Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
176/17.8TNLSB.L1-7
Relator: ALEXANDRA DE CASTRO ROCHA
Descritores: EMBARCAÇÃO TURÍSTICA
PASSEIO CONTRATADO
RESPONSABILIDADE CIVIL
ACIDENTE
ACTIVIDADE PERIGOSA
DANO BIOLÓGICO
DANOS MORAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/14/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I – Não se justifica a alteração da matéria de facto provada se, atentos os princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação, as provas produzidas não impuserem decisão diversa.
II – Quando um facto gerador de danos seja susceptível de gerar responsabilidade contratual e extracontratual, cabe ao lesado, enquanto titular do direito de indemnização, escolher a tutela pretendida, podendo beneficiar, numa mesma acção, de todos os efeitos jurídicos que lhe sejam favoráveis.
III – Num contrato mediante o qual uma empresa de animação marítimo-turística se obriga, mediante retribuição, a proporcionar um passeio de observação da natureza, a prestação a cargo daquela empresa não se esgota na deslocação física da contraparte, incluindo não só um dever de informação prévia, nos termos do  art.º 6º nºs 1 e 2 do DL 108/2009 de 15-5 (permitindo à parte contrária tomar uma decisão consciente e esclarecida), como um dever de protecção, indissociável daquela prestação principal, no sentido de garantir que o passeio se realize em condições de segurança e que o passageiro chegue incólume ao seu destino.  
IV – A actividade de animação marítimo-turística, implicando navegação marítima, integra o conceito de actividade perigosa a que alude o art.º 493º nº 2 do Código Civil,  dado encontrar-se notoriamente sujeita à imprevisibilidade das forças da natureza – ventos, ondulação e correntes –, que se alteram frequentemente de forma súbita, com risco elevado para a integridade física e até para a vida dos passageiros.
V – Afigura-se adequada a atribuição de uma indemnização de €12.000,00 para ressarcimento do dano biológico daquele que, ainda que se encontre desempregado, esteja em idade laboral activa (tendo 55 anos à data do sinistro) e tenha ficado a padecer de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos.
VI – Provando-se que a vítima de acidente sofreu dores, medo e ansiedade, sendo o quantum doloris de 4 numa escala crescente de 7, foi submetida a internamento hospitalar de dois dias, tendo-se o período de doença prolongado por 96 dias, e tendo resultado sequelas definitivas geradoras de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (4 pontos), com sofrimento físico e necessidade esporádica de medicação analgésica, e ainda uma repercussão permanente nas suas actividades desportivas e de lazer de 2 numa escala crescente de 7, entende-se ser adequada a fixação de uma indemnização de €15.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO:
LL...  intentou a presente acção declarativa, com processo comum, contra W…, L.da, M... Seguros, RL... e P..., pedindo:
«a) A declaração do direito da autora a receber a título indemnização e compensação pelos danos causados pela ré o montante global de €40.000,00 (quarenta mil euros) ou o valor a apurar em execução de sentença;
b) A condenação da ré por danos causados à autora.
c) A condenação da ré ao pagamento à autora a título de danos emergentes o montante global de €8.000,00 (oito mil euros).
d) A condenação da ré ao pagamento à autora a título de lucros cessantes do montante global de €15.498,40 (quinze mil quatrocentos e noventa e oito euros e quarenta cêntimos)
e) A condenação da ré ao pagamento à autora a título de danos morais do montante global de €15.000,00 (quinze mil euros)».
Para tanto, alega que, tendo efectuado um passeio para observação de golfinhos, numa embarcação da R. W... (cuja responsabilidade civil se encontrava transferida para a R. M... Seguros), e sendo guia a R. P..., e capitão daquela embarcação o R. RL..., este acelerou repentinamente e realizou uma manobra de viragem contra uma vaga, levantando a embarcação no ar e provocando que, na descida, a A. fosse projectada fortemente contra o assento da nave em que seguia.
Conclui que desse acidente resultaram danos para si, que contabiliza da seguinte forma:
a – despesas: €9.501,60
b – retribuições que deixou de auferir: €15.498,40;
c – sofrimentos físicos e morais: €15.000,00;
d – valor a apurar «em execução de sentença».
A R. M... Seguros, contestou, arguindo a ineptidão da petição inicial, por falta de indicação do pedido ou pedidos que contra a 2ª R. a A. pretende formular. Por outro lado, invoca o incumprimento parcial da obrigação de dedução da petição inicial por artigos. Impugna, ainda, a versão dos factos apresentada pela A., pretendendo, ademais, que esta ocultou aos tripulantes da embarcação que sofria de problemas de coluna, já tendo sido submetida a uma intervenção cirúrgica, sendo certo que, caso tivesse mencionado tal circunstância, teria sido sentada num lugar mais à ré, onde o impacto causado pela ondulação é inferior. Refere também que a navegação decorreu normalmente, a uma velocidade adequada às condições existentes, sendo certo que, a dada altura, quando a embarcação se encontrava a navegar, transpôs uma vaga de maior dimensão, que determinou o levantamento da sua proa, o que era impossível ao skipper de prever ou atenuar, por se tratar de forças da natureza incontroláveis e imprevisíveis. Conclui que, prevendo a apólice relativa ao contrato de seguro que celebrou com a proprietária da embarcação a cobertura de responsabilidade civil e de acidentes pessoais, só nesta última se pode enquadrar o sucedido, razão pela qual o capital seguro tem um limite de €3.500,00 e apenas cobre as despesas de tratamento. No mais, impugna os danos invocados e valores indemnizatórios peticionados a título de danos emergentes, lucros cessantes e danos não patrimoniais.
Contestaram também os RR. W... Unipessoal, L.da, RL... e P..., arguindo a ineptidão da petição inicial, por dedução de pedido contra a “ré”, sem identificação de qual o sujeito desse pedido, bem como por falta de causa de pedir em relação aos RR. P... e RL..., por contradição entre pedido e causa de pedir e por cumulação de pedidos incompatíveis. Pretendem, por outro lado, haver ilegitimidade passiva dos contestantes, por a R. W... ter transferido para a R. seguradora a responsabilidade civil pelos danos causados pela sua actividade. Mais alegam que, no início da viagem, os passageiros foram informados de que as vibrações e impactos provocados pela ondulação e correntes marítimas poderiam agravar qualquer patologia lombar, tendo a A. respondido negativamente à pergunta sobre se sofria de problemas de coluna. A A. foi, ainda, advertida de que no banco dianteiro, que escolheu, era onde mais se sentiam as vibrações e o impacto da embarcação na água, tendo-lhe sido dito que poderia utilizar um banco transversal, localizado à ré. Referem, ainda, que, a dada altura, a proa da embarcação sofreu um impacto com maior força, resultante da formação repentina de uma onda cavada, devido a uma mudança súbita e imprevista da corrente marítima, numa altura em que a A. estava de pé, agarrada às pegas metálicas apenas com a mão esquerda, enquanto acenava com a mão direita para os demais passageiros, sendo que o impacto fez com que a A. se desequilibrasse, pendendo, com todo o peso do corpo, sobre a sua perna esquerda. Concluem que a A. desrespeitou as instruções de segurança, ao levantar-se em plena marcha da embarcação, e desrespeitou a ordem de se manter firmemente agarrada às pegas metálicas dos assentos. Impugnam também a ocorrência e extensão dos danos invocados pela A..
Convidada a, querendo, pronunciar-se sobre as excepções invocadas pelos RR., a A. veio pugnar pela sua improcedência.
Oportunamente, foi saneado o processo, tendo sido julgadas improcedentes as excepções suscitadas. Foram ainda fixados o objecto do litígio [«determinar se os Réus W... Unipessoal, Lda, RL... e P... são responsáveis pelo sinistro sofrido pela Autora e, em caso afirmativo, se os citados Réus e ou a Ré M... Seguros, nos termos do contrato de seguro, devem reparar os danos que aquela sofreu bem como a medida da sua prestação»] e os temas da prova.
Procedeu-se a audiência final, que decorreu em diversas sessões, no intervalo das quais, em 28/4/2021, a A. veio apresentar articulado superveniente, alegando que o seu médico, em 2021, concluiu que a A. sofreu danos físicos permanentes, impedindo-a de realizar diversas tarefas e de trabalhar, além de ter sido obrigada a efectuar despesas para se deslocar a Portugal, para comparecer no exame médico-legal efectuado no presente processo. Finaliza pedindo:
«1. A condenação solidária dos réus, ao pagamento de uma indemnização no todo ou em parte, em forma de renda vitalícia.
2. A condenação solidária dos réus ao pagamento de uma renda vitalícia mensal não inferior ao correspondente salário mínimo nacional em vigor no Canadá, que é actualmente de €1600,00 (mil e seiscentos euros) mensais.
3. A condenação solidária dos réus ao pagamento, de todas as despesas efectuadas em virtude da presente ação judicial,nomeadamente as ocorridas após a entrada da petição inicial no montante global de €2.273,72 (dois mil duzentos e setenta e três euros e setenta e dois cêntimos).
4. A condenação do réu RL... em litigância de má-fé, por prestar falsas declarações».
Tal articulado foi liminarmente indeferido, mediante despacho de 26/5/2021, o qual transitou em julgado.
Concluída a audiência final, foi proferida sentença, que conclui com o seguinte dispositivo:
«a) Absolvo os Réus W... Unipessoal, Lda., RL... e P... do pedido deduzido pela Autora LL....
b) Condeno a Ré M... Seguros a entregar à Autora LL...:
- A importância de €185,82, a título de danos emergentes, acrescida do montante relativo aos juros de mora vincendos à taxa legal desde a citação da Ré até integral e efectivo pagamento;
- A importância de €19.000, a título de compensação do dano biológico, acrescida do montante relativo aos juros de mora vincendos à taxa legal desde a citação da Ré até integral e efectivo pagamento;
- A importância de € 20 000, para compensação dos danos não patrimoniais, acrescida do montante relativo aos juros de mora vencidos à taxa legal desde a data da prolação da presente sentença.
Custas a cargo da Autora LL... e da Ré M... Seguros na proporção do respectivo decaimento (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC)».
Não se conformando com esta decisão, dela apelou a R. M... Seguros, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões:
«Sobre a matéria de facto:
1. A Apelante impugna a decisão que recaiu sobre a matéria de facto constante dos pontos 90[1], 143 e 144 dos factos julgados provados pela douta sentença recorrida, e da alínea dd) dos factos julgados não provados, invocando os concretos meios probatórios que impunham decisão diferente a propósito de cada um deles no corpo da alegação para a qual aqui se remete e que aqui, por economia, se considera reproduzida;
2. Assim, atendendo à prova produzida, quanto ao ponto 70 dos Factos Provados, devia ter sido provado apenas que: Ao retomar a marcha, o comandante da OE... acelerou e passou por uma onda maior do que as demais que até então se tinham feito sentir, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse;
3. Os pontos 143 e 144 dos Factos Provados deviam ter sido julgados não provados;
4. E no que toca à Alínea dd) dos Factos Provados, devia ter sido provado apenas que: O Réu RL... não podia prever a vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs e determinou o levantamento da proa quando se encontrava a navegar no mar;
Sobre a matéria de direito:
5. Não resulta da prova produzida a responsabilidade civil contratual dos RR. pelo acidente sofrido pela Apelante, por manifesta falta de prova por parte da Apelada, cujo ónus lhe cabia, dos pressupostos dessa responsabilidade, nomeadamente o facto (actuação humana) e a ilicitude do mesmo no que toca ao único facto causal do dano (Facto Provado n.º 70), de molde a poder beneficiar da presunção quanto à culpa do devedor prevista no art.º 799º do Cód. Civil;
6. O facto causal do dano nada teve a ver com a eventual violação de deveres contratuais acessórios por parte dos RR., como o dever de informação, mas com um facto natural;
7. Assim, a douta decisão violou os art.ºs 798º e 342º, n.º 1 do Cód. Civil, devendo ser substituída por outra que enquadre o acidente na cobertura de acidentes pessoais da apólice e não na cobertura de responsabilidade civil;
8. A questão do dano biológico na vertente de lucros cessantes está completamente ausente do thema decidendum porque a Apelada restringiu a sua pretensão aos lucros cessantes decorrentes da impossibilidade de continuar a trabalhar devido ao acidente, tendo ficado demonstrado que a Apelada já não estava a trabalhar à data do acidente;
9. O princípio do dispositivo, ainda que mitigado com as recentes alterações trazidas pelo novo CPC, impede o Juiz de se substituir às partes no delinear e no configurar da lide e, quando a lei lhe concede poderes investigatórios, devem os mesmos sujeitar-se ao princípio do contraditório, sob pena de se violar o princípio da proibição das decisões surpresa, previsto no n.º 3 do art.º 607º do CPC e n.º 3 do art.º 3º do CPC, normas violadas pela douta decisão recorrida;
10. Mas ainda que assim não fosse, a Apelada não teria qualquer direito a ser indemnizada por dano biológico porquanto: não era previsível, com segurança bastante, que viesse a sofrer diminuição da sua capacidade de ganho devido ao acidente pois para tal a Apelada tinha de ter voltado ao mercado de trabalho, o que nunca fez nem pretende fazer; as sequelas da lesão que sofreu não são incompatíveis com uma actividade económica; não foram alegados factos (e logo também não pôde ser feita prova dos mesmos) sobre a sua ocupação profissional anterior ou habilitações por forma a aquilatar daquela que seria a “carreira profissional expectável” da Apelada que, assim, permanece desconhecida;
11. E mesmo que assim não se entendesse, sempre haveria de considerar o montante arbitrado manifestamente desproporcional ao putativo dano biológico com base em casos análogos ao da Apelada indicados na alegação de recurso;
12. Salvo o défice funcional permanente atribuído à Apelada (4 pontos), os casos indicados na fundamentação da douta sentença nenhuma outra afinidade têm com o caso sub judice por se reportarem, na sua maioria, a pessoas que tinham uma vida profissional activa e assim continuaram após os respectivos acidentes;
13. Ao ter excedido os limites da discricionariedade permitida pelo recurso à equidade, a douta sentença violou as regras dos art.ºs 564º, n.º 2 e 566º, n.º 3 do Cód. Civil, bem como o princípio da igualdade previsto no art.º 13º da CRP;
14. Apesar de a responsabilidade civil contratual não afastar o pedido de danos não patrimoniais, a avaliação realizada pela douta sentença recorrida é excessiva considerando que: na sequência do acidente, a Apelada esteve internada no hospital apenas 2 dias, sem ter realizado qualquer cirurgia ou acto médico invasivo; não foi sujeita a qualquer tratamento terapêutico, como fisioterapia, nem dele necessita; decorreram apenas 94 dias (pouco mais de 3 meses) para a consolidação médico-legal das lesões, durante o qual apenas lhe foram prescritos analgésicos e um anti-coagulante injectável para fazer uma vez por dia nos primeiros 12 dias após alta hospitalar; teve de usar, apenas durante 1 mês colete dorsolombar, deixando de estar limitada nos seus movimentos a partir dessa data; retomou a sua vida íntima; apenas se provou ter tido duas consultas médicas e feito 3 RX após sair do hospital; as sequelas permanentes que apresenta consistem em raquialgia residual, desencadeada por flexão repetitiva ou com esforços do tronco, carregar pesos nos membros superiores e ortostatismo, sedestação ou decúbitos prolongados, mas que não a afecta em termos de autonomia e independência, e afectam a sua capacidade funcional de forma discreta, tendo-lhe sido atribuído um quantum doloris de grau 4/7 apenas durante o período de incapacidade temporária (96 dias) e um défice funcional permanente de 4 pontos;
15. A Apelante considera que também devia ter sido ponderado o reduzido grau de culpa dos RR., se alguma houve, cuja actuação esteve longe de ser temerária e que sempre procuraram acautelar a segurança e bem-estar dos passageiros;
16. Ao não ter decidido por uma quantia indemnizatória mais adequada e razoável, superando mesmo a avaliação que a Apelada fez dos seus próprios danos morais na petição inicial, a douta sentença recorrida violou os n.ºs 1 e 4 do art.º 496º e o art.º 494º, ambos do Código Civil;
17. Por último, para que o Apelante se constitua em mora e possam ser calculados juros de mora sobre as prestações em que foi condenada, a obrigação tem de ser certa, líquida e exigível;
18. Emergindo a obrigação de indemnizar de responsabilidade civil contratual, o momento da mora ocorre 30 dias após a decisão judicial que confirme, entre outros factos, a prestação indemnizatória do segurador, apenas havendo lugar ao cálculo de juros de mora a partir dessa data;
19. Ao ter condenado a Apelante no pagamento de juros de mora desde a data da sua citação, no que respeita à indemnização dos danos emergentes e do dano biológico, e desde a data da prolacção da sentença, quanto à compensação por danos não patrimoniais, a douta sentença recorrida violou não só o n.º 3 do art.º 805º do Cód. Civil (no qual fundamenta a sua decisão) como também enferma de erro na determinação das normas aplicáveis, devendo ter sido aplicados ao caso as normas especiais dos art.ºs 102, n.ºs 1 e 2, e 104º do DL n.º 72/2008, de 16 de Abril.
TERMOS EM QUE, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se, a douta decisão recorrida, com o que V.ªs Ex.ªs, Senhores Desembargadores, farão a costumada
JUSTIÇA!».
Não foram produzidas contra-alegações.
QUESTÕES A DECIDIR
Conforme resulta dos art.ºs 635º nº4 e 639º nº1 do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, as quais desempenham um papel análogo ao da causa de pedir e do pedido na petição inicial. Ou seja, este Tribunal apenas poderá conhecer da pretensão e das questões [de facto e de direito] formuladas pela recorrente nas conclusões, sem prejuízo da livre qualificação jurídica dos factos ou da apreciação das questões de conhecimento oficioso (garantido que seja o contraditório e desde que o processo contenha os elementos a tanto necessários – art.ºs 3º nº3 e 5º nº3 do Código de Processo Civil). Note-se que «as questões que integram o objecto do recurso e que devem ser objecto de apreciação por parte do tribunal ad quem não se confundem com meras considerações, argumentos, motivos ou juízos de valor. Ao tribunal ad quem cumpre apreciar as questões suscitadas, sob pena de omissão de pronúncia, mas não tem o dever de responder, ponto por ponto a cada argumento que seja apresentado para sua sustentação. Argumentos não são questões e é a estes que essencialmente se deve dirigir a actividade judicativa». Por outro lado, não pode o tribunal de recurso conhecer de questões novas que sejam suscitadas apenas nas alegações / conclusões do recurso – estas apenas podem incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, salvo os já referidos casos de questões de conhecimento oficioso [cfr. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil”, Almedina, 2022 – 7ª ed., págs. 134 a 142].
Nessa conformidade, são as seguintes as questões que cumpre apreciar:
- nulidade da decisão recorrida, por violação do princípio do contraditório, na vertente de prolação de decisão-surpresa;
- impugnação da matéria de facto;
- erro de julgamento na fixação da responsabilidade da R. seguradora, dos danos indemnizáveis e da indemnização devida (incluindo apreciação da susceptibilidade de indemnização e contabilização do dano biológico, montante indemnizatório relativo aos danos não patrimoniais e termo inicial da contagem dos juros de mora).
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença sob recurso considerou como provados os seguintes factos:
«1. A Ré W... é uma sociedade por quotas que tem por escopo societário, entre outros, a organização de actividades de animação turística, transportes costeiros e de passageiros.
2. A Ré W..., no desenvolvimento do seu objecto social, dedica-se desde 2012 à organização regular e com escopo lucrativo de viagens de barco para observação de cetáceos.
3. A Ré W... encontra-se autorizada pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas para exercer a actividade de operação turística de observação de cetáceos (Autorização n.º AOC/15/2016, de 10-08-2016) na zona costeira entre a Praia do Carvoeiro e a Praia da Arrifana com as embarcações EE (…), OE... (GBHUM …), T… (…) e O… (…).
4. A Ré W... encontra-se registada como agente de animação turística no Turismo de Portugal sob o n.º ….
5. No exercício da sua actividade, a Ré W... utiliza embarcações de recreio semi-rígidas, com casco construído em fibra de vidro e os flutuadores em neoprene e hypalon, designadamente, a embarcação de recreio denominada OE..., registada em seu nome no porto de Amesterdão sob o n.º … e com pavilhão holandês.
6. A OE... tem uma lotação total de catorze pessoas, sendo doze passageiros e dois tripulantes.
7. A OE... dispõe de dois bancos longitudinais, com cinco lugares almofadados cada, orientados no sentido proa/popa e ainda um banco transversal, de dois lugares, situados à ré, na embarcação, junto à consola de comando.
8. Os bancos longitudinais distam cerca de 50cm entre si e 20cm a cada um dos bordos laterais da embarcação.
9. Os doze lugares disponíveis para passageiros são constituídos por cadeiras almofadadas, orientadas no sentido da marcha.
10. Nos bancos longitudinais, cada um dos dez lugares individuais, é delimitado por uma estrutura em metal que suporta o assento e o encosto de costas.
11. Na parte traseira do encosto de costas, de cada um dos cinco lugares individuais, a estrutura de metal do assento possui duas pegas para segurança e apoio de mãos do passageiro do banco anterior.
12. A mesma estrutura de metal destina-se, ainda, em cada um dos lugares, a amparar eventuais projecções do passageiro posicionado imediatamente atrás, e limitam os seus movimentos, nomeadamente as suas saídas do lugar que ocupam.
13. Nos dois assentos situados na primeira das filas dianteiras dos bancos longitudinais, o apoio de ambas as mãos dos respectivos passageiros é constituído por uma estrutura de metal, fixada no estrado da embarcação e que se eleva, em arco, até à altura do peito.
14. A mesma estrutura de metal destina-se, também neste lugar, a amparar eventuais projecções do respectivo passageiro, limitando desta feita os seus movimentos, nomeadamente as suas saídas do lugar que ocupam na embarcação,
15. Os tripulantes da embarcação vão em pé, na consola de comandos da embarcação, que se situa a ré da mesma, a cerca de 1,5 m de altura relativamente ao convés.
16. Nos dois bancos longitudinais não existe qualquer espaço livre entre as pernas do passageiro.
17. A configuração da embarcação e a estrutura e disposição dos bancos limitam o espaço, para uso dos passageiros, no interior da mesma e visa impedir os passageiros de ali se movimentarem.
18. Tal configuração estrutura e disposição fazem com que os passageiros fiquem confinados aos seus lugares quando estão em pé, levantando-se apenas respectivo assento.
19. Os bancos são almofadados para proporcionar maior comodidade e segurança e atenuar o movimento da embarcação e embate desta na ondulação.
20. O banco transversal, situado à ré da embarcação, sofre menos oscilações e sente menos o impacto das ondas dos que os bancos longitudinais.
21. Nos bancos longitudinais, quanto mais próximos da proa se situarem os assentos, maior é o impacto e a vibração neles sentidos.
22. A proa da embarcação sofre impactos na água provocados pela ondulação e está mais sujeita à acção das correntes marítimas.
23. O Réu RL... é titular da carta de navegador de recreio com a categoria de Patrão de Costa.
24. O Ré RL... desenvolve a actividade de skipper há cerca de 15 anos.
25. A Ré P... é titular da carta de navegador de recreio com a categoria de Patrão Local.
26. A Ré P... é licenciada em biologia marinha.
27. Em 08-06-2016, os Réus RL... e P... desenvolviam a actividade de skipper e guia turístico, respectivamente, para a Ré W..., sob as ordens, direcção e autoridade desta.
28. A Ré W... e a Ré M...Seguros celebraram um contrato de seguro do ramo “Marítimo-Turística”, titulado pela apólice n.º 85/22950, vigente em 08-09-2016, o qual teve por objecto a embarcação de recreio denominada OE... e era regulado pelas condições particulares de fls. 65, gerais de fls. 66-82 anverso e especiais de fls. 82 verso-86.
29. As condições particulares do seguro em apreço, consignam, designadamente, o seguinte:
Tomador do seguro – W... Unipessoal Lda. (…)
(…)
Cláusulas particulares – 001 003 004 005 012 015 017 038 040 042 043 045 050 058 075 107 265 300
(…)
Coberturas
Capital
Casco e máquinas
90.000,00€
Responsabilidade civil marítimo-turística
100.000,00€
Morte ou invalidez permanente
240.000,00€
Despesas de tratamento e repatriamento
42.000,00€
Reboque até ao máximo de 5 euros/milha
Número de pessoas seguras na Apólice: 12
Condições particulares
001 Perda total
003 Gastos de salvamento
004 Encalhe, submersão, incêndio, explosão, abalroamento
005 Colisão com objectos fixos/flutuantes
012 Mau tempo
015 Riscos rodoviários
017 Roubo
038 Reboques
040 Acidentes, incêndio, explosão – Estaleiros
042 Estaleiros – Mau tempo
043 Estaleiros – Fenómenos da natureza
045 Responsabilidade civil
050 Responsabilidade civil – Custas judiciais
058 Acidentes pessoais – ocupantes (animação marítimo-turística)
075 Reposição de capital
107 Condição particular
Os capitais garantidos por cada pessoa segura, resultam da divisão do capital total de cada uma das coberturas da apólice, pelo número de pessoas seguras
265 Condição especial assoc. “Marítimo/Turística”
Condição particular
Marítimo-Turística
O presente contrato destina-se a garantir as coberturas obrigatórias de Responsabilidade Civil e de Acidentes Pessoais dos passageiros, excluindo a tripulação, nos termos definidos pelo Regulamento das Embarcações Utilizadas na Actividade Marítimo-Turística, do Decreto-Lei n.º 149/2014, de 10 de Outubro, e de harmonia com o Decreto-Lei n.º 108/2009, de 15 de Maio, alterado pelos Decretos-Lei n.º 95/2013, de 19 de Julho, e n.º 186/2015, de 3 de Setembro, sempre de acordo com os limites estabelecidos nas Condições Gerais, Especiais e Particulares da apólice.
300 Franquia
A franquia é de 1% do valor seguro em CASCO, MÁQUINAS E PERTENCES, não podendo nunca ser inferior a 100 euros.
O presente contrato vigora em conformidade com o disposto nestas condições particulares, fazendo também parte integrante as condições gerais, especiais e particulares aplicáveis, disponibilizadas no site da M... Seguros (…), enviando, no entanto, o Segurador, as referidas condições em suporte papel, ao Tomador do Seguro, caso este o solicite.
(…)».
30. As condições gerais da “apólice de seguro marítimo para embarcações de marítimo-turística”, juntas a fls. 66-82 anverso, consignam, designadamente, o seguinte:
«(…) ARTIGO PRELIMINAR
Cláusula Preliminar
1- Entre a M... SEGUROS, adiante designada por segurador, e o tomador do seguro mencionado nas Condições Particulares, estabelece-se um contrato de seguro que se regula pelas presentes Condições Gerais e pelas Condições Particulares, e ainda, se contratadas, pelas Condições Especiais.
2- A individualização do presente contrato é efectuada nas Condições Particulares, com, entre outros, a identificação das partes e do respectivo domicílio, os dados do segurado, os dados do representante do segurador para efeito dos sinistros, e a determinação do prémio ou a fórmula do respectivo cálculo.
3- As Condições Especiais prevêem regimes específicos da cobertura prevista nas presentes Condições Gerais ou a cobertura de outros riscos e ou garantias além dos naquelas previstas, e carecem de ser especificamente identificadas nas Condições Particulares.
(…)
CAPÍTULO I
Definições, objecto e garantias do contrato
(…)
Cláusula 2.ª
Objecto e garantias do contrato
1. (…)
2. A cobertura de responsabilidade civil – que tem de garantir, pelo menos, o capital mínimo estipulado na legislação que regula o seguro obrigatório – é inteiramente individualizada e destacada do seguro do navio ou embarcação, sendo definida nos termos das Condições Especiais e Particulares.
 (…)
CAPÍTULO VIII
DOS SINISTROS
(…)
Cláusula 33.ª
Responsabilidade Civil
1. A responsabilidade do Segurador em relação a danos causados a terceiros fica limitada ao valor indicado nas Condições Especiais e Particulares.
(…)
Cláusula 35.ª
Franquia
As indemnizações serão liquidadas com a dedução das eventuais franquias indicadas nas Condições Especiais e Particulares e nos termos aí convencionados, mas nunca oponível aos terceiros lesados ou seus herdeiros.
(…)».
31. As condições especiais da “apólice de seguro marítimo para embarcações de marítimo-turística”, juntas a fls. 82 verso-86, consignam, designadamente, o seguinte:
CONDIÇÕES ESPECIAIS
(...)
RESPONSABILIDADE CIVIL
45 Danos causados a terceiros, de acordo com as Condições Gerais, até ao montante do capital seguro e nos termos indicados nas Condições Particulares.
(…)»
ACIDENTES PESSOAIS – OCUPANTES (EMBARCAÇÕES DE RECREIO)
58 Garante o pagamento das indemnizações até aos limites de capital por Pessoa Segura fixados nas Condições Particulares da Apólice de Acidentes Pessoais, regulados pelas cláusulas das Condições Gerais da Apólice de Acidentes Pessoais e limitadas pelas seguintes condições especiais:
Cláusula 1ª
Definições
Para efeitos do presente contrato entende-se por:
- Pessoa Segura, qualquer pessoa, que ocupe a embarcação segura e/ou embarque ou desembarque da mesma com autorização do Segurado, na qualidade de utente da actividade de animação turística. Não se consideram para efeitos desta cobertura, as pessoas que ocupem a embarcação ou desembarquem da mesma, em função da sua profissão ou actividade laboral.
Cláusula 2ª
Objecto da Garantia
1. O Segurador garante, em consequência de acidente sofrido pela pessoa segura e abrangido pelas coberturas contratadas, o pagamento das indemnizações fixadas nas Condições Particulares para:
a) Morte ou Invalidez Permanente
b) Despesas de Tratamento e Repatriamento
2. As garantias deste contrato produzirão efeito, única e exclusivamente, enquanto a embarcação segura se encontrar nas seguintes situações:
a) Navegando no mar, rio, lago ou outras águas navegáveis, dentro da área de navegação descrita nas Condições Particulares da apólice;
b) Inactiva em amarração, portos e estaleiros;
(…).
Cláusula 3ª
Âmbito de Cobertura
1. Ficam cobertos os acidentes sofridos pelas pessoas seguras:
a) Durante a sua participação nas operações de colocação ou retirada da embarcação da água;
b) Nos momentos do seu embarque e desembarque na embarcação;
c) Durante a sua permanência a bordo da embarcação;
d) Durante as operações de transferência forçada para uma embarcação salvadora e enquanto permanecerem nesta até ao momento do seu desembarque;
e) Por queda involuntária ao mar;
(…).
Cláusula 4.ª
Exclusões
1. Além das exclusões previstas nas Condições Gerais da Apólice de Acidentes Pessoais, não ficam em caso algum abrangidos por esta cobertura as lesões corporais resultantes directa ou indirectamente de:
a) Puerpério, gravidez e suas consequências;
2. Salvo convenção em contrário expressa nas Condições Particulares e mediante o pagamento de um prémio adicional, a Seguradora não responde pelas perdas ou danos directa ou indirectamente resultantes da prática de esqui aquático, mergulho ou pesca submarina e, em geral, sobrevindos em provas desportivas, corridas, regatas, desafios, concursos ou apostas, ou durante os respectivos treinos.
ASSISTÊNCIA ANIMAÇÃO MARÍTIMO-TURÍSTICA
63 Garante as coberturas nos termos e limites estabelecidos pela Condição Especial (Assistência Animação Marítimo-Turística).
(…)».
32. As Condições Gerais da Apólice de Acidentes Pessoais, referidas no n.º 58 das condições especiais da “apólice de seguro marítimo para embarcações de marítimo-turística” e juntas a fls. 87-101 anverso, consignam, designadamente, o seguinte:
(…)
CAPÍTULO I
Definições, objecto e garantias do Contrato
Cláusula 1.ª
Definições
Para efeitos do presente contrato entende-se por:
(…)
m) Acidente, acontecimento devido a causa súbita, externa, violenta e alheia à vontade do tomador de seguro, da pessoa segura e do beneficiário que produza lesões corporais, invalidez temporária ou permanente, ou morte, clínica e objectivamente constatadas.
n) Invalidez permanente, a situação de limitação funcional permanente da pessoa segura, sobrevinda em consequência de sequelas produzidas por um acidente.
o) Incapacidade temporária, a impossibilidade física e temporária da pessoa segura exercer a sua actividade normal, susceptível de constatação médica.
p) Sinistro, evento ou série de eventos resultantes de uma mesma causa, susceptível de fazer funcionar as garantias do contrato.
Cláusula 2.ª
Objecto da garantia
1. O presente contrato garante, nos termos das coberturas contratadas, o pagamento de capitais, subsídios e/ou indemnizações devidos por:
a) Morte
b) Invalidez Permanente
c) Morte ou Invalidez Permanente
d) Incapacidade Temporária
e) Incapacidade Temporária por Internamento Hospitalar
f) Despesas de Tratamento e Repatriamento
g) Despesas de Funeral
(…)
3. O capital por Invalidez Permanente só é devido se a mesma for clinicamente constatada no decurso de dois anos a contar da data do acidente, excepto caso se comprove que a incapacidade ainda é consequência directa do acidente.
(…)
Cláusula 4.ª
Âmbito de Cobertura
Salvo convenção em contrário, o presente contrato cobre as consequências de acidentes ocorridos em qualquer parte do mundo, nos termos constantes das Condições Gerais, Especiais e Particulares contratadas, que resultem de:
a) - Risco Profissional e Extra-Profissional, entendendo-se como tal, a cobertura do risco 24 horas por dia.
b) - Risco Profissional, entendendo-se como tal, o inerente ao exercício da actividade profissional expressamente referida nas Condições Particulares do contrato.
c) - Risco Extra-Profissional, entendendo-se como tal, todo o que não se relacione como exercício de qualquer actividade profissional.
d) - Riscos Específicos, nos termos definidos nas respectivas Condições Especiais.
(…)
Cláusula 6.ª
Exclusões absolutas
1. Ficam sempre excluídos da cobertura do presente contrato os sinistros consequentes de:
a) Acção ou omissão da Pessoa Segura sob efeito de álcool ou bebida alcoólica que determine grau de alcoolemia igual ou superior a 0,5 gramas por litro e/ou uso de estupefacientes fora da prescrição médica, ou quando incapaz de controlar os seus actos, excepto caso se trate de seguro legalmente obrigatório e não tenha havido negligência grave ou dolo do sinistrado no consumo daquelas substâncias;
b) Acções ou omissões criminosas, mesmo que em forma tentada, excepto quando se trate de seguro legalmente obrigatório, mas, neste caso, não resulte de actuação da pessoa segura sobre ela própria;
c) Acções ou omissões negligentes, quando a negligência possa ser qualificada de grave, excepto quando se trate de seguro legalmente obrigatório, mas, neste caso, não resulte de actuação da pessoa segura sobre ela própria;
d) Suicídio ou tentativa de suicídio;
e) Actos notoriamente perigosos que não sejam justificados pelo exercício da profissão;
f) Apostas e desafios;
g) Acções praticadas pela Pessoa Segura sobre si própria, excepto caso se trate de seguro legalmente obrigatório e desde que a acção tenha conexão com a actividade segura;
h) Acções praticadas pelo Beneficiário sobre a Pessoa Segura, excepto caso se trate de seguro legalmente obrigatório e desde que a acção tenha conexão com a actividade segura;
i) Acções praticadas pelo Tomador de Seguro sobre a Pessoa Segura, excepto caso se trate de seguro legalmente obrigatório e desde que a acção tenha conexão com a actividade segura;
j) Acções praticadas por todos aqueles pelos quais seja civilmente responsável qualquer das pessoas referidas nas alíneas g), h), i), excepto caso se trate de seguro legalmente obrigatório e desde que a acção tenha conexão com a actividade segura;
k) Actos de terrorismo.
(…).
CAPÍTULO VII
Pagamento de capitais ou indemnizações
Cláusula 26.ª
Dos valores
Os valores garantidos - que no caso dos seguros obrigatórios, asseguram os mínimos legalmente estabelecidos - constam, expressamente, das Condições Especiais e Particulares do contrato.
(…)
Cláusula 28.ª
Invalidez Permanente
1. Em caso de Invalidez Permanente, o Segurador pagará o capital determinado em função da Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil.
(…)
Cláusula 29.ª
Incapacidade temporária
1. Em caso de Incapacidade Temporária, a Seguradora pagará o subsídio diário fixado nas Condições Especiais e Particulares, enquanto subsistir essa incapacidade e por um período não superior a 360 dias.
2. O pagamento do subsídio diário será feito à Pessoa Segura, sem prejuízo de indicação em contrário constante das Condições Particulares.
3. A incapacidade temporária considera-se dividida em dois graus:
1º grau — Incapacidade Temporária Absoluta — enquanto a Pessoa Segura, que exerça profissão remunerada, se encontre na completa impossibilidade física, clinicamente comprovada, de atender ao seu trabalho, mesmo que este seja o de instruir, dirigir ou coordenar os seus subordinados. Para a Pessoa Segura que não exerça profissão remunerada, enquanto estiver hospitalizada ou for obrigada a permanecer acamada no seu domicílio sob tratamento médico.
2.° grau — Incapacidade Temporária Parcial — enquanto a Pessoa Segura, que exerça profissão remunerada, se encontre apenas em parte inibida de realizar qualquer trabalho, nas condições referidas para o 1º grau, se essa situação lhe provocar diminuição dos seus proventos.
Para a Pessoa Segura que não exerça profissão remunerada, este tipo de incapacidade não se aplica, não lhe sendo, portanto, conferido direito a qualquer subsídio por Incapacidade Temporária, logo que deixem de se verificar as circunstâncias que conferem direito a subsídio por Incapacidade Temporária Absoluta (1.º grau).
4. Em caso de Incapacidade Temporária Absoluta (1.º grau), a Seguradora pagará, durante o período máximo de 180 dias, a contar do dia imediato ao da assistência clínica, a indemnização diária fixada nas Condições Particulares.
5. Em caso de Incapacidade Temporária Parcial (2º grau), a Seguradora pagará, durante o período máximo de 360 dias, a contar do dia imediato ao da assistência clínica, uma indemnização até metade da fixada nas Condições Particulares para a incapacidade temporária absoluta, com base na percentagem de incapacidade fixada pelo médico assistente ou, se for caso disso, em resultado de um exame efectuado por um médico designado pela Seguradora.
Ao período máximo de Incapacidade Temporária Parcial (360 dias), será sempre deduzido o período de tempo de Incapacidade Temporária Absoluta (1º grau), conforme definido nos nºs 4 e 6.
6. A Incapacidade Temporária Absoluta (1.º grau), converte-se em Incapacidade Temporária Parcial (2.º grau) em qualquer das seguintes circunstâncias:
a) quando a Pessoa Segura que exerça profissão remunerada, embora não completamente curada, já não se encontrar absolutamente impossibilitada de atender ao seu trabalho;
b) quando, embora subsistindo as causas que deram origem à Incapacidade Temporária Absoluta, tenha decorrido o prazo de 180 dias fixado no nº 4.
Cláusula 30.ª
Incapacidade temporária por internamento hospitalar
1. No caso de Internamento Hospitalar, a Seguradora pagará o subsídio diário fixado nas Condições Especiais e Particulares enquanto subsistir o internamento em hospital ou clínica e por um período não superior a 360 dias, a contar da data do internamento da Pessoa Segura.
2. O pagamento do subsídio diário será feito à Pessoa Segura, sem prejuízo de indicação em contrário, constante das Condições Particulares.
Cláusula 31.ª
Despesas de tratamento e repatriamento
A Seguradora procederá ao reembolso, até à quantia para o efeito fixada nas Condições Especiais e Particulares das despesas necessárias para o tratamento das lesões sofridas pela Pessoa Segura, bem como das despesas extraordinárias do seu repatriamento em transporte clinicamente aconselhado em face dessas lesões, nos termos dos números seguintes:
1. Por despesas de Tratamento entendem-se as relativas a honorários médicos e internamento hospitalar incluindo assistência medicamentosa e de enfermagem, que forem necessárias em consequência do acidente.
2. Por Despesas de Repatriamento entendem-se as relativas ao transporte clinicamente aconselhado.
3. No caso de ser necessário tratamento clínico regular, e durante todo o período do mesmo, consideram-se também incluídas as despesas de deslocação da Pessoa Segura ao médico, hospital, clínica ou posto de enfermagem, desde que o meio de transporte utilizado seja adequado à gravidade da lesão.
4. O reembolso será feito a quem demonstrar ter pago as despesas, contra entrega da documentação comprovativa.
(…)».
33. No dia 18-08-2016, o marido da Autora, ML..., adquiriu à Ré W..., no website desta e pelo preço de € 195, três bilhetes para outros tantos adultos respeitantes ao passeio denominado de “Wild Life Explorer”, a realizar no dia 08-09-2016, às 09:30 horas, com partida na foz do Rio Arade, a duração de 3 horas, a fim de observarem golfinhos.
34. O bilhete então emitido pela Ré W... continha, entre o mais, a menção de que «[t]odas as actividades da W... dependem de boas condições de segurança! A W... reserva o direito de cancelar qualquer actividade conforme a avaliação em relação à meteorologia/ao estado do mar/condições de equipamento ou outra razão inesperada que possa representar um risco. Nestes casos, a W... efectua reembolso de 100% do montante pago em relação à actividade cancelada. A W... não é responsável por outras despesas associadas, tais como transfers, táxis, aluguer de veículo ou outro. O embarque é possível em dois locais: Marina de Portimão e Ferragudo (Centro de Observação de Golfinhos). Por favor, indique o local escolhido do embarque na área de comentários do seu formulário de reserva. Chegue 15 minutos antes da hora da viagem ao lugar de embarque. Trazer roupas confortáveis e casaco!»
35. O preço da viagem foi então pago à Ré W... via paypal.
36. A Autora e família adquiriram os bilhetes para observação de golfinhos à Ré W... via on-line, convencidos que se tratava de um passeio tranquilo, seguro e divertido.
37. Autora e família jamais foram informados de qualquer potencial perigo durante o passeio.
38. A Ré W... jamais informou – no seu website, no balcão ou na embarcação – que durante o passeio a embarcação navegaria por entre as ondas e nelas embateria de tal modo que os passageiros se elevariam dos seus assentos e sentar-se-iam bruscamente nos mesmos.
39. Após o sinistro dos autos, o website e bilhetes da Ré W... passaram a conter um aviso de que o passeio de observação de golfinhos pode não ser adequado a pessoas com sensibilidade a vibrações ou ao impacto das ondas.
40. O website da Ré W... tem diversos vídeos de outros passeios de observação de golfinhos sempre em águas calmas.
41. O facto de os bilhetes mencionarem que o passeio podia ser cancelado de forma discricionária devido às condições climatéricas adversas a essa actividade, criou a convicção na Autora que a Ré W... tinha conhecimento prévio do estado do tempo e do mar e que realizaria a viagem de modo a que ninguém se magoasse.
42. O único aviso no local de embarque e nos bilhetes foi para os passageiros levarem um casaco leve e roupa confortável.
43. No dia 08-09-2016, cerca das 09:30 horas, no cais de Ferragudo, a Autora, juntamente com o seu marido, ML..., e a filha do casal, NL..., ingressaram a bordo da OE... a fim de efectuarem o sobredito passeio de barco, para a observação de golfinhos no oceano, ao largo da zona costeira situada a Praia do Carvoeiro e a Praia da Arrifana.
44. Para além da Autora, seguiam a bordo da OE..., outros dez passageiros e dois tripulantes.
45. Os tripulantes eram o Réu RL..., skipper, e a Ré P..., guia, tendo o primeiro ficado incumbido do governo da embarcação e a segunda da direcção técnica e científica da viagem.
46. Aquando do embarque, a Autora e a sua filha NL... tomaram a primeira linha de assentos junto à proa da embarcação, tendo a primeira ficado do lado de estibordo e a segunda de bombordo.
47. O marido da Autora, ML..., sentou-se na segunda linha de assentos, imediatamente atrás da filha do casal.
48. A Autora escolheu o lugar por si ocupado na OE....
49. Esse lugar é delimitado por uma estrutura metálica que suporta o assento e o encosto do mesmo, existindo um apoio para as mãos à altura do peito que está fixo ao estrado da embarcação.
50. Este apoio serve para evitar que o passageiro seja projectado do lugar e diminuir o normal impacto e vibração provocado pelo contacto do casco com a água em contexto de navegação.
51. Autora e família embarcaram sem ter sido informados das condições do mar no local onde iria desenrolar-se o passeio.
52. Nos passeios marítimos de observação de golfinhos, a Ré W... obriga os passageiros a viajar sentados e com o colete salva-vidas insuflável envergado, desde o momento da partida até ao da chegada.
53. Mais obriga aos passageiros dos bancos longitudinais a manterem-se agarrados às grelhas metálicas dos assentos e com ambos os pés firmados no estrado da embarcação, sendo que, em caso de ocorrer algum problema durante a viagem, devem avisar a tripulação com um aceno, mantendo a outra mão bem agarrada à sobredita estrutura metálica.
54. Aos passageiros apenas é permitido levantarem-se e estarem de pé quando a embarcação está parada para observação dos golfinhos e depois de indicação dada nesse sentido pela tripulação.
55. Em cada saída, e ainda no cais de embarque, os passageiros são informados, oralmente pela guia da Ré W... destas regras, mormente, da obrigatoriedade de permanecerem sentados nos respectivos lugares durante o percurso, da necessidade de se manterem agarrados às pegas metálicas dos assentos e com ambos os pés firmados no estrado da embarcação.
56. Com tal procedimento, a Ré W... pretende evitar que os passageiros sejam projectados dos seus lugares aquando das oscilações e do embate da embarcação nas ondas.
57. No dia 08-09-2016, antes do início do passeio levado a cabo a bordo da OE..., a tripulação comunicou aos passageiros presentes as advertências e informações de segurança acima referidas, incluindo à Autora.
58. Mais avisaram os passageiros da necessidade de levarem um casaco leve.
59. As 09:30 horas do dia 08-09-2016, no cais de embarque em Ferragudo, a água do rio exibia uma superfície espelhada.
60. O dia estava limpo, com muito sol e no cais o vento estava calmo.
61. A OE... arrancou e rumou então para Sul em linha recta, desde a foz do rio Arade até ao largo da costa de Portimão, sendo que durante tal percurso o estado do mar passou a apresentar algumas rugosidades.
62. De seguida, o comandante da OE... rumou paralelamente à costa de Portimão, durante duas ou três milhas em busca de golfinhos, sendo que durante esse percurso o estado do mar alternava entre ondulações e alguns carneiros e pequenas vagas e carneiros frequentes.
63. Após cerca de vinte minutos sem sucesso na busca de golfinhos, o comandante decidiu alterar o rumo, tendo aproado a Sul até uma distância de cerca de 8-10 milhas náuticas ao largo de Portimão, a ponto de não se observar a costa, sendo que nesse percurso o estado do mar apresentava pequenas vagas (até 1 m) e carneiros frequentes.
64. O vento deslocava-se da costa para o mar.
65. Após uma hora a hora e meia de navegação desde a largada foram observados os primeiros golfinhos (golfinhos-roazes) a cerca de 8-10 milhas náuticas da costa de Portimão.
66. Tendo em vista a observação dos golfinhos, a embarcação acompanhava os cetáceos a uma determinada distância, após o que efectuava uma guinada (manobra de viragem de direcção) de 360º, completando um círculo, retomando a perseguição dos animais.
67. Logo após a visualização destes golfinhos-roazes, a qual durou cerca de 30 minutos, a tripulação foi informada da proximidade, a Sul, de um grupo de golfinhos-comuns.
68. Face a tal informação, a tripulação transmitiu aos passageiros que iria reiniciar a marcha e ordenou-lhes que se sentassem e acomodassem nos seus lugares, agarrando-se às pegas metálicas e firmando os pés no estrado da embarcação.
69. O Réu RL..., comandante da embarcação, apenas retomou a marcha quando todos passageiros estavam sentados, acomodados e seguros nos seus lugares.
70. Ao retomar a marcha, o comandante da OE... descreveu uma nova guinada para estibordo ao mesmo tempo que acelerou bruscamente, sendo que depois passou por uma onda maior do que as demais que até então se tinham feito sentir, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse.
71. Após, o casco da embarcação embateu fortemente contra a superfície da onda imediatamente seguinte.
72. Entre o momento em que a embarcação passou pela primeira onda e o instante em que embateu na segunda, a Autora perdeu o contacto com o assento devido ao movimento – a dado momento – descendente da OE... ser mais rápido do que o do corpo daquela.
73. Quando a OE... embateu na segunda onda, a Autora acabou de descender e embateu fortemente no seu assento, para além de que o peso do corpo pendeu sobre o seu membro inferior esquerdo.
74. A Autora, de imediato, sentiu uma dor excruciante, na zona do coxi, gritou, colapsou lateralmente, foi amparada pelo seu marido, que acorreu em seu auxílio, em pânico, e bracejou ao comandante para este parar a marcha da embarcação.
75. A Autora não caiu a bordo.
76. A embarcação ficou então a pairar.
77. A Ré P... aproximou-se e indagou sobre a situação da Autora, dadas as dores nas costas que manifestava, tendo sido, sumariamente, informada por ML... da urgência médica.
78. A Ré P... questionou a Autora sobre se sofria de “problemas de coluna”, tendo a mesma respondido que havia sofrido há mais de 20 anos de uma hérnia discal.
79. A guia, propôs, então, a alteração de lugares, tendo a Autora sido transportada com a ajuda do seu marido e de um outro passageiro, para o banco corrido situado à ré da embarcação, logo abaixo do local onde o comandante governava a embarcação.
80. A Autora deitou-se então nesse banco, amparada pelo seu marido.
81. Nenhum dos outros passageiros que seguiam a bordo da mesma embarcação teve qualquer problema ou sofreu algum tipo de acidente.
82. O Ré RL... aguardou uns minutos com a embarcação a pairar para que a Autora se recompusesse.
83. Posto que a Autora não mais exteriorizou as dores que a afectavam, mantendo-se imóvel e em silêncio, o Réu RL... retomou a marcha da embarcação rumo ao grupo de golfinhos comuns, sem dar conta de tal facto àquela e ao seu marido.
84. O Réu RL... apenas procedeu do modo descrito porquanto se convenceu de que a dor que havia acometido a Autora era suportável.
85. Eis então que o marido da Autora se apercebeu de que a embarcação, ao invés de regressar a terra para a Autora receber auxílio médico, continuava a perseguição de golfinhos, agora noutro local.
86. O marido da Autora, de pé, interpelou então os Réus RL... e P..., procurando saber se iam continuar com a viagem de observação de golfinhos.
87. Réu RL... e Ré P... responderam afirmativamente
88. ML..., espantado com tal resposta, insistiu e chamou novamente a atenção para a necessidade de regresso imediato a terra, tendo em conta as dores que a Autora estava a sofrer.
89. Nessa sequência, o Réu RL..., comandante da embarcação, dirigiu-se ao marido da Autora e em tom exaltado, rude e agressivo gritou em inglês que o mesmo deveria ter avisado dos problemas da mulher, aquando do embarque, porque se o tivesse feito teria ficado em terra ao invés de ter estragado o passeio dos demais passageiros.
90. Ao dirigir-se dessa forma ao marido da Autora, o Réu RL... utilizou expressões como “fucking river” e “fucking crazy bastard”.
91. A filha do casal, NL..., que se encontrava na primeira linha junto à proa ouviu as palavras proferidas pelo Réu RL....
92. O marido da Autora, perturbado, insistiu na necessidade de regresso imediato a terra devido à situação da sua mulher.
93. Após tal solicitação do marido da Autora, o Réu RL... regressou de imediato a terra, ao mesmo tempo que iniciou comunicações via rádio.
94. Mantendo o tom agressivo, o Réu RL... questionou ML... se queria regressar depressa ou devagar, tendo este respondido “suavemente”.
95. A Ré P... perguntou à Autora e marido se pretendiam uma ambulância junto à doca, tendo estes respondido afirmativamente.
96. A Autora e o marido convenceram-se, entretanto, de que o Réu RL... estaria a providenciar pela evacuação da Autora por via do transbordo para uma grande embarcação, que tinham avistado previamente, ou por via área, solução que no seu entendimento seria a mais rápida e segura.
97. A viagem de regresso demorou cerca de uma hora, por ter sido feita de forma mais lenta do que a normal, a pedido do marido da Autora.
98. O Réu RL... comunicou de imediato, com as autoridades em terra, para que providenciassem pela presença de uma equipa de emergência médica.
99. O percurso de retorno a terra, efectuado num percurso de 8-10 milhas náuticas, foi feito a 15 nós náuticos/hora, quando, por regra, nas mesmas condições oceano-meteorológicas é feito ao dobro desta velocidade.
100. Quanto menor é a velocidade da embarcação, maior é a oscilação provocada pelas ondas.
101. Uma maior velocidade permite cortar o sentido das ondas, ao invés de permitir que a embarcação acompanhe os movimentos destas, como acontece quando a nave está parada ou circula a baixa velocidade.
102. No retorno a terra, a Autora teve muitas dores devido, para além do mais, ao sentido contrário ao vento em que a embarcação navegava e à agitação marítima que se fazia sentir no constante ressalto da OE....
103. A Autora, ao perspectivar as lesões danos permanentes que eventualmente podia vir a padecer, ficou profundamente nervosa, com os dedos mão e pé esquerdo a tremer.
104. O passeio marítimo para observação de cetáceos é uma actividade apreciada por todos os que a experienciam.
105. Nenhum dos outros passageiros que seguiam no passeio com a Autora, incluindo o marido e a filha desta, sofreu qualquer desconforto ou lesão com o impacto das ondas ou a vibração da embarcação.
106. A tripulação da Ré W... fez o passeio em que a Autora seguiu, tal como o faz em quaisquer outras situações, depois de ter considerado que as condições climatéricas e a agitação marítima não faziam perigar os passageiros ou a tripulação.
107. Sempre que considera que tais condições não permitem fazer a viagem em segurança, a Ré W... não sai com os seus barcos para o mar e cancela as reservas que já tiverem sido efectuadas.
108. A Autora sofreu há mais de 20 anos de uma hérnia discal em L5.
109. A Autora não revelou esse facto à tripulação do OE... até ter sido inquirida pela Ré P... sobre a existência de problemas nas costas.
110. A Autora embarcou sem lesões na embarcação da Ré W....
111. Quando a OE... chegou ao cais de embarque já aí se encontrava uma equipa médica e uma ambulância à espera da Autora a fim de retirá-la da embarcação, o que foi efectuado pela sobredita formação.
112. Tal equipa ingressou a bordo e imobilizou a Autora em plano duro, tendo-lhe colocado ainda um colar cervical.
113. Foi depois transportada para o CHAlgarve – Centro Hospitalar do Algarve E.P.E. Portimão – Sitio do Poço Seco, 8500-338 Portimão.
114. A Autora aí permaneceu cerca de oito horas deitada numa maca nas urgências do referido hospital.
115. Na sequência de observação médica foi elaborado o seguinte relatório, datado de 08-09-2016, pela Dra. Mr do CHAlgarve – Portimão:
«(…) Trazia em plano rígido por queda acidental num barco, com traumatismo da região lombar, refere dor local, com parestesia do ME.
Nega TCE, nega perda da consciência.
Orientada e colaborante, queixosa, eupneica.
Sem deficits neurológicos periféricos na avaliação por Ortopedia, mobiliza 4 membros RX compatível com #L1.
TC Não encontramos referenciáveis alterações tomo densitométricas nas estruturas paravertebrais estando bem definidos os diferentes planos teciduais profundos.
Existe depressão fraturaria por mecanismo compressivo do planalto vertebral superior de L1.
Não há sinais reparadores apontando para fractura recente.
Há ligeiro recuo do muro anterior do canal raquidiano central à custa da amplitude do espaço epidural anterior.
Fractura com critério de instabilidade. Está respeitada a integridade dos pedículos e do arco posterior.
Coloca dorsolombostato.
Bem tolerado, tolera levante. Sem défices de novo.
Alta com indicação para manter dorsolombostato até reavaliação em consulta no hospital da área de residência.
Analgesia SOS.
Profilaxia TVP com enoxaparina 40 mg sc id. Sem contra-indicações para voar (…)».
116. No dia seguinte, 09-09-2016, a Autora recebeu alta do internamento, em cujo relatório se fez notar que a Autora «(…) recorreu ao serviço de urgência deste hospital por traumatismo da coluna lombar num barco. Tem como diagnóstico de internamento # L1. Fez TAC da coluna que confirma fractura. Fez RX tórax. Doente calma, consciente e orientada. Colaborante. Permaneceu em repouso no leito.
O marido comprou dorsolombostato que foi colocado. A doente fez levante progressivo que tolerou pelo que tem alta. Tem indicação de manter dorsolombostato até reavaliação em consulta nos hospitais da área da residência. Sem contra-indicação de voar.
Leva prescrição de paracetamol 1000 mg 1 comprimido de 8/8 horas; metamizol magnésico 575 mg 1 comprimido de 8/8 horas e Enoxaparina sódica 40 mg 1 aplicação 1 vez por dia durante 12 dias (…)».
117. A Autora teve alta do internamento no dia 09-09-2016 ao fim da tarde, sentada na cadeira de rodas e auxiliada pelo seu marido.
118. Foram-lhe prescritos paracetamol, metamizol magnésico e enoxaparina (anticoagulante injectável) e dados detalhes sobre as suas limitações físicas e instruções para permanecer sedentária até ocorrerem algumas melhorias relativas do estado da sua coluna vertebral, conforme referido em 111.
119. Recebeu ainda instruções sobre como devia o marido auxiliá-la a sentar-se, levantar-se e deitar-se.
120. De regresso à moradia que arrendaram para em família passarem as férias, o marido da Autora teve a seu cargo a recuperação da Autora, auxiliando-a – nomeadamente – nas deslocações à casa de banho, banho, pentear, vestir, levantar, sentar, deitar e assistir nas tentativas em dar alguns passos.
121. Durante dez noites, ML... injectou na barriga da Autora o medicamento anticoagulante, conforme prescrição médica.
122. Tal acto revelou-se extremamente desconfortável para ambos.
123. A Autora, em virtude do acidente, ficou dependente de terceiros, mormente do seu marido, para poder levar a cabo as tarefas básicas da vida diária, para além de que teve dores, tristeza e aflição constantes.
124. A Autora permaneceu na referida moradia, com a sua família, até ao final do período reservado, 13-09-2016.
125. Vários locais de interesse turístico que tinham planeado visitar, não o foram devido às limitações de locomoção e ao estado anímico e apreensivo da Autora.
126. O casal deixou de passear na praia, um dos seus passatempos favoritos.
127. A Autora esteve confinada na moradia durante cinco dias sem usufruir da piscina.
128. O casal deixou de poder ter contacto íntimo, em virtude do estado de saúde da Autora.
129. Em 13-09-2016, a Autora, marido e filha visitaram familiares em Almada, continuando o segundo a auxiliar a primeira nas tarefas básicas da vida diária.
130. A Autora movimentava-se em cadeira de rodas empurrada pelo marido.
131. No dia 15-09-2016 deslocaram-se no carro alugado ao Norte de Portugal para visitar familiares, tendo conseguido ver alguns locais, mas dentro do carro, não tendo o casal realizado as caminhadas que tanto apreciam.
132. O marido da Autora continuava a auxiliá-la nos termos preditos.
133. No dia 16-09-2016, a Autora pagou CAD 352,98 na reserva de lugares mais espaçosos nos aviões de regresso, de modo a que o seu marido conseguisse sentá-la e levantá-la e prestar-lhe auxílio durante a viagem de mais de 10 horas para o Canadá.
134. A Autora, marido e filha regressaram no dia 19-09-2016 a Almada para junto de familiares.
135. A existência de barreiras arquitectónicas e a dificuldade na movimentação na via pública e outros locais a pessoas em cadeira de rodas ou mobilidade reduzida fizeram com que a Autora não tivesse ponderado passear ou usufruir da praia conjuntamente com a família.
136. Entretanto, o marido da Autora continuou a auxiliá-la nos termos preditos.
137. Ainda assim, a condição física da Autora não a impediu de viajar no território português, em automóvel, entre o Norte e o Sul.
138. No dia 23-09-2016 a família Lima regressou a casa, Canadá.
139. A Autora sofreu dores na coluna e desconforto com o colar de apoio às cervicais durante a viagem aérea de regresso, primeiro até Heathrow, Inglaterra (02:30 horas) e depois até para Calgary, Canadá (08:50 horas).
140. Em resultado das horas em trânsito e do período de tempo em que então esteve sentada, a Autora sofreu dores e mau estar durante todo o dia de 24-09-2016.
141. De regresso ao lar, a Autora não conseguia efectuar a lide doméstica, designadamente, ir ao supermercado, cozinhar, passear o seu cão.
142. Foi então ajudada pelo marido, que viu os seus dias de férias ainda por gozar ficarem sobrecarregados.
143. A Autora tinha planeado, após o regresso das suas férias a Portugal, iniciar a busca de um novo emprego.
144. A Autora adiou essa busca até à sua completa recuperação.
145. Em 27-09-2016, a Autora esteve na consulta médica do Dr. Mtt (Calgary), tendo o RX então efectuado confirmado a fractura da vertebra L1, com afundamento de cerca de 40% de tal corpo vertebral, com cunha anterior.
146. Na altura, a Autora referia dor lombar desencadeada pela locomoção e sedestação e já não estava a utilizar colete à noite para dormir.
147. Apresentava então no exame objectivo contractura muscular para-espinhal lombar.
148. O prognóstico do Dr. Mtt … foi de que a coluna da Autora iria, em princípio, recuperar dentro de alguns meses, visto ser pequena a percentagem de doentes que apresenta dores crónicas para o resto das suas vidas.
149. Entretanto, a Autora continuava a necessitar da ajuda de terceiros na execução das tarefas básicas diárias.
150. Até que em 07-10-2016 a Autora ganhou alguma autonomia, conseguindo tomar banho com o auxílio de uma escova, ir à casa de banho e vestir-se parcialmente, embora necessitasse do auxílio do marido para, por exemplo, calçar-se.
151. A Autora começou igualmente a dar os primeiros passos sem precisar a todo o tempo de se apoiar em terceiros.
152. O dia 07-10-2016 marcou o início do fim-de-semana do Dia de Acção de Graças (Thanksgiving Day).
153. O Thanksgiving Day é um dia festivo, de celebração familiar, onde a Autora se reúne habitualmente na casa do casal.
154. Tal não sucedeu no ano de 2016 devido ao estado de saúde em que a Autora se encontrava, a qual não pode então ver e brincar com os seus netos, de um e três anos de idade.
155. Em 17-10-2016 a Autora sentiu uma melhoria no seu estado geral e mais recuperada, embora ainda não conseguisse realizar – designadamente – as tarefas domésticas de limpeza e arrumação da casa, tratar da roupa, passear o seu cão, jardinagem, etc…
156. Até 17-10-2016 a Autora ainda não tinha estado com os seus netos com receio que estes, nas suas brincadeiras, inadvertidamente agravassem o estado da avó, que não conseguia levantá-los ou sequer curvar-se para abraçá-los.
157. No dia 06-12-2016, a Autora foi submetida a novos exames médicos, efectuados no Rockyview General Hospital em Calgary Canadá, onde se constatou «(…) fractura da L1 com um decréscimo de 40% da altura. Não se verificando redução da compressão desde o ultimo RX efectuado em Setembro de 2016. Existe retropulsão cortical posterior de 3 mm também inalterada. Alinhamento preservado e todos os espaços de disco. Protuberância de disco suave em L5-S1. Nenhuma estenose foraminal ou central significativa.
Concluindo: Não há alteração significativa na compressão da fractura L1 conhecida.»
158. Na consulta de seguimento de 12-12-2016 com o Dr. K… (Formedic), a Autora recebeu indicação para fazer medicação ocasional com paracetamol, aumentar a dosagem de vitamina D e tomar cálcio e magnésio.
159. Em 08-11-2017, a Autora fez novo RX à coluna no qual foi novamente identificada a fractura por compressão do corpo de L1, com recuo do muro anterior, e observado calo ósseo assim como marginação osteofítica dos corpos vertebrais e desidratação discal L5-S1.
160. A família L… planeou em 2015 as suas férias anuais, a gozar em Setembro de 2016 em Portugal.
161. Projectou então arrendar uma moradia no Algarve, reservou e pagou as passagens aéreas para si e respectiva família, organizou visitas a locais que lhe interessavam, programou visitar familiares e com eles gozar o período de férias, planeou dar passeios com o seu marido nas praias portuguesas entre outros aspectos.
162. Para tanto, procedeu ao aluguer de veiculo e ao arrendamento de uma moradia no Algarve em 06-01-2016.
163. A reserva da habitação para a estadia no Algarve foi efectuada para o período de 03 a 13 de Setembro.
164. Realizou a reserva e selecção de lugares no avião no dia 27-07-2016.
165. LL..., após ter saído do CHAlgarve – Centro Hospitalar do Algarve E.P.E. Portimão, passou a deslocar-se com o auxílio de uma cadeira de rodas durante o restante período de férias.
166. A Autora e a sua família gozaram todo o período de férias em Portugal, tendo regressado ao seu país na data previamente calendarizada, não tendo antecipado o seu regresso.
167. A Autora e a sua família usaram e fruíram do automóvel alugado nas diversas e deslocações no Algarve, bem como para Almada e para o Norte.
168. A Autora, ML..., e NL..., por causa do acidente, não gozaram as férias de descanso anuais do modo como tinham planeado.
169. Ainda assim, a Autora permaneceu em território nacional durante o tempo programado para as suas férias apesar de medicamente não lhe ter sido colocada qualquer limitação ou contra-indicação quanto a regressar ao país de origem por via aérea nem quanto a especiais cuidados a observar nesse transporte que justificassem uma mudança de lugares no avião.
170. A Autora aproveitou o arrendamento da moradia onde permaneceu até à data de saída bem como o aluguer do veículo que usou para se deslocar a diversos sítios durante o período da sua estadia em território nacional.
171. Devido às dificuldades que a Autora tinha em movimentar-se, a família Lima alterou os lugares de avião na viagem de regresso ao Canadá para outros mais espaçosos, tendo suportado o custo correspondente a essa modificação.
172. Já na viagem do Canadá para Portugal a 31 de Agosto de 2016 a Autora e a família tinham pago a taxa adicional para reserva de lugares específicos no voo, lugares esses consecutivos entre si.
173. A viagem e estadia em Portugal da Autora, marido e filha implicou os seguintes desembolsos:
 Aluguer veículo - 22 dias: €1009,61 + €232,21 IVA;
 Bilhetes de avião x 3: USD 6410;
 Escolha dos lugares no avião x 3: CAD 275,70;
 Escolha dos lugares no avião x 3: CAD 352,98;
 Arrendamento da moradia de férias €1485,71;
 Bilhete W... Unipessoal, Lda.: €195.
174. No tratamento ou por causa das lesões sofridas a bordo da embarcação da Ré W..., foram suportadas as seguintes despesas:
 Colete ortopédico/dorsolombostato: €111,68 + €6,70 IVA;
 Medicamentos: €34,61(total c/IVA);
 Aluguer de cadeira de rodas: €15;
 Aluguer de cadeira de rodas: €12.
175. A Ré W... reembolsou a Autora o valor dos bilhetes do passeio.
176. A seguradora do marido da Autora reembolsou-o do valor despendido em medicamentos e no colete ortopédico/ dorsolombostato.
177. No ano de 2015, a Autora auferiu rendimentos do trabalho cifrados no montante global de CAD 52.160.
178. A Autora não trabalhava à data do acidente, não auferindo então qualquer rendimento.
179. Autora deixou de ter qualquer rendimento em virtude de não ter voltado a trabalhar.
180. A Ré M...Seguros informou a Autora que o capital para a cobertura de Despesas Tratamento e Repatriamento limitava-se a €3.500 contra a entrega de documentos originais comprovativos da realização de tais gastos.
181. Tal montante foi liminarmente rejeitado pela Autora.
182. A Autora nunca chegou a entregar os recibos das despesas médicas e medicamentosas por si realizadas.
183. Motivo pelo qual a Ré M... Seguros não procedeu ao pagamento de qualquer quantia ao abrigo desta cobertura.
184. A Autora nasceu no dia 16-03-1961.
185. A Autora apresenta marcha normal, sem apoio nem claudicação, conseguindo fazer marcha em pontas dos pés e calcanhares.
186. Na sequência da hérnia discal em L5 que sofreu há cerca de 20 anos, a Autora foi medicada oralmente e posteriormente deixou de ter queixas.
187. A Autora apresenta as seguintes lesões e/ou sequelas causadas pelo acidente:
Ráquis: contractura dos trapézios superior; palpação das apófises espinhosas cervicais, dorsais sem queixas álgicas; palpação das apófises espinhosas da transição dorso-lombar com referência a “desconforto” (sic); palpação das goteiras vertebrais sem queixas; sem contractura lombar; mobilidade do tronco com inclinação direita e rotação direita limitadas; nas amplitudes finais; flexão do tronco com Índice de Schober 10-14,7 cm; sinal de Laségue negativo bilateralmente.
188. A Autora não apresenta lesões e/ou sequelas sem relação com o acidente.
189. A Autora encontra-se medicada com paracetamol 1g em SOS, quando em crises, tomando então 2 a 4 comprimidos/dia, durante 3-5 dias.
190. A lesão traumática decorrente do acidente ocorrido a bordo do OE... é independente da protusão discal (hérnia discal em L5) diagnosticada previamente.
191. A única lesão existente a seguir ao acidente foi na L1, sendo que não foi detectada qualquer outra sequela ou indício de fracturas anteriores.
192. As limitações práticas que a Autora ficou a padecer em consequência das sobreditas lesões/sequelas decorrem de raquialgia residual, desencadeada por flexão repetitiva ou com esforços do tronco, carregar pesos nos membros superiores e ortostatismo, sedestação ou decúbitos prolongados.
193. A consolidação médico-legal das lesões sofridas pela Autora a bordo da OE... ocorreu em 12-12-2016.
194. A Autora padeceu de um Período de Défice Funcional Temporário Total fixável em 2 dias em consequência do acidente sofrido a bordo da OE....
195. A Autora padeceu de um Período de Défice Funcional Temporário Parcial fixável em 94 dias em consequência do acidente sofrido a bordo da OE....
196. Entre o período de danos temporários e a data da consolidação das lesões, a Autora padeceu de um Quantum Doloris fixável no grau 4/7.
197. Em consequência das sequelas que ficou a sofrer, a Autora passou a ter um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 4 pontos, o qual não a afecta em termos de autonomia e independência, embora sejam causa de sofrimento físico, com discreta limitação funcional e necessidade esporádica de medicação analgésica.
198. A Autora ficou a padecer de uma Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer em consequência do acidente sofrido a bordo da OE... fixável no grau 2 /7, a qual exigiu a necessidade de alteração/adaptação dos seus hábitos lúdicos anteriores».
Por outro lado, a sentença considerou como não provada a seguinte matéria:
«a) Antes de cada viagem, os passageiros que escolhem um dos dois lugares dianteiros dos bancos longitudinais para viajar são informados pela Ré W... de que é naqueles bancos que mais se sentem as vibrações e o impacto da embarcação na água, pelo que, caso pretendam, devem fazer o passeio nos bancos dispostos mais à ré.
b) A Ré P... advertiu a Autora que naquele banco era onde mais se sentiam as vibrações e o impacto da embarcação na água, pelo que caso quisesse poderia fazer a viagem no banco transversal localizado à ré, por haver ali um lugar vago.
c) Do mesmo modo, previamente a cada saída, a Ré W... pergunta aos passageiros se sofrem de problemas de coluna ou outras enfermidades sensíveis às vibrações, trepidações ou impactos.
d) Questiona igualmente se alguma das passageiras está grávida.
e) Em caso de resposta afirmativa a qualquer uma daquelas questões, o comandante da embarcação desaconselha ou impede o embarque por considerar que as vibrações e impactos provocados pela ondulação e correntes marítimas durante o passeio poderão agravar qualquer patologia lombar, ou no caso da gravidez, causar desconforto, mau estar, e constituir, no limite, perigo para o feto.
f) Estas advertências e informações de segurança constavam – em 18-08-2016 – no website promocional que a Ré W... dispõe na Internet, na rubrica “trips” nos seguintes termos Conselhos:
 Traga um casaco. Apesar do clima do Algarve ser agradável, a brisa domar é sempre fresca. * Prepare-se para se molhar, apesar de não ser frequente, pode acontecer durante a navegação. Às vezes até os golfinhos nos proporcionam momentos refrescantes, A melhor opção é um casaco impermeável. *Antes de embarcar recomendamos o uso de casa de banho.
 (...) * Se estiver grávida, tiver problemas de colunas ou outros estados que o possam tornar sensível a vibrações e impactos, esta experiência por não ser aconselhável. É importante que nos forneça o máximo de informação possível para que possamos aconselhá-lo;
 Atrasos não são esperados, mas considerando a natureza desta actividade porá acontecer.”
g) Ainda no mesmo sítio da Internet e na rúbrica “contacto” é possível consultar as perguntas e respostas mais frequentes, que têm por objectivo esclarecer dúvidas subjacentes à viagem, designadamente: Em condições normais qualquer pessoa pode juntar-se à viagem. Porém, para grávidas, bebés e assim como pessoas com problemas de colunas, esta actividade pode não ser aconselhável derivado à vibração. Por favor aconselhe-se com a equipa.
Note-se que as condições meteorológicas e condições do mar podem alterar-se e a equipa pode ter de aconselhar-lhe a não embarcar antes da partida.»
h) Ainda antes da partida, os Réus RL... e P... questionaram a Autora sobre se sofria de “problemas de coluna” tendo a mesma respondido negativamente.
i) A Autora não teria sido autorizada a embarcar caso tivesse informado a tripulação da sua pré-condição física, consistente na cirurgia a uma hérnia que afectou a L5.
j) A tripulação tomou conhecimento do “problema de coluna” da Autora pelo marido desta quanto este insistiu e chamou novamente a atenção para a necessidade de regresso imediato a terra, tendo em conta as dores que a Autora estava a sofrer.
k) A Autora foi operada à coluna há cerca de 20 anos por causa de uma hérnia discal em L5.
l) A Autora ocultou tal operação à tripulação do OE....
m) Não obstante ter sido perguntado, a Autora omitiu à tripulação as condicionantes da sua condição física, circunstância que teria impedido do seu embarque.
n) Caso o tivesse revelado, teria, no mínimo, viajado no lugar mais a ré, já que a intensidade do impacto normal causado pela ondulação é aí menor do que a vante.
o) A seis milhas da costa fazia-se sentir uma ondulação até 2,5 m, com cristas e muitos carneiros.
p) A ondulação chegou a ter uma altura superior a metro e meio.
q) Momentos após o mestre ter reiniciado a marcha e mudado de rumo, a proa da embarcação sofreu um impacto com maior força resultante da formação repentina de uma onda cavada, devido a uma mudança súbita e imprevista da corrente marítima.
r) No momento do impacto a Autora estava de pé, ainda que no seu lugar, agarrada às pegas metálicas apenas com a mão esquerda, enquanto acenava com a mão direita para os demais passageiros.
s) No momento em que a Autora se apoiou sobre o seu lado esquerdo e lançou um grito de dor, a tripulação presumiu que a mesma tinha lesionado o tornozelo esquerdo.
t) A Autora levantou-se em plena marcha da embarcação.
u) A Autora não seguia firmemente agarrada às pegas metálicas dos assentos e com ambos os pés firmados no estrado da embarcação.
v) A Autora desrespeitou as instruções de segurança dadas pela tripulação ao levantar-se em plena marcha da embarcação.
w) A Autora desrespeitou, ainda, as ordens dadas pela tripulação para se manter firmemente agarrada às pegas metálicas dos assentos e com ambos os pés firmados no estrado da embarcação.
x) A Autora ignorou a advertência da tripulação de que nos lugares dianteiros das filas de bancos longitudinais o impacto e a vibração das ondas era sentido com maior intensidade, pelo que sempre haveria a alternativa de ocupar o banco à ré onde tal percepção é substancialmente menor.
y) Logo após o sinistro, a Ré P... renovou a questão anteriormente colocada, aquando do embarque, sobre patologias lombares pretéritas,
z) Ambos, Autora e marido, negaram a existência de tais patologias.
aa) Apesar de referir que tinha dores, a Autora não especificou a localização das mesmas.
bb) A tripulação não quis saber do estado da Autora.
cc) Após a Autora ter sido deslocada para o banco situado à ré da embarcação, o Réu RL... regressou de imediato ao porto de partida, em Portimão
dd) O Réu RL... não podia prever ou atenuar os efeitos de uma vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs e determinou o levantamento da proa quando se encontrava a navegar no mar, ao largo de Portimão
ee) As férias da Autora terminaram logo no dia 8 de Setembro de 2016.
ff) Até à presente data o casal está impossibilitado de retornar a sua vida íntima normal.
gg) As despesas reclamadas pela Autora não foram realizadas por si.
-hh) A Autora deixou de poder obter qualquer rendimento por causa das lesões e sequelas sofridas em consequência do acidente.
ii) A Autora perdeu até à presente data, a título de rendimentos laborais o montante global de €15.498,40.
jj) Desde do dia do acidente, não lhe foi possível ainda, voltar à sua rotina laboral.
kk) A Autora, continua, até hoje, impossibilitada de trabalhar, tendo deixado de auferir o montante global de €16.999,68.
ll) A Autora ainda usa diariamente um colete ortopédico de suporte à coluna vertebral.
mm) Até à presente data, LL..., por causa das dores que padece na coluna vertebral, não lhe é possível permanecer sentada por um período normal de trabalho, necessário ao exercício das suas funções, por este motivo, permanecendo em casa, com restrições de mobilidade».
DO MÉRITO DO RECURSO
Da invocada nulidade da decisão recorrida
Pretende a recorrente que a decisão do tribunal a quo é nula, porque a condenou no pagamento de €19.000,00, para compensação do dano biológico, quando a A., na petição inicial, restringira os lucros cessantes aos vencimentos que deixou de auferir até à data da propositura da acção, decorrentes da impossibilidade de trabalhar, o que não se provou. Conclui que foi violado o princípio do contraditório, tendo sido proferida uma decisão-surpresa.
Apreciando.
Conforme resulta do art.º 608º nº2 do Código de Processo Civil, o juiz deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Assim, o juiz, na sentença, terá de resolver todas as questões que as partes suscitem ou que sejam de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Em consonância, nos termos do art.º 615º nº1 d), do mesmo diploma, a sentença é nula quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – aqui se incluindo os casos em que conhece de questões sem que, previamente, tenha garantido a observância do princípio do contraditório (art.º 3º nº3, também do Código de Processo Civil)[2].
As questões a resolver «reportam-se aos pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição das partes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir, pedido e excepções, não se reconduzindo à argumentação utilizada pelas partes em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos, mas sim às concretas controvérsias centrais a dirimir». Já «a qualificação jurídica dos factos é de conhecimento oficioso (art.º 5º nº 3 do Código de Processo Civil), mas esse poder não pode deixar de ser conjugado com outras limitações, designadamente aquelas que obstam a que seja modificado o objecto do processo (integrado tanto pelo pedido como pela causa de pedir) ou as que fazem depender um determinado efeito da sua invocação pelo interessado[3]».
No caso dos autos, tal como resulta do objecto do litígio e dos temas da prova enunciados no despacho saneador (que, aliás, não mereceram qualquer reclamação), as questões sobre as quais o tribunal tinha de se pronunciar eram a obrigação da ora recorrente de, ao abrigo de contrato de seguro celebrado com a proprietária da embarcação onde a A. seguia e onde sofreu um sinistro, reparar os danos que deste resultaram para a A., bem como qual a medida dessa reparação.
Relativamente aos danos patrimoniais, na vertente dos lucros cessantes, a A. alegou (cfr. art.º 102º da petição inicial) que os sofreu, porque deixou de poder obter qualquer rendimento. E pediu que a R. fosse condenada a reparar essa perda, no valor de €15.498,40 (correspondente ao rendimento do trabalho que deixou de obter até à dada da entrada da acção), ou no valor a apurar em execução de sentença [como, aliás, é permitido pelo art.º 569º do Código Civil[4]]. Significa isto que a A., na petição inicial, não restringiu os danos patrimoniais (lucros cessantes) aos salários que contabilizou até à data da propositura da acção, mas antes incluiu no pedido aqueles que se viessem a apurar, decorrentes de ter deixado de poder obter qualquer rendimento. Sobre tais factos e pedido tiveram os RR. (incluindo, portanto, a ora recorrente) a oportunidade de se pronunciar na contestação (tendo até a recorrente, em 8/11/2018, apresentado como quesito, relativamente à perícia médico-legal ordenada, as sequelas com que ficou a A., após a consolidação das lesões), estando, pois, plenamente garantido o princípio do contraditório a que alude o art.º 3º nº3 do Código de Processo Civil.
Deste modo, ao conhecer dos danos patrimoniais, na vertente do dano biológico sofrido pela A. (claramente invocado no referido art.º 102º da petição inicial), e considerando que a incapacidade de 4 pontos fixada pelo tribunal é um minus em relação à incapacidade total que havia sido alegada pela A., o tribunal limitou-se a cumprir o que lhe era imposto pelo citado art.º 608º nº2 do Código de Processo Civil, nenhuma nulidade se verificando, assim improcedendo a apelação, nessa parte.
Da pretendida alteração da matéria de facto
Nos termos do art.º 662º nº1 do Código de Processo Civil, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes (Recursos em Processo Civil, 7ª ed., págs. 333 e ss.), «sem embargo da correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto (v.g. contradição) e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art.º 640º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência». A modificação deverá, ainda, ocorrer sempre que «o tribunal recorrido tenha desrespeitado a força plena de certo meio de prova» ou «quando for apresentado pelo recorrente documento superveniente que imponha decisão diversa».
Note-se, no entanto, que «quando a apreciação da impugnação deduzida contra a decisão de facto da 1ª instância seja, de todo, irrelevante para a solução jurídica do pleito, ainda que a tal impugnação satisfaça os requisitos formais prescritos no art.º 640º nº1 do Código de Processo Civil, não se justifica que a Relação tome conhecimento dela, à luz do disposto no art.º 608º nº 2 do Código de Processo Civil» (cfr. Ac. STJ de 23/1/2020, proc. 4172/16, disponível em https://jurisprudencia.csm.org.pt)[5]. Caso contrário, estaríamos a praticar um acto inútil, proibido à luz do art.º 130º, do mesmo diploma.
Balizadas que estão as regras que nos orientarão, passemos à análise da pretensão da recorrente, que é a de que:
A – Seja alterado o ponto 70 da matéria de facto provada [«Ao retomar a marcha, o comandante da OE... descreveu uma nova guinada para estibordo ao mesmo tempo que acelerou bruscamente, sendo que depois passou por uma onda maior do que as demais que até então se tinham feito sentir, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse»], de modo a considerar-se provado apenas que:
«Ao retomar a marcha, o comandante da OE... acelerou e passou por uma onda maior do que as demais que até então se tinham feito sentir, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse».
B – Seja eliminada a alínea dd) dos factos não provados [«O Réu RL... não podia prever ou atenuar os efeitos de uma vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs e determinou o levantamento da proa quando se encontrava a navegar no mar, ao largo de Portimão»], dando-se como provado que:
«O Réu RL... não podia prever a vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs e determinou o levantamento da proa quando se encontrava a navegar no mar».
C – Sejam eliminados os pontos 143 e 144 dos factos provados [«A Autora tinha planeado, após o regresso das suas férias a Portugal, iniciar a busca de um novo emprego» e «A Autora adiou essa busca até à sua completa recuperação»].
Ora, quanto à alínea A) supra, temos que o que a recorrente pretende é, fundamentalmente, que do facto provado nº70 [«Ao retomar a marcha, o comandante da OE... descreveu uma nova guinada para estibordo ao mesmo tempo que acelerou bruscamente, sendo que depois passou por uma onda maior do que as demais que até então se tinham feito sentir, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse»] se elimine a expressão «descreveu uma nova guinada para estibordo ao mesmo tempo que acelerou bruscamente», passando a constar que, ao retomar a marcha, o comandante acelerou, após o que passou por uma onda maior do que as demais, a qual fez com que a proa da embarcação se elevasse.
Vejamos se as provas produzidas permitem, ou não, concluir, que, ao retomar a marcha, o comandante da embarcação descreveu uma guinada para estibordo, ao mesmo tempo que acelerou bruscamente.
O R. RL..., nas suas declarações de parte, disse que o barco estava parado, estando todos a observar um grupo de golfinhos, quando recebeu, via rádio, a informação de que tinha sido avistado um outro grupo de golfinhos, pelo que decidiu ir mostrar esse grupo aos passageiros. Estavam todos animados por irem ver mais golfinhos. Iam mudar de direcção para uma zona onde as ondas eram mais altas. Quando voltou o barco contra as ondas, para irem juntar-se ao outro grupo, aumentou a velocidade e apareceram logo ali algumas ondas mais altas. Entretanto, o barco enfrentou uma onda mais alta e o R. tentou parar o barco o mais rápido possível, mas não teve tempo de reagir. O motor da embarcação tem 370 cv.
A R. P..., nas suas declarações de parte, afirmou que tinham parado para observar golfinhos e, quando retomaram a marcha, mudando de rumo, formou-se uma onda um bocadinho mais cavada, que fez o barco subir, estando este de frente para a onda e em processo de ganhar velocidade.
O representante legal da R. W..., nas suas declarações de parte, disse que seguia, como mestre, noutra embarcação, tendo-se, entretanto, encontrado com a OE..., que estava a observar golfinhos e, quando as embarcações se aproximaram, a OE... foi embora de imediato, pois ia ao encontro de outro grupo de golfinhos. “Os golfinhos desaparecem se a gente perde o olhar”. Quando, logo de seguida, olhou, viu que a O.E. tinha abrandado, pelo que ligou ao R. RL..., tendo este referido que tinha havido um problema com uma pessoa, mas estava tudo bem e iam continuar. Não viu a concreta manobra feita pelo R. RL..., porque estava de costas, mas a O.E. estava aproada para Norte (rumo contrário ao que trazia).
A A., nas suas declarações de parte, afirmou que, quando avistaram golfinhos, o barco abrandou, mas, a dada altura, deu uma guinada, seguindo bastante depressa, subiu e depois embateu contra uma onda.
A testemunha ML... (marido da A., que a acompanhava) explicou que, quando viram os golfinhos, o barco abrandou bastante (para 10 a 15 Km/h) e acompanhou os golfinhos – sempre que eles mudavam de direcção, o barco também virava. Então o R. RL... virou para a direita (porque ia a perseguir os golfinhos), acelerou “imenso”, o barco subiu uma onda e, quando baixou, embateu na onda seguinte. Esta testemunha narrou os acontecimentos de forma segura e detalhada, sendo certo que, além de os ter presenciado, explicou com clareza e objectividade – considerando que é proprietário de um barco que utiliza, para passeio e pesca recreativa, em rios e lagos – a manobra efectuada.
A testemunha NL... (filha da A., que acompanhava os pais) disse que, antes do acidente, estavam a ver os golfinhos, seguindo o barco muito devagar e, a dada altura, “viraram e aceleraram atrás dos golfinhos”. Ao virar, o barco estava a ganhar velocidade. Disse ter-se apercebido disso não só porque sentia a embarcação a ir mais rápido, como porque ouvia os motores a fazer mais barulho.
Já o depoimento da testemunha BS… não nos parece relevante, uma vez que a mesma disse não ter assistido à manobra em causa, pois embora estivesse nas imediações, num outro barco pertença da W... (para quem trabalhava), não tinha contacto visual com o OE... nessa ocasião (quando teve esse contacto, já o acidente tinha ocorrido).
Assim, da conjugação da prova produzida em audiência é seguro concluir, como fez o tribunal a quo, que, com grande probabilidade, imediatamente antes do incidente, o comandante da embarcação OE... mudou o rumo desta (todos o mencionaram), rodando para estibordo. Por outro lado, temos também de concluir que, ao efectuar tal manobra, aquele comandante acelerou bruscamente. É o que resulta, com clareza, das declarações de parte e dos depoimentos [todos disseram que o barco estava a acelerar; o R. RL... tinha pressa de sair do local, para ir em perseguição de outro grupo de golfinhos, tanto que “os golfinhos desaparecem se a gente perde o olhar”; a A. e as testemunhas ML… e NL... explicaram a brusquidão da manobra, que apanhou os passageiros desprevenidos].
Em relação à alínea B) supra, pretende a recorrente que se considere provado que «O Réu RL... não podia prever a vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs e determinou o levantamento da proa quando se encontrava a navegar no mar».
Analisemos as provas produzidas a este propósito.
O R. RL... disse que, durante a viagem, houve um aumento do vento e as ondas estavam a ficar cada vez maiores, sendo o aumento gradual. Aliás, quando saíram de Ferragudo já tinha a percepção de que ia haver aumento de ondas e da velocidade do vento. Antes de retomar a marcha, para ir ao encontro do segundo grupo de golfinhos, avisou as pessoas para se sentarem, porque as ondas estavam um pouco mais altas e era necessário agarrarem-se bem. Iam mudar de direcção para uma zona onde as ondas eram mais altas. Quando voltou o barco contra as ondas e acelerou, apareceram logo ali algumas ondas mais altas. Na altura do acidente, o estado do mar estava a evoluir no sentido de atingir condições extremas (o que ocorreria duas / três horas mais tarde).
A R. P... também confirmou que, quando estavam a observar o primeiro grupo de golfinhos, começou a haver mais vento e maior ondulação. Disse que viram a onda que provocou a subida do barco a aproximar-se, “mas foi uma sucessão de ondas” e não puderam evitar, “não era possível saber que a onda ia ser mais cavada”. No entanto, não conseguiu explicar por que razão é que a onda não poderia ser evitada (ou, pelo menos, mitigados os seus efeitos).
O representante legal da R. W..., nas suas declarações de parte, disse que as ondas eram de meio metro e o vento entre 10 a 12 nós. O OE... é um barco rápido, que gera muito movimento (é semi-planador). Na zona de Portimão há uma confluência de correntes, pelo que é perigosa. Não se apercebeu de nenhuma ondulação repentina. As condições com ondas de 50 cm aumentam o nível de apreensão (alerta ao estado do mar).
A A., nas suas declarações de parte, afirmou que, quando entraram em mar aberto, este ficou mais agitado e ficou muito vento, sendo o passeio duro e desconfortável, pois tinha de fazer muita força para se manter agarrada ao banco (sentia que, se não se agarrasse, poderia ser atirada “borda fora”).
A testemunha BS… (que, como se referiu, disse encontrar-se a bordo de um outro barco, na mesma zona) disse que havia alguma ondulação, não superior a um metro, e vento de NO, estando o mar “partido” e formando carneirinhos, sendo o vento de 2 / 3 na escala de Beaufort.
A testemunha ML..., marido da A., que a acompanhava na ocasião, referiu que, à medida que o passeio progrediu, as ondas tornaram-se mais altas e o vento aumentou de intensidade, o que o preocupou, sobretudo por causa do regresso, que implicaria que navegassem contra as ondas. A onda que fez o barco subir é uma daquelas que aparecem “de vez em quando”.
A testemunha NL..., filha da A., que acompanhava os pais na ocasião, disse que, cerca de uma hora depois do início do passeio, as vagas começaram a ficar mais agressivas e o balanço do barco a ser maior.
Da conjugação destas declarações e depoimentos não nos resta se não concluir – como fez o tribunal recorrido – que não se pode considerar provado que o R. RL... não pudesse prever o surgimento de uma vaga de maior dimensão (como surgiu), já que todos referiram que vinha aumentando a altura das vagas e o vento (e o R. RL... disse mesmo que sabia que o estado do mar estava a evoluir no sentido de atingir condições extremas).
Quanto à alínea C) supra, pretende a recorrente que não se pode considerar provado que «A Autora tinha planeado, após o regresso das suas férias a Portugal, iniciar a busca de um novo emprego» e «A Autora adiou essa busca até à sua completa recuperação».
No entanto, o certo é que a A., nas suas declarações de parte, disse que, efectivamente, tinha planeado que, quando regressasse da viagem a Portugal, voltaria a trabalhar, até porque sempre trabalhou (tinha trabalhado, como administrativa, até ao mês anterior, ficando desempregada na sequência de um despedimento colectivo de que a empresa foi alvo). Após o acidente, não podia trabalhar, porque, durante alguns meses, não teve autonomia para realizar diversas tarefas. Entretanto, ainda não encontrou emprego, porque não consegue estar muito tempo sentada, nem muito tempo em pé, mas tem procurado e tem esperança de vir a encontrar.
A testemunha ML... referiu que  a A. sempre trabalhou (durante cerca de dois anos, como cuidadora de idosos e, nos demais, como administrativa), mas é agora difícil voltar ao mercado de trabalho [não porque a A. não queira, mas] porque não consegue fazer o que fazia antes (que implicava estar todo o dia sentada) e já tem 60 anos, sendo que nenhuma empresa treina uma pessoa com essa idade.
A testemunha NL... confirmou, no essencial, as declarações da A., sua mãe.
Tanto a A., nas suas declarações, como as testemunhas ML… e NL... foram assertivos e objectivos nas suas declarações, pelo que não vemos qualquer razão para delas duvidar, podendo, assim, considerar corroborados – no sentido da grande probabilidade da sua ocorrência – os factos constantes dos pontos 143 e 144 da matéria provada.
Tudo visto e analisados e ponderados as declarações de parte e os depoimentos produzidos (que não são contrariados por qualquer dos documentos juntos aos autos), de forma objectiva, à luz do princípio da livre apreciação da prova (art.º 607º nº5 do Código de Processo Civil)[6], não vemos que se possa concluir estarem corroborados os factos que a recorrente pretende aditar à matéria provada, nem considerar não provados os factos que a recorrente dela pretende eliminar. De resto, como se refere no Ac. RP de 21/6/2021 (proc. 2479/18, disponível em http://www.dgsi.pt), “mantendo-se em vigor, em sede de Recurso, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pelo Tribunal da Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser efectuado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados. Assim, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação, quando este Tribunal, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência final, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitaram uma conclusão diferente daquela que vingou na primeira Instância”. No caso dos autos, como vimos, a conjugação da prova produzida não permite obter decisão diversa da proferida em primeira instância.
O recurso improcede, nessa medida.
Do mérito da decisão recorrida:
Reportam-se os autos às consequências que a A. pretende fazer extrair da responsabilidade civil, fundada na culpa, configurando, na petição inicial, a existência quer de responsabilidade contratual, quer de responsabilidade extracontratual.
A responsabilidade contratual funda-se na violação de um direito relativo. Supõe a pré-existência de um específico vínculo entre as partes em causa, de uma obrigação em sentido técnico, qualquer que seja a sua fonte, que pode ser um contrato, um negócio jurídico unilateral, ou a própria lei. Já a responsabilidade extracontratual baseia-se na violação de direitos absolutos, com eficácia erga omnes, ou seja, num comportamento violador do dever geral de abstenção a que todos os homens estão obrigados. A diferença entre responsabilidade contratual e extracontratual parece estar no facto de a primeira pressupor a violação de um prévio compromisso assumido, enquanto a segunda se afirma a partir da violação do dever geral de neminem laedere[7].
No caso dos autos, o facto danoso invocado pela A. ocorreu no âmbito de uma viagem de recreio contratada com a R. W..., no decurso da qual a A. sofreu lesões físicas.
Assim, como vem assinalado na petição inicial, a par de uma eventual responsabilidade contratual, não deixa de se colocar a questão de saber se não existirá também lugar a responsabilidade civil extracontratual, uma vez que a A. terá visto lesada a sua integridade física, ou seja, um direito absoluto, oponível a todos os terceiros.
De facto, podem concorrer relativamente a um mesmo facto responsabilidade contratual e extracontratual e a mera invocação de um contrato não exclui a possibilidade de invocação de responsabilidade civil extracontratual, desde que os pressupostos desta última estejam preenchidos[8].
Refere Vaz Serra[9] que se discute se a responsabilidade contratual e extracontratual podem coexistir, no caso de o mesmo facto constituir, ao mesmo tempo, violação de um contrato e um acto ilícito extracontratual e «conquanto alguns sustentem que, nestes casos, são aplicáveis as regras da relação contratual (...), a solução que se afigura preferível é a de que são aplicáveis as regras de ambas as responsabilidades, à escolha do lesado, pois a solução contrária representaria para este um prejuízo grave quando as normas da responsabilidade extracontratual lhe fossem favoráveis (...). O que parece razoável é entender que, com o contrato, se não exclui o dever geral de não ofender os direitos ou os interesses de outrem protegidos pelas regras da responsabilidade delitual, querendo-se antes reforçá-lo; e que, por isso, a responsabilidade contratual não exclui a delitual». Assim, sustentar que, em virtude de haver entre as partes uma relação jurídica especial, que é a relação contratual, só são aplicáveis as regras dessa relação, constituiria para o lesado um grave prejuízo. Não é de presumir, sem mais, que ele tenha querido, com o contrato, afastar as regras da responsabilidade delitual. Por conseguinte, quando a violação do contrato for, ao mesmo tempo, um facto ilícito gerador de responsabilidade delitual nos termos gerais da responsabilidade, o lesado parece ter o direito de invocar, à sua escolha, as regras de uma ou de outra responsabilidade, conforme lhe convier. É certo que foi o contrato que, aproximando o credor do devedor ou da sua coisa, instituiu estas circunstâncias de facto, sem as quais o dano não se produziria, mas este argumento não exclui que, tendo embora sido o contrato que aproximou o credor do devedor ou da coisa, o contraente que viola o contrato cometa, ao mesmo tempo, um facto ilícito extracontratual. Foi porventura o contrato que tornou possível o facto lesivo do direito do credor, mas isto não obsta a que tal facto seja um facto ilícito idêntico ao que fosse cometido por um terceiro. Ao contratar com o devedor, não quererá, em regra, o credor prescindir das maiores garantias que as regras gerais da responsabilidade delitual lhe podem assegurar[10], não se excluindo, até, que possa beneficiar de todos os efeitos jurídicos que lhe sejam favoráveis, invocando, numa mesma acção, tanto as normas que regulam a responsabilidade contratual, como as que disciplinam a responsabilidade extracontratual[11].
De todo o modo, quer no âmbito da responsabilidade contratual, quer no da extracontratual, é necessário que tenha ocorrido a prática de um facto voluntário, ilícito, culposo e danoso, existindo nexo de causalidade entre o facto e os danos (cfr. art.ºs 798º e 483º, do mesmo diploma).
In casu, não há dúvidas de que o R. RL... tripulava, voluntária e conscientemente, a embarcação onde seguia a A.. E, tendo-se provado que aquele R. governava o barco da R. W... sob as ordens, direcção e autoridade desta, há que considerar que esta será responsável pelos actos daquele, desde que verificados os restantes pressupostos da responsabilidade civil (contratual ou extracontratual), nos termos dos art.ºs 800º e 500º do Código Civil.
Quanto ao requisito da ilicitude, significa o mesmo que tem de haver, no caso da responsabilidade civil contratual, o incumprimento de uma obrigação contratual e, no caso da responsabilidade delitual, uma violação de um direito subjectivo de outrem, ou de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios.
Na sentença recorrida foi já considerado que entre a A. e a R. W... (enquanto empresa que se dedica à actividade de animação marítimo-turística) foi celebrado um contrato de prestação de serviço, mediante o qual a R. se obrigou perante a A., mediante retribuição, a deslocá-la, a bordo da embarcação OE..., num passeio de observação da natureza ao longo da costa algarvia.
Esta qualificação não mereceu qualquer reparo da recorrente, que com ela se conformou, pelo que – sendo certo que não vemos razões para dela divergir – a consideramos assente.
E é certo que da matéria provada resulta que a R. W... cumpriu a prestação a que se obrigou, já que, efectivamente,  proporcionou à A. o passeio em causa.
Porém, quem celebra um contrato não tem de cumprir apenas as obrigações principais ou típicas, pois cumpre-lhe igualmente observar deveres laterais ou acessórios (destinados a preparar o cumprimento ou a assegurar a perfeita execução da prestação) e deveres de conduta essenciais ao correcto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra (que deve processar-se nos termos em que se processaria entre contraentes que agem honestamente e de boa fé nas relações recíprocas - art.ºs 406º nº1 e 762º do C.C.)[12]. Com efeito, «nem sempre ao cumprimento da obrigação basta a realização do acto (…) directamente a cargo do devedor. Tratando-se de uma obrigação de resultado (…) é ainda necessário que ao acto (…) do devedor acresçam os requisitos exteriores necessários (…) para que o efeito visado com a prestação de verifique[13]». Releva aqui, essencialmente, o dever de boa-fé no cumprimento da obrigação, a que alude o art.º 762º nº2 do Código de Processo Civil, o qual «envolve, além do mais, dois corolários essenciais. Por um lado, o devedor não pode limitar-se a uma realização puramente literal ou farisaica da prestação a que se encontra adstrito (…). Por outro lado, o dever de boa-fé não se circunscreve ao simples acto da prestação, abrangendo ainda, na preparação e execução desta, todos os actos destinados a salvaguardar o interesse do credor na prestação (o fim da prestação) ou a prevenir prejuízos deste, perfeitamente evitáveis com o cuidado ou a diligência exigível do obrigado (…). É nesta área do cumprimento da obrigação que especialmente se concentra a vasta galeria dos deveres acessórios de conduta (deveres de protecção, de esclarecimento e de lealdade)[14]».
Ora, num contrato como o dos autos, é evidente que a obrigação da R. W... não se esgotou na deslocação física da A. num passeio marítimo, já que lhe incumbia um dever de protecção, indissociável daquela prestação principal, relativamente à pessoa da A. – cabia-lhe garantir que o passeio se realizasse em condições de segurança e evitar que ocorresse qualquer prejuízo para a integridade física da A., ou seja, garantir que esta chegasse incólume ao seu destino[15]. Claramente, não foi isso que aconteceu, porquanto, durante o passeio, em razão de um embate do casco do barco contra a superfície de uma onda, a A. embateu fortemente no seu assento, sentindo uma dor excruciante e lesionando uma vértebra da coluna. Houve, pois, objectivamente, incumprimento contratual (ou, pelo menos, cumprimento defeituoso) por parte da R. W....
Aliás, esse incumprimento manifestou-se, ainda, tal como exaustivamente é descrito na decisão recorrida, no facto de terem sido omitidas à A. diversas informações prévias, que caberia à R. ter-lhe transmitido (cfr. art.º 6º nº1 e 2 do DL 108/2009 de 15-5), para que a A. pudesse ter na sua posse todos os elementos que lhe permitissem ponderar os riscos e tomar a decisão (consciente e informada) de efectuar, ou não, o passeio [designadamente, a A. embarcou sem ter sido informada das condições do mar no local onde iria desenvolver-se o passeio, nem de que haveria qualquer potencial perigo, ou sequer de que a embarcação embateria nas ondas de tal modo que os passageiros se elevariam dos seus assentos e se sentariam bruscamente nos mesmos].
Está, assim, configurada a violação dos deveres contratuais por parte da R. W... e, portanto, a ilicitude do seu comportamento.
No que tange à responsabilidade extracontratual, igualmente se mostra preenchido o requisito da ilicitude, mediante a violação de direitos subjectivos da A., porquanto, como já se disse, foi violada a sua integridade física (art.º 70º nº1 do Código Civil).
Em relação à culpa, temos que como tal se entende a conduta humana censurada pelo Direito: o lesante, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo - art.ºs 487º nº2 e 799º nº2 do Código Civil[16].
No caso da responsabilidade contratual, tal culpa presume-se, sendo certo que incumbia aos RR. provar que a falta de cumprimento não procedeu de culpa sua (cfr. art.º 798º do Código Civil).
Também no caso da responsabilidade extracontratual teremos de ter em consideração o disposto no art.º 493º nº2 do Código Civil, de acordo com o qual “quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir”.
Estabelece esta norma a inversão do ónus da prova relativamente à culpa, já que consagra uma presunção de culpa por parte de quem exerce uma actividade perigosa. Ou seja, não se trata de responsabilidade objectiva, porque a responsabilidade continua a depender de culpa, mas esta presume-se iuris tantum, sendo ao lesante que incumbe provar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de evitar os danos. Este art.º 493º nº 2 não diz o que deve entender-se por actividade perigosa, mas admite «que a perigosidade derive da própria natureza da actividade, como a navegação marítima»[17], actividade notoriamente sujeita à imprevisibilidade das forças da natureza – ventos, ondulação e correntes –, que se alteram frequentemente de forma súbita, com risco elevado para a integridade física e até para a vida dos passageiros.
Com efeito, como se refere no Ac. RL de 22/6/2021[18], devendo aferir-se a perigosidade de uma actividade pela especial probabilidade – avaliada aprioristicamente – de que a mesma venha a causar danos que, «em termos de normalidade, não ocorreriam noutra actividade», tem-se entendido que «é perigosa, nos termos e para os efeitos do citado normativo, a actividade de transporte de pessoas numa embarcação de recreio, no mar, para observação de golfinhos»[19]. Neste caso, «não basta ao lesante, para ilidir a presunção de culpa decorrente do nº2 do art.º 493º do Código Civil, provar que agiu com os cuidados de um homem normal, em circunstâncias igualmente normais e de acordo com a diligência de um bom pai de família, conforme exige o art.º 487º, nº2, havendo um plus que se lhe impõe e que decorre da própria perigosidade da actividade em causa, pois todo este regime assenta no princípio da prevenção do perigo e os deveres que recaem sobre o agente são deveres especiais de cuidado, deveres de segurança no tráfico».
Ora, os RR. não provaram qualquer facto susceptível de ilidir a presunção de culpa ou, pelo menos, de fazer concluir que foram empregues todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos.
Efectivamente, não se provou que a A. tenha sido informada de que o banco que escolheu era aquele onde mais se sentiam as vibrações e o impacto da embarcação na água, que tenha sido convidada a ocupar um outro banco onde aquele impacto seria menor, que tenha sido questionada previamente se sofria de problemas de coluna ou outras enfermidades sensíveis às vibrações, trepidações ou impactos – sendo certo que nada impedia a R. W... de ter prestado tais informações. Também não se provou que o impacto sofrido pela proa da embarcação tenha resultado da formação repentina de uma onda cavada, devido a uma mudança súbita e imprevista da corrente marítima, ou sequer que o R. RL... não podia ter previsto ou atenuado os efeitos de uma vaga de maior dimensão que a embarcação transpôs. Pelo contrário, provou-se que a A. embarcou sem ter sido informada de que a embarcação embateria nas ondas de tal modo que os passageiros se elevariam dos seus assentos e se sentariam bruscamente nos mesmos, sendo ainda certo que, imediatamente antes de passar por uma onda maior (que fez com que a proa da embarcação se elevasse e depois embatesse fortemente contra a superfície da onda seguinte), o R. RL... acelerou bruscamente – sabido que é que qualquer manobra brusca (a não ser que efectuada para evitar um perigo maior, o que não é o caso) é desaconselhável, ainda mais quando a ondulação vinha aumentando (cfr. factos provados nº60 a 63), assim potenciando as hipóteses de ocorrer um embate violento na sequência de uma vaga mais alta. Em suma, não se provou que o acidente tenha resultado de causas exclusivamente naturais, impossíveis de neutralizar ou mitigar («fortuna de mar»).
Não foi, assim, afastada a presunção de culpa prevista nos citados art.ºs 798º e 493º nº2 do Código Civil.
Dos factos provados resulta também claro que o embate em causa originou diversos danos para a A. e que existe um nexo de causalidade adequada entre a conduta da R. W... (por intermédio do R. RL...) e tais danos (art.º 563º do Código Civil).
Vejamos.
A A. pedia o pagamento das seguintes quantias:
a – Despesas: €9.501,60;
b – Retribuições que deixou de auferir desde a data do acidente até à data da propositura da acção: €15.498,40; e retribuições que deixará de auferir no futuro: “a apurar em execução de sentença”; c – Sofrimentos físicos e morais: €15.000,00.
a sentença, a aqui recorrente foi condenada a pagar-lhe as seguintes parcelas:
1 - €185,82 de despesas [assim procedendo parcialmente o pedido referido em a)];
2 - €19.000,00 de lucros cessantes / dano biológico [assim procedendo o pedido referido em b)];
3 - €20.000,00 pelos danos não patrimoniais [assim procedendo o pedido referido em c)].
A recorrente discorda da ressarcibilidade do dano biológico – atendendo a que a A., à data do acidente, não trabalhava – e dos montantes referidos em 2 e 3. Quanto ao valor fixado em 1, conformou-se com o mesmo, pelo que não cabe aqui apreciá-lo.
Isto posto, temos que dano é a lesão de qualquer bem jurídico. Engloba, por um lado, a lesão de um património, denominando-se, então, dano patrimonial, e, por outro, a lesão da integridade física e/ou moral de uma pessoa, denominando-se, nesse caso, dano não patrimonial.
Quanto aos danos patrimoniais [na parte aqui em causa], provou-se o constante dos pontos 143, 144, 177 a 179, 184, 192 a 195 e 197 da matéria de facto, ou seja, que:
- A A. nasceu no dia 16/3/1961;
- No ano de 2015, auferiu rendimentos do trabalho cifrados no montante global de CAD 52.160;
- À data do acidente, não trabalhava, não auferindo então qualquer rendimento;
- Tinha planeado, após o regresso das suas férias, iniciar a busca de um novo emprego;
- Adiou essa busca até à sua completa recuperação;
- Deixou de ter qualquer rendimento, por não ter voltado a trabalhar;
- Padeceu de um Período de Défice Funcional Temporário Total fixável em 2 dias: - Padeceu de um Período de Défice Funcional Temporário Parcial fixável em 94 dias;
- A consolidação médico-legal das lesões sofridas ocorreu em 12-12-2016;
- Ficou a padecer de limitações práticas, recorrentes de raquialgia residual, desencadeada por flexão repetitiva ou com esforços do tronco, carregar pesos nos membros superiores e ortostatismo, sedestação ou decúbitos prolongados;
- Em consequência das sequelas que ficou a sofrer, passou a ter um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 4 pontos, o qual não a afecta em termos de autonomia e independência, embora seja causa de sofrimento físico, com discreta limitação funcional e necessidade esporádica de medicação analgésica.
Já não se provou: que a A. tenha perdido, até à presente data, a título de rendimentos laborais, o montante global de €15.498,40; que, desde o dia do acidente, não lhe foi possível ainda voltar à sua rotina laboral; que continua, até hoje, impossibilitada de trabalhar, tendo deixado de auferir o montante global de €16 999,68; e que, até à presente data, por causa das dores de que padece na coluna vertebral, não lhe é possível permanecer sentada por um período normal de trabalho, necessário ao exercício das suas funções, por este motivo permanecendo em casa, com restrições de mobilidade.
Ora, quanto ao pedido de condenação da R. no pagamento das retribuições que a A. deixou de auferir desde a data do acidente até à data da propositura da acção (no valor de €15.498,40) e das retribuições que deixará de auferir no futuro («a apurar em execução de sentença»), a A. não logrou provar (ónus que lhe incumbia – art.º 342º nº1 do Código Civil) que, antes ou depois da data da alta, tenha tido ou virá a ter qualquer perda de rendimentos decorrente do acidente dos autos e, em consequência, que tenha tido ou que virá a ter o seu património reduzido de qualquer montante. Com efeito, provou-se que a A., à data do acidente, não trabalhava e não auferia qualquer rendimento, sendo certo que, embora tivesse planeado iniciar a busca de um novo emprego, busca que adiou até à sua completa recuperação, o certo é que a alta ocorreu em 12/12/2016, mas a A. não voltou a trabalhar, apesar de não se ter provado que o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos de que ficou a sofrer seja incompatível com o exercício da sua profissão.
No entanto, é evidente que as sequelas permanentes e irreversíveis de que ficou a sofrer implicam para a A. um maior esforço para realizar as tarefas laborais que lhe vierem a ser atribuídas, o que importa um dano patrimonial futuro susceptível de ser indemnizado, apesar de a A. se encontrar desempregada, pois, a qualquer momento, pode retomar a sua vida profissional. Como se refere no Ac. RL de 13/9/2018[20], «a perda definitiva e parcial da capacidade geral de utilização do corpo deve ser ressarcida como dano patrimonial, excepto quando se prove que o lesado está “irremediavelmente afastado do ciclo laboral”, ónus da prova que cabe ao responsável pela indemnização (e nesta hipótese excepcional essa perda entrará então no cálculo da compensação por danos não patrimoniais)».
No caso dos autos, não se tendo provado que a A. esteja irremediavelmente afastada do mercado de trabalho (até porque, na presente data, não atingiu ainda a idade da reforma), terá a mesma, assim, de ser compensada pelo prejuízo, no aspecto estritamente laboral, decorrente de ter de fazer um esforço maior para obter o mesmo rendimento e, muito provavelmente, perder futuras oportunidades laborais e perder a possibilidade de vir a obter ocupação mais bem remunerada[21].
Princípio geral da obrigação de indemnização é o de que o obrigado à reparação do dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art.º 562º do Código Civil).
Para efeitos de cálculo de indemnização, dispõe o art.º 564º, do mesmo diploma legal, que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, sendo certo que, na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior. Ainda com interesse, estatui o nº 2 do art.º 566º, do mesmo Código, que a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos [teoria da diferença], sendo certo que, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (nº3 da norma em referência).
Assim, em conformidade com aquelas normas, a A. deverá ser ressarcida da repercussão, na respectiva actividade profissional, das sequelas de que ficou a padecer e que lhe causam um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos (dano biológico). Note-se que, embora não conste da matéria provada qual era a actividade profissional que a A. desenvolvia anteriormente [provou-se apenas que auferiu rendimentos do trabalho no ano anterior, 2015], o certo é que se a incapacidade de que ficou a sofrer é geral (portanto, para todas as actividades), parece-nos claro que afectará a A. qualquer que seja a sua actividade profissional concreta.
Não sendo então possível apurar o montante concreto do prejuízo, recorrer-se-á a juízos de equidade e razoabilidade (art.º 566º nº3 do Código Civil).
Ora, tendo a A. nascido em 1961, é expectável que tenha uma vida activa de 10 anos, contados da data da consolidação das lesões (cfr. dados disponíveis em www.pordata.pt, de onde resulta que a idade média de reforma dos pensionistas do sexo feminino, em 2021, foi de 65 anos). Assim, levando-se em consideração o défice funcional de que a A. ficou a padecer, o vencimento que auferiu no ano anterior ao do acidente (CAD 52.160), o período pelo qual ainda perdurará a sua vida activa, bem como a jurisprudência do STJ[22], entende-se ser adequada a atribuição da quantia de €12.000,00 (em vez dos €19.000,00 fixados em primeira instância).
Quanto aos danos não patrimoniais, diz-nos o art.º 496º nº1 do Código Civil que deve atender-se àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada) - cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7ª ed., pág. 600. O dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Já o simples incómodo é destituído de relevância jurídica, porque não é ofensivo de um bem com dignidade suficiente para merecer a tutela indemnizatória.
A este respeito, com interesse, provaram-se os factos constantes dos pontos 74, 79 a 88, 92 a 103, 110 a 168, 187, 189 e 192 a 198.
Ora, os factos descritos constituem danos não patrimoniais dignos da tutela do Direito – de um ponto de vista objectivo, justifica-se plenamente a atribuição de uma indemnização àquele que sofreu lesões físicas, com as consequentes dores fortes (grau 4/7) e desgostos (impossibilidade de desfrutar das férias, de realizar autonomamente as suas tarefas e de brincar com os netos, necessidade de deambular em cadeira de rodas), ainda mais quando essas lesões implicaram internamento hospitalar (2 dias), tendo-se o período de doença prolongado por 96 dias, tendo resultado sequelas definitivas geradoras de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (4 pontos), com sofrimento físico e necessidade esporádica de medicação analgésica e com repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer (grau 2/7).
Como não é possível a reconstituição natural (art.º 566º nº1 do C.C.), o que se visa é a atribuição de uma quantia pecuniária, no sentido de proporcionar um prazer alternativo, susceptível de fazer esquecer a dor, a fixar equitativamente (art.ºs 496º nº4 e 494º do C.C.).
Levando-se em consideração:
- a fractura sofrida pela A. (na coluna vertebral),
- os tratamentos a que foi submetida (incluindo dois dias de internamento hospitalar, incluindo oito horas deitada numa maca na urgência, uso de dorsolombostato, uso de cadeira de rodas),
- as angústias e dores que sofreu (quantum doloris de grau 4 numa escala crescente de 7, viagem de uma hora num barco, com muitas dores e perspectivando os danos permanentes de que poderia vir a padecer) e continua a sofrer (obrigando a medicação analgésica),
- o período de doença (2 dias de défice funcional temporário total e 94 dias de défice funcional temporário parcial),
- as actividades desportivas e de lazer que teve de adaptar (grau 2 numa escala crescente de 7),
- a incapacidade para todas as actividades da sua vida diária de que ficou a padecer (de 4 pontos),
- o facto de, tendo a A. nascido em 1961, ser expectável que viva mais 28 anos (contados da data da alta – cfr. dados disponíveis em http://www.ine.pt, de onde resulta que a esperança média de vida, para o sexo feminino, é de 83,37 anos),
- a jurisprudência do STJ[23], que não permite que a indemnização a fixar seja miserabilista ou simbólica, antes impondo que a mesma permita o efectivo ressarcimento dos danos,
entende-se ser adequada a atribuição da quantia de €15.000,00 (em vez dos €20.000,00 fixados em primeira instância).
Definida que está, deste modo, a responsabilidade da R. W... (agindo por intermédio do R. RL...), há que dizer que pelo pagamento das quantias fixadas é responsável, tal como assinalado pelo tribunal a quo, a R. M... Seguros, atento o contrato de seguro de responsabilidade civil celebrado – cfr. pontos 28 a 31 dos factos provados e art.ºs 27º do DL 108/2009 de 15-5 e 14º do DL 149/2014 de 10-10.
Pugna, entretanto, a recorrente pela redução da indemnização, ao abrigo do art.º 494º do Código Civil, face ao reduzido grau de culpa do R. RL..., cuja conduta não foi dolosa, apenas revelando incapacidade de evitar a tempo os efeitos da onda maior que a embarcação teve de vencer.
Prevê aquela norma que «quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem».
Acontece que esta norma se aplica apenas à responsabilidade extracontratual e não à contratual[24]. Ora, considerando que a A. invocou a existência de ambos os tipos de responsabilidade, é forçoso aplicar aqui (conforme referimos supra) o regime que lhe é mais favorável, ou seja, o da responsabilidade contratual, no âmbito do qual não existe qualquer norma que implique a redução da indemnização em caso de mera culpa[25] [26].
Finalmente, naquilo que concerne aos juros de mora, pretende a recorrente que apenas são devidos juros 30 dias após a data da decisão, nos termos dos art.ºs 102º nº1 e 2 e 104º do DL 72/2008 de 16-4 (Regime Jurídico do Contrato de Seguro). De acordo com estas normas, «o segurador obriga-se a satisfazer a prestação contratual a quem for devida, após a confirmação da ocorrência do sinistro e das suas causas, circunstâncias e consequências»; para esse efeito, «pode ser necessária a prévia quantificação das consequências do sinistro» e «a obrigação do segurador vence-se decorridos 30 dias sobre o apuramento dos factos».
A este respeito, provou-se que a R. seguradora informou a A. de que apenas cobriria as despesas de tratamento e repatriamento, com um máximo de € 3.500,00, contra a entrega de documentos originais comprovativos da realização de tais gastos. Tal montante foi liminarmente rejeitado pela A., que nunca chegou a entregar os recibos das despesas médicas e medicamentosas por si realizadas, motivo pelo qual a R. não efectuou qualquer pagamento ao abrigo daquela cobertura (cfr. factos provados nº180 a 183).
Assim, considerando que a R. recorrente apenas teve acesso aos documentos comprovativos das despesas efectuadas pela A., no montante de € 185,82, com a citação (documentos 31 e 34 da petição inicial – aluguer de cadeira de rodas e alteração dos lugares de avião), pelo que, até essa data, não dispunha de elementos para as quantificar, há que aplicar o disposto naquele art.º 104º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro e, em consequência, considerar que a obrigação de pagamento daqueles € 185,82 não se venceu com a citação, mas 30 dias após esta.
No mais, quanto aos montantes fixados a título de indemnização por danos patrimoniais (na vertente do dano biológico) e não patrimoniais, a R. recorrente recusou o seu pagamento (por não se tratar de despesas de tratamento e repatriamento) e, portanto, a falta de pagamento não decorreu de qualquer necessidade de averiguação da ocorrência do sinistro, das suas causas, circunstâncias e consequências, pelo que é inaplicável o disposto nos art.ºs 102º a 104º em referência.
Assim sendo, e considerando que os montantes indemnizatórios foram fixados com recurso à equidade, os juros moratórios são devidos desde a data da decisão proferida em primeira instância, uma vez que a situação a que se atendeu para a fixação da indemnização foi aquela existente à data do encerramento da discussão em primeira instância - cfr. art.ºs 611º nº 1 do C.P.C., e 566º nº2 e 804º a 806º do C.C..
DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência:
A) Fixar como termo inicial do vencimento dos juros de mora incidentes sobre a quantia de €185,82, relativa a danos emergentes, fixada na sentença, trinta dias após a data da citação da R. M... Seguros;
B) Reduzir a €12.000,00 a quantia fixada na sentença, a título de compensação do dano biológico, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da sentença proferida em primeira instância, até integral pagamento;
C) Reduzir a €15.000,00 a quantia fixada na sentença, para compensação de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da sentença proferida em primeira instância, até integral pagamento;
D) No mais, manter o decidido em primeira instância.
Custas do recurso pela apelante e pela apelada, na proporção de 2/3 para a primeira e 1/3 para a segunda – art.º 527º do Código de Processo Civil.

Lisboa, 14 de março de 2023
Alexandra de Castro Rocha
Maria da Conceição Saavedra
Cristina Coelho

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[1] Atento o teor das alegações e das restantes conclusões, é manifesto que a recorrente se reporta ao ponto 70 dos factos provados, o que se considerará.
[2] Cfr. Ac. STJ de 13/10/2020, proc. 392/14, disponível em http://www.dgsi.pt.
[3] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol I, 3ª ed.,pág. 782.
[4]   “Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos”.
[5] A este respeito pode ver-se, ainda, o Ac. RC de 27/5/2014 (proc. 1024/12, disponível em http://www.dgsi.pt): «Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o (s) facto (s) concreto (s) objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente».
[6]  Que, não equivalendo a arbitrariedade, implica a formação de uma convicção pessoal da verdade dos factos segundo regras de lógica e experiência objectiva e comunicacional – cfr. Natália Lopes Gonçalves, Livre Apreciação da Prova e Prudente Convicção do Juiz, Universidade de Lisboa, 2019, págs.  11 e ss., bem como a doutrina aí citada.
[7] Cfr. Maria Victória Rocha, A Imputação Objectiva na Responsabilidade Contratual, in R.D.E., ano XV, 1989, págs. 32-33; Manuel Carneiro da Frada, Contrato e Deveres de Protecção, Coimbra, 1994, págs. 124-126; Jorge Sinde Monteiro, Responsabilidade Civil, R.D.E., ano IV, nº2, págs. 314-315.
[8] Cfr. Ac. STJ de 22-10-87, BMJ 370, pág. 529; Fernando Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Coimbra, 1995, pág. 41.
[9] RLJ, ano 102º, pág. 313; ano 109º, pág. 120.
[10] cfr. Vaz Serra, Responsabilidade Contratual e Responsabilidade Extracontratual, in BMJ nº85, págs. 230-231 e 237-238. No mesmo sentido, cfr. Sentença de 27-7-76 publicada na CJ, ano IV, t. IV, pág. 1347; João Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7ª ed., pág. 512.
[11] Cfr. Fernando A. Ferreira Pinto, O concurso entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual, in Revista de Direito Comercial, 20/11/2020, pág. 2013 a 2016 – disponível em www.revistadedireitocomercial.com.
[12] Cfr. Antunes Varela, RLJ, ano 102º, pág. 119.
[13] Cfr. Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume II, 3ª ed., pág. 2.
[14] Ob. cit. págs. 2-3.
[15] Cfr. Ac. RL de 21/5/2013, proc. 1114/09, disponível em http://www.dgsi.pt.
[16] Cfr. Antunes Varela, R.L.J., ano 102º, págs. 38 e ss.
[17] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª ed., pág. 495.
[18] Proc. 1694/18, disponível em http://www.dgsi.pt.
[19] Certamente por reconhecer a perigosidade da actividade dos operadores marítimo-turísticos é que o art.º 27º do DL 108/2009 de 15-5 prevê a obrigatoriedade de que tais empresas celebrem e mantenham válidos seguros que cubram os riscos decorrentes dessa actividade para a saúde e segurança dos destinatários dos serviços ou de terceiros.
[20] Proc. 3181/14, disponível em http://www.dgsi.pt.
[21] Cfr. entre outros, Ac. RP de 7/12/2018, proc. 23088/15, Ac. RP 27/9/2018, proc. 903/15, Ac. STJ de 29/10/2019, proc. 7614/15, Ac. RC de 9/11/2021, proc. 307/19, Ac. STJ de 13/4/2011, proc. 843/07, todos disponíveis em http://www.dgsi.pt).
[22] Cfr. Ac. STJ de 27/4/2017, proc. 1343/13 (disponível em http://www.stj.pt – Sumários), e Ac. STJ de 17/12/2019, proc. 2224/17 (disponível em http://www.dgsi.pt), em que, em casos semelhantes ao dos autos – idade de 56 anos à data do sinistro, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5 pontos; idade de 61 anos à data do acidente, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos –, foi fixada em € 10.000,00 a indemnização pelo dano biológico.
[23] Cfr. os seguintes Ac. do STJ:
- 27/4/2017, já citado – 56 anos à data do sinistro, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5 pontos, quantum doloris 4/7 –, em que os danos não patrimoniais foram fixados em €15.000,00;
- 17/12/2019, já citado - 61 anos à data do acidente, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 4 pontos, quantum doloris 4/7 –, em que os danos não patrimoniais foram fixados em €15.000.00;
- 12/6/2017, proc. 559/10, disponível em http://www.dgsi.pt – 31 anos à data do sinistro, défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 2 pontos, quantum doloris 4/7 – em que os danos não patrimoniais foram fixados em €15.000,00.
[24] Cfr. Ac. RL de 5/5/2020, proc. 8162/16, disponível em http://www.dgsi.pt.
[25] A não ser em casos-limite, mediante o recurso ao instituto do abuso de direito (art.º 334º do Código Civil), sendo certo que, na situação sub judice não vêm invocados factos susceptíveis de o integrarem.
[26] De qualquer modo, entendemos que, mesmo no caso da responsabilidade extracontratual, não se justificaria qualquer redução da indemnização ao abrigo do art.º 494º do Código Civil, atendendo a que não foi sequer alegado e não ficou provado que os RR., de qualquer forma, tenham ao menos diligenciado por tentar reparar ou mitigar os danos sofridos pela A..