Sentença de Julgado de Paz
Processo: 13/2018-JPBBR
Relator: CRISTINA EUSÉBIO
Descritores: INCOMPETÊNCIA MATERIAL
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DE ENTE PUBLICO
SEGURADORA
Data da sentença: 04/13/2018
Julgado de Paz de : BOMBARRAL-OESTE
Decisão Texto Integral: Compulsados os autos verifica-se que, na sua douta contestação, alega a demandada, além do mais a excepção de incompetência material do Julgado de Paz, e de ilegitimidade passiva.
Pelo que, cumpre apreciar, antes do prosseguimento dos autos em cumprimento do principio de gestão processual e da limitação dos actos.
Relatório
O demandante A, devidamente identificado a fls. 1 dos autos, ancora a sua pretensão de indemnização por danos corporais sofridos, na existência de contrato de seguro celebrado entre o lesante - Município de Alcobaça - e a seguradora, ora demandada, imputando a responsabilidade do sinistro àquele município.
Mais refere que a demandada, B., igualmente devidamente identificada nos autos, decidiu não assumir o pagamento da indemnização que peticiona, sem atender aos factos apurados quer pela C - que procedeu à peritagem por sua ordem, - quer pelo Provedor da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões.
Na contestação apresentada pela demandada, e no que ao sinistro diz respeito, a seguradora pugna pela ausência de responsabilidade do Município de Alcobaça, seu segurado e consequentemente pela não assunção de pagamento dos danos sofridos pelo demandante. Atribui, aliás a culpa pela ocorrência do sinistro á “falta de destreza motora” do demandante.
Fundamentação
Quer a competência, quer a jurisdição têm como ponto de referência o modo como o autor configura a acção, definido pelo pedido e causa de pedir.
Ora, in casu o Julgado de Paz seria materialmente competente para decidir a questão em apreço, caso a responsabilidade pelo sinistro estivesse fixada, ou dito de outro modo, caso a seguradora houvesse assumido a responsabilidade pelo ressarcimento ao demandante e apenas se pretendesse discutir a falta de pagamento ou divergência nos valores indemnizatórios a liquidar.
No entanto, tal não se verifica, sendo este tribunal chamado a pronunciar-se sobre a responsabilidade civil extracontratual do segurado – Município de Alcobaça,- (ente público), na produção do acidente verificado.
Destarte, apenas e só na medida em que o Município de Alcobaça seja civilmente responsável pelos danos sofridos pelo demandante é que responderá a seguradora, no âmbito do contrato de seguro celebrado.
Não será possível cindir a responsabilidade do segurado da responsabilidade da seguradora, e nessa conformidade o pedido apenas poderá ser apreciado in totum.
Ora sendo certo que, o apuramento da responsabilidade civil de um ente público caberá ao Tribunais Administrativos e fiscais, haverá este de ser competente para conhecer do presente acção.
Como bem refere o Ac. Do TCA Norte de 6/4/2006 in www.dgsi.pt :”
Os tribunais administrativos são competentes, em razão da matéria, para conhecer e julgar actos de gestão pública, mas esta conclusão não se altera pelo facto de intervir, no lado passivo da acção, uma entidade privada.
Com efeito, a competência que se discute é em razão da matéria controvertida, ou seja, a natureza dos actos ou factos causadores dos danos cujo ressarcimento se imputa ao ente público. O contrato de seguro apenas faz transferir o "quantum" indemnizatório para a empresa seguradora, não a responsabilidade jurídica pelo evento.
Aferindo-se a competência material dos Tribunais Administrativos pela alínea g) do n.º 1 do art. 4º do ETAF,
o que implica ou exclui tal competência não é a qualidade dos sujeitos em si mesma considerada mas tal qualidade conjugada com as questões a apreciar que impliquem a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público.”(sublinhado nosso).

Neste sentido vide também Ac. TCA Norte de 20/5/2016 e de 28/06/2013, in www.dgsi.pt

De facto, tem sido entendimento da doutrina e da jurisprudência que a distinção entre a jurisdição comum e a administrativa está na diferença entre actos de gestão pública e actos de gestão privada”, não podendo os tribunais de jurisdição cível “conhecer dos litígios que envolvem a administração pública enquanto poder administrativo, isto é, sempre que ela tenha actuado no exercício de uma actividade de gestão pública” (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13.02.97, www.dgsi.pt). Sendo que “a competência em razão da matéria afere-se pelo pedido do autor, não dependendo nem da legitimidade das partes, nem da procedência da acção”(Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 16.04.1996, www.dgsi.pt). (sublinhado nosso).
E dúvidas não restam que o demandante atribui a responsabilidade do sinistro ao Município de Alcobaça, no exercício de uma actividade de gestão pública, o que pretende ver dirimido com a presente acção.

Nos termos do disposto nos n.º 1 e 2 do art. 1º da Lei 67/2007: “- A responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público por danos resultantes do exercício da função legislativa, jurisdicional e administrativa rege-se pelo disposto na presente lei, em tudo o que não esteja previsto em lei especial.
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, correspondem ao exercício da função administrativa as acções e omissões adoptadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo.“

Pelo exposto, verificada a incompetência absoluta deste tribunal nos termos e para os efeitos do disposto no art. 99º do CPC, dispensa-nos de tecer considerações sobre a excepção de ilegitimidade invocada pela ora demandada.

Decisão:

Declaro o Julgado de Paz do Oeste, incompetente em razão da matéria e em consequência absolvo a demandada da instância, nos termos e para os efeitos no disposto nos art. 278º n.º 1 al. a), 576, n.º 2, 577º al. a) , e 579º do CPC.


Custas:
A cargo do demandante, que declaro parte vencida, devendo efectuar o pagamento das custas em falta (€ 35,00) num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, sob pena de incorre no pagamento de uma sobretaxa de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no efectivo cumprimento dessa obrigação, conforme disposto nos números 8º e 10º da Portaria 1456/2001, de 28 de Dezembro.

Proceda ao reembolso da Demandada, nos termos do artigo 9.º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro.

Registe e notifique.

Bombarral, 13 de Abril de 2018

A Juiza de Paz

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