Centro de Documentação da PJ
Analítico de Periódico

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ALBERTO, José
Contrabando de diamantes em bruto : reflexões em torno da Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro / José Alberto
Investigação Criminal, Ciências Criminais e Forenses. IC3F, Lisboa, Nº 4 (Abril 2019), p. 98-131
(*) CD 314. Resumo inserto na publicação.


PEDRA PRECIOSA, CONTRABANDO, CRIME ORGANIZADO, DIREITO ADUANEIRO, TRÁFICO DE DIAMANTES, LEGISLAÇÃO PENAL

O Sistema de Certificação do Processo de Kimberley (SCPK) surgiu em novembro de 2002, na sequência de negociações entre os governos, a indústria internacional de diamantes e as organizações da sociedade civil, como resultado do Processo de Kimberley iniciado em maio de 2000 por Estados produtores de diamantes da África Austral, com intuito de considerar uma solução para o comércio de diamantes de zonas de conflito – «diamantes de sangue». Em Portugal, dispomos de legislação para o comércio de diamantes em bruto, cujo diploma legal (Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro) veio assegurar a execução do Regulamento (CE) n.º 2368/2002, do Conselho, de 20 de dezembro relativo à aplicação do SCPK para o comércio internacional de diamantes em bruto. A Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro prevê o crime de contrabando de diamantes em bruto, uma incriminação aduaneira que tutela o pagamento devido de impostos, mas também a prevenção do financiamento de conflitos armados através de diamantes. Trata-se de um regime jurídico específico e, na nossa opinião, meritório. Contudo, a conceção de nova legislação para o comércio de diamantes lapidados representaria um importante contributo para a prevenção de crimes conexos com a transação de diamantes, tais como, branqueamento e eventual financiamento do terrorismo. Em Portugal, as transações que envolvam artigos com metais preciosos (ouro, prata, paládio e platina) regem-se pelo postulado no RJOC – Regime Jurídico da Ourivesaria e Contrastaria1, normativo que regula também a prestação de serviços pelas Contrastarias, bem como as atividades profissionais desempenhadas por técnico de ensaiador-fundidor de metais preciosos e de avaliador de artigos com metais preciosos e de materiais gemológicos. Ficam de fora, no entanto, deste normativo os diamantes em bruto e lapidados, bem como outras pedras preciosas – gemas de cor. O comércio de diamantes em bruto, desde de 01 de fevereiro de 2003 e até à entrada em vigor da Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro, foi apenas tutelado pelo Regulamento (CE) n.º 2368/2002. Este normativo veio estabelecer a proibição de importação de diamantes em bruto para a União Europeia, desde que não acompanhados do respetivo certificado PK (certificado de Processo de Kimberley). Até 2014, a Imprensa Nacional-Casa da Moeda, S.A. (INCM) licenciava os operadores económicos para importação de diamantes e gemas de cor, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 139/91, de 10 de abril. Contudo, com a vigência da Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro, a competência para licenciar as empresas para importação de diamantes em bruto passou a recair nas atribuições da Direção-Geral das Atividades Económicas (DGAE), sendo este diploma omisso quanto ao comércio de gemas de cor. Atualmente, e desde a entrada em vigor da Lei n.º 5/2015, de 15 de janeiro – que materializou o SCPK – Sistema de Certificação do Processo de Kimberley (comércio internacional de diamantes em bruto) –, nos termos do artigo 25.º, a importação ou exportação de diamantes em bruto quando não acompanhados de certificado emitido por autoridade competente do SCPK, passou a constituir crime aduaneiro de contrabando, punido com pena de prisão de 3 a 8 anos. Tal incriminação é extensível a quem oferecer, puser à venda, vender, ceder ou por qualquer título receber, comprar, transportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver diamantes em bruto, desde que não acompanhados do respetivo certificado de Kimberley. No que concerne a Portugal, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) é a instituição competente para a emissão, validação e verificação dos certificados de importação e exportação dos diamantes em bruto, e para o controlo dessas importações e exportações, no âmbito do SCPK. O presente artigo visa ressalvar a problemática do comércio de diamantes, com especial enfoque para o contrabando de diamantes em bruto, a vertente deste comércio que atualmente encontra tutela legal em diploma mais recente, remetendo este – ainda que de forma algo discutível – a tutela legal de diamantes lapidados para legislação muito mais antiga. Para o efeito, procuramos enquadrar o crime de contrabando a partir de breve resenha histórica atinente à cobrança de impostos e às fontes das infrações penais tributárias. Concluímos pela pertinência do normativo que tutela o contrabando de diamantes em bruto, ainda que tal se mostre presumivelmente insuficiente face à dimensão dos valores decorrentes das transações de diamantes. Concomitantemente, a falta de regulamentação atualizada quanto ao comércio de diamantes lapidados resulta numa omissão legislativa preocupante, porquanto contribui para uma evidente ineficácia do regime do contrabando dos diamantes em bruto, tanto mais que se descura a prevenção da prática de outros crimes conexos, nomeadamente, branqueamento e/ou financiamento do terrorismo.