais por saldar, o que sucede até hoje. À data do acidente a demandante estava grávida, pelo que necessitou de cuidados médicos, bem como os passageiros nomeadamente o seu cônjuge, mãe e filhos, para além disso suportou despesas médicas. Todos os bens materiais que tinha no veículo ficaram danificados, nomeadamente telemóveis, PSP, máquina fotográfica e comandos da garagem. Foi solicitado um veículo de substituição á demandada a qual sempre o negou, o que causou um enorme transtorno pois teve de se deslocar a consultas pois a sua gravidez foi considerada de alto risco após o acidente, para além disso precisava de ir buscar os filhos á escola, e o seu cônjuge tem um trabalho noturno, pelo que também ficou sem transporte, dependendo da boa-fé de terceiros, ou seja, de boleias, fazendo um total de 2520 km em carro de terceiros e utilizando o serviço de táxi, tendo por isso um prejuízo de 1124,85€, de danos patrimoniais, incluindo 105€ em roupa danificada. Quanto a danos não patrimoniais como se referiu a demandante estava gravida, com o acidente ficou abalada psicologicamente transferindo tal sentimento para o bebé, também os filhos menores ficaram fragilizados com o susto e o aparato do acidente, também a sua progenitora que já tem certa idade necessitou de cuidados médicos, além da preocupação causada. A demandante com toda esta situação ficou perturbada com o estado de saúde dos seus familiares, o que não foi benéfico para a gravidez, ora todo este sofrimento não é quantificável e não sendo possível coloca-la na situação imediatamente anterior ao acidente será justo uma compensação nunca inferior a 3.400€. Conclui pedindo que seja condenada A) a pagar a quantia de 1.124,85€ de danos patrimoniais; B) a pagar a quantia de 2.400€ de danos não patrimoniais; C) a pagar juros de mora vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento. Junta 13 documentos, e comprovativo da concessão de apoio judiciário.

MATERIA: Ação de responsabilidade civil extracontratual, enquadrada no art.º 9, n.º 1 alínea H) da L.J.P.

OBJETO: Acidente de viação, indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

VALOR DA CAUSA: 4.524,85€ (quatro mil, quinhentos e vinte e quatro euros e oitenta e cinco cêntimos).

A demandada, Companhia de Seguros A…, S.A., NIPC…, com sede no …, em Ponta Delgada, representada por mandatário constituído.

Contestação: Confirma que o veículo QR se encontrava seguro na demandada, pela mencionada apólice, bem como aceita o dia, local e hora do acidente e indicação dos intervenientes. Quanto aos danos patrimoniais impugna por desconhecimento. Na realidade a demandante reclama o pagamento de um valor referente a objetos que foram danificados em consequência do acidente, contudo é estranho que apenas junte faturas pró-forma e meros orçamentos, o que prova a aquisição dos bens são as faturas, as quais não foram juntas aos autos. Quanto ao transporte de tai não se sabe qual o ponto de origem e destino, desconhecendo-se se a sua utilização foi resultado do acidente. Quanto ao dispêndio de combustível também não faz prova desse custo, e em relação aos 200€ de desgaste é desprovido de fundamento, pois se andou em carros emprestados não pode pedir o desgaste de veículos de que não é proprietária, por falta de legitimidade. Quanto aos danos não patrimoniais desconhece os mesmos sendo o valor excessivo e desajustado, pois engloba os danos sofridos pela mãe da demandante e também pelos filhos, os quais não são parte nesta ação, pelo que não os pode peticionar. Conclui pela improcedência da ação. Junta 1 documentos.

TRAMITAÇÃO:

Não se realizou pré-mediação por recusa expressa da demandante.

O Tribunal é competente em razão do território, do valor e da matéria.

As partes dispõem de personalidade e capacidade judiciária.

O processo está isento de nulidades que o invalidem na sua totalidade.

AUDIENCIA DE JULGAMENTO:

Foi iniciada dando cumprimento ao disposto no art.º 26, n.º 1 da L.J.P., sem que as partes tenham chegado a consenso. Seguindo-se para produção de prova com a junção de 1 documento pela demandante, audição das testemunhas presentes, e terminando com breves alegações, conforme resulta da ata de fls. 52 a 54.

-FUNDAMENTAÇÃO-

I- FACTOS ASSENTES (POR ACORDO):

A) No dia 11/10/2015, pelas 21h e 25m, na estrada nacional 111, ao km 33.700 S. João do Campo, ocorreu um acidente entre a demandante e J., condutor do veículo segurado na demandada.

B) O veículo segurado pela demandada, á data dos factos, tem a matrícula QR, e do seguro com a apólice n.º ….

C) A 26/11/2015 as partes acordaram o valor de 11.000€ tendo em consideração que houve perda total do veículo, ficando o salvado na posse da demandante, ficando os outros danos patrimoniais por saldar.

II-FACTOS PROVADOS:

1)À data do acidente a demandante estava grávida, pelo que necessitou de cuidados médicos.

2) Os passageiros, nomeadamente o seu cônjuge, mãe e filhos, também necessitaram de cuidados médicos.

3)A demandada suportou despesas com medicamentos no valor de 22,72€.

4)No veículo iam outros bens materiais que ficaram danificados.

5)Um telemóvel no valor de 63,05€.

6)Uma máquina fotográfica no valor de 95,01€.

7)Uma P.S.P.

8)O comando da garagem no valor de 119,93€.

9) A demandante ficou com a roupa que trazia inutilizada, a qual tem o valor de 105€.

10) Foi solicitado um veículo de substituição á demandada a qual sempre o negou.

11)Tal facto causou transtornos á demandante que tinha de se deslocar a consultas.

12) Para além disso precisava de ir buscar os filhos á escola.

13)E, o cônjuge desta tem trabalho noturno.

14) A demandante ficou dependente da boa-fé de terceiros para se deslocar.

15)Para compensar atribui-se o valor de 200€.

16) A demandante estava gravida, o acidente e o stresse, abalaram-na psicologicamente, transferindo tal sentimento para o bebé.

17)Os filhos menores também ficaram fragilizados com o susto que o acidente lhes causou.

18)A sua mãe necessitou de cuidados médicos.

MOTIVAÇÃO:

O Tribunal baseou a decisão na analise critica da documentação apresentada pelas partes, a qual foi conjugada com a prova testemunhal e regras da experiencia comum.A testemunha, R., é marido da demandante, e no dia do acidente estava no interior do veículo. Tem conhecimento direto dos factos, mas o seu depoimento foi, por vezes pouco claro, não obstante auxiliou na prova dos factos com os n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7,8,9,10,11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18.

A testemunha, M., é mãe da demandante e seguia no veículo no dia do acidente. Não obstante o seu depoimento foi isento. Auxiliou na prova dos factos n.º 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7,8,9,10,11, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18.

Os documentos que a demandante juntou para efeito de prova das despesas foram pouco relevantes, pois tratam-se de faturas pró-forma ou orçamentos.

Não se provaram mais factos por ausência de prova.

III - DO DIREITO:

O caso dos autos refere-se a um acidente ocorrido entre dois veículos ligeiros de passageiros em movimento, situação regulada pelo C. E conjugado com as normas do C.C., mais propriamente o disposto no art.º 483 e sgs.

Questão: danos e indemnização.

No que respeita ao apuramento da responsabilidade pelo sinistro, foi assumida tacitamente (art.º 217, n.º 1 e 2 do C.C.) pela demandada no momento em que atribuiu á demandante uma indemnização pelos danos materiais, nomeadamente pela perda do respetivo veículo em consequência do sinistro, indo assim ao encontro do teor da respetiva contestação. Assim apenas estão em causa os restantes danos que a demandante alega ter sofrido em consequência do sinistro, mas dos quais, até ao momento não foi ressarcida.

A trave mestra da reparação do dano ao nível civil rege-se pelo princípio da reposição ou reconstituição natural (art.º 562, do C.C.), o qual se traduz na obrigação de reconstituir a situação anterior à lesão, ou seja, o dever de repor as coisas na situação em que estariam caso o evento lesivo não se tivesse produzido.

A medida da indemnização em dinheiro deve refletir a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo Tribunal, e que existiria ainda hoje, caso não fossem os danos resultantes do sinistro, abrangendo por isso todos os danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.

Quanto ao pedido de danos materiais, a demandante alega um conjunto de bens que ficaram danificados no acidente, peticionando o valor global de 1.124,85€.

Assim, em relação aos telemóveis, apurou-se que um era da demandante e o outro do marido. Mais se apurou que já eram usados e por isso não dispunham da fatura de compra, o que significa que teriam mais de dois anos, pois é esse o período da garantia legal, prazo durante o qual se guarda normalmente as faturas para reclamação por eventual defeito, o que resulta da experiência comum. Assim, temos duas faturas pro forme, de fls. 21 a 21 verso, os quais foram pedidos pelo marido da demandada, conforme admitiu em audiência, daí os mesmos estarem no nome dele.

Não obstante, na presente ação apenas a demandante é a lesada, no entanto estão a ser peticionados os danos de outras pessoas, que embora possam ser lesados não são parte nesta ação, pelo que que a demandante, somente terá direito aos danos próprios.

Acrescenta-se, ainda, que as faturas pro forme não correspondem ao valor real do bem, já que não há uma compra mas sim uma procura no mercado sobre o preço do custo do bem, na data em que é pedido á empresa, ou seja, no dia 31/12/205, conforme consta dos documentos já referidos. Ora a lei tem por referência a data do sinistro e não momento posterior. Face ao exposto, e socorrendo-me da equidade considero que o valor de 63,05€, peticionado pelo telemóvel nem será excessivo, face aos preços que atualmente se praticam no mercado, pelo que deve ser ressarcida nesse montante.

Quanto á roupa foi explicado que, com o acidente ficaram danificadas as botas - de cor castanha - que na altura calçava, as calças e uma camisa, a qual seria o que a demandante vestiria no dia do acidente, sendo, ainda, referido que a mesmo foi levada de urgência para o hospital para fazer exames, daí a necessidade de substituição. Quanto a estas não existem documentos que comprove, nem o preço de custo inicial, nem uma posterior aquisição, não obstante a quantia peticionada de 105€ não é excessiva, pelo que com recurso á equidade (art.º 566, n.º 3 do C.C.) será justo atribui-la.

Em relação á máquina fotográfica, o documento 9, junto a fls. 23 verso, refere que não será reparável, pois além de não tirar fotos, o que constitui a sua lesão, o custo da reparação será bem superior ao valor que a mesma possui no mercado, uma vez que já era usada. Não obstante, esta integrava o património da demandante, o qual ficou empobrecido devido ao acidente, pelo que deve ser ressarcida em montante semelhante (art.º 566, n.º 3 do C.C.), no valor de 95,01€. Mais se acrescenta que, o custo de uma máquina fotográfica, é superior ao peticionado, o que resulta das regras da experiência.

Em relação á P.S.P., foi apurado que na altura do sinistro o filho da demandante ia a brincar com a mesma, e com o acidente ficou danificada. A demandada apresentou o documento n.º 8, a fls. 23, o qual é somente um orçamento para eventual reparação do referido aparelho, embora no mesmo seja mencionado que a reparação das peças partidas ultrapassa o valor do bem, dando a entender que será preferível adquirir um novo.

Não obstante, tal como já se referiu, na presente ação apenas a demandante é a lesada, pois foi somente ela que a apresentou, sendo este um bem que integrava o património do filho, que será ainda menor.

Para que pudesse peticionar este valor, deveria a ação ser intentada, também, pelo marido, e pai dos filhos, ambos em representação do filho menor, conforme resulta do disposto no art.º 1878, n.º1 do C.C. e art.º 2 do C.P.C., motivo pelo qual se indefere.

No que respeita ao comando, foi apurado que se refere ao comando do portão de acesso á sua casa, o qual desapareceu no acidente. O custo deste perfez a quantia de 119,93€, conforme documento 10 junto a fls. 25, pelo que se entende ser justo ressarci-la desta despesa.

No que respeita às despesas com medicamentos, conforme documento 6, a fls. 19 verso, resultou provado que devido ao acidente a demandante foi de urgência para o hospital, pois estava com algumas dores, e estando ela no 7º mês de gestação havia que tomar as devidas precauções. Assim, verifica-se que dois desses medicamentos são normais tomar numa gravidez, mesmo para quem não teve qualquer acidente, como é o caso do magnésio card, o que resulta da experiência comum, quanto ao valdisper é um medicamento á base de plantas naturais, usado para a indução do sono, não estando sujeito a receita médica, no entanto atendendo á data da fatura 16/10/2015 e ao facto do acidente ter agitado a demandante, ficando mais sensível e ansiosa, é natural que sentisse necessidade de descansar, e que este fosse indicado para o seu estado de gravidez. Quanto ao paracetamol, é o que normalmente é recomendado às gravidas, em caso de dores variadas, pelo que também parece ser adequado á situação em concreto, assim entendo que o valor peticionado de 22,72€ seja ajustado. A demandante requer, ainda, ser indemnizada pela privação do uso do veículo, uma vez que o seu não teve concerto.

Para o efeito reclama três montantes distintos, um no valor de 126,30€, referentes às vezes que foi de táxi ao hospital; o valor de 200€ para compensar o desgaste de veículo, e 252€ alegando que foi de abastecimento em combustível do veículo emprestado.

Um veículo automóvel é atualmente um bem essencial e utilitário para a deslocação do comum dos cidadãos, proporcionando a quem o utiliza evidentes vantagens de comodidade e rapidez nas viagens de trabalho ou de lazer, tendo assim frequentemente um elevado valor de uso.


Em relação ao pedido de indemnização, é sabido que nos casos de imobilização de um veículo em consequência de um acidente de viação, podem decorrer dois tipos de danos, os danos emergentes, derivados da utilização, mais onerosa, de um meio de transporte alternativo, designadamente o aluguer de outro veículo; e os lucros cessantes, em consequência da perda de rendimento que o veículo acidentado propiciava, como no caso de um táxi ou outro veículo utilizado em transporte de público ou de carga.


Mas, pode considerar-se que resulta outro dano, que consiste na própria privação do uso do veículo. Defende Abrantes Geraldes, in “Temas da Responsabilidade Civil, I Vol., Indemnização do Dano da Privação do Uso”, desenvolvendo um estudo sobre a questão, concluindo que a simples privação do uso, designadamente, “tratando-se de veículo automóvel de pessoa singular ou de empresa utilizado como instrumento de trabalho ou no exercício de atividade lucrativa, a existência de um prejuízo material decorre normalmente da simples privação do uso, independentemente da utilização que, em concreto, seria dada ao veículo no período de imobilização, ainda que o veículo seja substituído por outro de reserva. Mesmo quando se trate de veículo em relação ao qual inexista prova de qualquer utilização lucrativa, não está afastada a ressarcibilidade dos danos, tendo em conta a mera indisponibilidade do bem.

No mesmo sentido, Menezes Leitão, in “Direito das Obrigações”, vol. I, pág. 297, sublinha que “entre os danos patrimoniais se inclui naturalmente a privação do uso das coisas ou prestações, como sucede no caso de alguém ser privado da utilização de um veículo seu ou ser impedido de realizar uma viagem turística que tinha contratado.

Efetivamente, o simples uso constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação constitui naturalmente um dano. De facto, o que está em causa é a concreta e real desvantagem resultante da privação do gozo do bem, que já integrava o património do lesado, o qual é avaliável em dinheiro, constituindo naturalmente um dano patrimonial.A nível da Jurisprudência mais recente, podemos distinguir duas teses extremadas. Para uns, o dano da mera privação do uso não é indemnizável, e para que a privação seja ressarcível, terá de fazer-se prova do dano concreto e efetivo, isto é, da existência de prejuízos decorrentes diretamente da não utilização do bem. Para outros, a simples privação do uso, só por si, constitui um dano indemnizável, mesmo que nada se prove a respeito da utilização ou destino que seria dado ao bem. Mais recentemente, surgiu uma tese diferente, que pode considerar-se de intermédia: se, por um lado, afirma que não basta a simples privação do uso do bem, também não exige a prova de danos concretos e efetivos; será essencial a alegação e prova da frustração de um propósito real, concreto e efetivo de proceder à sua utilização,

in AC. do STJ de 12/11/2009, de 05/07/2007, de 09/12/2008, de 05/02/2009, de 26/05/2009 e de 02/06/2009, todos in www.dgsi.pt.

Propendemos para a terceira posição que segundo julgamos é a que melhor se adequa com as reais situações da vida, e consequentemente é a que melhor repara os danos causados á lesada.

No caso concreto, foi apurado que o veículo da demandada ficou sem conserto, não lhe sendo facultado qualquer veículo de substituição, até ser ressarcida do mesmo. Foi, também, apurado que a mãe da demandante emprestou-lhe o seu próprio veículo, o qual foi usado por ela e restante família para fazer face às necessidades diárias normais da vida, o que sucedeu, durante cerca de mês e meio, conforme a testemunha, AA, relatou. Quanto a este parece-me ser justo o valor peticionado de 200€, pois embora quem lhe emprestou o veículo fosse a sua própria mãe, a verdade é que isso afetou a sua vida, ficando sempre a dever favores, os quais são do foro moral, e como tal apenas são suscetíveis de mera compensação.

Porém, em relação á despesa com combustível era algo que teria sempre de fazer, quer andasse em carro próprio, quer fosse emprestado, ou até mesmo se fosse alugado, pois é algo inerente ao uso normal dos veículos, e sem o qual não circulam, o que resulta do senso comum, pelo que entendo que esta despesa não pode ser imputada á demandada.

Quanto á despesa com táxi no valor de 126,30€, foi provado que após o dia do acidente, a demandante ficou mais ansiosa e angustiada, pelo que, por vezes deslocava-se ao hospital pois referia não sentir o bebé.

Conforme documento que juntou em audiência a mesma, após o acidente, terá sido assistida 5 vezes. Quanto a estas a do dia em que ocorreu o sinistro será normal já que foi de urgência ao hospital. A última que está mencionada, 5/01/2016, será referente ao parto, pelo que não deve ser imputada á demandada. Quanto às outras três, a do dia 16/10/2015 pode ser imputada pelos motivos já referidos, quanto às outras duas, começa a ser normal que a mulher gravida se desloque nos últimos meses de gestação mais vezes ao médico para controle, o que faz parte da própria gravidez, pelo que não deve ser imputado à demandada.

Não obstante, o montante peticionado com recurso a táxi, atendendo á data aposta nas faturas, a fls. 27 verso, respetivamente a 21 e 22/10/2015, não me parecem coerentes, pois além de ter veículo emprestado, como também foi provado, carecia de mais explicações, de forma a perceber-se o motivo por que usou um táxi e se o valor referido corresponde apenas a 2 deslocações, uma vez que essas datas não correspondem com nenhuma das vezes que terá ido ao hospital, quer á urgência, quer às consultas programadas, o que resulta do confronto desta com o documento que juntou em audiência. Assim, como esta prova lhe competia fazer, e não a tendo realizado, entendo indeferi-la.

Quanto ao pedido de danos não patrimoniais, dispõe o art.º 496, n.º1 do C.C. o critério legal para estabelecer indemnização por este tipo de danos, devendo atender-se apenas aqueles que pela sua gravidade merecem a tutela do direito.

Quanto aos restantes danos não patrimoniais referidos nas outras alíneas deste artigo dizem respeito a situações de morte, o que felizmente neste acidente não sucedeu, embora o sinistro tivesse sido aparatoso. Isto para dizer que, na ação (r.i.) são mencionados danos que não são da demandante mas de outras pessoas que com ela seguiam no veículo sinistrado, e só em caso de falecimento de alguma delas, que, como já se referiu não sucedeu, é que podia peticionar os mesmos, nomeadamente o desgosto dela e as dores que sentidas com determinados entes queridos.

Assim, em relação á demandante ficou apurou-se que estava entre o 6º a 7º mês de gestação, após o acidente foi a mesma ao hospital pois sentia dores resultantes do impacto. O acidente que sofreu tornou-a mais frágil, ansiosa e nervosa, tendo ido algumas vezes ao hospital pois não sentia o bebé mexer, o que a preocupava.

Na realidade embora a gravidez tenha que ser acompanhada, o facto de ter um acidente aumentou a ansiedade, tal facto não só se repercute na criança, que sente as mudanças ocorridas na mãe, como na própria demandante que a transporta. Este foi o único facto alegado e provado que diz respeito á demandante, todos os demais, embora de natureza não patrimonial, não podem ser por ela peticionados.

Quanto a este, atendendo às circunstâncias especiais que na altura vivia, estado de gravidez, parece-me justo atribuir-lhe o montante de 800€.

Quanto a juros, decorre do art.º 805, n. º1 do C.C. que o credor só fica constituído em mora após ser interpelado para cumprir, sendo certo que tratando-se de um caso de responsabilidade civil, constitui-se em mora desde a citação (art.º 805, n. º3 do C.C.), a qual ocorreu a 5/12/2016, conforme registo de receção a fls. 34, a calcular até integral pagamento.

DECISÃO:

Pelo exposto, julga-se a ação parcialmente procedente, e em consequência condena-se a demandada no pagamento da quantia de 1310,70€, e nos juros que se vencerem, até integral pagamento.

CUSTAS:

São da responsabilidade das partes na proporção de 50%, tendo em consideração o respetivo decaimento nos autos, pelo que se encontram totalmente satisfeitas.

Notificada nos termos do art.º 60, n.º 2 da L.J.P.

Envie-se cópia à demandada.

Coimbra, 26 de fevereiro de 2018

A Juíza de Paz

(redigido pela signatária, art.º 131, n.º 5 do C.P.C.)

(Margarida Simplício)