Sentença de Julgado de Paz
Processo: 90/2013-JP
Relator: IRIA PINTO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
Data da sentença: 08/30/2013
Julgado de Paz de : SANTA MARIA DA FEIRA
Decisão Texto Integral:
Sentença

Processo nº x
Relatório
O demandante A, melhor identificado a fls. 1, intentou em 19/6/2013, contra a demandada B, melhor identificada a fls. 1, ação declarativa nos termos do artigo 9º, nº 1, alínea h) da Lei 78/2001 de 13 de julho, formulando o seguinte pedido:
Ser a demandada condenada a proceder a reparações necessárias à restauração do edifício, eliminando os seus defeitos e anomalias, considerando o orçamento; ou alternativamente a pagar a quantia de €1.925,00 acrescida de Iva, necessárias para obras, além de juros de mora desde a citação até efetivo pagamento e ainda a quantia de €2.000,00, a título de danos morais, a que acrescerão juros desde a citação até integral pagamento.
Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 1 a 4 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido. Juntou 4 (quatro) documentos e 1 (um) documento em audiência.
Regularmente citada a demandada (fls. 23), apresentou a contestação, de folhas 24 a 29, que se dá por integralmente reproduzida, impugnando os factos constantes do requerimento inicial e peticionando a absolvição do pedido da demandada, deduzindo a exceção peremtória de pagamento, expondo ter pago ao demandante o valor apurado de €231,66, de acordo com a permilagem de 10.37%. Juntou 2 (dois) documentos.
O demandante prescindiu da fase de mediação (fls. 4).
Procedeu-se a audiência de julgamento no dia 19 de julho de 2013, como da respetiva Ata se infere (fls. 61 e 62).
Cumpre apreciar e decidir
O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras exceções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Fundamentação da Matéria de Facto
Factos provados
Com interesse para a decisão da causa ficou provado que:
1 – A demandante celebrou com a demandada contrato de seguro denominado X, mediante a apólice nº x, com inicio em 10 de abril de 2007 e atualmente em vigor, cobrindo riscos, nomeadamente de danos por água, sem franquia.
2 – O objeto do contrato é a fração autónoma para habitação, sita em Lourosa.
3 – Em início de outubro de 2012, começaram a ocorrer na fração autónoma segurada, infiltrações na casa de banho e hall de entrada.
4 – A origem das assinaladas patologias ocorreu na tubagem de esgoto comum do edifício, que passa no piso da fracção 3º Dto..
5 – Essa rotura do esgoto do edifício causou danos nas habitações inferiores e nas zonas comuns.
6 – Na fração segura na demandada, verificaram-se danos no hall de entrada, teto do WC e móvel WC.
7 – As referidas infiltrações tomaram conta das divisões da fração do demandante, o que originou estragos nas paredes e pinturas, bem como o apodrecimento de tetos e paredes afetadas, mormente no hall de entrada e teto da casa de banho, danificando ainda um móvel de casa de banho.
10 – Na sequência de participação do sinistro, a demandada mandou fazer uma vistoria/peritagem tendo encarregado para o efeito a x, que elaborou relatório técnico, que apurou, em pesquisa na fracção do 3º Dtº., a rotura na coluna vertical de esgoto do edifício.
11 – A origem do sinistro verifica-se numa parte comum do edifício, inexistindo seguro do condomínio.
12 – O demandante acionou a sua apólice.
13 – A permilagem da fração segura “H”, correspondendo ao 2º Dtº é de 10.37%.
A fixação da matéria dada como provada resultou da audição das partes, dos factos admitidos, da prova testemunhal (como se exporá), dos documentos de fls. 5 a 14 e 16 30 a 46 e 60 juntos aos autos, o que devidamente conjugado com as regras de experiência comum alicerçou a convicção do Tribunal.
As testemunhas apresentadas pelo demandante – X, X e X – expuseram que a fração do demandante tem humidades, derivadas de danos por água, nos tetos e paredes do hall de entrada, no teto do WC, além do móvel do WC, expondo ainda que os azulejos do WC se encontram ocos, não sendo considerada credível esta ultima afirmação, nem tecnicamente justificada.
A testemunha apresentada pela demandada – X – na qualidade de perita averiguadora, foi considerada credível e isenta, com conhecimento dos factos em questão, tendo feito pesquisa decorrente do sinistro, com origem nas partes comuns do edifício, e, tendo elaborado relatório de peritagem, recolhendo orçamentos relativamente a danos e concluindo que a demandada teria de indemnizar o demandante em determinado valor, considerando os danos e a permilagem da fração do demandante, já que não há seguro do condomínio, mas de danos próprios, informação que deu no relatório, mais assinalando que os azulejos do WC não se encontram ocos, pelo que não vê razão para a sua substituição.
Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou insuficiência de prova nesse sentido.
O Direito
O demandante intentou a presente ação, com base no instituto da responsabilidade civil contratual, peticionando a condenação da demandada a proceder a reparações necessárias à restauração do edifício, eliminando os seus defeitos e anomalias, considerando o orçamento; ou alternativamente a pagar a quantia de €1.925,00 acrescida de Iva, para obras e ainda a quantia de €2.000,00, a título de danos morais, alegando em sustentação desse pedido a existência de um contrato de seguro multirriscos com cobertura de danos por água, existentes em virtude da ocorrência de sinistro alegadamente coberto pela demandada.
O contrato de seguro é definido como um contrato formal, dado que é reduzido a escrito, constituindo a apólice de seguro o documento pelo qual uma entidade, a seguradora, se obriga a proporcionar a outrem, o segurado, a segurança de pessoas ou bens, mediante o pagamento de uma contraprestação designada prémio de seguro. Ao segurado é imposto o pagamento do prémio, de acordo com o acordado e estipulado na apólice e à seguradora incumbe, face à prova da existência do sinistro e de que o segurado cumpriu com as obrigações a que se vinculou, liquidar com diligência as obrigações devidas com a ocorrência dos factos previstos na apólice.
Não obstante tratar-se de contratos de adesão, há a possibilidade das partes adequarem o contrato de seguro a condições especiais, de acordo com o princípio da liberdade contratual previsto no artigo 405º do Código Civil. Relevante, a este propósito, é ainda o artigo 406º do mesmo código que estipula que os contratos devem ser pontualmente cumpridos. Além do princípio da boa-fé que deve nortear toda a tramitação contratual entre as partes.
No caso objeto dos autos, o demandante celebrou com a demandada um contrato de seguro multirriscos, com cobertura de danos por água. Acontece porém que está provado nos autos que o sinistro em causa, que causou danos por água na fração do demandante, teve origem nas partes comuns do edifício, inexistindo seguro seguro de condomínio, o que levou a que o demandante accionasse a sua apólice.
Do ponto de vista do demandante caberia à demandada a responsabilidade pela totalidade de danos existentes na fração do demandante. Do ponto de vista da demandada, esta aceita o pagamento de indemnização calculada segundo a permilagem da fracção “H” do demandante que é de 10,37%, tendo apurado a esse titulo o valor de €231,66, que o demandante não aceita.
A demandada veio invocar a exceção peremptória de pagamento no valor de €231,66, mas a verdade é que o demandante não recebeu esse montante, juntando aos autos o original do cheque desse valor (fls. 60), pelo que improcede tal exceção, uma vez que o pagamento não se efetivou.
Da análise das condições constantes da apólice do contrato de seguro X, de que é tomador do seguro o demandante, consta que para determinação do capital seguro são considerados o valor proporcional das partes comuns, nos seguros de frações em regime de propriedade horizontal (a fls. 3 das Condições Particulares e fls. 7 dos autos), documento que foi junto pelo demandante e que se aplica ao presente caso, dada a existência de seguro de danos próprios, mas não seguro das partes comuns, não obstante a ocorrência do sinistro ter origem nas partes comuns.
Pelo exposto, inexistindo seguro do condomínio com cobertura das partes comuns do edificio, onde se integra a fração do demandante, existindo danos por água com origem nessas partes comuns e acionada a apólice do demandante, resta a aplicação da mesma, considerando como consta das Condições Particulares da apólice, o valor proporcional das partes comuns, que é aceite ser de 10.37%.
Assim ao valor reclamado, de acordo com o apuramento de prejuízos, foi contabilizado o valor de €231,66, como consta do Relatório de Peritagem, Ponto 6, de fls. 32. Não foram, porem, considerados prejuízos derivados do sinistro a substituição de azulejos da casa de banho, por se considerar a desnecessidade da substituição, como consta do ponto 10. “Informações Complementares” (fls. 33) do mencionado relatório.
Da prova produzida, conclui-se não assistir razão ao demandante, porquanto no seu entendimento o seu contrato de seguro abrangeria todos os danos por água ocorridos, estando porém, os mesmos por via contratual limitados à respetiva permilagem, por terem origem nas partes comuns do edifício onde a fração do demandante se insere.
Nos termos do relatório de peritagem de fls. 30 a 46, é assim de aplicar a permilagem de €10,37% ao valor reclamado aí constante, estando apurado o valor de €231,66, a título de valor indemnizatório pela ocorrência do sinistro, nos termos já expostos.
Em consequência, deve o demandante ser indemnizado pela demandada do valor de €231,66, correspondente ao valor apurado pela ocorrência do sinistro dos autos.
Relativamente a indemnização por danos morais, peticionada pelo demandante, entende-se não haver lugar à mesma, por não se revelarem com gravidade bastante que mereçam a tutela do direito. Considera-se, então, que os meros incómodos, irritabilidade e nervosismo sentidos com a situação dos autos não são indemnizáveis, antes fruto de situações quotidianas, improcedendo os peticionados danos morais.
Por outro lado, considera-se ainda não serem devidos quaisquer juros, na medida em que a quantia de €231,66 já havia sido disponibilizada pela demandada ao demandante, que não a aceitou.
Decisão
Em face do exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, condeno a demandada, a pagar à demandante a quantia de €231,66 (duzentos e trinta e um euros e sessenta e seis cêntimos), indo no mais absolvida.
Custas
Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, condeno o demandante e demandada no pagamento das custas totais do processo no valor de €70,00 (setenta euros), na proporção de responsabilidade de 95% para o demandante, no valor de €66,50 (sessenta e seis euros e cinquenta cêntimos) e de 5% para a demandada, no valor de €3,50 (três euros e cinquenta cêntimos), devendo o demandante, considerando o pagamento de taxa de justiça de €35,00, proceder ao pagamento dos restantes €31,50 (trinta e um euros e cinquenta cêntimos), no Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia atraso.
Devolva-se à demandada o valor de €31,50 (trinta e um euros e cinquenta cêntimos), considerando que efectuou o pagamento de €35,00 de taxa de justiça.
A sentença (conforme A.O., processada em computador, revista e impressa pela signatária - artº 18º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho) foi proferida nos termos do artigo 60º da Lei nº 78/2001, de 13 de Julho.
Na data e hora agendada para leitura de sentença (2/8/2013, pelas 16H30), não foi possível disponibilizar a mesma, devido a problemas informáticos, sentença que foi disponibilizada logo que possível.
Notifique e Registe.
Arquive (após trâmites legais).
Julgado de Paz de Santa Maria da Feira, em 30 de agosto de 2013
A Juíza de Paz (em gozo de férias de 5 a 23/8/2013 e em acumulação de serviço),
(Iria Pinto)