Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5311/16.0T8OER.L1-8
Relator: CRISTINA LOURENÇO
Descritores: EXECUÇÃO
AGENTE DE EXECUÇÃO
NOTA DISCRIMINATIVA DE HONORÁRIOS
REMUNERAÇÃO ADICIONAL
NEXO CAUSAL ENTRE ACTIVIDADE E RESULTADOS
RECLAMAÇÃO DO EXEQUENTE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/25/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1–É devido acréscimo remuneratório ao agente de execução desde que seja possível estabelecer qualquer nexo causal entre a atividade desempenhada no processo - para além daquela que já é contemplada na remuneração fixa – e os resultados concretamente obtidos, designadamente, na recuperação do crédito exequendo, devendo, por conseguinte, os autos de execução revelar factualmente o contributo dinâmico e eficaz do agente de execução na obtenção do resultado, não bastando a prática e a realização dos atos necessários à normal tramitação executiva.

2–No caso particular previsto no nº 13, do art. 50º, da Portaria 282/2013, o legislador também não prescindiu da verificação do referido nexo causal entre a atividade dos agentes de execução nomeados em cada um dos processos (processo sustado e processo onde foi efetuada a venda) e a recuperação do crédito exequendo, uma vez que de acordo com a norma, a repartição da remuneração é feita entre os agentes de execução na proporção do trabalho efetivamente realizado, donde, só relevará o trabalho desenvolvido por um e outro dos agentes, com relevância na verificação do resultado final, o que terá de ser revelado factualmente em cada um dos processos.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:



Relatório


Nesta ação executiva para pagamento de quantia certa que “Banco Comercial Português, S.A.”, com sede na Praça D. João I, Nº 28, Porto, move contra A(…) e T(…), ambos residentes na Rua (…), a agente de execução apresentou nota discriminativa de honorários e despesas em 30 de maio de 2019, relativamente à qual o exequente apresentou reclamação em 9 de julho de 2021 (referência citius 19175341), alegando, para tanto, que:
Nestes autos foi penhorado imóvel dos executados, relativamente ao qual estava registada hipoteca a favor do exequente;
Em 17/06/2019 os autos foram extintos em virtude da sustação integral;
O imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC, liquidando, dessa forma, o crédito peticionado.
Não se pode conformar, assim, com a remuneração adicional reclamada na íntegra pela agente de execução, atento o disposto no art. 50º, nº 13, da Portaria nº 282/2013, de 29/08, uma vez que aquela não promoveu a venda, nem efetuou quaisquer diligências nesse sentido, não podendo receber uma remuneração adicional, apenas e só porque penhorou o imóvel.
Terminou, pedindo a procedência da reclamação, com a consequente notificação da Sra. agente de execução para proceder à correção da nota discriminativa nos termos peticionados.
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A agente de execução respondeu à reclamação em 12 de julho de 2021 (referência citius 19183486), dizendo, em síntese, que:
Procedeu à penhora do imóvel indicado pelo exequente, sobre o qual incidiam penhoras anteriores, motivo pelo qual a penhora aqui realizada foi sustada por decisão de 06/10/2017, e, a pedido do exequente formulado em 24/10/2017, procedeu ao cancelamento da primeira penhora prioritária registada a favor da Fazenda Nacional, atendendo à extinção dos autos que lhe deram origem; mantendo-se o referido imóvel penhorado no âmbito do  processo 275/14.8TBCSC, manteve-se a suspensão da presente execução e em 17/06/2019 foi proferida decisão de extinção dos presentes autos, por sustação integral, nos termos do art. 794.º do CPC;
Em 23/06/2021 o exequente requereu a emissão do termo de cancelamento da penhora registada no âmbito dos presentes autos, atendendo que estava marcada escritura para venda do referido imóvel, o que a reclamada fez;
Em consequência da dita venda, o exequente informou que se encontrava ressarcido com a venda extrajudicial do imóvel;
Sempre seria devida remuneração adicional à ora signatária, nos termos do disposto no art. 50.º, n.º 13 da Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto, repartida com o agente de execução do processo onde ocorreu a venda, atendendo à sustação dos presentes autos, sendo que o valor recuperado no âmbito do outro processo judicial ocorreu em virtude da garantia que o exequente detinha sobre o imóvel, reforçada com a penhora registada no âmbito deste processo.
Termina, pedindo seja indeferida a pretensão do exequente/reclamante.
Apresentou documentos.
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Em 13 de junho de 2022 foi proferida a seguinte decisão:
“Veio o exequente reclamar contra a nota discriminativa de honorários e despesas do Sr. A.E., com os fundamentos constantes a ref. 19175341.
A Sr.ª A.E. pronunciou-se nos termos expostos a ref. 19183486.
Apreciando.
A questão suscitada é a remuneração adicional cobrada pela Sr.º AE.
Resulta dos autos que:
Nos presentes autos foi penhorado o bem imóvel melhor identificado no auto de penhora.
Sobre o referido bem imóvel encontrava-se registada a favor do Exequente uma hipoteca.
Em 17/06/2019, foram declarados extintos em virtude da sustação integral.
O imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC, liquidando, dessa forma, o crédito peticionado.
A questão suscitada tem merecido especial atenção na jurisprudência recente, a qual tem tentado definir critérios gerais para o reconhecimento do direito a remuneração adicional por parte do agente de execução, sem prejuízo dos contornos de cada caso concreto – ver, a este propósito, Ac. RC, de 03.11.2015, relatado por Maria Domingas Simões; Ac. RP, de 02.06.2016, relatado por Aristides Rodrigues de Almeida; Ac. RP, de 10.01.2017, relatado por Maria Cecília Agante; Ac. RL, de 09.02.2017, relatado por Ezagui Martins; todos disponíveis em www.dgsi.pt.

Da referida jurisprudência podem retirar-se as seguintes linhas gerais:
A remuneração adicional devida ao agente de execução nos termos do art.º 50.º da Portaria 282/2013, de 29 de Agosto, não prescinde da verificação do nexo causal entre a recuperação de valores pelo exequente e as diligências que nesse sentido foram por aquele desenvolvidas;
Destinando-se a premiar o resultado obtido, a dita remuneração adicional só se justifica quando a recuperação ou a garantia dos créditos da execução tenha ficado a dever-se à eficiência e eficácia da actuação do agente de execução;
O critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que se verifica sempre que, na sequência das diligências do agente de execução, se conseguir recuperar ou entregar dinheiro ao exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento.
Parece-nos, assim, linear que o direito à remuneração adicional está, sempre, dependente de actos do agente de execução e da verificação de nexo causal entre estes e o resultado obtido.
No caso em apreço, a execução deu entrada em 28.12.2016, tendo a Sr.ª A.E. procedido à penhora do móvel e à citação dos executados.
Em 18.04.2018 proferiu decisão de sustação integral.
Em 17.06.2019 extinguiu a execução.
Não se vislumbra qualquer nexo causal entre os actos praticados pela Sr.ª A.E. e valor pago extrajudicialmente ao exequente, para mais quando o mesmo beneficiada de garantia hipotecaria.
Peticionar honorários no montante de € 1 459,32, em função dos resultados obtidos, na sequência dos actos praticados nestes autos –penhora e citação, sem que esteja minimamente demostrado o nexo causal entre os mesmos e o resultado obtido não tem qualquer cabimento legal.
Veja-se, a este propósito, o Ac. RC, de 03.11.2015, supra mencionado, quando refere que “o agente de execução não tem direito à aludida remuneração adicional tomando como base de cálculo o valor constante de acordo de pagamento em prestações celebrado entre exequente e executado, se os autos evidenciam com clareza que nenhuma intervenção teve na obtenção do mesmo”.
No mesmo sentido pode ler-se, no Ac. RP, de 10.01.2017, supra mencionado, que, “destinando-se a premiar o resultado obtido, essa remuneração adicional incide sobre os valores recuperados e garantidos ao exequente na execução, mas não abrange a totalidade da quantia exequenda quando a extinção da execução deriva de uma restruturação extrajudicial da dívida a que foi alheio o agente de execução.”
Comuns a todos os arestos estão as seguintes ideias:
Por um lado, tal interpretação é aquela que se impõe considerando os critérios interpretativos fixados no art.º 9.º do CC, quando, logo no Preâmbulo, o legislador deixou claro que é devido o pagamento de uma remuneração adicional ao agente de execução quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas;
Por outro lado, a referida interpretação do artigo 50º, 5, da portaria 282/2013, de 29 de agosto, sustenta um juízo de conformidade constitucional à luz dos princípios constitucionais da proporcionalidade e do direito a um processo equitativo, que supõem que os encargos com a realização coativa do direito não sejam desmesurados e inibidores da sua efetivação por parte dos seus titulares.
Em face de todo o exposto, não estando demonstrado – pelo contrário – que os actos praticados pela Sr.ª A.E. conduziram ao pagamento da quantia exequenda, conclui-se assistir razão ao exequente na reclamação apresentada que, por isso, procede integralmente, no sentido da redução do valor da nota de honorários e despesas apresentada pela Sr.ª A.E. no valor correspondente à remuneração adicional, por não se mostrar devida.
No mais, atenta a explicação fornecida pela Sr.º AE, nada tenho a determinar.
Notifique.”
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A agente de execução não se conformou com este despacho e dele recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
I)Da factualidade efetivamente ocorrida e contrariamente ao falsamente alegado   pelo Exequente na reclamação apresentada, a verdade é que a compra e venda efetuada da fração penhorada pela aqui Recorrente não foi desenvolvida no âmbito de qualquer processo judicial, nomeadamente do processo n.º 275/14.8TBCSC, mas sim no âmbito de negociações e subsequente transação extra judicial;
II)Isto mesmo resulta evidente do afirmado pelo próprio Exequente no requerimento pelo mesmo junto aos presentes autos executivos em 05.07.2021 no qual se declara «(...) ressarcido com a venda extrajudicial do imóvel.», afirmação (verdadeira) que antagoniza de forma flagrante com o constante do art. 4º da reclamação à nota discriminativa e justificativa de honorários também pelo Exequente apresentado mas desta vez em 09.07.2021 onde o mesmo refere que “o imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC, liquidando, dessa forma, o crédito peticionado”;
III)Mesmo que a venda em causa tivesse sido desenvolvida no âmbito do referido processo judicial (que comprovadamente não foi), ainda assim sempre seria devida remuneração adicional à ora Recorrente, nos termos do disposto no art. 50.º, n.º 13 da Portaria n.º 282/2013, de 29 de Agosto, repartida com o Agente de Execução do processo onde tivesse ocorrido a venda, atendendo à sustação dos presentes autos;
IV)Os honorários constantes da nota discriminativa e justificativa de honorários notificada ao Exequente são devidos à ora Recorrente, em virtude de o pagamento apenas ter ocorrido após o prazo para a dedução de oposição e no resultado de uma ação executiva em que a ora Recorrente exerce as funções de agente de execução, sendo certo que foi a atuação da agente de execução que desencadeou, necessária e consequentemente, o pagamento coercivo da obrigação não satisfeita voluntária e pontualmente pelos devedores/Executados;
V)Tendo em conta o conteúdo funcional do agente de execução e justificada a   sua caracterização como auxiliar da justiça e não como mandatário ou representante de qualquer das partes, cumpre afirmar que haverá sempre lugar ao pagamento da remuneração adicional mesmo quando a extinção da execução deriva de uma transação ou reestruturação extrajudicial da dívida em que o agente de execução não interveio ou mediou;
VI)Nesse mesmo sentido vai a jurisprudência dominante e que não poderá deixar de ser atendida, como por exemplo decorre do doutamente vertido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 02.06.2021 e relativo ao Processo nº. 3252/17.3T8OER-E.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, e onde taxativamente se afirma que “nas execuções de pagamento de quantia certa, é devida ao agente de execução a remuneração adicional prevista na Portaria nº 282/2013, desde que haja produto recuperado ou apreendido, nos termos do art. 50º, nºs 5 e 6, sempre que se evidencie que para o resultado contribuíram as diligências promovidas pelo agente de execução”, acrescentando ainda, de forma absolutamente cristalina, que “o direito do agente de execução àquele pagamento não depende de ter tido intervenção directa nas negociações entre o exequente e o executado que levaram a uma transação, na qual foi acordado o valor da dívida e as condições de pagamento”, ou ainda do referido no Acórdão do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 11.01.2018 e relativo ao Processo nº. 3559/16.7T8PRT-B.P1, igualmente disponível em www.dgsi.pt, onde se refere que “o critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, o que se verifica sempre que na sequência das diligências do agente de execução se conseguir recuperar ou entregar dinheiro ao exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento”, para se concluir que “a remuneração adicional do agente de execução prevista na Portaria n.º 282/2013, de 29.08, é sempre devida desde que haja produto recuperado ou garantido, excepto, nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado, se este efectuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução”;
VII)O nº. 12 do artigo 50.º da Portaria n.º 282/2013, de 29/08, estabelece que, nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia, se o executado efetuar o pagamento integral da quantia em divida até ao termo do prazo para se opor à execução, não há lugar ao pagamento de remuneração adicional, configurando, pois, por força do normativo aplicável, a única situação em que não haverá lugar ao seu pagamento;
VIII)É o "legislador" quem esclarece, em perfeita articulação com o regime dispositivo que o artigo 50.º da referida Portaria e o Anexo VIII, que só há lugar a dispensa do pagamento de qualquer remuneração adicional ao agente de execução quando, logo no início do processo - portanto até ao termo do prazo para o executado se opor à execução - a dívida seja satisfeita de modo voluntário, o que manifestamente não aconteceu no caso vertente;
IX)Decorre, portanto, inequivocamente, do texto da Portaria n.° 282/2013, de 29 de agosto, que o sistema de remuneração do agente de execução combina remuneração fixa, por ato ou lote de atos praticados, com remuneração variável, cujo cálculo está intimamente ligado ao sucesso da execução, a fim de acautelar dois objetivos fundamentais: garantir uma remuneração mínima que constitua, em qualquer dos casos, incentivo suficiente à realização dos atos e diligências do processo executivo e proporcionar uma remuneração adicional, que estimule a eficiência e a celeridade na realização desses atos e diligências, sendo por isso tão mais reduzida quanto mais demorado for o processo e tardio o seu resultado, pelo que, consequentemente não pode deixar de se entender que a redação do artigo 50.º da Portaria 282/2013, de 29/08, e do anexo para o qual remete, impõe o entendimento de que, havendo valor recuperado ou garantido, a remuneração adicional é sempre devida ao agente de execução, exceto numa situação, que a lei expressamente prevê - a de nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado e este efetue o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução (n.° 12), caso em que a intervenção do agente de execução se restringiu à realização da citação, ato que não é exclusivo nem específico da ação executiva, pelo que se pode entender que a intervenção do agente que é própria da execução coerciva ainda não se iniciou;
X)O critério que releva para a constituição do direito à remuneração adicional é o da obtenção de sucesso nas diligências executivas, sucesso que ocorre sempre que na sequência dessas diligências, realizadas pelo agente de execução, se conseguir recuperar ou entregar dinheiro do exequente, vender bens, fazer a adjudicação ou a consignação de rendimentos, ou ao menos, penhorar bens, obter a prestação de caução para garantia da quantia exequenda ou que seja firmado um acordo de pagamento, sendo certo que neste último caso o sucesso depende (da medida) do cumprimento do acordo (n.º 8);
XI)É mister concluir que o "legislador" apenas excluiu a remuneração adicional nos casos em que a citação antecede a realização as penhoras e o executado efetua o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução, por presumir que nessa situação, não tendo ainda sido realizadas penhoras e devendo estas realizar-se apenas após a concessão de prazo para o pagamento voluntário, a atuação do agente de execução foi totalmente indiferente para a obtenção do pagamento e não gerou qualquer expectativa em relação à remuneração devida pelo seu envolvimento do processo;
XII)O Tribunal recorrido, com o despacho pelo mesmo proferido, andou manifestamente mal e, com tal decisão, violou, pelo menos, o disposto no artigo 50º, da Portaria 282/2013, de 29/08, do qual fez uma incorreta interpretação e aplicação ao caso concreto em apreço.”
Com o recurso, a apelante apresentou dois documentos, a saber:
Pedido de cancelamento da penhora referente ao imóvel identificado nos autos, formulado em 23 de junho de 2021;
Contrato de compra e venda do mesmo imóvel, celebrado em 1 de julho de 2021.
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O recurso não foi objeto de qualquer resposta.
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Cumpridos os vistos legais, cabe apreciar e decidir.

II.Objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas suas conclusões, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. arts. 635º, nº 4, 639º, nº 1, e 662º, nº 2, todos do Código de Processo Civil), sendo que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art.º 5º, nº3 do mesmo Código).
No caso, as questões que importa decidir, são as seguintes:
Impugnação da decisão de facto;
Saber se a agente de execução tem direito à remuneração adicional que reclamou na nota discriminativa de despesas e honorários.

Questão prévia
Antes de mais, importa, porém, decidir da admissibilidade dos documentos apresentados pela apelante com o requerimento de interposição do recurso.
Segundo a regra geral contida no art. 423º, nº 1, do Código de Processo Civil, os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
Adaptando a norma ao caso concreto, resulta, assim, que a ora apelante deveria ter apresentado com a resposta à reclamação, todos os documentos necessários à prova dos factos por si alegados.
De acordo com o disposto no art. 425º, do Código de Processo Civil, “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento”.
Dispõe, por seu turno, o nº 1, do art. 651º, do mesmo Código, que “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1º instância”.
Adaptando os ditos normativos legais ao circunstancialismo dos autos, concluímos, então, que a junção dos documentos ora apresentados pela apelante só seria admissível se se demonstrasse que a mesma não os pode juntar até ao momento em que foi prolatado o despacho em crise, ou, se se verificasse a necessidade da respetiva junção em consequência da mesma decisão.
Analisados os documentos ora apresentados, constatamos que ambos foram elaborados/emitidos em momentos anteriores à resposta que a apelante apresentou à reclamação deduzida pelo exequente, pelo que poderiam e deveriam ter sido apresentados com aquele requerimento, tanto mais que nele a reclamante faz alusão a factos que alegadamente são comprovados pela dita documentação, que agora vem apresentar, mas que já não pode ser admitida face ao disposto no sobredito art. 425º, do CPC.
Nos termos da parte final do nº 1, do art. 651º, as partes podem ainda juntar documentos às alegações quando a junção se tenha tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.
Segundo António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa[1], nestes casos, “(…) tem-se entendido que a junção de documentos às alegações da apelação só poderá ter lugar se a decisão da 1ª instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento, quer quando a decisão se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito cuja aplicação ou interpretação as partes não contavam (….)”. 
Neste sentido, a título exemplificativo, cita-se o acórdão do STJ, de 30 de maio de 2019, proferido no processo nº 1130/18.8T8FNC.L1S1 e acessível em www.dgsi. pt., em cujo sumário se lê que “Os casos em que a junção de documentos se torna necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância são apenas aqueles em que, pela fundamentação da sentença, ou pelo objeto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não poderia razoavelmente contar antes de a decisão ter sido proferida.”
Volvendo ao caso dos autos, e em face da discussão travada no requerimento da reclamação e na resposta apresentada pela ora apelante, é manifesto que a facticidade suscetível de ser comprovada pelos documentos ora apresentados foi discutida previamente à decisão recorrida pela própria apelante, que, assim, por ela não foi surpreendida, nomeadamente quanto a qualquer dos factos e/ou meios de prova ali ponderados.
Deste modo, não estando preenchidos quaisquer dos requisitos de admissibilidade de documentos nesta fase, não se admitem os que foram apresentados pela apelante, determinando-se o respetivo desentranhamento e devolução à apresentante.
Notifique.

Fundamentação de Facto
Da impugnação da decisão de facto
De acordo com o disposto no art. 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”, explicando António Abrantes Geraldes[2] que esta norma tem cariz genérico, “de tal modo que tanto se reporta aos recursos em que sejam unicamente suscitadas  questões de direito, como àqueles que também envolvam a impugnação da decisão da matéria de facto. Em qualquer caso, cumpre ao recorrente enunciar os fundamentos da sua pretensão no sentido da alteração, anulação ou revogação da decisão, rematando com as conclusões que representarão a síntese das questões que integram o objeto do recurso”.
No caso, a apelante não manifesta de forma expressa a vontade de impugnar a decisão relativa à matéria de facto fixada na decisão recorrida, mas na realidade fá-lo, quer no corpo das alegações, que nas conclusões I, a III, com que remata o recurso, no que diz respeito ao seguinte trecho do facto dado como provado na decisão em crise: “O imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC (…).” 
Diz, a tal propósito (vide 1ª conclusão), que o imóvel em causa foi vendido “(…) no âmbito de negociações e subsequente transação extra judicial”.
Não pediu, não obstante, a alteração da matéria de facto que ficou provada e não indicou meios probatórios suscetíveis de comprovar a facticidade que alegou, limitando-se a invocar contradições do exequente em dois requerimentos que dirigiu ao processo, o primeiro, em 05.07.2021 onde se declarou «(...) ressarcido com a venda extrajudicial do imóvel.», o segundo, quando em sede de reclamação alega que  “o imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC, liquidando, dessa forma, o crédito peticionado”.
No que em particular diz respeito à impugnação da decisão de facto, dispõe o referido art. 640º:
1 Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c). A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
(…)”. – sublinhado nosso.
Relativamente ao recurso que envolva impugnação da decisão da matéria de facto, salienta, ainda, aquele mesmo autor, o seguinte:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos.
(…)[3] – sublinhado nosso.
“A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artºs. 635º,nº 4 e 641º, nº 2, al. b));
b) Falta de especificação, nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artº 640º, nº 1, al. a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.)
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.
(…)
As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo.”[4] – sublinhado nosso.
Como dissemos anteriormente, a apelante não indica qualquer meio probatório que permita infirmar o facto que na realidade impugna, e relativamente ao qual se pronuncia sobre a decisão (factual) que deveria ser firmada, limitando-se a remeter para declarações de cariz factual alegadamente contraditórias e produzidas pelo exequente no processo, indicando aquelas que a seu ver são verdadeiras, sem que indique o meio probatório que suporte tal convicção, sendo que não pode olvidar que os factos trazidos ao processo por qualquer das partes/intervenientes tem de ser demonstrado por qualquer meio de prova admissível, e que sobre si recaía o ónus de indicar os meios probatórios constantes dos autos suscetíveis de demonstrar as circunstâncias em que foi negociada e concretizada a venda do imóvel, de molde a poder ultrapassar-se a invocada contradição de factos relatados pelo exequente.
A apelante não cumpriu, deste modo, o ónus decorrente da alínea b), do nº 1, do sobredito art. 640º, impondo-se, por conseguinte, rejeitar o recurso de impugnação da decisão de facto.
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Posto isto, tem-se como definitivamente fixado o seguinte quadro factual fixado em 1ª instância.
1Nos presentes autos foi penhorado o bem imóvel melhor identificado no auto de penhora.
2Sobre o referido bem imóvel encontrava-se registada a favor do Exequente uma hipoteca.
3Em 17/06/2019, foram declarados extintos em virtude da sustação integral.
4O imóvel que garantia a responsabilidade em causa foi vendido no âmbito do processo judicial n.º 275/14.8TBCSC, liquidando, dessa forma, o crédito peticionado.
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Nos termos e ao abrigo do disposto no art. 607º, nº 4, aplicável ex vi art. 663º, nº 2, do Código de Processo Civil, tendo por base os elementos que os autos fornecem, e bem assim os documentos infra referenciados, apresentados pela agente de execução com a resposta à reclamação do exequente e que não foram objeto de impugnação, aditam-se àquela decisão os seguintes factos:
5Em 6 de outubro de 2107 a agente de execução proferiu a seguinte decisão: “No âmbito dos presentes autos foi registada uma penhora sob a fracção A, pertencente ao imóvel urbano descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº (…), através da Ap. 1811 de 2017/01/09.
Sucede que, sob a referida fracção já incidem penhoras anteriores, tendo a primeira sido registada pela Fazenda Nacional através da Ap. 4489 de 2009/06/09, no âmbito do processo nº 3433199901013238,
Assim, nos termos do nº 1 do artigo 794º do CPC, susta-se a presente execução relativamente ao imóvel supra descrito.”
6Tal penhora, efetuada no âmbito de processo fiscal foi levantada, do que foi dado conhecimento à agente de execução.
7A agente de execução endereçou ao exequente a seguinte notificação:
“Fica v.ª Exa. notificado do oficio remetido pelo Serviço de Finanças de Cascais para, querendo, no prazo de dez dias, vir informar se pretende que se diligencie pelo cancelamento da penhora registada pela Ap. 4489 de 2009/06/09 a favor daquele Serviço de Finanças.
Mais informamos que, conforme poderá constatar na Consulta ao Registo Predial em anexo, mesmo cancelamento a penhora supra indicada, encontram-se ainda registadas duas penhoras anteriores, pela Ap. 572 de 2015/03/12 e pela Ap. 1527 de 2015/10/28, pelo que não poderemos prosseguir com a venda do imóvel em causa.”
8Em resposta, o exequente pediu que a gente de execução diligenciasse pelo cancelamento do registo da penhora.
9Em 18 de abril de 2018, a agente de execução proferiu a seguinte decisão:
“No âmbito dos presentes autos foi registada uma penhora sobre a fracção A, pertencente ao imóvel urbano descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº (…), através da Ap. 1811 de 2017/01/09.
Sucede que, sobre a referida fracção já incide uma penhora anterior, registada através da Ap. 572 de 2015/03/12, no âmbito do processo nº 275/14.8TBCSC, a correr termos no Tribunal de Oeiras - Inst. Central - 2ª Secção de Execução - Juiz 2.
Assim, nos termos do nº 1 do artigo 794º do CPC, susta-se a presente execução relativamente ao imóvel supra descrito.”
10Em 1 de julho de 2021, depois de extinta a instância na sequência da decisão de sustação integral, a agente de execução dirigiu ao exequente a seguinte comunicação: “Fica v.ª Exa. notificado, na qualidade de ilustre mandatário do exequente, na sequência da emissão do termo de cancelamento da penhora, para, no prazo de 10 dias, informar qual o valor recebido e se se encontra ressarcido do valor em dívida.”
11Em 1 de julho de 2021, a Srª Drª (…), à margem deste processo, mas com referência ao mesmo dirigiu via e-mail a seguinte comunicação à Srª agente de execução: “Reportando-nos ao processo em epígrafe, cumpre o presente solicitar os S/ bons ofícios no sentido de nos remeter a certidão de cancelamento da penhora uma vez que está marcada a escritura extrajudicial do imóvel para o dia 30/06/2021.” – documento nº 5, apresentado pela agente de execução com a resposta à reclamação.
12 Em 5 de julho de 2021, aquela mesma ilustre advogada dirigiu via e-mail à agente de execução, e reportando-se a este processo, a seguinte comunicação: “Reportando-nos ao processo em epígrafe, cumpre o presente informar V. Exa. que o Banco Exequente se considera ressarcido com a venda extrajudicial do bem imóvel.” – documento nº 7, junto com a resposta à reclamação apresentada pelo Banco exequente.
13Na nota de honorários e despesas que endereçou à exequente, a agente de execução reclama a título de remuneração devida pelo valor recuperado após a penhora, a quantia de € 1459,32.

Fundamentação de Direito
A Portaria Nº 282/2013 de 29/08 (a que pertencem as disposições legais doravante citadas sem indicação expressa) que, além do mais, introduziu alterações ao regime da remuneração do agente de execução (face ao anteriormente previsto pela Portaria nº 225/2013, de 10/07), deixa antever no respetivo preâmbulo a intenção do legislador nessa matéria, quando elucida que se visou clarificar “… os momentos e a forma como os honorários e despesas devem ser adiantados ou pagos pelos respetivos responsáveis, no intuito de evitar conflitos entre o agente de execução e as partes, tantas vezes surgidos nesta matéria. Nos termos deste novo regime, deixam de existir montantes máximos até aos quais o agente de execução pode acordar livremente com as partes os valores a cobrar. Passam, ao invés, a existir tarifas fixas quer para efeitos de adiantamento de honorários e despesas, quer para honorários devidos pela tramitação dos processos, quer ainda pela prática de atos concretos que lhes caiba praticar.
Precisa-se melhor a estrutura de fases do processo executivo, para efeitos de adiantamento de honorários e despesas, reduzindo-se o valor da fase 1.
Ao adotar um regime de tarifas fixas, procura-se estimular a sã concorrência entre agentes de execução, baseada na qualidade do serviço prestado e não em diferentes valores a acordar, caso a caso, entre agente de execução e exequente, autor ou requerente.
Por outro lado, com vista a promover uma maior eficiência e celeridade na recuperação das quantias devidas ao exequente, reforçam-se os valores pagos aos agentes de execução, a título de remuneração adicional, num sistema misto como o nosso, que combina uma parte fixa com uma parte variável. Uma vez que parte das execuções é de valor reduzido, prevê-se a atribuição de um valor mínimo ao agente de execução quando seja recuperada a totalidade da dívida, precisamente para incentivar a sua rápida recuperação.
Procura-se igualmente estimular o pagamento integral voluntário da quantia em dívida bem como a celebração de acordos de pagamento entre as partes, que pretendam pôr termo ao processo. Para tanto, prevê-se o pagamento de uma remuneração adicional ao agente de execução quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas, ou a dispensa do pagamento de qualquer remuneração adicional ao agente de execução quando, logo no início do processo, a dívida seja satisfeita de modo voluntário, sem a intermediação do agente de execução. Este regime visa, em última linha, tornar mais simples e mais célere a fiscalização da atividade dos agentes de execução, no que respeita a esta matéria em particular, e promover uma mais rápida ação em caso de atuações desconformes.” – sublinhados nossos.
Dispõe o art. 50º:
1Sem prejuízo do disposto nos n.os 2 a 4, o agente de execução tem direito a ser remunerado pela tramitação dos processos, atos praticados ou procedimentos realizados de acordo com os valores fixados na tabela do anexo VII da presente portaria, os quais incluem a realização dos atos necessários com os limites nela previstos.
2Nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que não haja lugar a citação prévia do executado e se verifique após a consulta às bases de dados que não existem bens penhoráveis ou que o executado foi declarado insolvente, caso o exequente desista da instância no prazo de 10 dias contados da notificação do resultado das consultas apenas é devido ao agente de execução o pagamento de 0,75 UC.
3Quando o exequente requeira a realização de atos que ultrapassem os limites previstos nos pontos 1 e 2 da tabela do anexo VII da presente portaria, são devidos pelo exequente pela realização dos novos atos os seguintes valores:
a)- 0,25 UC por citação ou notificação sob forma de citação por via postal, efetivamente concretizada;
b)- 0,05 UC por notificação por via postal ou citação eletrónica;
c)-0,5 UC por ato externo concretizado (designadamente, penhora, citação, afixação de edital, apreensão de bem, assistência a abertura de propostas no tribunal);
d) 0,25 UC por ato externo frustrado.
4 Nos processos executivos para pagamento de quantia certa, quando haja lugar à entrega coerciva de bem ao adquirente, o agente de execução tem direito ao pagamento de 1 UC, a suportar pelo adquirente, que poderá reclamar o seu reembolso ao executado.
5 Nos processos executivos para pagamento de quantia certa, no termo do processo é devida ao agente de execução uma remuneração adicional, que varia em função:
a)- Do valor recuperado ou garantido;
b)- Do momento processual em que o montante foi recuperado ou garantido;
c)- Da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar.
6 Para os efeitos do presente artigo, entende-se por:
a)- «Valor recuperado» o valor do dinheiro restituído, entregue, o do produto da venda, o da adjudicação ou o dos rendimentos consignados, pelo agente de execução ao exequente ou pelo executado ou terceiro ao exequente;
b)- «Valor garantido» o valor dos bens penhorados ou o da caução prestada pelo executado, ou por terceiro ao exequente, com o limite do montante dos créditos exequendos, bem como o valor a recuperar por via de acordo de pagamento em prestações ou de acordo global.
7 O agente de execução tem ainda direito a receber dos credores reclamantes uma remuneração adicional pelos valores que foram recuperados pelo pagamento ou adjudicação a seu favor.
8Em caso de incumprimento do acordo de pagamento em prestações ou do acordo global, a comunicar pelo exequente, o agente de execução elabora a nota discriminativa de honorários e despesas atualizada tendo em consideração o valor efetivamente recuperado, afetando o excesso recebido a título de pagamento de honorários e despesas ao pagamento das quantias que venham a ser devidas, sem prejuízo de, no termo do processo, restituir ao exequente o saldo a que este tenha direito.
9O cálculo da remuneração adicional efetua-se nos termos previstos na tabela do anexo VIII da presente portaria, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
10 Nos casos em que, na sequência de diligência de penhora de bens móveis do executado seguida da sua citação seja recuperada ou garantida a totalidade dos créditos em dívida o agente de execução tem direito a uma remuneração adicional mínima de 1 UC, quando o valor da remuneração adicional apurada nos termos previstos na tabela do anexo VIII seja inferior a esse montante.
11O valor da remuneração adicional apurado nos termos da tabela do anexo VIII é reduzido a metade na parte que haja sido recuperada ou garantida sobre bens relativamente aos quais o exequente já dispusesse de garantia real prévia à execução.
12Nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia, se o executado efetuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução não há lugar ao pagamento de remuneração adicional.
13Havendo lugar à sustação da execução nos termos do artigo 794.º do Código de Processo Civil e recuperação de montantes que hajam de ser destinados ao exequente do processo sustado, o agente de execução do processo sustado e o agente de execução do processo onde a venda ocorre devem repartir entre si o valor da remuneração adicional, na proporção do trabalho por cada qual efetivamente realizado nos respetivos processos.
14Nos casos de delegação para a prática de ato determinado, e salvo acordo em contrário entre os agentes de execução, o agente de execução delegado tem direito ao pagamento, a efetuar pelo agente de execução delegante, de 0,75 UC por ato externo realizado.
15Havendo substituição do agente de execução, que não resulte de falta que lhe seja imputável ou de delegação total do processo, o agente de execução substituído e o substituto devem repartir entre si o valor da remuneração adicional, na proporção do trabalho por cada qual efetivamente realizado no processo.
16Em caso de conflito, entre os agentes de execução, na repartição do valor da remuneração adicional, a Câmara dos Solicitadores designa um árbitro para a resolução do mesmo.”
O sistema de remuneração misto, combinando uma remuneração fixa (nºs 1, a 4) com uma remuneração adicional variável (nºs 5, a 16), é evidenciada pelo mencionado art. 50º.
O pagamento da remuneração variável não tem, porém, conhecido até à data um entendimento uniforme na jurisprudência, tendo-se formado correntes distintas, sucinta e  claramente referenciadas no acórdão do STJ, de 18 de janeiro de 2022[5], que, por isso, passaremos a citar:
“(…)
7.De um lado, entende-se que “a remuneração adicional do agente de execução prevista na Portaria n.º 282/2013, de 29.08, é sempre devida desde que haja produto recuperado ou garantido, excepto, nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado, se este efectuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução”. O agente de execução tem direito à remuneração adicional ainda que a extinção da execução resulte de ato individual do devedor (pagamento voluntário), de ato conjunto de credor e devedor (acordo de pagamento) ou, até, de ato do próprio credor (desistência da execução). Para fundamentar esta posição, invocam-se os elementos teleológico (retirado da exposição de motivos da Portaria n.º 282/2013) e gramatical da interpretação da lei, assim como a natureza mista da remuneração do agente de execução.
8.De outro lado, a posição atualmente dominante considera, tal como o acórdão recorrido, que a atribuição da remuneração adicional depende da existência como que de um nexo de causalidade entre a atividade concretamente desempenhada pelo agente de execução e o êxito da ação executiva – i.e., a cobrança ou garantia do crédito exequendo. Deve, pois, aferir-se se a atividade do agente de execução foi processualmente relevante para a obtenção do resultado final, atendendo-se à sua “eficiência e eficácia”.
9.Importa referir ainda uma posição como que intermédia ou mitigada, segundo a qual, desde que hajam sido efetuadas no processo executivo diligências concretas dirigidas à cobrança coerciva do crédito exequendo, o resultado obtido, ainda que por acordo das partes, deve presumidamente ser considerado como ocorrendo na sequência da atividade desenvolvida pelo agente de execução.”
E expostas as interpretações que a norma tem suscitado, conclui-se no citado aresto que:
25.A ponderação dos diversos cânones hermenêuticos permite afirmar a exigência da verificação como que de um nexo causal entre a atividade do agente de execução e a realização (ainda que voluntária) do crédito exequendo enquanto requisito da remuneração adicional. O an e o quantum desta remuneração estão dependentes da atividade desenvolvida pelo agente de execução com vista à obtenção da quantia exequenda, surgindo o resultado dessa atividade como conditio sine qua non da mesma retribuição. Assim, o resultado obtido pelo exequente de modo alheio à atividade empreendida pelo agente de execução, em virtude de não ter havido qualquer contributo da sua parte, direto ou indireto, para a obtenção da quantia exequenda, não permite atribuir-lhe o direito à remuneração adicional.
26.Não pode, mediante o argumento a contrario, deduzir-se da disciplina estabelecida para certos casos no art. 50.º, n.º 12, da Portaria n.º 282/2013 (“Nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia, se o executado efetuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução não há lugar ao pagamento de remuneração adicional”), um princípio-regra de sentido oposto para os casos não abrangidos pela norma. Na verdade, não se mostra adequado, a partir da regra contida no art. 50.º, n.º 12, deduzir-se a contrario que os casos que ela não contempla na sua hipótese seguem um regime oposto. Conforme resulta dos diversos cânones hermenêuticos, não se afigura apropriado atribuir ao agente de execução o direito à remuneração adicional nos casos em que a sua atividade não assume relevância – atual ou potencial – para o sucesso da lide executiva. De qualquer modo, se tal preceito – reconhecimento do direito à remuneração adicional em todas as hipóteses não contempladas no art. 50.º, n.º 12 – se pudesses deduzir, a contrario, sempre careceria de uma redução teleológica. A norma restritiva seria, com efeito, exigida pelo fim da regulação. Só assim esse preceito, que se deduziria da regra contida no art. 50.º, n.º 12, concebido demasiado amplamente, se reconduziria e seria reduzido ao âmbito de aplicação que lhe corresponde segundo o fim da regulação ou a conexão de sentido do mesmo preceito. Tal resulta do imperativo de justiça de tratar desigualmente o que é desigual, de proceder às diferenciações postuladas pela valoração.”
Em sentido idêntico, decidiu o mesmo Supremo Tribunal, no acórdão de 2 de junho de 2021[6]: “O que é determinante é que haja produto recuperado ou garantido, na sequência das diligências do agente de execução, o que aponta para que deve evidenciar-se algum nexo de causalidade entre a actividade do agente de execução e um resultado positivo da execução, nos termos das alíneas a) e b) do nº6 do art. 50º.
Nexo que existirá sempre que dos factos apurados se possa concluir com alguma segurança, lógica e razoabilidade que a actividade do agente de execução contribuiu, criou as condições, para a obtenção de um acordo, ou para que haja valor recuperado.
E, consequentemente, para além das situações previstas no nº12 do art. 50º, em que o legislador excluiu expressamente o pagamento de remuneração adicional, não haverá lugar a remuneração adicional nas situações em que não se descortina qualquer contribuição do agente de execução para o proveito conseguido pelo exequente.
Diferente interpretação poderia estar ferida de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da proporcionalidade e do acesso à justiça e aos tribunais, consagrado nos arts. 2º, 18º/2 e 20º da CRP, mormente nos casos de flagrante desproporção entre o valor da remuneração adicional face aos resultados e a singeleza dos actos do agente de execução. (cf. Rui Pinto, obra citada, pag. 96: “Os nºs 5 e 6 da alínea b) do art. 50º são inconstitucionais tal qual foram delineados pelo legislador, pelo que deve ser feita uma interpretação restritiva que os torne proporcionais nos resultados e que passa pela consideração dos valores que o exequente veio realmente a receber.” – sublinhado nosso.
No sentido de o direito à remuneração adicional depender da existência de nexo causal entre as diligências promovidas pelo agente de execução e a recuperação do crédito exequendo, por ter sido essa a intenção do legislador quando no preâmbulo da citada Portaria deixou dito que tal pagamento era devido “(…) quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências por si promovidas”, encontramos na jurisprudência publicada a evidência de que é hodiernamente esta a corrente maioritária. Vejam-se, neste sentido, a título meramente exemplificativo, e todos acessíveis em www.dgsi.pt, o Ac. TRC, de 3/11/2015 (processo nº 1007/13.3TBCBR.C.C1); Ac. TRL de 26/09/2019 (processo nº 6186/15.2T8LSB-A.L1.-2); Ac. TRP de 11/05/2022 (processo nº 1724/21.2T8VCT-A.G1). 
No caso, a decisão recorrida deferiu a reclamação apresentada pelo exequente relativamente à nota de honorários apresentada pela agente de execução, na parte em que é peticionado o pagamento da remuneração adicional, com o fundamento de inexistir “(…) qualquer nexo causal entre os actos praticados pela Sr.ª A.E. e valor pago extrajudicialmente ao exequente, para mais quando o mesmo beneficiava de garantia hipotecaria.”, acrescentando que “Peticionar honorários no montante de € 1 459,32, em função dos resultados obtidos, na sequência dos actos praticados nestes autos –penhora e citação, sem que esteja minimamente demostrado o nexo causal entre os mesmos e o resultado obtido não tem qualquer cabimento legal.”
No âmbito duma remuneração mista, em que o agente de execução aufere uma remuneração fixa por determinados atos praticados no processo e uma remuneração adicional que é devida quando a recuperação do crédito exequendo ocorra na sequência de diligências realizadas pelo agente de execução (vide preâmbulo do referido diploma), o mesmo é dizer, em resultado ou em consequência de diligências por si concretamente promovidas e concretizadas, sufragamos do entendimento de que o acréscimo remuneratório é devido desde que seja possível estabelecer qualquer nexo causal entre a concreta atividade do agente de execução – para além daquela que já é contemplada na remuneração fixa – e os resultados obtidos, designadamente, e na parte que ora importa considerar, na recuperação do crédito exequendo. Isto é, os autos têm de revelar factualmente o contributo dinâmico e eficaz do agente de execução na obtenção do resultado, não bastando a prática e a realização dos atos necessários à normal tramitação executiva.
E tal juízo, terá de ser efetuado a partir do quadro factual revelado pela execução.
Tendo presente a factualidade apurada nos autos, temos de sufragar a decisão recorrida, na medida em que para além dos atos praticados pela agente de execução, inerentes ao natural desenvolvimento processual, tendo em consideração as particularidades do processo – necessidade de sustação integral – não emerge do acervo factual apurado qualquer ato que revista essencialidade à recuperação do crédito, alcançado mediante a venda do imóvel, em circunstâncias que nem sequer se mostram aqui apuradas, desconhecendo-se, inclusivamente, se a dita venda foi até concretizada mediante uma intervenção ativa e fulcral do agente de execução nomeado no processo executivo que permaneceu em curso.  
É que, no caso, sempre seria de chamar à colação o nº 13. do sobredito art. 50º, de acordo com o qual, “Havendo lugar à sustação da execução nos termos do artigo 794.º do Código de Processo Civil e recuperação de montantes que hajam de ser destinados ao exequente do processo sustado, o agente de execução do processo sustado e o agente de execução do processo onde a venda ocorre devem repartir entre si o valor da remuneração adicional, na proporção do trabalho por cada qual efetivamente realizado nos respetivos processos.”
Mas, também aqui, a norma não prescinde da verificação do nexo causal entre a atividade dos agentes de execução nomeados em cada um dos processos (processo sustado e processo onde foi efetuada a venda) e a recuperação do crédito exequendo, uma vez que de acordo com a mesma, a repartição da remuneração é feita entre os agentes de execução na proporção do trabalho  efetivamente realizado, e o recurso ao referido advérbio não é seguramente inócuo, dele se inferindo que só relevará o trabalho desenvolvido por um e outro dos agentes, com relevância na verificação do resultado final.
Resulta, ainda da referida norma, que havendo lugar ao pagamento de remuneração adicional, esta é única e tem de repartida entre os próprios agentes de execução. Desconhece-se se no outro processo foi reclamada remuneração adicional por parte do(a) agente de execução nele nomeado(a) e, em caso afirmativo, se foi deferido, sendo que a ora apelante nada disse no processo a tal propósito, o que a nosso ver sempre se impunha, face ao disposto no referido nº 13, do art. 50º.
Pelo exposto, não merece censura a decisão recorrida atenta a inexistência de factos e/ou fundamentos suscetíveis de a abalarem.
Improcede, por conseguinte, a apelação.

Decisão
Pelo exposto, acordam as juízas da 8ª Secção Cível deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação, mantendo, em consequência, a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante (art. 527º, nº 1, do Código de Processo Civil).
Notifique.


Lisboa, 25 de maio de 2023


Cristina Lourenço- (Relatora)
Carla Maria da Silva Sousa Oliveira- (1ª Adjunta)
Ana Paula Nunes Duarte Olivença- (2ª Adjunta)


[1]In, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, 2ª Edição, Almedina, pág. 813.
[2]“Recursos em Processo Civil”. 6ª Edição, pág. 181.
[3]Obra citada, págs. 196-197.
[4]António Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 199-200.
[5]Proferido no processo nº 9317/8.7T8PRT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[6]Proferido no Processo Nº 3252/17.38OER-E.L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt.