Centro de Documentação da PJ
Monografia

3710725.B.34
SILVA, Sandra Oliveira e
O arguido como meio de prova contra si mesmo : considerações em torno do princípio nemo tenetur se ipsum accusare / Sandra Oliveira e Silva.- reimpressão.- Coimbra : Almedina, 2019.- 899 p. ; 23 cm. - (Teses de doutoramento)
Publicação que corresponde, com ligeiras alterações, à dissertação de Doutoramento em Ciências Jurídico-Criminais, apresentada à Faculdade de Direito da Universidade do Porto, cuja defesa teve lugar a 17 de outubro de 2016. Resumo inserto na publicação.
ISBN 978-972-40-8110-6


DIREITOS DO ARGUIDO, DIREITO AO SILÊNCIO, MEIO DE PROVA, PROCESSO PENAL, DOUTRINA JURÍDICA, JURISPRUDÊNCIA, TESE, PORTUGAL

O presente estudo tem como propósito prioritário a densificação do sentido e alcance da garantia subjetiva cristalizada na máxima latina «nemo tenetur se ipsum accusare (vel prodere)». A univocidade da doutrina e da jurisprudência na identificação do seu núcleo essencial, constituído pela proibição de métodos coativos dirigidos à obtenção de declarações, contrasta com as dificuldades em delimitar o perímetro exterior do «direito à não autoincriminação», potenciando uma tendência «expansionista» que o tem convertido em tópico argumentativo omnipresente na discussão sobre a admissibilidade de todas as intervenções estaduais probatórias — desde a realização coativa de zaragatoas bucais até às obrigações de entrega de documentos no domínio fiscal, passando pela recolha coativa de «autógrafos» e pela utilização de meios ocultos de investigação. Na falta de expressa positivação normativa da «garantia contra a autoincriminação», a tarefa metódica de demarcação da sua área de tutela tem como ponto de partida a contextualização histórica do direito ao silêncio e a consideração dos seus possíveis fundamentos jurídico-constitucionais, não prescindindo também da análise das normas e construções doutrinais que têm emoldurado o problema noutros quadrantes jurídicos. A esta primeira aproximação ao problema se dirige a Parte I. A Parte II tem como ponto nevrálgico o esboço de critérios operativos adequados a identificar as espécies proibidas de intervenção estadual sobre o arguido (o sentido do «nemo tenetur») e a recortar as modalidades de colaboração probatória incluídas no âmbito de proteção da garantia (o problema do «se ipsum accusare»). A respeito do segmento «nemo tenetur» são analisadas as intromissões estaduais coativas, incluindo a valoração desfavorável do silêncio, as medidas processuais de promoção da colaboração e as soluções de direito substantivo assentes na imposição de um onus probandi ao arguido (todas discutidas entre os métodos de coação indireta). São ainda discutidos os mecanismos não coativos de obtenção de provas autoincriminatórias, destacando-se, entre os meios enganosos, os «interrogatórios ocultos» por agentes encobertos e «V-Männer». Neste conspecto, é ainda feita uma breve alusão aos deveres de informação e colaboração exteriores ao processo que nele se projetam em contributos autoincriminatórios coativos. A análise do trecho «se ipsum accusare» centra-se na investigação das formas de colaboração não declarativa incluídas no âmbito material do direito à não autoincriminação, em torno de um critério que o perspetiva como instrumento de salvaguarda da autonomia e liberdade do arguido na revelação do seu conhecimento sobre os factos (excluindo, portanto, as intervenções sobre o corpo que não se destinem a aceder à sua «esfera mental-espiritual», mesmo que exprimam contributos ativos para a própria perseguição penal). Contempla-se, ainda, uma referência sucinta à articulação entre o direito ao silêncio e do dever de declarar sobre os dados pessoais (e sobre o passado criminal). No epílogo deste itinerário, são interpeladas as soluções normativas e jurisprudenciais para alguns dos segmentos críticos que o «nemo tenetur se ipsum accusare» põe em evidência: a recolha coativa de amostras corporais, os reconhecimentos compulsivos, as perícias de caligrafia, as obrigações de entrega de documentos e outros objetos corpóreos, a utilização do polígrafo e de outros expedientes técnicos de «leitura da mente».