Acórdãos TC
Acórdão do Tribunal Constitucional
Nº Convencional: ACTC7740
Acordão: 97-499-1
Processo: 95-823
Relator: FERNANDA PALMA
Descritores: PROCESSO CONSTITUCIONAL.
FISCALIZAÇÃO CONCRETA DA CONSTITUCIONALIDADE.
FISCALIZAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO.
INTERPRETAÇÃO INCONSTITUCIONAL.
OBJECTO DO RECURSO.
INCONSTITUCIONALIDADE SUSCITADA NO PROCESSO.
APLICAÇÃO DE NORMA ARGUIDA DE INCONSTITUCIONAL.
TEMPESTIVIDADE.
INTERPOSIÇÃO DO RECURSO.
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE.
PRESSUPOSTO DO RECURSO.
PROCESSO CRIMINAL.
AMNISTIA.
REFORMATIO IN PEJUS.
PERDÃO.
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. DIREITO AO RECURSO.
GARANTIAS DE DEFESA. PRINCÍPIO DO ACUSATÓRIO.
ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO.
Nº do Documento: TCB19970710974991
Data do Acordão: 07/10/1997
Espécie: CONCRETA B
Requerente: PARTICULAR
Requerido: STJ
Nº do Diário da República: 244
Série do Diário da República: II
Data do Diário da República: 10/21/1997
Página do Diário da República: 12983
Volume dos Acordãos do T.C.: 37
Votação: UNANIMIDADE
Privacidade: 1
Constituição: 1989 ART32 N1 N5.
Normas Apreciadas: CPP87 ART409 N1 N2.
L 15/94 DE 1994/05/11 ART9 N3 A.
Normas Suscitadas: L 15/94 DE 1994/05/11 ART8 N1 D.
Normas Julgadas Inconst.: CPP87 ART409 N1 N2. L 15/94 DE 1994/05/11 ART9 N3 A.
Legislação Nacional: CPP29 ART667 N4.
LTC82 ART70 N1 B ART67 ART68.
CCP87 ART65 N1 D.
Jurisprudência Constitucional:
Área Temática 1: DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS PESSOAIS.
FISCALIZAÇÃO DA CONSTITUCIONALIDADE.
Área Temática 2: DIR PROC PENAL.
Decisão: Julga inconstitucionais as normas dos artigos 409.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal e 9.º, n.º 3, alínea a), da Lei n.º 15/94, de 11 de Maio, conjugadamente, na interpretação segundo a qual a revogação pelo Supremo Tribunal de Justiça do perdão concedido na 1.ª instância por aplicação da Lei n.º 15/94, de 11 de Maio {artigo 8.º, n.º 1, alínea d)}, fundamentada no artigo 9.º, n.º 3, alínea a), do mesmo diploma, não se encontra subordinada à proibição da reformatio in pejus consagrada no artigo 409.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal.
Sumário: I - Não era exigível aos recorrentes prever, no momento da interposição do recurso junto do Supremo Tribunal de Justiça, que este viria a alterar o acórdão recorrido em sentido desfavorável aos arguidos, dado que o recurso foi interposto apenas pela defesa. Nestes termos, não lhes sendo exigível suscitar a questão de constitucionalidade da norma que fundamentou tal decisão antes da prolação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, deve entender-se que a revogação do perdão surgiu, na perspectiva dos arguidos, como uma “decisão surpresa”, pelo que há que concluir pela admissibilidade do presente recurso.
      II - Não decorre, obviamente, da Constituição uma proibição absoluta da reformatio in pejus, pois isso seria conflituante com o direito ao recurso da acusação e com a realização da justiça. Mas tem de ser garantida, num certo grau, a estabilidade das sentenças judiciais. Ora, a proibição da reformatio in pejus é reclamada pela plenitude das garantias de defesa, quer porque a reformatio in pejus poderia surgir inesperadamente ou de modo insusceptível de ser contraditada pela defesa, quer porque restringiria gravemente as condições de exercício do direito ao recurso. São, assim, princípios constitucionais, na sua concretização no sistema jurídico, que exigem a configuração de uma certa medida de proibição de reformatio in pejus.
      III - O contraditório surge como regra orientadora da produção pelo tribunal de um juízo que interfira com o arguido, para além de se justificar pela defesa de direitos. É, assim, o princípio do contraditório expressão do Estado de direito democrático e, nessa medida, igualmente das garantias de defesa. A sua absoluta derrogação pela permissão de uma reformatio in pejus oficiosa torna-se, assim, clara violação do próprio princípio do contraditório, na sua justificação última.
      IV - Não sendo concebível, no caso concreto, uma intervenção do tribunal superior sem que houvesse sido interposto recurso pela defesa, a aceitação da revogação oficiosa da reformatio in pejus perverteria a função de tal recurso. Deste modo, o direito ao recurso, concebido como garantia de defesa consagrada no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, torna inviável, por si só, a reformatio in pejus oficiosa de uma decisão penal que aplicou um perdão. Mesmo que o contraditório fosse garantido, estaríamos ante uma inconstitucionalidade material por violação da referida garantia de defesa.
      V - Em conclusão, quer a norma derivada do artigo 9.º, n.º 3, alínea a), da Lei n.º 15/94, quando se prescinda, na sua aplicação, dos limites impostos pelos artigos 409.º, n.ºs 1 e 2, e 65.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, quer a norma derivada do próprio artigo 409.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, na interpretação que permite subtrair a revogação de um perdão ao âmbito da proibição da reformatio in pejus, violam os princípios da plenitude das garantias de defesa, o princípio do contraditório na sua inserção na estrutura acusatória do processo e o direito ao recurso consagrados no artigo 32.º, n.ºs 1 e 5, da Constituição.
Texto Integral: