Centro de Documentação da PJ
Analítico de Periódico

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SILVA, Ana M. Pires
Tráfico de órgãos humanos : benefícios e desafios da nova convenção sobre o tráfico de órgãos humanos e sua implementação no ordenamento jurídico português / Ana M. Pires Silva
Revista do CEJ, Lisboa, Nº 1 (1.º semestre 2019), p. 85-102
(*) CD 300. Resumo inserto na publicação.


TRANSPLANTAÇÃO DE ÓRGÃOS, TRÁFICO DE PESSOAS, PROFISSIONAL DE SAÚDE, BIOÉTICA, CONVENÇÃO EUROPEIA

A existência de um comércio ilícito à escala mundial de órgãos humanos para fins de transplantação é um fato bem estabelecido, e várias medidas tem vindo a ser adoptadas pelo Conselho de Europa, em particular a recente Convenção contra o Tráfico de Órgãos Humanos, para combater esta actividade criminosa. Actualmente, a Convenção está assinada por 24 países e ratificada por 8, incluindo Portugal. O tráfico de órgãos humanos constitui uma violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais, e uma ameaça séria à saúde individual e colectiva. Os profissionais de saúde que tratam doentes no pré e pós - transplante encontram-se numa posição única para prevenir, detectar e denunciar eventuais casos de tráfico de órgãos. Na sua prática diária, acompanham doentes que podem estar a considerar a hipótese de recorrer à compra de um rim (situação mais comum), avaliam potenciais dadores vivos e recetores (par dador-recetor), e fazem o seguimento de doentes que possam ter sido transplantados no exterior em circunstâncias consistentes com o tráfico de órgãos e regressaram ao centro de transplantação de origem para receber o necessário acompanhamento médico pós-transplante (follow-up). A comunicação de eventuais casos suspeitos ou confirmados de tráfico de órgãos por parte dos médicos às autoridades competentes é fundamental para a perseguição criminal e erradicação das redes de tráfico. No entanto, os profissionais de saúde confrontam-se com dilemas éticos e legais quando se deparam com estes casos devido ao seu dever de preservar o sigilo médico. O presente artigo aborda o modelo português recentemente desenvolvido para a transposição e implementação da Convenção do Conselho de Europa contra o Tráfico de Órgãos Humanos no ordenamento jurídico português. Em primeiro lugar, é feita uma abordagem transversal do fenómeno do tráfico de órgãos e do tráfico de seres humanos para fins de extracção de órgãos, procurando contextualizar e dar a conhecer a sua dimensão. Em segundo lugar, apresentamos as alterações legislativas que estão em curso do ponto de vista da política criminal para dar resposta às obrigações decorrentes da Convenção. Por último, apresentamos as medidas regulamentares propostas tendo em vista: a) a implementação de um protocolo de atuação destinado aos profissionais de saúde sobre a conduta a adoptar para a prevenção, detecção e reporte de eventuais casos suspeitos ou confirmados de tráfico de órgãos às autoridades competentes; b) a introdução de uma excepção ao dever de segredo médico que permita que os médicos possam divulgar informações relevantes para a investigação criminal, sem incorrer em responsabilidade disciplinar nem criminal.