Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
167/09.2TTLMG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MACHADO DA SILVA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
DESPEDIMENTO DE FACTO
Nº do Documento: RP20101011167/09.2TTLMG.P1
Data do Acordão: 10/11/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Decorre do art. 394º, nº 1, do CT, aprovado pela Lei nº 99/03, de 27.08 que o acordo reveste obrigatoriamente forma escrita, ou seja, a forma escrita é uma formalidade “ad substantiam”, sendo que a inobservância dessa forma escrita gera a nulidade do eventual acordo, nos termos do art. 220º do CC.
II - A prova de tal acordo só podia ser feita através da confissão ou de documento escrito – cf. art. 393º, nº 1, do CC.
III - Inexistindo documento escrito, titulando o eventual acordo revogatório, ou a sua confissão, não podia tal acordo ser dado como provado.
IV - A Declaração de Situação de Desemprego, emitida e entregue ao trabalhador pelo empregador nos termos e para os efeitos dos art. 43º e 73º do DL 220/2006, de 03.11, na qual este declarou que o contrato de trabalho cessou por "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho...", tem como destinatário a Segurança Social, não fazendo prova plena quanto à veracidade dos factos contidos na declaração, ou seja, não faz prova plena de que o contrato de trabalho cessou por despedimento por aquele promovido.
V - No domínio do despedimento promovido pelo empregador, a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser “inequívoca”, admitindo-se os “despedimentos de facto”, corporizados numa atitude inequívoca daquele, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Reg. nº 1468.
Proc. nº 167/09.2TTLMG.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

1. B………. intentou a presente acção, com processo comum, contra C………., Lda., pedindo seja declarada a ilicitude do seu despedimento e em consequência seja a Ré condenada:
- a readmiti-lo no seu posto de trabalho, sem perda de qualquer direito ou regalia;
- a pagar-lhe todas as retribuições que teria auferido desde 30 dias antes da propositura da acção até à sentença, acrescida de juros de mora à taxa legal;
- a pagar-lhe a quantia de € 4.625,00, a título de férias não gozadas;
- e ainda a quantia de € 10.000,00, a titulo de indemnização por danos morais;
- tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto, em suma, que foi admitido ao serviço da Ré, em Abril de 2006, para exercer as funções de encarregado de exploração agrícola, o que fez desde então até Janeiro de 2009, sem ter gozado férias.
Mais aduziu que, em Outubro de 2008, a Ré manifestou o propósito de proceder ao seu despedimento o que veio a concretizar no dia 28 de Janeiro de 2009 mediante a entrega da declaração de situação de desemprego fundada numa reestruturação, por motivos tecnológicos e estruturais.
Acrescentou que tais fundamentos não se verificaram, sendo o único trabalhador a ser despedido, logo a Ré diligenciando pela sua substituição e, tendo o A. manifestado a sua intenção de impugnar tal despedimento, a Ré moveu-lhe um procedimento disciplinar que culminou na decisão de o despedir com justa causa por faltas injustificadas.
Mais alegou que tal procedimento por parte da Ré lhe provocou grande desgosto, frustração e constrangimento na obtenção de novo emprego, o que tudo se reflectiu na sua vivência diária com família e amigos.
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A Ré contestou a acção, por impugnação, alegando, em síntese, que entre o dia 29 de Janeiro de 2009 e 5 de Marco de 2009 o Autor não compareceu ao serviço nem deu qualquer justificação para o efeito, comportamento que pela sua gravidade determinou o seu despedimento com justa causa.
Mais aduziu que, em Dezembro de 2008, as partes haviam encetado negociações com vista à cessação do contrato por mútuo acordo, mediante o pagamento de uma indemnização, para o que foram redigidas várias minutas, às quais o Autor solicitou alterações, prontamente introduzidas pela Ré.
Assim, para que o Autor pudesse fazer as consultas necessárias, a Ré, no dia 26 de Janeiro de 2009, entregou-lhe a declaração de situação de desemprego, cuja data alterou depois para 28 de Janeiro de 2009 e que o Autor entregou na Segurança Social.
Mais acrescentou que, convencida do bom termo das negociações, processou todos os vencimentos do Autor vencidos naquela data, mormente férias e subsídio de férias, mas que depois do dia 28 de Janeiro de 2009 o Autor não mais compareceu ao trabalho nem contactou a Ré para formalizar o acordo de revogação do contrato.
Mais alegou que não obstante o motivo indicado na declaração de situação de desemprego ter sido um acordo entre as partes a sua justificação não ultrapassa o âmbito do Decreto-lei n° 220/2006 e que as razões para tal acordo se verificaram.
Acrescentou não serem devidas ao Autor as quantias reclamadas opondo-se expressamente à sua reintegração e concluindo pela improcedência da acção, por manifesto abuso de direito do Autor requerendo a sua condenação como litigante de má fé.
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À matéria da contestação respondeu o Autor, impugnando os factos alegados pela Ré, concluindo pelo pedido de condenação desta como litigante de má fé.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova, foi, posteriormente, proferida sentença, julgando a acção improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos, e condenado o A., como litigante de má fé, em multa correspondente a 5 UC e indemnização a favor da Ré correspondente aos honorários devidos à sua ilustre mandatária, no montante de € 1.500,00, a pagar directamente a esta, a menos que a Ré demonstre que a mesma já se encontra embolsada.
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Inconformado com esta decisão, dela recorreu o A., formulando as seguintes conclusões:
1. Pugna o recorrente pela completa revisão da sentença recorrida, na medida em que da prova processualmente adquirida resulta a procedência da acção, em razão do despedimento ilícito do A./trabalhador pela R./empregadora, radicando, desde logo, a sua discordância quanto à fixação da matéria de facto.
2. Impugna, em primeira e decisiva linha, as respostas dadas aos artigos 31° a 35°, 44°, 55°, 45° e 46°, da Contestação e ao artigo 10, da petição inicial, que se referen­ciam à matéria essencial para o destino decisório da acção, hipotético estabelecimento de um acordo entre a R. e o A., para cessação, por revogação, do contrato de trabalho que os ligava.
3. Tendo obtido respostas de "Provado", as que se impunham, face à prova produzida, no que respeita àqueles artigos da Contestação, eram as de "Não provado" em relação a todos, à excepção da que consta do artigo 45°, em que deve ser restritiva, quanto mais não seja porque o primeiro segmento – desde "Note-se" até "conveniente" – é conclusivo, devendo ser eliminado da resposta, e do que consta do artigo 46°, em que deve ser eliminado o advérbio "inexplicavelmente".
4. Em sentido oposto, o facto alegado sob o artigo 10 da p.i., a que foi dada a resposta de "Provado apenas que em 28 de Janeiro de 2009 os responsáveis da Ré entregaram-lhe a declaração de situação de desemprego, junta aos autos a fls. 12", deve ser dado como "Provado" na totalidade.
5. Tendo-se, no seu dizer, o tribunal valido "da conjugação dos documentos juntos aos autos, depoimentos de parte e depoimentos testemunhais", não conseguimos identificar os meios de prova que sustentaram as referidas respostas, conjugando-se, ao invés, para demonstração da pertinência das respostas por nós propugnadas.
6. Os documentos com atinência com a matéria, minutas juntas pela R. e por ela redigidas, não assinadas, referentes ao tal tentado acordo, não passam de isso mesmo, minutas que traduzem a tentativa de se chegar a um acordo, que nunca chegou a existir, não lhes podendo ser reconhecida qualquer idoneidade e relevo probatórios.
7. Analisadas as respostas dadas pela única testemunha apresentada pela R., seu trabalhador administrativo, D………., conclui-se pela confirmação da tese do A., ou seja, que existiram tentativas de acordo para a cessação do contrato de trabalho, nada trazendo em suporte da alegação da R. sobre a sua concretização.
8. Revisitada a prova trazida a Juízo pela recorrida, no que a este segmento da matéria de facto respeita, conclui-se pela sua absoluta falência, inviabilizando, só por si, a solução decisória por que se optou.
9. Não se aceita a lógica de fundamentação da Mma Juiz de que a sua convicção para dar como provados os referidos artigos da Contestação e para dar a resposta ao aludido artigo da p.i. se firmou no depoimento de parte dos legais representantes da R., porque noutros meios de prova, como vimos, não pôde radicar.
10. O "principio da aquisição processual" invocado pela julgadora não pode ser subvertido ao ponto de dar guarida à posição de que esse depoimento "valeu ainda além de uma perspectiva meramente confessória", não se admitindo que a prova do que foi alegado por uma parte possa assentar, precisamente, nas suas próprias declarações, o que subverteria, inadmissivelmente, a matriz conceptual do regime legal consignado nos arts. 552° e sgs., do CPC.
11. A própria julgadora, durante a prestação do depoimento dos representantes da R., mostrou não ter dúvidas de que os factos alegados na Contestação não podiam ser dados como provados com base nesses depoimentos de parte, tendo, pelo menos em duas ocasiões, interrompido as instâncias do mandatário do A., impedindo-as, sobre os termos do tal invocado acordo.
12. Não se entende, também, como a que a Mma Juiz a quo podia ter valorizado o que foi dito em depoimento de parte da R., desprezando, ao contrário e sem justificação, por completo, o que foi dito em depoimento de parte do A., em manifesta violação do direito à igualdade de tratamento das partes.
13. Mesmo assim, sem se prescindir de quanto se afirmou, o depoimento de parte dos representantes da R., naquilo que "escapou" para a gravação, não foi de molde a sustentar a ideia de que o dito acordo tenha sido concretizado, não tendo, sequer, mostrado que as condições, sobretudo relacionadas com a compensação a dar ao trabalhador (até por contradição insanável entre os dois representantes), tinham sido acordadas, razão pela qual não constavam das tais minutas não assinadas.
14. Acresce a tudo isto que transpareceram para o processo circunstâncias várias, que deveriam ter servido de elementos coadjuvantes para que a Mma Juiz não desse como provados os factos da Contestação que impugnamos e desse como provado o da p.i., por que nos batemos.
15. Fazem parte desses elementos, tal como atrás alegado: o facto de a R. ter entregue ao A. a declaração de situação de desemprego assinada e carimbada (cujos termos foram ditados pelo gerente da recorrida), indicador de definitividade da cessação do contrato de trabalho, por efeito de despedimento ilícito, porque não coberta por outra causa; a implausibilidade absoluta da alegação da R., de que o contrato não tinha cessado, aquando da entrega da tal declaração, estando dependente da assinatura do acordo por parte do A., com o comportamento posterior da própria recorrida (ausência de contacto com o trabalhador ou com os serviços da Segurança Social para clarificar a situação; estratégia trazida a Juízo gizada pela R. – instaurando-lhe processo disciplinar por faltas injustificadas – só depois de ser confrontada pelo A. com a sua intenção de recorrer a tribunal para realização dos seus direitos, por ter sido ilicitamente despedido; confissão – v. artigos 50° e 51° da Contestação – de que, afinal, o acordo, em que a sentença assentou, não existiu; abono dos proporcionais retributivos, logo que foi entregue a declaração de desemprego, por única iniciativa da R.).
16. Os factos provados na sentença, nºs 50 a 52, acerca do padecimento do A. de situações de abalo psíquico e emocional, por efeitos da cessação do contrato de trabalho, mostram-se incompatíveis com a existência de um acordo em que ele tivesse intervindo e aceite, só se percebendo que tal tivesse acontecido por se ter visto despedido.
17. Outra contradição evidente extrai-se da resposta dada ao artigo 13 da p.i, de que foi o A. o único trabalhador a ser "despedido" pela R., em que se afirma, inequivocamente, a razão da cessação do contrato: despedimento e, não, acordo de revogação.
18. Em conformidade com o que dissemos, não pode haver dúvida de que as respostas aos artigos atrás transcritos, e que impugnamos, padecem de incorrecção, devendo ser alteradas do modo acima enunciado.
19. Em decorrência lógica da alteração das referidas respostas, deixando de constar da factualidade provada a existência de acordo entre A. e R. e afirmado o despedimento ilícito daquele, impõe-se que a resposta dada aos artigos 9° a 12° da Contestação seja de "Não Provado" em relação a todos.
20. Impugnam-se, também, as respostas dadas aos artigos 1º, 4º, 6º e 8º da p.i e 88º da contestação, batendo-nos pela altera­ção, em relação aos quatro primeiros, para "Provado", e, em relação ao último, para "Não Provado", até por incompatível com as restantes respostas ora defendidas.
21. Na verdade, a prova produzida, sobretudo através de confissão, advinda do depoimento de parte dos legais representantes da R., registado em assentada, e das declarações da única testemunha por ela apresentada, é clara no sentido de que o contrato de trabalho que unia A. e R. se iniciou em Abril de 2006, independentemente de, em parte do tempo (Abril de 2006 a Julho de 2007), a R. ter pago através de recibos verdes, como se o A. fosse prestador de serviços.
22. Embora se não concorde com as respostas de "Provado" dadas aos artigos 58° a 64°, 67° e 69° da Contestação, em que se aborda o motivo da cessação do contrato de trabalho, tal como consta da "declaração para situação de desemprego" (invocada "reestruturação" da empresa da R. e substituição do A. por outrem), sentimo-nos libertos do ónus da correspondente impugnação, na medida em que a sentença não valorizou essa matéria, fixando que o tal motivo não corresponde à realidade dos factos.
23. Alteradas que sejam as respostas no sentido por nós propugnado, a decisão tomada tem que ser outra, que parta do pressuposto factual de que o A./recorrente foi despedido ilicitamente pela R. (violando o disposto no art. 382°, do Código do Trabalho, por inexistência de justa causa), quando, em 28 de Janeiro de 2009, lhe entregou a "declaração para situação de desemprego", fazendo cessar o contrato de trabalho (que se iniciou em Abril de 2006), sem qualquer motivo.
24. Aliás, a sentença recorrida perde-se em suposições e juízos de intenção, sem factos que os sustentem, na consideração de que foi firmado um acordo de revogação do contrato de trabalho entre A. e R., que não passou da fase de negociações, razão porque não foi assinado pelo recorrente.
25. É, assim, completamente despida de sentido a conclusão de que o A. teria actuado em abuso de direito, quanto mais não fosse fazendo interpretação normativa à revelia do regime laboral instituído, no que respeita ao disposto nos arts. 394° e 395°, do Código do Trabalho (CT), cujas exigências reforçadas se destinam a sobressaltar as implicações que um acordo de revogação pode ter para o trabalhador, querendo que ele se vincule apenas em situações bem pensadas, analisadas e valoradas.
26. Não tem, também, qualquer cabimento a condenação do A. como litigante de má fé, tendo-se limitado a fazer valer em Juízo o que considera serem os seus direitos, face à actuação da R., descrevendo, com verdade, os factos ocorridos.
27. Assim não se tendo entendido e decidido na sentença recorrida, pensamos não ter sido feita a melhor interpretação e aplicação ao caso das pertinentes disposições legais, nomeadamente, dos arts. 382°, 394° e 395°, do CT, 334°, do CC, e 456°, 457°, 552° e ss. do CPC.
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Contra-alegou a Ré, pedindo a confirmação do decidido.
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Nesta Relação, o Ex.mo Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu o seu douto parecer no sentido do não provimento do recurso.
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Cumpre decidir.
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2. Factos provados (na 1ª instância):
1. O Autor foi admitido ao serviço da Ré em Abril de 2006.
2. Para desempenhar as funções de encarregado de exploração agrícola.
3. Até Maio de 2007, o Autor foi remunerado com base em recibos verdes, por ele emitidos à Ré como se fosse um prestador de serviços.
4. Entre Autor e Ré foi celebrado um contrato de trabalho por tempo indeterminado com início em 02-07-2007.
5. Durante todo o tempo em que esteve ao serviço da Ré, cumpria as tarefas próprias da categoria de encarregado de exploração agrícola.
6. Nomeadamente, contratando pessoal para mão-de-obra do trabalho agrícola, orientando a execução dos trabalhos, assim como adquirindo os produtos, máquinas e alfaias agrícolas que iam sendo necessários.
7. Assim actuando, desde Julho de 2007, sob as ordens, autoridade e direcção dos representantes e responsáveis da Ré.
8. Tanto que, a partir de Junho de 2007, a Ré passou a emitir-lhe os recibos de vencimento normais e próprios de trabalhador subordinado.
9. Antes dessa data o Autor apenas prestou serviços de forma independente, sem qualquer subordinação à Ré, sem qualquer horário e executando as tarefas que lhe eram solicitadas com perfeita autonomia.
10. Por forma a acompanhar a evolução e evitar as consequências nefastas da crise mundial a nacional, a Ré, iniciou em 2008, com especial incidência a partir de finais de 2008, uma reestruturação da organização produtiva, uma substituição de produtos dominantes, a alteração nas técnicas e processo de fabrico e a informatização de serviços.
11. Concretamente, no sentido de aumentar a produção de uvas de qualidade relativamente às uvas de gama inferior, por forma a poder produzir e vender maior quantidade de vinho de qualidade mais elevada, indo de encontro as necessidades do mercado e dos seus clientes.
12. A partir de Setembro de 2008, a Ré iniciou um processo de aquisição de vários prédios rústicos situados na freguesia de ………., concelho de Vila Nova de Foz Côa (Douro Superior), no sentido de aí desenvolver também o cultivo de vinha de alta qualidade a partir de 2009.
13. As alterações acima referidas implicam alterações nas técnicas e processos de fabrico que estavam a ser utilizados, com especial incidência, ao nível de sistemas de rega não utilizados na zona da Régua.
14. Mais passou a Ré também a dedicar-se a outra actividade, a cultura da oliveira para produção de azeite.
15. Com a consequente necessidade de um encarregado com conhecimentos ao nível desta cultura e produção.
16. Finalmente, a Ré adquiriu um programa informático de gestão agrícola, denominado agro gestão, o qual efectuará o controlo da gestão agrícola das plantações actuais e das que se iniciarão em 2009 nos termos anteriormente referidos.
17. O Autor exercia as funções de responsável de exploração agrícola ao nível do cultivo da vinha nos terrenos propriedade da R. nas freguesias de ………. e ………., no Peso da Régua.
18. A Ré necessitava de um encarregado de exploração agrícola com conhecimentos para fazer face aos novos desafios da Ré acima definidos, sendo que o Autor não os tem manifestamente.
19. A Ré desencadeou procedimentos (anúncio em Jornal) tendentes à contratação de outro trabalhador para a mesma categoria.
20. Já foi admitido outro trabalhador e para essa contratação a Ré publicou o anúncio junto aos autos a fls. 12.
21. As funções do Autor foram assumidas pelo gerente Eng. E………., pessoa com conhecimentos adequados.
22. Sendo certo que foi o Autor o único trabalhador qualificado a ser despedido pela Ré.
23. Em Outubro de 2008 a Ré manifestou ao Autor o seu propósito de cessar o contrato de trabalho.
24. Em Outubro de 2008 Autor e Ré encetaram negociações tendo em vista a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho que vigorava entre Autor e Ré.
25. Autor e Ré acordaram os termos da cessação por mútuo acordo, designadamente, com especial relevância para o caso, acordaram que, por causa da cessação, seriam pagos ao Autor os proporcionais de férias e subsidio de férias e subsidio de Natal relativos ao ano da cessação, a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia 1 do ano da cessação ainda não gozadas e uma indemnização no valor de € 2.700,00, e que, em princípio, o contrato cessaria no último dia do mês de 30-Janeiro-2009.
26. O Autor solicitou à Ré as minutas dos documentos que iriam formalizar o acordo de cessação do contrato de trabalho para, segundo ele, se ir informar junto do advogado e da Segurança Social.
27. Em 05.01.2009, a Ré entregou ao Autor as propostas de minutas dos documentos (acordo e declaração com motivos para efeitos de subsidio de desemprego).
28. Minutas estas, relativamente às quais, em 16.01.2009, o Autor solicitou alterações.
29. A Ré procedeu à alteração das minutas em conformidade com as solicitações do Autor, elaborando as propostas de minutas dos documentos (acordo e declaração com motivos para efeitos de subsidio de desemprego, com datas de 30-01-2009).
30. Em 28 de Janeiro de 2009 os responsáveis da Ré entregaram ao Autor a declaração de situação de desemprego, junta aos autos a fls. 12.
31. Para justificar a cessação do contrato do Autor, a Ré fez constar na referida declaração "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho..." (v. quadricula 15) tendo acrescentado como "fundamentação do motivo assinalado" que "a declarante se encontra actualmente em fase de reestruturação, por motivos estruturais e tecnológicos, ao abrigo e para os efeitos do disposto no art. 397.° do Código do Trabalho, nomeadamente: reestruturação da organização produtiva; substituição de produtos dominantes; alteração nas técnicas ou processo de fabrico; informatização de serviços".
32. Em 28.01.2009, mais uma vez, a solicitação e em conformidade com o solicitado pelo Autor, no Modelo RP 5044 – DGSS (declaração de situação de desemprego) junto como Doc. 1 com a petição inicial, a Ré rasurou no ponto 2.2. a data do valor base da última retribuição colocando 28.01.2009, como resulta claramente da rasura relativa ao dia aí colocado, e no campo 3.1. relativo à certificação do empregador colocou a data de 28.01.2009 e assinou e carimbou.
33. Nesse mesmo dia 28.01.2009, a Ré entregou ao Autor o Modelo RP 5044 – DGSS (declaração de situação de desemprego) junto como Doc. 1 com a petição inicial na versão preenchida nos termos referidos no artigo anterior.
34. Tendo ficado acordado que, como das outras vezes, a Ré aguardaria que o Autor lhe transmitisse a sua posição quanto aos diferentes documentos para formalização do que tinha sido acordado.
35. O teor dessa declaração resultou de solicitação expressa do Autor e foi entregue pela Ré ao Autor, a solicitação deste, no contexto acima referido, em especial, como mera minuta para que o Autor a pudesse levar para obter a opinião da Segurança Social sobre a mesma.
36. Note-se que, dada a boa fé da Ré em todo o processo de negociação, não obstante ainda não estar formalizado o acordo, dado o avançado das negociações, porque em termos de processamento de recibos era conveniente, a Ré chegou a processar e a pagar ao Autor a quantia de € 975,00, a titulo de proporcionais de retribuição de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação e a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia um do ano da cessação ainda não gozadas.
37. O Autor trabalhou nesse dia 28.01.2009, mas, inexplicavelmente, depois dessa data, nunca mais compareceu para trabalhar e nada disse à Ré.
38. Não chegou a ser assinado o acordo entre as partes.
39. O Autor através de advogado dirigiu à Ré a carta junta aos autos a fls. 13, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
40. A Ré recebeu a carta junta aos autos a fls. 13.
41. Essa carta teve a resposta da Ré através dos seus advogados, com data de 20 de Fevereiro de 2009, nos termos que melhor constam do documento junto aos autos a fls. 166.
42. A Ré tentou remediar a situação instaurando-lhe um processo disciplinar mediante a imputação de faltas injustificadas ao trabalho, a partir do dia 28 de Janeiro de 2009.
43. A Ré fê-lo mais de um mês depois de se ter apercebido das disposições do Autor a quem enviou a nota de culpa junta aos autos a fls. 14 e seguintes, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
44. O Autor não respondeu e a Ré comunicou-lhe a decisão de o despedir, conforme melhor consta do documento junto aos autos a fls. 19 e seguintes, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
45. No dia 29-01-2009, o Autor faltou injustificadamente ao trabalho e, desde essa data até ao dia 31 de Janeiro de 2009 faltou injustificadamente.
46. Desde 29-01-2009 até ao dia 31.01.2009, o Autor não compareceu em qualquer hora, no seu local de trabalho nem compareceu em qualquer local para exercer a suas funções para a Ré.
47. O Autor não apresentou qualquer justificação para as suas faltas, nem apresentou qualquer prova de uma eventual justificação para as suas faltas.
48. O Autor não comunicou com a antecedência mínima de 5 dias, nem logo que possível, as faltas.
49. À data da cessação do contrato o Autor auferia € 900,00 mensais.
50. A cessação do contrato provocou ao Autor frustração pois desempenhava as suas funções com o maior zelo e dedicação.
51. Além do que, dele se apoderou um forte constrangimento pelo receio de não arranjar outro emprego ou demorar muito tempo a consegui-lo.
52. O que muito tem afectado a sua vivência diária, pois, tendo sempre presente a situação em causa, tem vivido muito menos alegre e com menos boa disposição.
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Fixação da matéria de facto:
Nas suas alegações, e conclusões, o recorrente pretende a alteração da decisão da matéria de facto, considerando que o Tribunal a quo deveria ter dado diferentes respostas à matéria de facto dos pontos nºs 25 a 29, 34, 35, 36, 37, correspondentes aos arts. 31° a 35°, 44°, 55°, 45° e 46°, da Contestação, sustentando que deviam ser considerados não provados, à excepção da que consta do artigo 45°, em que a resposta devia ser restritiva, quanto mais não seja porque o primeiro segmento – desde "Note-se" até "conveniente" – é conclusivo, devendo ser eliminado da resposta, e do que consta do artigo 46°, em que deve ser eliminado o advérbio "inexplicavelmente".
Por outro lado, sustenta que o ponto nº 30, correspondente ao artigo 10º da petição inicial, devia ser dado como integralmente provado.
Mais sustenta que os artigos 1º, 4º, 6º e 8º da p.i deviam ser dados como “provados” e o art. 88º da contestação como "não provado", até por incompatível com as restantes respostas ora defendidas.
Para tanto, fundamenta o recorrente essa pretensão nos depoimentos de parte produzidos e os depoimentos das testemunhas por si devidamente indicados.
E, na verdade, a audiência de julgamento decorreu com gravação dos depoimentos prestados, estando estes, assim, acessíveis, nos termos e para os efeitos do art. 712º, nº 1, al. a), do CPC.
Inexistindo, assim, quaisquer obstáculos formais à modificação da decisão da matéria de facto, vejamos se a sua pretensão pode proceder no plano substantivo.
Recordemos apenas que esta Relação, ao reapreciar a prova, não pode ir ao ponto de tornar letra morta o princípio fundamental da livre apreciação das provas por parte do tribunal de 1ª instância (cf. art. 655º, nº 1, do CPC), a menos que este tribunal tenha incorrido em erro na apreciação do valor probatório dos concretos meios de prova.
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A matéria de facto supra transcrita merece, desde logo, uma inevitável correcção em alguns dos seguintes pontos:
- pontos nºs 4, 7, e 9.
Em causa nesses pontos estava a matéria atinente a indagar da existência de um contrato de trabalho entre o A. e a Ré, desde Abril de 2006, e não desde Julho de 2007, como alegava a Ré.
Ora, em tal contexto, ao abrigo do art. 646º, nº 4, do CPC, eliminam-se tais pontos, por conterem ou questões de direito – ponto nº 4 – ou meras conclusões – nºs 7 e 9.
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- ponto nº 22.
Estando em discussão a questão de saber se o A., como alegava, foi objecto de um despedimento pela Ré, o ponto em apreço, implicando uma questão de direito, deve ser também eliminado, nos termos do citado art. 646º, nº 4, do CPC.
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- ponto nº 36.
O seu teor é o seguinte:
«Note-se que, dada a boa fé da Ré em todo o processo de negociação, não obstante ainda não estar formalizado o acordo, dado o avançado das negociações, porque em termos de processamento de recibos era conveniente, a Ré chegou a processar e a pagar ao Autor a quantia de € 975,00, a titulo de proporcionais de retribuição de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação e a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia um do ano da cessação ainda não gozadas».
Por ser também conclusiva, como supra referido, elimina-se o consignado desde o seu início até “conveniente”, ficando o ponto 25º com a seguinte redacção:
«A Ré chegou a processar e a pagar ao Autor a quantia de € 975,00, a titulo de proporcionais de retribuição de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação e a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia um do ano da cessação ainda não gozadas».
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- ponto nº 37.
Por ser também conclusiva, elimina-se deste ponto o advérbio “inexplicavelmente”, passando a ter a seguinte redacção:
«O Autor trabalhou nesse dia 28.01.2009, mas, depois dessa data, nunca mais compareceu para trabalhar e nada disse à Ré».
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Reapreciando, agora, a matéria de facto controversa:
- pontos nºs 25 a 29.
No tocante às respostas dadas, o tribunal, na sua motivação, invocou, em síntese, "a conjugação dos documentos juntos aos autos, depoimentos de parte e depoimentos testemunhais".
No tocante ao ponto nº 25, recordemos o seu teor:
«Autor e Ré acordaram os termos da cessação por mútuo acordo, designadamente, com especial relevância para o caso, acordaram que, por causa da cessação, seriam pagos ao Autor os proporcionais de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação, a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia 1 do ano da cessação ainda não gozadas e uma indemnização no valor de € 2.700,00, e que, em princípio, o contrato cessaria no último dia do mês de 30-Janeiro-2009».
Esta factualidade integra a existência de um acordo revogatório do contrato de trabalho.
Considerando a data de tal acordo revogatório, anterior à publicação da Lei nº 7/09, de 12.02 (que aprovou a revisão do Código do Trabalho), tem aqui inteira aplicação o regime definido no Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/03, de 27.08 – de que serão doravante todos os artigos citandos sempre que outra origem não for mencionada –, atento o disposto nos arts. 3º, nº 1, e 8º, nº 1, 1ª parte, desta última Lei, e no art. 7º, nº 1, da Lei nº 7/09.
Tal matéria está prevista nos arts. 393º a 395º.
Justamente decorre do art. 394º, nº 1, que o acordo reveste obrigatoriamente forma escrita, ou seja, a forma escrita é uma formalidade “ad substantiam”, sendo que a inobservância dessa forma escrita gera a nulidade do eventual acordo, nos termos do art. 220º do CC.
A prova de tal acordo só podia ser feita através da confissão ou de documento escrito – cf. art. 393º, nº 1, do CC.
No caso em apreço, apesar da falta de documento escrito, titulando o eventual acordo revogatório, a M.ma Juíza deu como provado tal acordo, em função de prova documental e dos depoimentos produzidos.
Ora, nesta parte, além da inexistência de documento escrito, dos depoimentos de parte produzidos apenas se retira que houve negociações entre o A. e os representantes legais da Ré, no sentido desse acordo revogatório, nunca concretizado, sendo que a prova testemunhal produzida sobre tal matéria, além de nada ter revelado de concreto, nunca teria qualquer relevo probatório, por não admitida, nos termos do citado art. 393º, nº 1.
Assim, por inexistência de prova de tal acordo revogatório, elimina-se dos factos provados o citado ponto nº 25.
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- pontos nºs 26 a 29, 30, 34 e 35
No tocante aos pontos nºs 26 a 29, 34 e 35, ouvida com atenção toda a prova produzida, da mesma não logramos alcançar algo no sentido que conduziu às respostas dadas.
No tocante à prova documental, estão em causa apenas minutas juntas pela R. e por ela redigidas, não assinadas, referentes às negociações entre as partes no sentido desse acordo revogatório, apenas delas se concluindo a tentativa de se chegar a um acordo, nunca concretizado.
Dos depoimentos de parte dos legais representantes da Ré e do autor, apenas foi possível concluir pela existência de negociações para tal acordo revogatório, ainda que o autor, não aceitando – na sua versão – o seu despedimento pela Ré, logo anunciado pelos seus legais representantes em Outubro de 2008, e afirmando a sua recusa em aceitar um acordo revogatório, admitisse a existência das referidas minutas da iniciativa da Ré.
Por outro lado, do depoimento da única testemunha apresentada pela R., o seu trabalhador administrativo, D………., apenas é possível concluir que existiram tentativas de acordo entre as partes para a cessação do contrato de trabalho e que, em 28 de Janeiro de 2009, os responsáveis da Ré entregaram ao Autor a declaração de situação de desemprego, junta aos autos a fls. 12.
Assim, mantendo-se o ponto nº 30, eliminam-se dos factos provados os citados pontos nºs 26 a 29, 34 e 35.
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- artigos 1º, 4º, 6º e 8º da p.i e 88º da contestação.
Nesta parte, o recorrente, invocando a mesma prova produzida, e supra já referida, pretende que sejam dados como provados os factos por si alegados naqueles artigos da petição, no sentido de que o contrato de trabalho celebrado com a Ré teve o seu início em Abril de 2006, e não em Julho de 2007, como alegado pela ré.
Dos depoimentos de parte dos legais representantes da Ré e do autor, apenas foi possível concluir pela existência de duas versões contraditórias sobre a prestação do trabalho do autor, entre Abril de 2006 e Julho de 2007.
Por outro lado, dos demais depoimentos produzidos não foi possível concluir com segurança sobre a forma como tal trabalho se desenvolveu a partir de 2006, uma vez que as testemunhas do recorrente, nessa parte, não produziram depoimentos seguros da única testemunha apresentada pela R., o seu trabalhador administrativo, D………., apenas é possível concluir que existiram tentativas de acordo entre as partes para a cessação do contrato de trabalho e que, em 28 de Janeiro de 2009, os responsáveis da Ré entregaram ao Autor a declaração de situação de desemprego, junta aos autos a fls. 12.
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Por provados documentalmente, impõe-se a rectificação dos pontos nºs 39 e 41, ficando a terem o seguinte teor:
39. O Autor, através de advogado, em 9.02.2009, dirigiu à Ré a carta junta aos autos a fls. 13, cujo teor é o seguinte:
«Escrevo por incumbência e como Advogado do Sr. B……….. O meu cliente não se conforma com o seu ilícito despedimento, na medida em que não descortina motivos minimamente atendíveis para tal.
Desde logo não concorda com os fundamentos por Vªs. Exªs. invocados no Mod. 5044 "Declaração de Situação de Desemprego".
Depois, mesmo que esses motivos fossem atendíveis (como Vas. Exas. muito bem sabem, não são), não tiveram nem têm o mínimo suporte legal.
Assim, a fim de evitar os inconvenientes, que vos acarretarão, no recurso aos meios judiciais, exige-se:
1- A revogação do seu despedimento e a consequente integração na categoria e funções que desempenhava à data do ilícito despedimento.
2- Em alternativa, uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais no montante de 10.000,00 € (dez mil euros).
Se nada me for comunicado até ao próximo dia 16 do corrente mês, intentarei a acção judicial competente para a realização dos direitos que ao meu cliente assistem».
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41. Essa carta teve a resposta da Ré através dos seus advogados, com data de 20 de Fevereiro de 2009, cujo teor é o seguinte:
«Confrontado o teor da mesma com a realidade dos factos, só podemos concluir que o Constituinte do Exmo. Colega falta à verdade com manifesto má fé.
Com efeito, a pura verdade dos factos é a seguinte:
1. A N/Constituinte encontra-se em processo de reestruturação por motivos estruturais e tecnológicos de que o V/Constituinte tem perfeito conhecimento.
2. No âmbito desse processo foram acordados os termos da cessação por mútuo acordo entre a N/Constituinte e o V/Constituinte.
3. Sendo que o V/Constituinte, como é normal, solicitou à N/Constituinte as minutas dos documentos que iriam formalizar o acordo de cessação do contrato de trabalho para, segundo ele, se ir informar junto do advogado e da Segurança Social.
4. Em 05-01-2009, a N/Constituinte entregou as minutas dos documentos ao V/Constituinte e, seguidamente, em 16-01-2009, o mesmo, solicitou alterações às mesmas, sendo que a N/Constituinte procedeu à revisão das minutas para ir de encontro às sugestões feitas.
5. Introduzidas as alterações nas minutas, em 21-01-2009 foram as novas minutas entregues ao V/Constituinte para que pudesse mais uma vez analisá-las e fazer as consultas que bem entendesse.
6. Mais uma vez, foram solicitadas alterações, e em 28-01-2009, foram entregues ao V/Constituinte outras minutas para ir de encontro às sugestões feitas.
7. Inexplicavelmente, o V/Constituinte trabalhou nesse dia 28-01-2009, mas, depois dessa data, nunca mais o V/Constituinte compareceu para trabalhar.
8. Ou seja, desde o dia 29-01-2009 inclusivamente que faltou ao trabalho sem que tenha feito qualquer comunicação e sem dar qualquer justificação N/Constituinte.
9. A N/Constituinte inclusivamente estava a preparar o envio da carta para efeitos de abandono do trabalho.
Em face do exposto, não houve qualquer despedimento ilícito do V/Constituinte e os motivos que foram comunicados para a cessação por acordo correspondem absolutamente à realidade.
Da parte do V/Constituinte, isso sim, houve um comportamento manifestamente ilícito – faltas injustificadas ao trabalho – que constituem fundamento para despedimento com justa causa.
Por conseguinte, numa tentativa de resolução amigável do assunto, a título muito excepcional, até porque a N/Constituinte tem a máxima consideração pela Sra. D. F………., caso o V/Constituinte dê sem efeito o teor da carta do Exmo. Colega, está disposta a formalizar uma cessação do contrato por mútuo acordo pagando a indemnização de 3.000,00 Euros.
Caso tal proposta não seja aceite até ao dia 26-02-2009, de imediato a N/Constituinte irá instaurar o processo disciplinar contra o V/Constituinte com vista ao despedimento por faltas injustificada, com consequências graves para o mesmo em termos de subsídio de desemprego e obviamente obtenção de emprego no futuro, sobretudo neste sector que é restrito e de grande concorrência».
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3. Do mérito.
Nesta sede, as questões suscitadas são:
- despedimento ilícito;
- litigância de má fé.
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3.1. Despedimento ilícito.
Sustenta o recorrente que, alterada a matéria de facto no sentido propugnado, contrariamente à sentença recorrida, que considerou ter existido entre as partes um acordo revogatório, deve ser proferida decisão que parta do pressuposto factual de que o A./recorrente foi despedido ilicitamente pela R., quando, em 28 de Janeiro de 2009, lhe entregou a "declaração para situação de desemprego", fazendo cessar o contrato de trabalho sem qualquer motivo.
Vejamos a fundamentação da sentença recorrida atinente a esta questão:
Dispõe o artigo 393°, do Código do Trabalho, que o empregador e o trabalhador podem fazer cessar o contrato de trabalho por acordo.
No caso dos presentes autos, face aos factos provados, foi indubitavelmente o que sucedeu.
Com efeito, em Outubro de 2008 a Ré manifestou ao Autor o seu propósito de cessar o contrato de trabalho e, afigura-se-nos que precisamente para evitar o recurso a um procedimento de extinção de posto de trabalho, as partes encetaram negociações tendo em vista a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho que vigorava entre si.
Autor e Ré acordaram os termos da cessação por mútuo acordo, designadamente, acordaram que, por causa da cessação, seriam pagos ao Autor os proporcionais de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação, a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia 1 do ano da cessação ainda não gozadas e uma indemnização no valor de € 2.700,00, e que, em princípio, o contrato cessaria no ultimo dia do mês de Janeiro de 2009.
No que se reporta à declaração de situação de desemprego conforme resulta dos factos provados foi a mesma entregue ao Autor a solicitação deste para efeito de averiguar junto da Segurança Social se a mesma servia, obviamente, para efeito de lhe ser concedido o Fundo de Desemprego.
Ora, como é de conhecimento geral e resulta do disposto no artigo 2°, n° 1, do Decreto-lei n° 220/2006, de 3 de Novembro, para efeitos de concessão do subsídio de desemprego só é considerado o desemprego decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário, ou seja, só poderá aceder ao subsidio de desemprego o trabalhador que não tenha contribuído para a situação de desemprego.
Com efeito, estipula o artigo 9°, n° 1, do citado diploma, que "o desemprego considera-se involuntário sempre que a cessação do contrato de trabalho decorra de: a) iniciativa do empregador; b) caducidade do contrato não determinada por atribuição de pensão; c) resolução com justa causa por iniciativa do trabalhador; d) acordo de revogação celebrado nos termos definidos no presente decreto-lei"'.
No caso dos presentes autos jamais o Autor poderia aceder ao subsídio de desemprego se apusesse no requerimento que a cessação do contrato se devia a simples mútuo acordo entre as partes porque este pressupõe o contributo do Autor para a situação de desemprego.
Assim, para justificar a cessação do contrato do Autor, a Ré fez constar na referida declaração "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho..." (v. quadricula 15) tendo acrescentado como "fundamentação do motivo assinalado" que "a declarante se encontra actualmente em fase de reestruturação, por motivos estruturais e tecnológicos, ao abrigo e para os efeitos do disposto no art. 397.° do Cod. do Trabalho, nomeadamente: reestruturação da organização produtiva; substituição de produtos dominantes; alteração nas técnicas ou processo de fabrico; informatização de serviços".
Nos termos do artigo 10°, do citado diploma legal, consideram-se desemprego involuntário, para efeitos da alínea d), do artigo anterior, as situações de cessação do contrato de trabalho por acordo, que se integre num processo de redução de efectivos, quer por motivo de reestruturação, viabilização ou recuperação da empresa, quer ainda por a empresa se encontrar numa situação económica difícil, independentemente da sua dimensão.
Do exposto se conclui que a declaração assinada pela Ré para efeito de declaração da situação de desemprego contém um motivo que não corresponde à realidade dos factos tendo sido ali aposto com a única finalidade de o Autor poder aceder ao subsídio de desemprego o que não ocorreria se ali fosse escrito que tal situação ocorria simplesmente de um mutuo acordo entre as partes.
De tudo quanto foi dito se conclui que o contrato de trabalho entre as partes não cessou por extinção do posto de trabalho, muito embora o Autor tenha sido substituído por outro trabalhador, mas sim na sequência de um acordo celebrado entre ambas tendente à sua cessação, ou seja, por revogação.
Vejamos, agora, tal modalidade de cessação dos contratos.
Dispõe o artigo 394°, do Código do Trabalho, que:
"1 - O acordo de cessação deve constar de documento assinado por ambas as partes, ficando cada uma com um exemplar.
2 - O documento deve mencionar expressamente a data da celebração do acordo e a de início da produção dos respectivos efeitos".
Ora, sendo a revogação um acordo aplica-se-lhe o regime geral dos negócios jurídicos quanto à formação com excepção das regras relativas à forma.
Neste particular, a tutela conferida ao trabalhador, a prevenção de eventuais fraudes e as dificuldades de prova estão na base da exigência da forma escrita e da observância de certas formalidades, bem como da possibilidade de o trabalhador, nos termos do artigo 395°, do Código de Trabalho, poder revogar o acordo, no prazo de 7 dias, conquanto as assinaturas não tenham sido objecto de reconhecimento notarial presencial.
Estipula o artigo 220°, do Código Civil, que a declaração negocial que careca de forma legalmente prescrita é nula, sendo tal nulidade, nos termos do artigo 286°, do mesmo diploma, invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal.
No caso dos presentes autos afigura-se-nos que ao Autor ocorreu que não tendo assinado o acordo de revogação do contrato o mesmo tem-se por inexistente e como tal não se tendo observado o prescrito na lei para o despedimento por extinção do posto de trabalho o seu despedimento seria ilícito.
Olvida o Autor, porém, que tal acordo de revogação, que foi firmado entre as partes e inclusivamente reduzido a escrito só não se encontra assinado porque o Autor depois de obter a declaração de desemprego deixou de comparecer no local de trabalho inclusivamente para assinar o acordo de cessação.
Com efeito, resulta dos factos provados que em Outubro de 2008 Autor e Ré encetaram negociações tendo em vista a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho que vigorava entre Autor e Ré acordando designadamente, que, por causa da cessação, seriam pagos ao Autor os proporcionais de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação, a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia 1 do ano da cessação ainda não gozadas e uma indemnização no valor de € 2.700,00, e que, em principio, o contrato cessaria no ultimo dia do mes de 30-Janeiro-2009.
A solicitação do Autor, em 05.01.2009, a Ré entregou ao Autor as propostas de minutas dos documentos (acordo e declaração com motivos para efeitos de subsídio de desemprego), para que o mesmo pudesse informar-se junto do advogado e da Segurança Social.
Em 16.01.2009, o Autor solicitou alterações e a Ré procedeu a alteração das minutas em conformidade com as solicitações do Autor, elaborando as propostas de minutas dos documentos (acordo e declaração com motivos para efeitos de subsidio de desemprego, com datas de 30-01-2009).
Porém, desde 28 de Janeiro o Autor não compareceu mais ao trabalho.
Dispõe o artigo 334°, do Código Civil, que "é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".
O abuso de direito constitui uma fórmula tradicional para exprimir a ideia do exercício disfuncional de posições jurídicas, isto é: do exercício concreto de posições jurídicas que, embora correcto em si, acabe por contundir com o sistema jurídico na sua globalidade.
Uma das formas em que se traduz o abuso de direito consiste em uma pessoa tentar prevalecer-se de uma situação violadora de uma norma jurídica quando a própria criou tal situação. No caso dos presentes autos seria manifesto abuso de direito por parte do Autor prevalecer-se da nulidade do acordo de revogação do contrato de trabalho quando o mesmo nulo por recusa injustificada do mesmo em proceder a sua assinatura.
Com efeito, a lei prevê e concede ao Autor o direito de arrependimento no decurso das negociações e mesmo depois do acordo estar assinado o que tido lhe permite é chegar a um acordo com a Ré, obter da mesma documentos que serviam o seu propósito de obter um rendimento, diga-se a talho de foice, de forma ilícita, e depois indo assinar o documento de revogação do acordo sem qualquer explicação para o efeito.
Ora, a ordem jurídica postula uma articulação de valores materiais cuja prossecução pretende ver assegurados e assim faz prevalecer o substancial sobre o formal.
[…]
Do exposto resulta que não obstante o acordo de revogação do contrato de trabalho ser ilícito por falta de forma o Autor não pode prevalecer-se de tal nulidade porque tal configura um manifesto abuso de direito na medida em que a mesma ocorre por facto só a si imputável.
Assim, não se verificando a ilicitude do despedimento, conforme alegado pelo Autor, improcedem os pedidos de condenação da Ré na sua reintegração, sem perda de qualquer direito ou regalia, no pagamento das retribuições que teria auferido desde 30 dias antes da propositura da acção até à sentença, acrescida de juros de mora a taxa legal, bem como no pagamento da quantia de € 10.000,00, a titulo de indemnização por danos morais, tudo acrescido de juros de mora a taxa legal desde a citação ate efectivo e integral pagamento».
Esta fundamentação da sentença não pode sufragar-se, desde logo em função das alterações supra referidas na decisão da matéria de facto.
Na verdade, a M.ma Juíza deu como provado, no ponto nº 25, que as partes, de forma verbal, concretizaram um acordo revogatório do contrato de trabalho.
Ora, como supra explanado, tal ponto nº 25 foi eliminado dos factos provados, o que põe em causa toda a fundamentação da sentença.
Mas resulta desta alteração a procedência da tese do despedimento?
Adiantemos, desde já, que a resposta é negativa.
Recordemos, agora, os factos provados interessantes à questão:
- A partir de Setembro de 2008, a Ré iniciou um processo de aquisição de vários prédios rústicos situados na freguesia de ………., concelho de Vila Nova de Foz Côa (Douro Superior), no sentido de aí desenvolver também o cultivo de vinha de alta qualidade a partir de 2009.
- As alterações acima referidas implicam alterações nas técnicas e processos de fabrico que estavam a ser utilizados, com especial incidência, ao nível de sistemas de rega não utilizados na zona da Régua.
- Mais passou a Ré também a dedicar-se a outra actividade, a cultura da oliveira para produção de azeite.
- Com a consequente necessidade de um encarregado com conhecimentos ao nível desta cultura e produção.
- Finalmente, a Ré adquiriu um programa informático de gestão agrícola, denominado agro gestão, o qual efectuará o controlo da gestão agrícola das plantações actuais e das que se iniciarão em 2009 nos termos anteriormente referidos.
- O Autor exercia as funções de responsável de exploração agrícola ao nível do cultivo da vinha nos terrenos propriedade da R. nas freguesias de ………. e ………., no Peso da Régua.
- A Ré necessitava de um encarregado de exploração agrícola com conhecimentos para fazer face aos novos desafios da Ré acima definidos, sendo que o Autor não os tem manifestamente.
- A Ré desencadeou procedimentos (anúncio em Jornal) tendentes à contratação de outro trabalhador para a mesma categoria.
- Já foi admitido outro trabalhador e para essa contratação a Ré publicou o anúncio junto aos autos a fls. 12.
- As funções do Autor foram assumidas pelo gerente Eng. E………., pessoa com conhecimentos adequados.
- Em Outubro de 2008 a Ré manifestou ao Autor o seu propósito de cessar o contrato de trabalho.
- Em Outubro de 2008 Autor e Ré encetaram negociações tendo em vista a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho que vigorava entre Autor e Ré.
- Em 28 de Janeiro de 2009 os responsáveis da Ré entregaram ao Autor a declaração de situação de desemprego, junta aos autos a fls. 12.
- Para justificar a cessação do contrato do Autor, a Ré fez constar na referida declaração "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho..." (v. quadricula 15) tendo acrescentado como "fundamentação do motivo assinalado" que "a declarante se encontra actualmente em fase de reestruturação, por motivos estruturais e tecnológicos, ao abrigo e para os efeitos do disposto no art. 397.° do Código do Trabalho, nomeadamente: reestruturação da organização produtiva; substituição de produtos dominantes; alteração nas técnicas ou processo de fabrico; informatização de serviços".
- Em 28.01.2009, mais uma vez, a solicitação e em conformidade com o solicitado pelo Autor, no Modelo RP 5044 – DGSS (declaração de situação de desemprego) junto como Doc. 1 com a petição inicial, a Ré rasurou no ponto 2.2. a data do valor base da última retribuição colocando 28.01.2009, como resulta claramente da rasura relativa ao dia aí colocado, e no campo 3.1. relativo à certificação do empregador colocou a data de 28.01.2009 e assinou e carimbou.
- Nesse mesmo dia 28.01.2009, a Ré entregou ao Autor o Modelo RP 5044 – DGSS (declaração de situação de desemprego) junto como Doc. 1 com a petição inicial na versão preenchida nos termos referidos no artigo anterior.
- A Ré chegou a processar e a pagar ao Autor a quantia de € 975,00, a titulo de proporcionais de retribuição de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação e a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia um do ano da cessação ainda não gozadas.
- O Autor trabalhou nesse dia 28.01.2009, mas, depois dessa data, nunca mais compareceu para trabalhar e nada disse à Ré.
- Não chegou a ser assinado o acordo entre as partes.
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Estes factos colocam, pois, a questão de saber se, no tocante à entrega pela recorrida ao recorrente da declaração para efeitos de subsídio de desemprego, podem integrar o conceito de despedimento, ainda que na forma de despedimento de facto.
Sobre este tipo de despedimento, têm pertinência as considerações feitas no acórdão desta Relação, de 24.05.2010, proferido no Processo nº 231/08.5TTLMG (relatora Paula Carvalho e em que interviemos como adjunto), publicado in www.dgsi.pt, e que aqui passamos a transcrever:
“(…)
Como é sabido, o despedimento constitui estruturalmente um negócio jurídico unilateral receptício, através do qual a entidade patronal revela a vontade de fazer cessar o contrato de trabalho – na palavras do Prof. Pedro Romano Martinez [Direito do Trabalho, 845], trata-se de uma forma de cessação unilateral do contrato em que a iniciativa cabe ao empregador e pressupõe uma declaração de vontade deste comunicando ao trabalhador a cessação do mesmo, declaração essa que, por ser uma declaração de vontade receptícia e com efeitos constitutivos, só produz efeitos depois de chegar ao poder do trabalhador ou depois de ser dele conhecida e não é susceptível de ser unilateralmente revogada pelo empregador, depois de ter sido recebida pelo trabalhador ou de ser dele conhecida (artigos 224.º/1 e 230.º/1 do Código Civil).
Tal como resulta do preceituado no artigo 217.º do Código Civil, a declaração negocial pode ser expressa ou tácita, sendo expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de demonstração da vontade e tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelem, sendo que essencial para a relevância da declaração tácita, é a inequivocidade dos chamados facta concludentia.
Como cristalinamente refere o Prof. Mota Pinto [Teoria Geral, 174], a declaração tácita tem lugar sempre que a um comportamento seja atribuído um significado legal tipicizado, sem admissão de prova em contrário, salientando ainda o mesmo autor que diversa da declaração tácita é a declaração presumida, que ocorre sempre que a lei liga a determinado comportamento o significado de exprimir uma vontade negocial em certo sentido, podendo ilidir-se tal presunção mediante prova em contrário.
No domínio do despedimento promovido pela entidade patronal, tem sido, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, aceite a existência de situações em que a vontade da entidade empregadora em fazer cessar unilateralmente o contrato de trabalho com o trabalhador ao seu serviço se revela de atitudes inequívocas, conduzindo, assim, a um despedimento de facto.
Ou seja, embora não se admita o despedimento tácito com a amplitude que é conferida às declarações negociais tácitas pelo mencionado artigo 217.º do Código Civil (e muito menos, o despedimento presumido), admitem-se, quer na doutrina, quer na jurisprudência, os chamados despedimentos de facto, corporizados numa atitude inequívoca da entidade patronal, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral.
Como se refere no AC STJ de 05.04.2006, «a referida inequivocidade visa tanto evitar o abuso de despedimentos efectuados com dificuldade de prova pelo trabalhador, como obstar ao desencadear das suas consequências legais, quando não se mostre claramente ter havido ruptura indevida do vínculo laboral por parte da entidade patronal».
Refira-se ainda que a declaração da entidade patronal há-de ser interpretada segundo os critérios enunciados no artigo 236.º do Código Civil, pelo que, se não for expresso, o despedimento terá de ser extraído de factos que, perante o homem médio, revelem inequivocamente a vontade da entidade patronal de fazer cessar o contrato [vide AC STJ de 12.09.2007, www.dgsi.pt].
Podemos, assim, e em substância, concluir que: a) tecnicamente, o despedimento configura-se como uma declaração de vontade recipienda, vinculativa e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho; b) essa declaração, expressa ou tácita, terá de ser enunciada em condições de não suscitar dúvida razoável sobre o seu verdadeiro significado, razão pela qual é necessário que o declarante – por escrito, verbalmente ou até por mera atitude – denote ao trabalhador, de modo inequívoco, a vontade de extinguir a relação de trabalho – o que é exigível é que, havendo tal vontade por parte do empregador, este assuma um comportamento que a torne perceptível e inequívoca junto do destinatário, enquanto declaratário normal, tendo sempre presente que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante [vide AC TRL de 26.05.2009, www.dgsi.pt].”.
Resta acrescentar que, nos termos do art. 236º, nº 2, do Cód. Civil, “2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida” e, por fim, que o ónus da prova do despedimento incumbe ao trabalhador – art. 342º, nº 1, do CC».
No caso em apreço, aplicando este entendimento, perante a matéria de facto provada, de forma alguma poderemos considerar provado o alegado despedimento do A.
Com efeito:
Para além da emissão e entrega ao A. da declaração de situação de desemprego, nenhum outro facto se provou susceptível de consubstanciar o despedimento.
E quanto à entrega dessa Declaração, não permite ela, tanto mais tendo em conta a restante matéria de facto provada, a conclusão, muito menos de forma inequívoca, de que a Ré despediu o A.
A declaração em questão foi emitida nos termos do disposto no art. 43º do DL 220/2006, destinando-se a ser entregue à Segurança Social com vista a instruir o requerimento de concessão das prestações de desemprego.
Trata-se de um documento particular que, ainda que não impugnada a letra e assinatura e fazendo, por isso, prova plena de que o seu autor emitiu a declaração nele inserta (art. 376º, nº 1, CC), não tem, contudo, a força probatória prevista no nº 2 do mesmo, ou seja, não faz prova plena da veracidade dos factos contidos nessa declaração, sendo certo que, como se tem entendido, doutrinal e jurisprudencialmente, carecem de tal força os documentos que tenham como destinatários terceiros, que não a parte que dele pretende beneficiar.
Ou seja, a declaração em questão faz prova plena de que a ré declarou que o contrato de trabalho cessou por "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho...", tendo acrescentado como "fundamentação do motivo assinalado" que "a declarante se encontra actualmente em fase de reestruturação, por motivos estruturais e tecnológicos, ao abrigo e para os efeitos do disposto no art. 397.° do Código do Trabalho, nomeadamente: reestruturação da organização produtiva; substituição de produtos dominantes; alteração nas técnicas ou processo de fabrico; informatização de serviços".
Assim tal declaração, tendo como destinatário a Segurança Social (terceiro), não faz prova plena de que a Ré tenha, na verdade, procedido, ou pretendido proceder, ao despedimento do A. e que o tenha feito com invocação dessa causa, sendo que, nesta parte, o documento está sujeito à livre apreciação do julgador.
O despedimento consiste numa declaração do empregador que provém ou pressupõe a sua vontade, unilateral, de fazer cessar o contrato de trabalho.
Ora, no caso, da matéria de facto provada não decorre que tal se tenha verificado.
Com efeito, e ao contrário, o que decorre é que, desde Outubro de 2008, existiam negociações entre as partes no sentido de uma cessação do contrato de trabalho por acordo, tendo sido elaboradas várias minutas dum eventual acordo, nunca formalizado, vindo, finalmente, a ser entregue, em 28.01.2009, ao A., por solicitação deste, a declaração em questão sendo que, a partir dessa data, aquele não mais trabalhou para a Ré.
É certo que a Ré pagou ao Autor a quantia de € 975,00, a titulo de proporcionais de retribuição de férias e subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano da cessação e a retribuição e subsídio de férias vencidas no dia um do ano da cessação ainda não gozadas, mas não se apurando a data e o circunstancialismo em que ocorreu, daí nada de relevante se extrai no sentido de imputar tal pagamento a um eventual despedimento.
Não tendo, assim, o A. feito prova do alegado despedimento, a qual lhe competia – art. 342º, nº 1, do CC –, não tem, também, direito à reintegração e às prestações que reclama com base na ilicitude desse alegado despedimento – retribuições desde a data do despedimento até à data da sentença e indemnização por danos não patrimoniais.
Assim, ainda que por diversa fundamentação, deve ser nesta parte, confirmada a sentença.
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3.2. Litigância de má fé.
A sentença recorrida condenou o A., como litigante de má fé, com a seguinte fundamentação:
«Diz-se litigante de má-fé, nos termos do artigo 456°, do Código de Processo Civil, quem com dolo ou negligência grave tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; tiver praticado omissão grave do dever de colaborarão; tiver feito do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».
Cumpre, desde logo, referir que a lei processual pune o litigante de má-fé independentemente do resultado a que a sua conduta conduziu uma vez que o dano não e um seu pressuposto operando a mesma oficiosamente só exigindo a formulação de um pedido quando esteja em causa a atribuição de uma indemnização a contra parte, o que nos presentes autos ocorre.
As referidas condutas apenas serão sancionadas se praticadas com dolo ou negligência, entendida esta como imprudência grosseira, destituída de um mínimo de diligência por parte do litigante que lhe permitiria facilmente dar-se conta a sua falta de razão.
A segunda das previstas condutas consiste se tiver havido alteração da verdade dos factos ou omissão de factos relevantes para a decisão da causa.
No caso dos presentes autos pede o Autor que seja declarada a ilicitude do despedimento promovido pela Ré e em consequência seja a mesma condenada a readmiti-lo no seu posto de trabalho, sem perda de qualquer direito ou regalia, a pagar-lhe todas as retribuições que teria auferido desde 30 dias antes da propositura da acção até à sentença, acrescida de juros de mora a taxa legal, a pagar-lhe a quantia de 4.625,00, a titulo de férias não gozadas e ainda a quantia de € 10.000,00, a titulo de indemnização por danos morais, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tanto, em suma, que foi admitido ao serviço da Ré em Abril de 2006 para exercer as funções de encarregado de exploração agrícola, o que fez desde então até Janeiro de 2009, sem ter gozado férias.
Mais aduziu que em Outubro de 2008 a Ré manifestou o propósito de proceder ao seu despedimento o que veio a concretizar no dia 28 de Janeiro de 2009 mediante a entrega da declaração de situação de desemprego fundada numa reestruturação, por motivos tecnológicos e estruturais.
Acrescentou que tais fundamentos não se verificaram, que foi o único trabalhador a ser despedido e que a Ré logo diligenciou pela sua substituição e que tendo manifestado a sua intenção de impugnar tal despedimento a Ré moveu-lhe um procedimento disciplinar que culminou na decisão de o despedir com justa causa por faltas injustificadas.
Mais alegou que tal procedimento por parte da Ré lhe provocou grande desgosto, frustração e constrangimento na obtenção de novo emprego, o que tudo se reflectiu na sua vivência diária com família e amigos.
Omitiu o Autor que a cessação do contrato ocorreu nas circunstâncias alegadas pela Ré, ou seja, na sequência de negociações tendentes à revogação do contrato por mútuo acordo, que só não chegaram a bom termo porquanto o Autor sem qualquer explicação ou justificação deixou de comparecer no local de trabalho e não cumpriu como acordado assinando o dito acordo.
Ora, atendendo a que os referidos factos eram do conhecimento do Autor e que os mesmos assumiam tal relevância que poderiam como levaram a improcedência da acção, conclui-se que o mesmo alterou da verdade dos factos e omitiu factos relevantes para a decisão da causa.
Com efeito, não podendo ignorar que havia encetado negociações com a Ré tendentes à cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo tendo aquela, inclusivamente a seu pedido, reduzido a escrito o acordo e procedido a alterações no mesmo, também a seu pedido, sabia o Autor ou não podia ignorar que os factos alegados na petição inicial alteravam a verdade dos factos e omitiam factos relevantes para a decisão da causa».
Não podemos concordar.
Desde logo, importa salientar que o recorrente, através do presente recurso, logrou uma modificação da sua situação, quanto ao fundo ou mérito da causa, ao não serem dados como provados os pontos de facto nºs 25 a 30, que anteriormente haviam recebido resposta diferente da julgadora.
Os mesmos meios de prova que haviam fundado a convicção da julgadora da 1ª Instância, nesta Relação, determinaram diverso entendimento, tudo isso traduzindo, afinal, contingências processuais que frequentemente criam tais áleas,
Exactamente por isso, no caso, a nova realidade fáctica surgida repercute-se na qualificação da conduta do recorrente, não permitindo, nesta instância de recurso, a emissão de um juízo suficientemente seguro sobre a eventual ausência de boa fé, por banda do ora Recorrente, ou, por outras palavras, não autorizam uma condenação tão gravosa como a do litigante de má fé.
Em consequência do supra decidido em sede de matéria de facto, não ficando provado que o A. tenha celebrado o referido acordo de cessação do contrato de trabalho, ou que tenha omitido factos relevantes à decisão – note-se que, na resposta à contestação, o A., recusando a existência de um acordo final, não deixou de admitir a existência de negociações com a Ré – o simples facto de não ter logrado provar o seu despedimento pela Ré, não é suficiente para dar como verificada a litigância de má fé.
Concluindo:
Não se vislumbra que o recorrente, em face dos factos que alegou e do seu comportamento processual, tenha litigado de má-fé.
Assim, nesta parte, procedem as conclusões do recurso.
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4. Atento o exposto, e decidindo:
Acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, na parte em que condenou o autor como litigante de má fé, no demais a confirmando, ainda que por diferente fundamentação.
Custas por ambas as partes na proporção do seu decaimento, que se fixa em 1/4 e 3/4, respectivamente, por A. e Ré.
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Porto, 11.10.201
José Carlos Dinis Machado da Silva
Maria Fernanda Pereira Soares
Manuel Joaquim Ferreira da Costa


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Sumário elaborado pelo relator:
I - Decorre do art. 394º, nº 1, do CT, aprovado pela Lei nº 99/03, de 27.08 que o acordo reveste obrigatoriamente forma escrita, ou seja, a forma escrita é uma formalidade “ad substantiam”, sendo que a inobservância dessa forma escrita gera a nulidade do eventual acordo, nos termos do art. 220º do CC.
II - A prova de tal acordo só podia ser feita através da confissão ou de documento escrito – cf. art. 393º, nº 1, do CC.
III - Inexistindo documento escrito, titulando o eventual acordo revogatório, ou a sua confissão, não podia tal acordo ser dado como provado.
IV - A Declaração de Situação de Desemprego, emitida e entregue ao trabalhador pelo empregador nos termos e para os efeitos dos art. 43º e 73º do DL 220/2006, de 03.11, na qual este declarou que o contrato de trabalho cessou por "acordo de revogação fundamentado em motivo que permita o despedimento colectivo ou extinção do posto de trabalho...", tem como destinatário a Segurança Social, não fazendo prova plena quanto à veracidade dos factos contidos na declaração, ou seja, não faz prova plena de que o contrato de trabalho cessou por despedimento por aquele promovido.
V - No domínio do despedimento promovido pelo empregador, a vontade de pôr termo ao contrato há-de ser “inequívoca”, admitindo-se os “despedimentos de facto”, corporizados numa atitude inequívoca daquele, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral.
VI - Não consubstancia um “despedimento de facto” a simples entrega ao trabalhador da Declaração de Situação de Desemprego, emitida e entregue ao trabalhador pelo empregador nos termos e para os efeitos dos arts. 43º e 73º do DL nº 220/2006, de 03.11.