Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
726/20.2T8ALQ-A.L1-2
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA
ADMISSIBILIDADE
REQUISITOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/25/2023
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – O incidente de intervenção principal provocada pressupõe a existência de uma situação de litisconsórcio voluntário ou necessário.
II – O incidente de intervenção principal provocada é o adequado para o demandado fazer intervir na lide a seguradora para a qual havia transferido a responsabilidade civil emergente dos danos causados a terceiro por sinistro decorrente da sua atividade de empresa transportadora de bens.
III – Quando o chamamento do terceiro se faz a requerimento do réu, a lei é mais restrita, fazendo precludir a possibilidade de o requerer no termo do prazo para a contestação.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
AGEAS PORTUGAL - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., intentou ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra TRANSPORTES AS... - UNIPESSOAL, LDA, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 46 716,92€ (quarenta e seis mil setecentos e dezasseis euros e noventa e dois cêntimos) a titulo de indemnização, acrescida dos juros vencidos em 17.11.2020, calculados à taxa legal desde 27.10.2020 e que em 17.11.2020 somam 107, 5 € (cento e sete euros e cinquenta e um cêntimos) bem assim como nos vincendos calculados à mesma taxa até efetivo e integral pagamento.
A ré, TRANSPORTES AS... - UNIPESSOAL, LDA deduziu incidente de intervenção principal provocada, o qual foi julgado improcedente e, em consequência, foi indeferida a intervenção principal provocada do lado passivo de AXA – VERSICHRUGEM. AG..
Inconformada, veio a ré apelar do despacho, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES[3]:
1) - Vem o presente recurso interposto do despacho com a referência 155385057, que que indeferiu a intervenção principal provocada pelo lado passivo da seguradora AXA – VERSICHRUGEM.AG, requerida no início da diligência de tentativa de conciliação e audiência prévia (doc. referência 149660101), por requerimento que complementou (referência 11345902) e que posteriormente corrigiu através do requerimento com a referência 11390144.
2) - Entende a Recorrente, que ao fazê-lo, o Tribunal a quo, violou o disposto nos artigos 262.º alínea b), 311.º, 312.º e 316.º e seguintes, todos do CPC, sendo que, o cumprimento das referidas disposições legais, impunha que, fosse deferida a intervenção principal passiva provocada da seguradora AXA – VERSICHRUGEM.AG.
3) - A Ré, no início da tentativa de conciliação e antes de ser proferido qualquer despacho pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, requereu intervenção principal passiva provocada, tendo-lhe sido conferido o prazo de 5 dias para o fazer por escrito e para a presentar cópia da apólice do contrato de seguro.
4) - Isto porque, a mandatária da Ré, ao conversar com o ilustre mandatário da parte contrária, antes da “abertura da conferência de interessados” foi informada que a Autora, face à prova produzida pela Ré, iria alterar os fundamentos de facto da P.I. e a causa de pedir.
5) - Decorre da respetiva ata, da qual se se transcreve o seguinte:
Quando eram 11 horas e 35 minutos (e não antes porquanto as partes solicitaram um breve período de tempo uma que vislumbravam a possibilidade de requererem a intervenção principal provocada de uma nova parte e para permitir a análise do projeto de decisão entregue aos Il. Mandatários para posterior discussão do mesmo), foi pela Mmª Juiz de Direito declarada aberta a audiência prévia.
*
Seguidamente, pela Mmª Juiz de Direito foi tentada a conciliação entre as partes, a qual não foi possível, por ora, por se mostrarem irredutíveis relativamente às posições assumidas nos articulados.
Pedida e dada a palavra à Ilustre Mandatária da ré, no seu uso, requereu: "A autora vem requerer o incidente de intervenção principal provocada da AXA Seguros de Portugal, S.A., com sede na Praça Marques de Pombal, n.º 14, 1250-162 Lisboa, por ter sido celebrado entre esta companhia de seguros e a ré, um contrato de seguro titulado pela apólice n.º 80/0766163216, válido à data do acidente e através do qual a ré transferiu a responsabilidade decorrente do exercício da sua atividade de transporte, tendo a mesma todo o interesse em pleitear ao lado da ré e interesse em intervir no presentes autos. "Requer, ainda, o prazo de 5 dias para junção aos autos de cópia da apólice de seguros supra indicada e comprovativo da liquidação da taxa de justiça devida.
Após, a Mmª Juiz de Direito proferiu o seguinte: DESPACHO "Decorrido que seja o prazo de 5 dias e que se mostre junto quer o documento, quer o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, ouça-se a autora quanto ao incidente de intervenção provocada, suscitado pela ré, no prazo de 15 dias. Notifique." Sublinhado nosso
6) - No seu requerimento (com a referência 11390144) a Ré alegou (e fez junção do contrato de seguro), que na data em que prestou o serviço de transporte contratado pela Gefco-Lda, tinha legal e validamente transferida a responsabilidade civil por danos causados a terceiros no exercício da sua atividade de transporte, para a AXA - Versichrugem, AG (seguradora autorizada a exercer em Portugal em LPS pela ASF - Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões), através do contrato de Seguro de Responsabilidade Civil no âmbito dos Transportes Terrestres, titulado pela apólice n.º …-….
7) - Ou seja a Ré, que se dedica ao transporte rodoviário de mercadorias, no exercício da sua atividade, celebrou com a AXA - Versichrugem, AG., um contrato de seguro do ramo de transportes, pelo qual esta assumiu a responsabilidade pelo risco de perda ou dano, sofrido pela mercadoria transportada no serviço objeto dos presentes autos.
8) - E, consequentemente, requereu a chamada à ação a Axa Versichrugem, AG., legalmente representada por Saraiva Lima e Associados - Sociedade de Advogados, SP, RL, com morada na Avenida António Augusto de Aguiar, n.º 15, 1º Dto, 1050-012 Lisboa, para intervir na qualidade de Ré, nos termos do art.º 316 n.º 1., de modo a assegurar definitivamente a legitimidade passiva para a efetivação da eventual responsabilidade civil, em causa nos presentes autos.
9) - Em 13-01-2023, o tribunal a quo indeferiu a intervenção principal provocada do lado passivo de AXA – VERSICHRUGEM. AG. apresentando dois fundamentos distintos para a sua decisão.
10) - Conforme se transcreve:
“A intervenção principal é admitida relativamente àquele que, quanto ao objeto da causa, detiver um interesse igual ao do autor ou ao do réu, nos termos dos arts. 32.º, 33.º e 34.º do Código de Processo Civil (casos de litisconsórcio), de acordo com o estabelecido no art. 311.º do Código de Processo Civil. Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, a intervenção pode ser da iniciativa de qualquer das partes, nos termos do n.º 1 do art. 316.º do CPC. Acresce que tal intervenção principal pode ser provocada pelo réu, segundo o disposto no n.º 3 do art. 316.º do Código de Processo Civil, quando mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida (al. a), ou quando pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor (al. b).
Sucede que não estando em causa, face aos termos em que a autora desenha a relação material controvertida, qualquer situação de litisconsórcio, mormente necessário, como pretende a ré requerente, ou voluntário, relativamente àquela cuja intervenção é visada, verificando-se, outrossim, excluída a hipótese normativa acautelada na al. b), conclui-se ser inadmissível a intervenção principal requerida nos termos previstos no artigo 316.º do Código de Processo Civil.
Não se enquadrando igualmente o caso sujeito no campo de aplicação do art. 317.º do Código de Processo Civil, circunscrito às obrigações solidárias, impõe-se concluir pela ausência de fundamento legal para o chamamento nos termos requeridos a título principal. Não se verifica, assim, no caso, qualquer situação de preterição de litisconsórcio necessário passivo que cumprisse sanar pela intervenção desta visada, nem de litisconsórcio voluntário, nem se suscita dúvida fundamentada sobre o sujeito da relação controvertida, fundamentos que habilitariam, nos termos do art. 316.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, à admissão da intervenção da terceira que a ré pretende chamar.
Acresce que o chamamento se mostra extemporâneo, porquanto apenas pode ser deduzido até ao termo da fase dos articulados, nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 318.º do Código de Processo Civil e na situação vertente foi requerido, como aludido, na audiência prévia.” sublinhado nosso
11) - Entende a recorrente que, salvo o devido respeito, andou mal o tribunal a quo ao indeferir a intervenção principal provocada do lado passivo de AXA – VERSICHRUGEM. AG, uma vez que, estão cumpridos os requisitos para a referida chamada aos autos, que a mesma não é extemporânea e que a intervenção da terceira que a Ré chamou, se revela fundamental e imprescindível para a boa decisão da causa e para o cumprimento da Lei.
12) - E que com tal decisão, o tribunal a quo violou, por deficiente interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 262.º b), 311.º, 312.º e 316.º do CPC.
Senão vejamos;
13) - A intervenção principal implica, quando admitida, a modificação subjetiva da instância (artº 262º, al. b) do CPC), mediante a constituição de novo sujeito processual na posição de autor ou réu, em litisconsórcio ou coligação com os autores ou réus primitivos.
14) - Com este incidente o réu obtém não só o auxílio do chamado, como também a vinculação deste à decisão, de carácter prejudicial, sobre as questões de que depende o direito de regresso (art. 332º, nº 4, hoje art.º 323º, n.º 4) – cfr. Ac.s STJ de 16.12.1987, BMJ 372/385, e de 31.3.1993, BMJ 425/473.
15) - Decorre da Lei, que estamos perante um litisconsórcio necessário sempre que a intervenção de todos os interessados seja necessária para que a decisão a proferir regule de forma definitiva, uma determinada situação concreta.
16) - Decorre da lei que o chamamento pode ser deduzido por iniciativa do réu quando este:
a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida;
b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor.
17) - Nos termos do artigo 39.º do CPC: É admitida a dedução subsidiária do mesmo pedido, ou a dedução de pedido subsidiário, por autor ou contra réu diverso do que demanda ou é demandado a título principal, no caso de dúvida fundamentada sobre o sujeito da relação
controvertida.
18) - Saliente-se que, o instituto do litisconsórcio necessário, tem como fim último evitar decisões inconciliáveis, sob o ponto de vista prático e, consequentemente, obter segurança e certeza nas decisões jurídicas.
19) - Se não for admitida a intervenção da companhia de seguros para quem a Ré, valida e atempadamente, transferiu a responsabilidade pelos danos da carga que transportava ao serviço da segurada da Autora, a sentença que vier a ser proferida nestes autos para além de não ser justa, não permite regular de forma definitiva a situação sub judice, não atinge todos os interessados na decisão, podendo vir a ser posta em causa em decisão posterior.
20) - E existindo, um vínculo contratual com a Ré, no que respeita ao objeto dos presentes autos, devidamente comprovado nos autos, deverá a Companhia de Seguros, ser chamada a ocupar na lide a posição de parte principal, ou seja a mesma posição da Ré enquanto parte principal primitiva, a que se associa, fazendo valer um direito próprio (art.º 312º do CPC), podendo apresentar articulados próprios (art.º 314º do CPC) e sendo a final condenado ou absolvido na sequência da apreciação da relação jurídica de que é titular efetuada na sentença, a qual forma quanto a ele caso julgado, resolvendo em definitivo o litígio em cuja discussão (art.º 320º do CPC).
21) - O Tribunal a quo, também, andou mal, quando fundamentou o seu indeferimento na sua extemporaneidade, porque dispõem o art.º 316.º n.º1 e o art.º 318.º n.º1 al. a), ambos do CPC, que qualquer das partes pode provocar a intervenção de terceiro, desde que o faça até ao termo da fase dos articulados, no caso de ocorrer preterição de litisconsórcio necessário, sem prejuízo do disposto no artigo 261º.
22) - Entende a recorrente, que tendo a chamada sido requerida no início da diligência de tentativa de conciliação e antes de proferido qualquer despacho, estava em tempo para deduzir o incidente de intervenção, pois, até esse momento não pode considerar-se finda a fase dos articulados, uma vez ao abrigo das normas dos art.ºs 590º e ss. do CPC a fase dos articulados legalmente só termina com o despacho saneador. E o despacho saneador apenas foi proferido em 13-01-2023. (referência 155385057)
23) - É certo que a interpretação “mais literal” do artigo 318, n.º 1 a) poderá apontar para que o termo do prazo para o último articulado do processo preclude a intervenção do terceiro, todavia, a interpretação designada como“ racional”, que é aquela que vem a ser defendida pela jurisprudência, aponta para que a preclusão se dá com a prática do ato seguinte à apresentação do último articulado, que é na tramitação normal do processo e consoante os caso, o despacho pé-saneador (artº 590º n.º 2), a realização da audiência prévia ou tentativa de conciliação (artº 591º n.º 1 e 594.).
24) - E salvo melhor opinião, a interpretação preferível é que se estriba no elemento racional que finda a fase dos articulados, tese esta que já havia sido alvo de debate entre os professores Lopes Cardoso e Alberto dos Reis, a propósito do artº 359º do CPC de 1939, defendendo este que referindo a lei que a intervenção teria lugar “durante o período dos articulados” tal significava que só podia ter lugar até ao termo do prazo do último articulado, enquanto aquele entendia que o limite para a intervenção era o momento em que era proferido o despacho saneador, ato que na altura sucedia ao último articulado (v. Alberto dos Reis in CPC anotado, 1980, vol. I, 522).
25) - Entendemos assim, e porque nos autos, ainda, não havia sido proferido qualquer despacho marcando o início da segunda etapa da ação, a fase intermédia do processo, é permitido que fosse requerida a intervenção provocada devendo a mesma ser deferida pelo tribunal a quo.
26) - Não obstante a posição defendida e que partilhamos, acresce que o artº 261º do CPC, dispõe que até ao trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa, pode o autor ou o reconvinte, chamar essa pessoa a intervir nos termos do artº 321º do CPC.
27) - Ora, conforme supra se referiu, se é possível deduzir o incidente de intervenção principal provocada por preterição de litisconsórcio necessário, mesmo após ter sido proferido despacho saneador que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa e mesmo depois do trânsito em julgado do despacho que julgue ilegítima alguma das partes e ponha termo ao processo (artº 325º nº 2 do CPC), esta norma deverá obrigatoriamente de ser interpretada no sentido de possibilitar o chamamento, após a fase dos articulados e antes ainda da decisão quanto à legitimidade, quando o incidente é deduzido pela Ré (como é o caso).
28) - Entende a Doutrina e decorre da jurisprudência que a ressalva, no artº 318º, nº 1º, a) do CPC, permite esta interpretação (conforme defendem José Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil anotado, 1º volume, Coimbra Editora, 1999, anotação ao artº 269º do CPC, na redação do DL 180/96, de 25/09, que mantém plena atualidade)
29) - Salvo melhor entendimento, nos presentes autos não houve ainda despacho pré-saneador, saneador e audiência prévia aquando do pedido de intervenção provocada não estavam os autos na fase do saneamento.
30) - Logo, estaríamos ainda na fase dos articulados uma vez que enquanto não se entrar efetivamente noutra fase, estaremos nessa.
31) - Assim, deve o presente incidente ser admitido, por cumprir os requisitos previstos na lei e por ter sido deduzido tempestivamente.
Nestes termos e nos melhores de direito sempre com o mui douto suprimento de VEx.ºs, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, por provado, revogando-se, a decisão proferida pelo tribunal, a quo, ora recorrida, ordenando-se a sua substituição por outra que admita o incidente requerido pela Ré, como intervenção principal provocada, fazendo-se prosseguir os ulteriores termos do processo.
A autora não contra-alegou.
Colhidos os vistos[4], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[5],[6]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por TRANSPORTES AS... - UNIPESSOAL, LDA, ora apelante, que o seu objeto está circunscrito à seguinte questão:
1.) Saber se estão verificados os requisitos de admissibilidade do incidente de intervenção principal provocada.                  
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS
1.)  Em 08-09-2021, foi realizada audiência prévia.
2.) Nesta audiência prévia, a ré deduziu incidente de intervenção principal provocada.
3.) Por despacho de 12-01-2023, foi indeferido o incidente de intervenção principal provocada suscitado pela ré.
2.2. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[7] (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).
1.) SABER SE ESTÃO VERIFICADOS OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE DE INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA.
A apelante alegou que “a responsabilidade pelo transporte das mercadorias foi transferida para a companhia de seguros AXA – VERSICHRUGEM. AG, pelo que esta terá um interesse na ação igual ao seu”.
Mais alegou que “estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu”.
Alegou ainda que “tendo a chamada sido requerida no início da diligência de tentativa de conciliação, e antes de proferido despacho saneador, estava em tempo para deduzir o incidente de intervenção, pois, até esse momento não pode considerar-se finda a fase dos articulados”.
Assim, requereu “a intervenção principal provocada pelo lado passivo da seguradora AXA – VERSICHRUGEM”.
O tribunal a quo indeferiu “o requerido incidente de intervenção principal provocada”.
Vejamos a questão.
Se a relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a ação respetiva pode ser proposta por todos ou contra todos os interessados; mas, se a lei ou o negócio for omisso, a ação pode também ser proposta por um só ou contra um só dos interessados, devendo o tribunal, nesse caso, conhecer apenas da respetiva quota-parte do interesse ou da responsabilidade, ainda que o pedido abranja a totalidade – art. 32º/1, do CPCivil.
Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade – art. 33º/1, do CPCivil.
Estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 32.º, 33.º e 34.º – art. 311º, do CPCivil.
Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária – art. 316º/1, do CPCivil.
O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida, ou, pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor – art. 316º/3/a/b, do CPCivil.
Sendo a prestação exigida a algum dos condevedores solidários, o chamamento pode ter por fim o reconhecimento e a condenação na satisfação do direito de regresso que lhe possa vir a assistir, se tiver de realizar a totalidade da prestação – art. 317º/1, do CPCivil.
O chamamento para intervenção só pode ser requerido nos casos previstos no n.º 3 do artigo 316.º e no artigo anterior, na contestação ou, não pretendendo o réu contestar, em requerimento apresentado no prazo de que dispõe para o efeito – art. 318º/1/c, do CPCivil.
Âmbito do incidente de intervenção principal provocada suscitado pelo réu
A intervenção principal provocada consubstancia-se, em regra, no chamamento ao processo, por qualquer das partes, de terceiros interessados na intervenção, seja como seus associados, seja como associados da parte contrária, sobretudo em situações de litisconsórcio[8].
O art. 316º ordena mais logicamente as situações em que é admitida a intervenção principal provocada: litisconsórcio necessário; litisconsórcio voluntário por iniciativa do autor; litisconsórcio voluntário por iniciativa do réu[9].
O incidente de intervenção principal provocada pressupõe a existência de uma situação de litisconsórcio voluntário ou necessário[10],[11],[12],[13],[14],[15].
O próprio réu pode promover o chamamento de terceiros para a lide quando haja outros sujeitos passivos da relação material controvertida objeto dos autos e pretenda fazer intervir, em regime de litisconsórcio voluntário e a si associados, os demais sujeitos. Para tal exige-se que o réu revele “interesse atendível” na intervenção (art. 316º/3/a)[16].
Esta intervenção provocada passiva suscitada pelo réu abrange os casos em que a obrigação comporte uma pluralidade de devedores ou em que existam garantes da obrigação a que a causa principal se reporte, sob condição de o réu ter algum interesse atendível em os chamar a intervir, com vista à defesa conjunta ou a acautelar o eventual direito de regresso ou de sub-rogação que lhe assista contra eles[17].
Assim, o réu tem de mostrar um interesse atendível no chamamento do terceiro para a ele se associar[18].
Entra no processo, como réu, ao lado do réu primitivo, um dos sujeitos passivos da relação jurídica material controvertida que à ação serve de causa de pedir[19],[20],[21].
Ora, a apelante alegou que celebrou um contrato de seguro do ramo de transportes com a AXA - Versichrugem, AG., nos termos do qual esta assumiu a responsabilidade pelo risco de perda ou dano sofrido pela mercadoria transportada no serviço efetuado nos presentes autos.
A questão que se coloca é, pois, a de saber se o incidente de intervenção principal é o adequado para chamar à lide, como associada da ré, a seguradora para quem aquela transferiu a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros no exercício da sua atividade de transporte.
Porém, não tem tido um tratamento unívoco[22] nem na jurisprudência nem na doutrina a questão de saber se numa ação de responsabilidade civil extracontratual, a seguradora, com a qual a ré celebrou um contrato de seguro (não obrigatório), pode ser considerada titular da mesma relação jurídica invocada pela autora ou de relação jurídica com ela conexa a ponto de se poder aceitar que a seguradora seja admitida a intervir como parte principal, defendendo um interesse igual ao da ré[23],[24]; ou se, pelo contrário, poderá intervir na causa, mas apenas como parte acessória, auxiliando a ré na sua defesa[25].
No caso dos autos, tendo a apelante transferido a sua responsabilidade pelos danos causados a terceiros no exercício da sua atividade de transporte, está-se no âmbito de um seguro de responsabilidade civil que integra a classificação de contrato a favor de terceiro[26],[27].
Daí que ao objetivo normalmente prosseguido com a intervenção litisconsorcial provocada passiva – operar uma defesa conjunta no confronto do credor, opondo-lhe os meios de defesa que forem pertinentes – acresça o interesse do réu em acautelar eventual direito de regresso.
Tratando-se de obrigação solidária, admite-se expressamente que a finalidade do chamamento possa também consistir – para além do objetivo de possibilitar defesa comum – em o réu obter o reconhecimento eventual do direito de regresso que lhe assistirá, se for compelido a pagar a totalidade do débito[28].
Daqui decorre que o terceiro lesado sempre teria possibilidade de demandar o alegado lesante e a sua seguradora, em litisconsórcio voluntário, nos termos do art. 32º do CPCivil.
E, por isso, também o segurado demandado teria o direito a fazer intervir, a título principal e não a título secundário, a sua seguradora como ré, através de intervenção principal provocada para ser condenada no pedido, por força da alínea a) do art. 320º (atual art. 311º) do CPCivil[29],.
Temos, pois, que o incidente de intervenção principal provocada é o adequado para a ré assegurar a presença na lide da seguradora para a qual havia transferido a responsabilidade civil emergente dos danos causados a terceiro por sinistro decorrente da sua atividade de empresa transportadora de bens[30],[31], [32],[33],[34],[35],[36],[37].
Concluindo, no caso dos autos, é processualmente adequado o recurso ao incidente de intervenção principal provocada da seguradora, AXA - Versichrugem, AG., em razão do contrato de seguro invocado pela apelante como fundamento para tal.
Momento até poder ser deduzido pelo réu o chamamento de terceiros
E, sendo admissível tal intervenção, vejamos se foi deduzida tempestivamente, isto é, na contestação, ou, no prazo desta, como estatuído no art. 318º/1/c ex vi do art. 316º/3, ambos do CPCivil.
O chamamento pode ser requerido até ao termo da fase dos articulados, salvo no caso previsto no artigo 260º, exceção respeitante à hipótese de haver sido proferida decisão a declarar a ilegitimidade de alguma das partes, por não estar em juízo determinada pessoa[38].
O momento da preclusão da faculdade de chamar terceiro à intervenção principal não pode assim, logicamente, exceder o da preclusão do direito à intervenção de terceiro mediante articulado próprio, também aqui se tendo passado do despacho saneador (ou da designação da data da audiência final, ou ainda da sentença) para o termo da fase dos articulados[39].
Mas, quando o chamamento do terceiro se faz a requerimento do réu, a lei é mais restrita, fazendo precludir a possibilidade de o requerer no termo do prazo para a contestação. No código revogado o chamamento pelo réu era obrigatoriamente deduzido na contestação, ou dentro do respetivo prazo se o réu não contestasse, tendo o CPC de 2013 sujeitado ao mesmo regime (de prazo) todo o chamamento requerido pelo réu[40].
Relativamente aos casos regulados no art. 316º/3 e no art. 317º, o chamamento em que o réu queira promover deve ser deduzido na contestação ou no prazo desta, caso o réu não conteste (art. 318º/1/c)[41].
Assim, o réu tem de provocar a intervenção principal do terceiro no instrumento da contestação, apresentado no prazo normal ou no prazo prorrogado, nos termos do nº 5 do artigo 569º, ou, não contestando, em petição autónoma, no prazo de 30 dias, conforme disposto no nº 1 do mesmo artigo[42].
Ora, decorre dos autos, que a apelante deduziu o incidente de intervenção principal provocada, não na contestação, ou, no prazo desta, como legalmente estatuído, mas na audiência prévia.
Tendo o incidente de intervenção principal provocada sido deduzido na audiência prévia, por isso, após a apresentação da contestação, o mesmo por extemporâneo, não é admissível (mas mesmo que se entendesse que o incidente adequado seria a intervenção acessória provocada da seguradora[43],[44], o mesmo também teria sido deduzido extemporaneamente – art. 322º/1, do CPCivil[45]).
Concluindo, é extemporâneo o requerimento de intervenção principal provocada deduzido após ter sido apresentada contestação, atento o estatuído no art. 318º/1/c ex vi do art. 316º/3.
Assim, a apelante, para fazer intervir na causa a seguradora para a qual pretendia que se reconhecesse transferida a obrigação de ressarcimento dos danos invocados pela apelada, não poderia ter deixado de o fazer aquando da sua contestação, o que não se verificou.
Destarte, improcedendo as conclusões do recurso de apelação, há que confirmar a decisão proferida, mas não exatamente pelos mesmos fundamentos aí aduzidos.

3. DISPOSITIVO
3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar-se a decisão recorrida.       
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas pela apelante (na vertente de custas de parte, por outras não haver[46]), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida[47].
                           
Lisboa, 2023-05-25[48],[49]
Nelson Borges Carneiro
Paulo Fernandes da Silva
Pedro Martins (com declaração de voto)

(Declaração de voto)[50],[51]
Estou de acordo com a decisão, mas considero que o incidente de intervenção a deduzir, no caso, seria o da intervenção acessória: art. 321/1 do CPC.
Isto é, entendo que é de seguir a posição que o ac. do TRP de 31/01/2013, 2499/10.8TBVCD-A.P1, tendo já em conta o art. 140/2 da LCS, defende:
I - No âmbito de uma acção fundada em responsabilidade civil, ainda que o demandado como lesante a tenha transferido, mediante contrato, para uma empresa de seguros, são excepcionais as hipóteses em que o lesado pode demandar directamente a seguradora e exigir dela indemnização.
II - Tal verifica-se nos casos de seguro obrigatório e só em circunstâncias restritas no facultativo.
III - Por isso, em regra, a intervenção da seguradora, provocada pelo demandado, só pode ocorrer acessoriamente, enquanto titular de mera relação jurídica conexa com a que fundamenta a acção e que lhe confere o direito de regresso.
IV - Não se verificando qualquer das hipóteses excepcionais referidas em I, mas verificando-se a mencionada em III, o incidente de intervenção principal provocada pode ser convolado para intervenção acessória.”
Já defendi a mesma posição no ac. do TRL de 21/05/2020, proc. 5/14.4TCFUN.L1:
“É que [a] admissibilidade da intervenção principal e a condenação da seguradora no caso do seguro obrigatório resulta do conjunto das normas legais que permite que ela intervenha na lide ao lado do segurado, como descrito acima (neste sentido, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 1, 3.ª edição, Coimbra Editora, págs. 523-524 e 630-631 [agora, na 4.ª edição, 2021, Almedina, págs. 537-538 e 644]; a mesma situação também se verifica no caso dos seguros voluntários em que se permita, ao abrigo do art. 140/2 e 3 da LCS, a demanda da seguradora: neste sentido, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, obra e local citados; José Vasques, LCS anotado, pág. 484; Salvador Costa, Incidentes de instância, 2016, Almedina, 8.ª edição, pág. 109 (dois penúltimos §§ do ponto 7.2.1); quando não se permite [ou não se demonstra que permite – parenteses introduzido agora], já a intervenção é só a acessória: ac. do TRP de 31/01/2013, proc. 2499/10.8TBVCD-A.P1; é que nem sempre um contrato de seguro é um contrato a favor de terceiro; neste sentido, já o ac. do TRP de 14/11/2013, proc. 1394/13.3TBMAI-A.P1).
Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, na obra citada, desenvolvem o assunto e, para além de subscreverem o referido ac. do TRP, lembram dois acórdãos do TRL, acórdãos esses que decidiram que o incidente adequado era o da intervenção acessória no caso de seguros voluntários (e admitiram a convolação da intervenção): de 12/02/2008, proc. 6533/2008-1 e de 19/02/2013, proc. 1875/11.3TVLSB-A.L1-1; no mesmo sentido, aliás, vão os dois  acórdãos referidos nas notas 54 e 55 do acórdão a que esta declaração de voto fica anexa (do TRG, de 2020, proc. 1904/19.2T8VCT-A.G1, e de 2019, proc. 4289/18.0T8VCT-C.G1; todos eles com inúmeras referências doutrinárias e jurisprudenciais).
Estando, hoje, a questão devidamente estudada e sistematizada, não vejo razões para se continuar a assumir posições anteriores ao estado actual da questão.
Pedro Martins
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[1] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[2] As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.
[3] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2, do CPCivil.
[4] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2, do CPCivil.
[5] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.
[6] Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[7] Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, a Relação deve assegurar o contraditório, nos termos gerais do art. 3º/3. A Relação não pode surpreender as partes com uma decisão que venha contra a corrente do processo, impondo-se que as ouça previamente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.
[8] SALVADOR DA COSTA, Os Incidentes da Instância, 10ª ed., p. 85.
[9] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 629.
[10] Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2011-01-06, Relator: MANUEL BARGADO, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[11] O incidente da intervenção principal provocada ou da pluralidade subjetiva subsidiária superveniente tem aplicação, quer ocorra preterição do litisconsórcio necessário, quer nos casos de litisconsórcio voluntário, ou seja, em que a relação material controvertida respeite a várias pessoas, destinado a chamar a juízo algum litisconsorte do réu que não haja sido demandado, inicialmente, quer para chamar a intervir um terceiro contra quem o autor pretenda dirigir o pedido, no quadro da pluralidade subjetiva subsidiária, o que deve ser possível, tanto nas situações de litisconsórcio, como de coligação – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-06-02, Relator: HÉLDER ROQUE, http://www.dgsi.pt/jstj.
[12] A intervenção principal pretende a participação de terceiros que sejam titulares de uma situação subjetiva própria, paralela à invocada pelo autor ou pelo réu e quer essa situação seja ativa quer seja passiva. Conseguindo a participação de um interveniente evitar-se-á, em princípio, a propositura de mais uma ação sobre a mesma relação jurídica – Ac. Tribunal da Relação de Évora de 2008-07-03, Relatora: MARIA ALEXANDRA SANTOS, http://www.dgsi.pt/jtre.
[13] Para que o incidente de intervenção principal provocada possa ser admitido, é imperioso que o interveniente possa vir a juízo fazer valer um direito seu, próprio, um direito pelo qual pudesse ab initio demandar ou ser demandado com a parte a quem pretende associar-se ou que o pretende ter ou ver como associado – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2004-07-08, Relator: FERNANDO BAPTISTA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[14] O incidente de intervenção principal provocada pressupõe a existência de uma situação de litisconsórcio necessário ou voluntário – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2018-02-06, Relator: FERNANDO SAMÕES, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[15] A intervenção principal provocada pressupõe que o chamado e a parte à qual pretende associar-se tenham interesse igual na causa, pelo que não é de admitir a intervenção apenas destinada a prevenir a hipótese de a parte primitiva não ser titular do interesse invocado. A intervenção principal provocada abrange todos os casos em que a obrigação comporte pluralidade de devedores ou quando existam garantes da obrigação a que a causa principal se reporte, sob condição de o réu ter algum interesse atendível em os chamar a intervir na causa, quer com vista à defesa conjunta, quer para acautelar o eventual direito de regresso ou de sub-rogação que lhe assista – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2018-11-27, Relatora: MICAELA SOUSA, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[16] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 388, nota (5).
[17] SALVADOR DA COSTA, Os Incidentes da Instância, 10ª ed., p. 85.
[18] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 630.
[19] SALVADOR DA COSTA, Os Incidentes da Instância, 10ª ed., p. 91.
[20] No incidente da intervenção principal provocada, o chamamento ao processo é desencadeado por alguma das partes iniciais com interesse em alargar o âmbito da eficácia subjetiva da decisão aos chamados, terceiros interessados na intervenção, seja como seus associados, seja como associados da parte contrária – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-06-02, Relator: HÉLDER ROQUE , http://www.dgsi.pt/jstj..
[21] A intervenção de terceiros principal provocada passiva pressupõe a contitularidade da relação jurídica controvertida entre o réu e o chamado, o que não se verifica no caso em apreço – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2018-1-25, Relator: ESPINHEIRA BALTAR, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[22] Esta questão não tem tido um tratamento unívoco nem na jurisprudência, nem na doutrina, sendo frequentemente convocada quando se analisa qual o tipo de incidente suscetível de fazer intervir na ação a seguradora, nas situações para as quais inexiste seguro obrigatório – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2011-01-06, Relator: MANUEL BARGADO, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[23] Tendo o segurado-lesante celebrado um contrato no qual a seguradora se obrigou a garantir a um terceiro beneficiário até determinada quantia, o cumprimento das obrigações daquele, a prestação a exigir pelo beneficiário é só uma, podendo a mesma ser exigida, por força do contrato, tanto ao segurado como à seguradora, pelo que o terceiro lesado sempre teria possibilidade de demandar o alegado lesante e a sua seguradora, em litisconsórcio voluntário, nos termos do artigo 27.º do CPC. Por isso, também o segurado demandado teria o direito a fazer intervir, a título principal e não a título secundário, a sua seguradora como ré, através de intervenção principal provocada para ser condenada no pedido, por força da alínea a) do artigo 320.º do CPC – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2008-11-27, Relatora: ONDINA ALVES, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[24] Atenta a natureza do contrato de seguro de responsabilidade civil, assumidamente concebido como um contrato a favor de terceiro (art. 444º, do Código Civil), a seguradora obriga-se, também, para com o lesado a satisfazer a indemnização devida, ficando aquele com o direito de demandar diretamente a seguradora, ou o segurado, ou ambos, em litisconsórcio voluntário – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2011-01-06, Relator: MANUEL BARGADO, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[25] O contrato de seguro celebrado entre a lesante e a respetiva seguradora apenas confere a esta um interesse processual secundário, podendo a mesma intervir na própria ação de responsabilidade civil na qual a lesante é ré, mas apenas por via do incidente de intervenção acessória. Não sendo a seguradora contitular da relação material controvertida, mas sim sujeito passivo de uma relação jurídica (contrato de seguro) que é conexa com a relação material controvertida, inexiste interesse litisconsorcial necessário ou voluntário entre a ré/lesante e a sua seguradora, não podendo esta ser demandada como parte principal, nem poderá ser admitido o incidente de intervenção principal provocada previsto no artigo 325º do CPC, por forma a desencadear uma situação de litisconsórcio sucessivo, apenas se justificando a intervenção acessória da seguradora, à luz do artigo 330º do CPC, como auxiliar da ré/lesante, com vista a uma futura ação de regresso contra a mesma, e por forma a ser indemnizada pelos prejuízos que venha a sofrer com a perda da demanda – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2008-11-27, Relatora: ONDINA ALVES, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[26] JOSÉ VASQUES, Contrato de Seguro, pp. 120/121.
[27] Mas, quando o seguro for facultativo, o terceiro-lesado que sofreu a lesão e exige a responsabilidade do lesante-segurado, poderá receber da seguradora deste a prestação devida pelo lesante. Está em causa um contrato a favor de terceiro, ainda que possa ser designado de impróprio, por não existir aquisição de um crédito autónomo pelo terceiro-lesado – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2008-11-27, Relatora: ONDINA ALVES, http://www.dgsi.pt/jtrl
[28] Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2011-01-06, Relator: MANUEL BARGADO, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[29] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2008-11-27, Relatora: ONDINA ALVES, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[30] Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2011-01-06, Relator: MANUEL BARGADO, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[31] Mas, considerando que o segurado poderá exercer o direito de regresso se vier a ser reconhecida a sua responsabilidade pelo sinistro, a intervenção da seguradora pode ser alcançada através do incidente de intervenção acessória provocada, nos termos dos arts. 330º e segs. do CPC, permitindo estender-lhe, desde logo, os efeitos do caso julgado que se formar com a eventual sentença condenatória. Neste caso, se a seguradora não tiver sido inicialmente demandada, v.g. por se ignorar a existência de contrato de seguro, o lesado ou mesmo o segurado pode requerer a sua intervenção principal provocada, nos termos dos arts. 325º e segs. do CPC. Assim, para além das desvantagens da solução no que respeita ao direito substantivo, a opção pela excecionalidade da ação direta conduz a um regime jurídico-processual escusadamente complexo, o que poderia ter sido facilmente ultrapassado se tivesse sido adotada outra opção em que, como regra geral, se admitisse aquela ação direta contra a seguradora, com ou sem demanda do segurado, sem embargo da intervenção deste quando se revelasse necessário – ABRANTES GERALDES, O novo regime do contrato de seguro, antigas e novas questões, Intervenção no Colóquio organizado pela AIDA-PORTUGAL, www.trl.mj.pt/intervenções/.
[32] A chamada seguradora podia ter sido demanda pelos AA conjuntamente com os RR, sendo certo que estes transferiram para a chamada a obrigação de indemnizar terceiros, até determinado montante, pelos danos invocados na petição. Donde resulta como expressamente estabelece a 2ª parte do no 1ºdo art. 330º que o incidente próprio não é a intervenção acessória – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2012-11-15, Relator: LEONEL SERÔDIO, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[33] O contrato de seguro tem as feições de um contrato a favor de terceiro, pelo que o réu/recorrente tem o direito de suscitar a intervenção principal da seguradora, pois são ambos solidariamente responsáveis nos termos do artigo 497º do Código Civil – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2015-07-09, Relator: HEITOR GONÇALVES, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[34] O incidente de intervenção principal é o adequado para chamar à lide, como associada do R. médico, a seguradora para quem aquele transferiu a responsabilidade civil pelos danos emergentes de sinistros ocorridos em consequência de atos, omissões e erros profissionais cometidos em diagnósticos, prescrições ou aplicações terapêuticas e no decurso de tratamentos ou intervenções cirúrgicas – Ac. Tribunal da Relação de Évora de 2018-01-11, Relatora: ELISABETE VALENTE, http://www.dgsi.pt/jtre.
[35] Tendo o Autor, na petição inicial, demandado o Fundo de Garantia Automóvel, e o responsável pelo acidente, convencido da inexistência de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, formulando, após a contestação dos réus, o pedido de intervenção principal provocada da seguradora, admitido por despacho, nos termos das referidas disposições legais, e apurando-se a existência do contrato de seguro válido e eficaz, a ação tem de prosseguir contra a Ré e interveniente seguradora – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2013-05-02, Relator: TOMÉ ALMEIDA RAMIÃO, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[36] O incidente de intervenção processual provocada é o expediente processual adequado a que o réu, demandado em ação para efetivação de responsabilidade civil por danos provocados por uma inundação, convoque para a causa uma companhia de seguros para a qual alega ter transferido a obrigação de indemnização desses danos, através de um contrato de seguro de responsabilidade civil não obrigatório – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2013-05-21, Relator: RUI MOREIRA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[37] Mediante contrato de seguro celebrado entre a Ré e a Zurich Insurance Plc UK Branch, esta assumiu o risco da responsabilidade civil dos administradores da referida Ré perante a sociedade, acionistas e terceiros pelos prejuízos decorrentes de atos ou omissões que lhes sejam individualmente imputáveis. Trata-se de um seguro D&O Insurance ( Directors and Officers ) que visa mitigar o risco pessoal do património do administrador de forma a incentivar e atrair os gestores mais capazes para o desempenho desses cargos. Deve ser admitida a intervenção principal da Seguradora nos termos do art.º 316.º n.º3 a) do Código de Processo Civil – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2022-03-17, Relatora: MARIA DE DEUS CORREIA, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[38] SALVADOR DA COSTA, Os Incidentes da Instância, 10ª ed., pp. 95/6.
[39] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 636.
[40] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 636.
[41] ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 319, nota (4).
[42] SALVADOR DA COSTA, Os Incidentes da Instância, 10ª ed., pp. 96.
[43] No seguro de responsabilidade civil facultativo os n.ºs 2 e 3 do art. 140º do Dec. Lei n.º 72/2008, de 16/04, concedem ao lesado o direito de demandar diretamente o segurador, isoladamente ou em conjunto com o segurado, nas duas situações excecionais aí mencionadas: a) - quando tal se encontre expressamente previsto no contrato de seguro; b) - quando o segurado tenha informado o lesado da existência de um contrato de seguro com o consequente início de negociações diretas entre o lesado e o segurador.  Não se verificando qualquer das referidas situações excecionais, a intervenção da seguradora, provocada pelo demandado/segurado, só pode ocorrer acessoriamente, enquanto titular de mera relação jurídica conexa com a relação material controvertida que fundamenta a ação e que lhe confere o direito de regresso – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2020-02-27, Relator: ALCIDES RODRIGUES, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[44] Estar-se-á, pois, perante um contrato a favor de terceiro quando as partes num contrato de seguro de responsabilidade civil facultativo atribuem ao terceiro lesado o direito a exigir diretamente ao segurador o pagamento de uma indemnização pelos danos imputáveis ao segurado, caso em que o instrumento processual adequado a chamar a juízo o segurador para intervir na causa é o incidente de intervenção principal provocada – arts. 316.º e sgs. do C.P.C.. Se o contrato de seguro de responsabilidade civil facultativo apenas se limita a conferir ao segurado um direito de exoneração da sua dívida para com o terceiro lesado, vinculando-se o segurador apenas com ele, segurado, o instrumento processual adequado a chamar a juízo o segurador para intervir na causa é o incidente de intervenção acessória – arts. 321.º e sgs. do C.P.C. – Ac. Tribunal da Relação de Guimarães de 2019-12-17, Relator: FERNANDO FERNANDES FREITAS, http://www.dgsi.pt/jtrg.
[45] O requerimento do chamamento de terceiro para se constituir como parte acessória é feito na própria contestação, só o sendo separadamente quando o réu não conteste. Nela, ou no requerimento autónomo quando não haja contestação, o réu deve justificar o seu interesse no chamamento – LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 645.
[46] Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.
[47] A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º/1, do CPCivil.
[48] A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.
[49] Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.
[50] O acórdão definitivo é lavrado de harmonia com a orientação que tenha prevalecido, devendo o vencido, quanto à decisão ou quanto aos simples fundamentos, assinar em último lugar, com a sucinta menção das razões de discordância – art. 663º/1, do CPCivil.
[51] Funcionando em regime de colegialidade, se algum dos juízes discordar da decisão ou de algum dos seus fundamentos, expressá-lo-á mediante a apresentação de voto de vencido ou de declaração de voto – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.