Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1268/10.0YRLSB-2
Relator: SOUSA PINTO
Descritores: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
EMBARGOS DE TERCEIRO
JULGAMENTO
SENTENÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/24/2011
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA
Decisão: ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA
Sumário: Tendo sido remetido o processo de embargos de terceiro dum juízo de execução para uma Vara Cível a fim de aí se proceder ao julgamento do mesmo, a competência da Vara Cível compreenderá tanto o julgamento da matéria de facto como a de direito, ou seja, deverá a sentença ser aí proferida.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa,

I – RELATÓRIO

O Digno Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal da Relação de Lisboa, veio requerer a resolução do conflito negativo de competência suscitado entre as Senhoras Juizas do 2.º Juízo de Execução de Lisboa e da 8.ª Vara Cível de Lisboa.
Tal conflito terá resultado do facto da Senhora Juíza da 8.ª Vara Cível de Lisboa ter entendido que a competência para a prolação da sentença seria da competência da Senhora Juíza do 2.º Juízo de Execução, razão pela qual lhe remeteu o processo de embargos de terceiro após a realização do julgamento e decisão sobre a matéria de facto, sendo certo que esta declinou a competência para tal, por entender que a competência para a sentença caberia a quem presidiu à audiência de o julgamento.
Na sequência da notificação que foi efectuada a tais Magistradas, nos termos e para os efeitos do disposto nos artgs. 118.º e 119.º, do CPC, vieram as mesmas apresentar as suas respostas, nas quais mantiveram as posições que já anteriormente haviam defendido. O Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação, no seu visto final, entendeu que o conflito deveria ser decidido favoravelmente à tese defendida pela Meritíssima Juíza do 2.º Juízo de execução.
Colhidos os vistos, cumpre decidir

II – Fundamentos

1. De facto

A factualidade que importa ter em consideração é genericamente aquela que resulta do relatório supra exibido.

2. De direito

Na apreciação do presente Conflito a questão que nos é colocada prende-se exclusivamente com o saber se será da competência das Varas Cíveis a prolação da sentença relativamente a processo que originariamente não era da sua competência e que lhe foi remetido para julgamento em determinada fase da sua tramitação, ou se, pelo contrário, realizada a audiência de julgamento com a inerente decisão da matéria de facto, a competência para a prolação da sentença compete aos Juízos originários, no caso, os de execução.
Adiantaremos desde já que na nossa óptica a competência está legalmente atribuída às Varas Cíveis, sendo que tal conclusão resulta da interpretação que fazemos da articulação legal que passaremos a enunciar.
Com efeito, estando-se perante um incidente da instância de embargos de terceiro, por via do disposto no art.º 357.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, o processo seguiria (como seguiu) os termos do processo ordinário, atento o seu valor, isto após os mesmos terem sido recebidos e as partes terem sido notificadas para os contestarem.
Aqui chegados importa saber então quem passaria a processar o incidente em causa.
Ora, nos termos do art.º 97.º, n.º 1, da LOFTJ, “Compete às varas cíveis:
a) A preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de valor superior à alçada do tribunal da Relação em que a lei preveja a intervenção do tribunal colectivo;
sendo que o n.º 4 do preceito é ainda mais preciso ao referir que “ São ainda remetidos às varas cíveis, para julgamento e ulterior devolução, os processos que não sejam originariamente da sua competência, ou certidão das necessárias peças processuais, nos casos em que a lei preveja, em determinada fase da sua tramitação, a intervenção do tribunal colectivo.
Cientes de que o processo passará a ser tramitado nas Varas Cíveis importará agora saber que actos deverão ser aí realizados, mais concretamente, saber se será da competência dos juízes de tal tribunal a prolação do julgamento de facto e sentença ou se apenas aquele.
Como se viu, estamos perante um incidente que segue os termos do processo ordinário, sendo que quanto a este a LOFTJ prevê a possibilidade de intervenção do tribunal colectivo:
“Art.º 106.º
Compete ao tribunal colectivo julgar:
(…)
b) As questões de facto nas acções de valor superior à alçada dos tribunais da Relação e nos incidentes e execuções que sigam os termos do processo de declaração e excedam a referida alçada, sem prejuízo dos casos em que a lei de processo exclua a sua intervenção;
c) As questões de direito, nas acções em que a lei de processo o determine.
Nessa sequência e no âmbito do preceito que fixa as competências do presidente do tribunal colectivo, estipula-se no art.º 108.º da LOFTJ:
“1 - Compete ao presidente do tribunal colectivo:
(…);
c) Proferir a sentença final nas acções cíveis;
d) Suprir as deficiências das sentenças e dos acórdãos referidos nas alíneas anteriores, esclarecê-los, reformá-los e sustentá-los nos termos das leis de processo;
(…).”
No caso concreto das Varas Cíveis, temos que o art.º 97.º, n.º 5 desta lei orgânica remete para aquele preceito ao dizer:
5 - Nas varas cíveis compete ao juiz da causa ou ao juiz a quem for distribuído o processo o exercício das funções previstas no artigo 108º, com as devidas adaptações.”
Por último, e na sequência destes dispositivos legais, surge-nos o art.º 646.º do Código de Processo Civil, que inserido em sede do processo de declaração ordinário (Capítulo IV, do Subtítulo I, do Título II, do Livro III, da nossa lei adjectiva civil), nos refere no seu n.º 1:
A discussão e julgamento da causa são feitos com intervenção do tribunal colectivo se ambas as partes assim o tiverem requerido.
Mais adiante porém, este mesmo preceito, acautelando a cada vez mais frequente inexistência de constituição do tribunal colectivo – ou por não ser requerida (n.º 1 do art.º), ou por não ser admissível (n.º 2 do mesmo) – estipula que “Quando não tenha lugar a intervenção do colectivo, o julgamento da matéria de facto e a prolação da sentença final incumbem ao juiz que a ele deveria presidir, se a sua intervenção tivesse tido lugar.
De todo o exposto, resulta para nós claro que ao ter sido remetido o processo para as Varas Cíveis, a competência destas para o julgamento englobará quer o julgamento de facto quer o de direito, pois que é essa a melhor interpretação das normas a que fizemos referência.
Em sentido idêntico ao aqui perfilhado, veja-se o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 16/07/2007 (proc.º 0752416), em que foi relator, o Senhor Juiz Desembargador, Dr. José António Sousa Lameira, disponível em www.dgsi.pt .
Resta tão-só acrescentar que quando o n.º 4 do art.º 97.º da LOFTJ alude à “ulterior devolução “ do processo ao tribunal de onde foi originário, mais não quer dizer do que o mesmo ali deverá regressar após ter sido decidido na sua plenitude (de facto e de direito), pois que, por regra, ele está associado a outro que aí se manteve.
Desta forma, face a todo o exposto, entende-se que a competência para a prolação da sentença, no presente caso, será da Meritíssima Juíza da 2.ª Secção, da 8.ª Vara Cível de Lisboa.

III – DECISÃO

Assim, acorda-se em declarar que a competência para a prolação da sentença nos presentes autos pertence à Meritíssima Juíza da 2.ª Secção, da 8.ª Vara Cível de Lisboa.

Sem custas.

Lisboa, 24 de Março de 2011

José Maria Sousa Pinto
Jorge Vilaça Nunes
João Vaz Gomes – Vencido como se segue: “Efectivamente no conflito 1588/06, lido até ao fim, entendi que o julgamento nas Varas é apenas o julgamento da matéria de facto, e não também de direito, regressando o processo de embargos de terceiro ao juízo de execução para a sentença, por via da regra da apensação.”