Sentença de Julgado de Paz
Processo: 23/2014-JP
Relator: CRISTINA BARBOSA
Descritores: INCUMPRIMENTO CONTRATUAL
Data da sentença: 11/18/2014
Julgado de Paz de : PORTO
Decisão Texto Integral:
SENTENÇA

Proc.º 23/2014-JP
em que são partes:
Demandante: A, Ld.ª, com sede na Rua ------------- Porto.

Demandados: B e C , ambos residentes na Rua ------ Porto.
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OBJECTO DO LITÍGIO
A Demandante intentou a presente acção declarativa, enquadrável na alínea i) do nº 1 do art.º 9º da Lei n.º 78/2001 de 13 de Julho, pedindo a condenação dos Demandados a pagarem-lhe a quantia de € 6.150,00, acrescida de juros de mora calculados à taxa anual de 4% sobre o capital de € 5.000,00, a partir da data da sua citação e até efectivo pagamento.
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Os Demandados vieram contestar nos termos plasmados a fls.48 a 58.
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Procedeu-se à Audiência de Julgamento, com a observância do formalismo legal, conforme resulta da Acta.
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O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor que se fixa em € 6.150,00 – artºs 297º nº1 e 306º nº2, ambos do C. P. Civil.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (a Demandante por representação – art.º 25º do C. P. Civil) e são legítimas.
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FACTOS PROVADOS
A. A Demandante dedica-se à actividade da mediação imobiliária, encontrando-se para tanto devidamente licenciada enquanto titular da licença D emitida pelo Instituto da Construção e Imobiliário, i.p.
B. No exercício da sua actividade e na sequência de solicitação dos Demandados, a Demandante celebrou com estes em 09 de Maio de 2013 contrato de mediação imobiliária destinado a encontrar interessado na aquisição do prédio então àqueles pertencente, constituída por fracção destinada a habitação, sita no rés-do-chão esquerdo-frente do prédio sito à Rua E , ali identificado como ----, inscrito na matriz urbana da freguesia de Ramalde, nesta cidade e concelho sob o art. -----, descrito na Conservatória Predial do Porto sob o nº ------- da dita freguesia.
C. Contrato esse estandardizado que foi elaborado e apresentado pela Demandante aos Demandados.
D. Tal contrato foi celebrado pelo prazo de seis meses a contar da data da sua celebração, em regime de exclusividade.
E. Nos termos contratuais estabelecidos, os Demandados obrigaram-se a remunerar a Demandante pelo produto da aplicação da comissão de cinco por cento sobre o preço da venda.
F. O preço foi fixado em € 170.000,00.
G. Após a assinatura do contrato, a Demandante diligenciou os procedimentos habituais para promover a venda, deslocando-se ao local para tirar fotografias diversas das suas características e organizou panfleto identificativo.
H. Tendo-o publicitado, inserindo-o nos sítios electrónicos mais conhecidos e procurados, suportando os custos inerentes.
I. Os Demandados, por escritura pública realizada em 23 de Outubro de 2013, no 1º Cartório Notarial de Competência Especializada de Matosinhos, venderam a terceiros a fracção identificada em B. supra.
J. Pelo preço de € 40.000,00.
K. Em momento algum os Demandados informaram a Demandante que se achavam dispostos a vender por aquele preço.
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Não se provaram quaisquer outros factos alegados pelas partes com interesse para a decisão da causa.
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FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Os factos assentes resultaram da conjugação dos documentos constantes dos autos com o depoimento testemunhal prestado em audiência de julgamento, sendo que os factos constantes de A. e B. consideram-se admitidos por acordo – artº 574º nº2 do C.P.C.
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Os factos não provados resultaram da ausência ou prova convincente.
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O DIREITO
Fixada a matéria de facto, cumpre agora fazer o seu enquadramento jurídico.
A relação negocial estabelecida entre as partes consubstancia um contrato de mediação imobiliária, nos termos previstos na Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro.
A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos tenham por objecto bens imóveis – art.º 2º do citado Dec.-Lei.
Dispõe o seu art.º 19º — A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 — É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
Tal como resulta do Ac. da RP, Proc. nº 563/13.0TBVCD.P1 de 03.07.2014 a consultar em www.dgsi.pt: “Daqui resulta que a remuneração, em princípio apenas é devida com a conclusão e perfeição do negócio, exceptuando-se, nomeadamente, o caso de existir uma cláusula de exclusividade e a não concretização do negócio ser imputável ao cliente da empresa de mediação que, nesse contexto, terá direito a remuneração. Para que exista, nesta hipótese, direito a remuneração, é exigível, todavia, que o negócio esteja não somente perspectivado, mas acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo, que aceite as condições do vendedor, o qual se vem a frustrar por recusa do cliente”.
Com efeito, da matéria de facto assente resulta, que no exercício da sua actividade e na sequência de solicitação dos Demandados, a Demandante celebrou com estes em 09 de Maio de 2013 contrato de mediação imobiliária destinado a encontrar interessado na aquisição do prédio então àqueles pertencente, constituída por fracção destinada a habitação, sita no rés-do-chão esquerdo-frente do prédio sito à Rua E, ali identificado como ----, inscrito na matriz urbana da freguesia de Ramalde, nesta cidade e concelho sob o art. ------, descrito na Conservatória Predial do Porto sob o nº ----- da dita freguesia. Tal contrato foi celebrado pelo prazo de seis meses a contar da data da sua celebração, em regime de exclusividade, obrigando-se ainda os Demandados a remunerar a Demandante pelo produto da aplicação da comissão de cinco por cento sobre o preço da venda, tendo o preço sido fixado em € 170.000,00.
Mais se provou, que após a assinatura do contrato, a Demandante diligenciou os procedimentos habituais para promover a venda, deslocando-se ao local para tirar fotografias diversas das suas características e organizou panfleto identificativo, tendo-o publicitado inserindo-o nos sítios electrónicos mais conhecidos e procurados, suportando os custos inerentes. Ora, sucede que os Demandados, por escritura pública realizada em 23 de Outubro de 2013, no 1º Cartório Notarial de Competência Especializada de Matosinhos, venderam a terceiros a fracção objecto do contrato de mediação, pelo preço de € 40.000,00.
A pretensão da Demandante é que os Demandados sejam condenados ao pagamento da quantia de € 6.150,00, referente à remuneração que entende ter direito, (€5.000,00+IVA), acrescida de juros de mora calculados à taxa anual de 4% sobre o capital de € 5.000,00, a partir da data da sua citação e até efectivo pagamento.
Ora bem, em lado nenhum da sua peça processual, a Demandante alega ter, sequer, arranjado um potencial cliente, muito menos que tenha arranjado um cliente certo para o negócio, referindo apenas que o preço de venda do imóvel era elevado face às suas características e que pelo preço efectivamente vendido também teria arranjado cliente para o mesmo. Mas este facto não releva para efeitos do direito à retribuição.
Com efeito e prosseguindo o entendimento do AC. da Relação do Porto supra identificado, em matéria de direito à retribuição, o momento relevante é o da constituição do contrato promovido, concluindo-se, in casu, que a Demandante em nada contribuiu para o negócio que se veio a realizar em 23.10.2013.
No texto do já citado Acórdão, é feita também uma referência ao acórdão do STJ de 12.12.2013[1], «No âmbito de um contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade em que as partes não fazem depender o pagamento da remuneração da efectiva outorga de qualquer contrato, é a mesma devida ao mediador que tenha desenvolvido actividade que haja influído de forma decisiva para a conclusão do negócio visado, como sucede se um cliente vem a ocupar as lojas visadas, tendo ocorrido a intervenção daquele nas reuniões que ocorreram com o cliente interessado, foram por si apresentadas minutas dos contratos e foi mesmo outorgado contrato promessa, ainda que o contrato prometido se não haja realizado, por razões apenas imputáveis ao cliente.».
Conforme resulta da cláusula 5.ª no nº1 do contrato celebrado entre as partes «A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir destinatário que celebre com o Segundo Contratante o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no art. 19.º do DL 15/2013, de 8 de Fevereiro. »
Daqui resulta que não existe qualquer direito da Demandante à retribuição.
Contudo, do que antecede, não restam dúvidas, que existiu violação pelos Demandados do contrato celebrado com a Demandante. Com efeito, segundo a cláusula 8.ª, o contrato foi celebrado por 6 meses, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de 15 dias em relação ao seu termo.
Não obstante os Demandados terem invocado na contestação a resolução do contrato por justa causa, não lograram fazer a respectiva prova, nos termos em que lhes competia – nº2 do art.º 342º do Cód. Civil, daí que, tendo o contrato sido celebrado em 9 de Maio de 2013, à data da respectiva venda (23.10.2013) estava em vigor.
Acresce que, na cláusula 4.ª nº1, fixou-se o regime de exclusividade, dizendo-se no n.º 2 da mesma que «Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade, só a Mediadora contratada tem direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência.»
Vieram os Demandados alegar, tratar-se de um contrato de adesão e, não tendo sido informados nem esclarecidos desta cláusula, deverá a mesma ser excluída, nos termos do regime aplicável das cláusulas contratuais gerais.
Ora, embora este tipo de contratos sejam, de facto, na sua maior parte, contratos modelo, como é o caso do contrato em apreciação, sendo até utilizados formulários comuns a essa actividade, o certo é que os Demandados apuseram a sua assinatura após o conteúdo das respectivas cláusulas e não se afigura que o significado da palavra “exclusividade” não seja cognoscível pelos Demandados, daí que a tese por estes apresentada não vingue, sendo a cláusula em questão, válida e por isso, deveria ser respeitada.
Estando em vigor o contrato, não podiam os Demandados ter vendido a fracção nas condições em que o fizeram, tendo, pois, violado o disposto no art. 406º nº1 do Cód. Civil, segundo o qual: “O contrato deve ser pontualmente cumprido e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.”- incorrendo, assim, em responsabilidade contratual, nos termos do art. 798.º do mesmo diploma legal, o qual dispõe que: “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua”.
Nesta matéria prescreve o art.º 562º do Cód. Civil: “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.” E o respectivo nexo de causalidade previsto no art.º 563º do citado código que refere o seguinte: “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
Sabe-se que a Demandante após a assinatura do contrato, diligenciou os procedimentos habituais para promover a venda, deslocando-se ao local para tirar fotografias diversas das suas características e organizou panfleto identificativo, tendo-o publicitado, inserindo-o nos sítios electrónicos mais conhecidos e procurados, suportando os custos inerentes, mas a verdade é que a Demandante, nada mais refere quanto aos prejuízos efectivos que esse incumprimento lhe trouxe, restringindo o pedido à remuneração que considera ser-lhe devida, pelo que, sem necessidade de mais considerações, tem a presente ação de improceder.
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DECISÃO
Face ao exposto, julgo improcedente a presente acção e, em consequência, absolve-se os Demandados do peticionado.
Custas a cargo da Demandante, em conformidade com os artigos 8º e 9º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro.
Registe e notifique.
Porto, 18 de Novembro de 2014

A Juíza de Paz
(Cristina Barbosa)
Processado por computador Art.º 131º/5 do C.P.C.
Revisto pelo Signatário.
Julgado de Paz do Porto